Arquivo da categoria: História da Arte

O mundo da arte é incomum e fascinante. Pode-se viajar através dele em todas as épocas da história da humanidade — desde o alvorecer dos povos pré-históricos até os nossos dias —, pois a arte é incessante.

AS GRANDES BANHISTAS (Aula nº 85 B)

Autoria de Lu Dias Carvalho

A obra de Cézanne foi a maior revolução na arte desde que o impressionismo greco-romano transformou-se no formalismo bizantino. (Roger Fry – crítico e historiador)

A pintura de Cézanne representa um afastamento da arte puramente visual e sensorial para uma arte mais cerebral e intelectual. As lições e o legado de sua arte são fundamentais para se compreender o desenvolvimento da pintura moderna. (David Gariff)

O desenho e a cor não são distintos, porque tudo na natureza é colorido. À medida que se pinta, desenha-se; quanto mais a cor harmoniza, mais o desenho se torna preciso. Quando a cor atinge a riqueza, a forma encontra sua plenitude. (Cézanne)

O olho não é suficiente. É preciso refletir. (Cézanne)

O pintor francês Paul Cézanne pintou uma série de banhistas, tanto homens como mulheres, sendo As Grandes Banhistas acima uma delas. É também considerada a mais importante da série. Para ele os corpos nus de seus banhistas eram parte da paisagem, vistos como elementos naturais que a ela se integravam. O tema era usado pelo artista com a finalidade de fazer estudos sobre a ordenação das figuras no espaço e sua composição cromática, o que era muito comum na história da arte.

Neste quadro as banhistas também estão divididas em dois grupos, separadas por um pequeno espaço que permite ver a paisagem do outro lado do rio, com um campo aberto, árvores e algumas edificações. Ali também estão duas outras figuras humanas. As banhistas encontram-se nas mais diferentes posições: assentadas, deitadas, de pé, de cócoras, etc., numa perfeita união com a natureza.

As figuras que compõem o grupo da direita estão bem próximas. A luminosidade do sol atravessa as folhas e reflete no corpo das banhistas, que compõem a base de um triângulo, formado por duas árvores que vergam e se encontram na parte de cima, formando o ângulo superior. As cores usadas pelo pintor passam pelo azul-claro do céu, com nuvens brancas esparsas e toques de rosa, pelo azul mais forte da água, no qual espelham o verde-escuro da vegetação. Uma luz clara irradia sobre os corpos nus.

O pintor possivelmente não usou modelos vivos na sua série de telas sobre as banhistas, preferindo os desenhos de nus de seus estudos, muitos deles da época em que era estudante, ou os realizados ao visitar o Louvre, ou ainda os encontrados em revistas. Deles retirava aquilo que lhe convinha.

Cézanne levou sete anos trabalhando nesta tela. Uma das mulheres de pé à esquerda, toma exatamente a inclinação do tronco ao seu lado.

Nota: este quadro serviu de modelo para que Matisse pintasse as suas banhistas.

Ficha técnica
Ano: c. 1898-1905
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 208 x 249 cm
Localização: Museum of Art, Filadélfia, EUA

Fontes de pesquisa
Cézanne/ Coleção Folha
Cézanne/ Abril Coleções
Cézanne/ Girassol
Cézanne/ Taschen
Grandes Pinturas/ Publifolha

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A AULA DE DANÇA (Aula nº 85 A)

Autoria de Lu Dias Carvalho

À parte das falsas aparências no palco, Degas mostra todas as fealdades reais, a precocidade doentia das moças de fisionomias envelhecidas, bem magras, bastante audazes ou sonhadoras demais, sobre membros infantis. (Paul Lafond)

A composição intitulada A Aula de Dança faz parte das obras-primas do pintor impressionista e de uma série de pinturas com o mesmo tema. Edgar Degas era encantado pelo balé. Assistia tanto aos ensaios como às suas representações. Pintou inúmeras telas sobre o tema, captando em minúcias expressões e poses de cada bailarina, resultando num conjunto bem elaborado e no seu perfeito entrosamento com o espaço, o que o transformou no mais importante pintor de bailarinas.

Ao pintor não importava retratar a beleza dos corpos. Ele gostava de captar sobretudo o esgotamento, o cansaço, a dor extenuante e as lágrimas advindos de muitas horas de ensaio. Podemos dizer que ele mostrava a outra face da moeda, aquela que não era observada durante as apresentações, embora também pintasse tais momentos. Não lhe importava a emoção dos artistas e público, mas o aspecto plástico, a união entre luzes, sombras e figuras humanas.

