Autoria de Lu Dias Carvalho
Lutar com as palavras/ é a luta mais vã./ Entretanto lutamos/ mal rompe a manhã. (Carlos Drummond)
O universo das palavras é por demais encantador, com seus mistérios e complexidades, de modo que cada palavra possui uma história, que vai passando por ajustes ou transformações através dos tempos. E algumas delas são como pessoas, que fogem a qualquer explicação plausível.
Estas diabinhas, muitas vezes, parecem nos enlouquecer. Uma mesma palavra pode ter significados diferentes em países que falam a mesma língua (ver puto no Brasil e em Portugal), ou vestir roupagens diversificadas, até mesmo dentro do próprio país, variando de uma região para outra (mandioca, macaxeira, maniva…), isto quando a diferença não se processa dentro de um mesmo Estado (entojada/sertão mineiro e grávida/capital mineira).
As expressões idiomáticas são uma pedra no sapato de quem tenta aprender uma língua estrangeira, pois o dicionário perde toda a sua imponência diante destas bruxinhas. Cortem-me a língua, se eu estiver mentindo. Imagine algum gringo, de dicionário em punho, tentando traduzir, palavra por palavra, a frase: A esposa saiu do casamento com uma mão na frente e outra atrás. Não haverá de colher bons frutos, o coitado.
Os dicionaristas, os escritores e todos os seres falantes lutam com as palavras, pois a língua é dinâmica, modifica-se constantemente para acompanhar as transformações que operam no dia a dia de um povo, quer para acompanharem as mudanças tecnológicas, científicas, literárias ou até mesmo para se afinar com o linguajar popular. E neste vai e vem, algumas palavras caem em desuso, outras tantas ressuscitam e mais outras são criadas.
Nos dias de hoje, quem tem a língua afiada, deve pesar as palavras antes de expô-las, caso não queira um processo judicial nas costas. O que significa que algumas destas senhoras caíram no desagrado conceitual. Ficaram démodé. Foram relegadas à marginalidade, pois reforçam o preconceito e difundem visões discriminatórias sobre pessoas ou grupos sociais. Bani-las do convívio entre os indivíduos seria uma forma de erradicar o preconceito existente na linguagem, pensam os defensores de uma linguagem politicamente correta. Mas temos, também, aqueles que se colocam ao lado das palavras “marginais”, defendendo que tais mudanças empobrecem o idioma e a comunicação, pois, muitas delas, originárias do latim, possuem dois mil anos e estão sendo banidas da língua portuguesa.
Assim, como o Professor Aldo Bizzocchi, doutor em linguística pela USP, penso que o problema não está na palavra, mas na intenção que o indivíduo exterioriza através dela. Ou seja, no tom com que se fala certa palavra ou no contexto em que ela se encontra inserida. Tudo é relativo.
Embora algumas palavras tenham ganhado a classificação de grosseiras, isto não acontece com a grande maioria que está sendo posta em xeque. Tais mudanças, em busca do politicamente correto, apareceram nos Estados Unidos, na década de 70, como herança dos direitos civis pós-guerra, e se espalham hoje por vários países ocidentais. A palavra homossexualismo, por exemplo, é uma da listagem das tidas como politicamente incorretas por gays e lésbicas. A explicação é que o sufixo “ismo” é indicativo de doença. Mas, o que dizer de liberalismo, positivismo, criacionismo, evolucionismo…?
Se tais mudanças começarem a ocorrer com muita assiduidade, a comunicação entre as pessoas vai se tornar cada vez mais difícil. Antigamente, aquele que perdesse um braço, era aleijado. Depois, passou a ser chamado de deficiente. Agora deve ser chamado de portador de deficiência física. Como acompanhar tanta mudança?
A Secretaria de Direitos Humanos lançou, em 2006, a Cartilha do Politicamente Correto. Dentre as muitas palavras que devem ser evitadas estão: baianada (abuso no trânsito), beata, bêbado, anão e palhaço, assim como certas expressões, a coisa está preta, etc. Só para citar um exemplo, o que dizer dos tantos “anões” que aparecem nos programas de tevê, sendo usados, muitas vezes, em situações deprimentes?
Policiar a linguagem tem muito mais a ver com educação, em todos os sentidos. Para mim é questão de caráter e ética de cada indivíduo. Educar o povo é a melhor mudança. As mudanças são permanentes, quando vêm de dentro para fora, sem maquiagem, mas resultante de uma boa educação familiar e escolar. O resto é pura maquiagem.
Glossário Politicamente Correto
(O uso da primeira palavra é incorreto)
gordo / portador de sobrepeso
favela/ comunidade
cego/ deficiente visual
negro / afrodescendente
velho/ idoso, da terceira ou melhor idade
surdo/ deficiente auditivo
pobre/ menos favorecido
deficiente/ portador de necessidade especial
empregada/ assistente
funcionário/ colaborador
homossexualismo/ homossexualidade
Nota: Imagem copiada de scienceblogs.com.br
Fonte de pesquisa:
Revista Época, 08/03/2010
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