Aquele era um reino exuberante, cortado pelos Trópicos de Câncer e de Capricórnio, deitado indolentemente no meio da placa tectônica sul-americana. Sua privilegiada posição apenas o balançava – leve e imperceptivelmente – em seu extenso berço, protegendo-o contra os ciclones, terremotos e vulcões que afetavam os reinos vizinhos. Vez ou outra a Mãe Natureza descarregava – num ou noutro lugar – chuvas torrenciais, mas apenas para mostrar àquela gente que ela se encontrava sob seu comando. Porém, passados os temporais, tudo brotava como se fosse o Jardim do Édem – uma recompensa da generosa mãe pelos dissabores impingidos aos filhos.
Nem mesmo todos os sábios presentes no Universo seriam capazes de enumerar as riquezas minerais e vegetais daquele reino. Somente a título de exemplo, ali se encontravam o bioma mais importante do mundo e os dois maiores aquíferos da Terra. Escassez de água, portanto, não seria uma preocupação para suas futuras gerações. Assim, as ameaças ao futuro da humanidade no que diz respeito à falta do líquido da vida – até mesmo ocasionando guerras – não afetavam as pessoas do lugar que em razão de tamanha dadivosidade acabavam descambando para o desperdício. Quanto aos súditos, ainda que não primassem por uma educação de boa qualidade, não se podia dizer que não tivessem boa índole.
O fato é que toda essa generosidade do Criador em relação àquele reino despertou a ira dos outros reinos. Uma delegação foi encaminhada ao Céu com o objetivo de reivindicar mais benesses para os domínios reclamantes. Explicações foram dadas pelo Todo Poderoso e a delegação despachada de volta à Terra. Contudo, insatisfeitos com o parecer divino, os poderosos reais resolveram apelar para os poderes do Diabo. Falaram-lhe daquele reino X, privilegiado em todos os quesitos pela Mãe Natureza (assessora do Criador), como se o Paraíso fosse. Se nada mudasse, eles – os revoltosos – seriam capazes de destruir o planeta, pois armas para isso é que não lhes faltavam.
O Diabo – achando uma besteira das grossas aquela intenção de mandar a Terra em cacos pelos ares – achou que deveria intervir – não por bondade, é claro –, pois corria o risco de ficar vagando feito planeta fora de órbita, sem ter o que fazer, caso todos os humanos fossem transformados em pó. Explicou Satã aos prepotentes reclamantes que ele não poderia fazer nada no que diz respeito àquilo que o reino tinha recebido do Criador – pois, apesar de ser seu inimigo mor, não tinha poderes para tanto. Contudo, poderia manipular a bel-prazer os dirigentes daquele reino – pertencentes a qualquer que fosse o Poder. Em consequência acabaria destruindo a paz de seus súditos, jogando tudo na bancarrota, mas primando pelo enriquecimento dos peixes graúdos – os seus cúmplices. E assim aconteceu!
Não se pode dizer que o diabo não tenha trabalhado sério, cumprindo a promessa feita aos ambiciosos. A vida no reino transformou-se numa desgraça ambulante e o povão em bobos da corte. Tudo passou a andar de cabeça para baixo. A Esperança evaporou-se, deixando à vista um desespero cruel. A Credibilidade pegou sua trouxa e partiu para um lugar desconhecido, ficando a Mentira a alastrar-se como erva-daninha. A Ética bateu as botas, deixando o campo aberto para a Anarquia. O Nacionalismo – sempre muito frágil – foi para o CTI e lá permanece em agonia, enquanto o Entreguismo segue a todo vapor, esquartejando e distribuindo as riquezas do reino a outros reinos mais vorazes.
O infeliz reino desmorona a olhos nus. Ainda que boi manso, aperreado, arremeta, os vassalos só fazem ficar com a bola murcha, quando o que se precisa é botar a casa abaixo. Continuam submetidos à vontade dos poderosos, sempre reverentes e subservientes… Comendo o pão que o Diabo mandou os graúdos amassar para eles…
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Lu
Parabéns por este texto tão delicioso, tão preciso e tão necessário.
A LITERATURA é elementar em todos os tempos, pois nos permite inumeráveis possibilidades para a escrita e para a análise de tudo desta vida e de outras.
Adorei!!!
Um grande abraço daqui de Tiradentes,
Luiz Cruz
Luiz
Já estava com saudades suas, menino!
Notei que tenho escrito poucas crônicas, mas estou voltando à labuta, ainda mais com o seu incentivo:
“A LITERATURA é elementar em todos os tempos, pois nos permite inumeráveis possibilidades para a escrita e para a análise de tudo desta vida e de outras.”
Outro abraço para você,
Lu
O mal não tem limites!
Marcio “Osbourne” – Joinville/SC
Márcio
Ainda que não haja Justiça por parte daqueles que deveriam ser imparciais, existe a Lei da Ação e da Reação. Nada fica impune no Universo. Todos estamos sujeitos a estas leis cósmicas. Basta apenas dar tempo ao tempo.
Agradeço muitíssimo a sua participação.
Abraços,
Lu