Nenhuma outra cantora brasileira terá tido tanto poder de emocionar o público. (…) O agudo dourado de sua voz apaixonada comoveu todas as plateias como o canal inexcedível de vocalização dos assuntos amorosos: afetos e renúncias, êxtases e traições e baixarias da vida dos casais. (Moacyr Andrada – jornalista, escritor e crítico de música popular)
Vicentina de Paula Oliveira nasceu na cidade de Rio Claro/SP, em 1917. Seu pai, Mário de Oliveira, também conhecido como Mário Carioca, era marceneiro. No seu tempo livre, ele tocava clarinete e saxofone nas serenatas e ganhava alguns trocados tocando em matinês dançantes e em clubes sociais. Sua mãe, a portuguesa Alice do Espírito Santo de Oliveira era quituteira e doceira. Nair, Margarida e Lila eram suas três irmãs. O nome de Vicentina foi em homenagem ao irmão que não vingou, que iria se chamar Vicente, mas ela adotou o nome artístico de Dalva de Oliveira.
Mesmo antes de completar oito anos de idade, Mário Carioca já levava a filha consigo para cantar nas matinês dançantes. A garotinha, de pé num banquinho, soltava a voz cantando tango. Mas, após completar 8 anos, ela perdeu o pai, e a mãe se mudou para a cidade de São Paulo com as filhas, indo trabalhar como governanta. As meninas foram estudar num orfanato de freiras. Ali, Dalva começou a aprender piano e dança. Mas teve que deixar o orfanato, quando seus olhos verdes foram acometidos por uma enfermidade. Foi trabalhar como babá na casa em que trabalhava a mãe, onde deu início, ainda criança, a uma vida de trabalhos pesados: cozinheira, arrumadeira, faxineira, costureira e funcionária de fábrica de calçados.
A família de Dalva mudou-se para o Rio de Janeiro, indo morar num cortiço próximo à Central do Brasil. Certa vez, enquanto trabalhava numa fábrica de chinelos, um diretor de estação de rádio ouviu-a cantar, sendo levada por ele para fazer um teste. Ali se iniciava sua vida artística, passando por muitas rádios e cantando canções de grandes compositores. Terminou conhecendo Herivelto Martins que fazia a dupla Preto e Branco, com Nilo Chagas. Dupla que viria a se transformar em Trio de Ouro, com a participação de Dalva.
Quando trabalhava numa academia de dança como faxineira em São Paulo, após o serviço, ela aproveitava o tempo livre para cantar e tocar piano. Descoberta, foi convidada para excursionar pelo interior mineiro junto a um grupo que se desfaria na capital mineira. Em Belo Horizonte, ela cantou na Rádio Mineira e, segundo ela, foi ali que trocou “Vicentina” por “Dalva”, seguindo sugestão de Dona Alice.
Dalva de Oliveira, com sua voz límpida de soprano, sobressaia no Trio de Ouro em meio às duas vozes masculinas. Acabou se casando com um dos componentes do trio, Herivelto Martins. Ao gravar a marchinha “Cecy e Pery”, ela fez tanto sucesso que os fãs pediram-lhe que desse à sua criança, prestes a nascer, o nome de Pery ou Cecy, de acordo com o sexo. Assim nasceu Pery Ribeiro. Dois anos depois chegaria Ubiratan.
Ave Maria no Morro, composição de Herivelto Martins, foi uma das mais famosas das mais de 100 canções de Dalva de Oliveira, gravadas com o trio. Na sua discografia também estão duetos com Francisco Alves, além de canções gravadas somente por ela.
O casamento de Dalva de Oliveira com Herivelto Martins naufragou, desfazendo-se o Trio de Ouro. Imediatamente ela assumiu cantar sozinha, o que a levaria à condição de uma das mais famosas e brilhantes cantoras da época, emplacando um sucesso atrás do outro: Olhos Verdes (Vicente Paiva), Tudo Acabado (J. Piedade/Osvaldo Martins), Errei Sim (Ataulfo Alves), Que Será (Marino Pinto/Mário Rossi), dentre outros.
A separação de Dalva e Herivelto rendeu uma série de réplicas e tréplicas, com a mídia e os fãs tomando partido. Polêmica essa que durou dois anos. Foi eleita Rainha do Rádio, recebendo o cetro das mãos de Marlene. Ela gravou em Londres, depois de ter se apresentado em Portugal e na Espanha. Sua vendagem de disco era excepcional.
Dalva casou-se depois com o comediante, dançarino e empresário argentino Tito Clemente. O casal adotou a menina Dalva Lúcia. Mas a felicidade não bateu à porta da nova família, e o seu declínio vocal era iminente. Separaram-se. E, aos 47 anos, ela voltou a se casar. Dessa vez com seu ex-motorista e secretário, Manuel Nuno Carpinteiro, 28 anos mais novo do que ela. Em 1965, quando voltava de uma boate, o carro do casal capotou, matando quatro pessoas que se encontravam num ponto de ônibus. Dalva teve o maxilar afundado, a bacia fraturada e um grande corte no rosto. Ficou no hospital um bom tempo e dele saindo endividada e com uma profunda cicatriz na face. Depressiva, passou a beber muito. Conseguiu dar a volta por cima.
Dentre as novas gravações feitas por Dalva de Oliveira estava Bandeira Branca (Max Nunes/Laercio Alves), tida por pesquisadores musicais como o último clássico da canção carnavalesca e o último dela. A cantora morreu em 1972, aos 55 anos, vitimada por hemorragias ocasionadas por varizes no esôfago.
Nota
Acessem o link para ouvirem Ave Maria com a cantora.
http://www.youtube.com/watch?v=x2ear6xj0oY
Fonte de pesquisa:
Grandes Vozes/Coleção Folha de São Paulo
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