Na composição A Aula de Dança um grupo de bailarinas faz um semicírculo em volta do professor, enquanto esse dá explicações à aluna que se encontra à sua frente. O rosto da garota expressa seu estado de concentração, encontrando-se numa postura de balé clássico. As demais alunas aproveitam para descansar ou para treinar alguns passos. Elas usam faixas com cores vivas e fitas pretas no pescoço.

Degas traz a ilusão de movimento na pintura, ao individualizar as bailarinas que se encontram em diferentes posturas e gestos. É interessante notar a maestria do pintor, ao criar a ilusão de profundidade, como ao pintar tábuas diagonais com suas nítidas linhas pretas e as colunas verticais de mármore preto que criam fortes verticais e levam o olhar do observador para o fundo da tela, onde se encontra uma garota consertando o seu colar.

Um cãozinho terrier aparece cheirando as pernas da bailarina de laço verde e sapatilhas cor de rosa, postada em primeiro plano e de costas para o observador. À sua esquerda uma bailarina está assentada sobre o piano, coçando as costas, enquanto abaixo dela, quase oculta, outra ajeita seu brinco. Debaixo do piano encontra-se um regador verde-escuro, onde o pintor assinou seu nome. A presença de tal objeto na pintura lembra que ele é usado para umedecer as tábuas empoeiradas do salão. Cãozinho e regador dão um toque de leveza ao rigor da composição.

O coreógrafo que também usa sapatilhas encontra-se de pé no meio do salão, com os braços apoiados no seu bastão de madeira que serve para marcar o compasso. Ele é a figura central da composição. Trata-se do famoso bailarino e coreógrafo Jules Perrot. No fundo da sala um grupo embevecido de mães observa suas filhas, enquanto as garotas mostram-se à vontade nas mais diferenciadas posições.

Na composição o observador parece fazer parte da cena, assim como o pintor, mas sem ser notado. Ele apenas olha sem ser observado. As bailarinas estão voltadas para o mestre ou para si mesmas, enquanto as mães observam-nas.

Curiosidades

  • Durante a Belle Époque a capital francesa fascinava os artistas impressionistas com a dança, sobretudo com o balé.
  • Embora o balé fosse um tipo de dança muito apreciado naquela época, não se tratava de uma atividade respeitável, de modo que muitas bailarinas tornavam-se prostitutas, sendo cobiçadas pelos burgueses ricos. Como mudam as coisas!

Ficha técnica
Ano: 1873-1876
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 85 x 75 cm
Localização: Museu D’Orsay, Paris, França

Fontes de pesquisa
Degas/ Coleção Folha
Degas/ Abril Coleções
Arte em Detalhes/ Publifolha

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OS GUARDA-CHUVAS (Aula nº 84 D)

Autoria de Lu Dias Carvalho

Talvez Renoir seja o único grande pintor que nunca fez um quadro triste. (Mirbeau)

A composição Os Guarda-chuvas é uma obra do chamado período “áspero” de Renoir, quando ele se encontrava na travessia do estilo Impressionista para um novo, mas ainda cheio de dúvidas, de modo que é possível encontrar elementos do Impressionismo presentes no quadro, inclusive o corte de figuras nas margens da tela.

A obra mostra o vai e vem de pessoas, debaixo de seus guarda-chuvas, num dia chuvoso na cidade, onde predominam os tons azuis, cinzentos e castanhos. O pintor iluminou-os com cores brilhantes. Ao contrário de suas obras impressionistas, Renoir trabalha as formas com precisão, como podemos ver no aro que a criança segura, nos guarda-chuvas e na chapeleira que a costureirinha segura no braço.

Os guarda-chuvas encontram-se nas mais variadas posições e direções, o que confere ao quadro uma grande variação de formas. Destacam-se como personagens principais da composição: as duas crianças com seus chapéus pomposos e a costureira carregando uma chapeleira. Apesar do dia acinzentado, as figuras parecem alegres, uma característica constante na obra do pintor.

Há uma certa dicotomia na composição da tela. Na parte direita uma senhora burguesa, elegantemente vestida, volta o olhar para suas duas crianças, cuja pintura lembra o estilo impressionista. Por sua vez, a bela costureira com a chapeleira, à esquerda da tela, possui traços nítidos, com sua silhueta bem delineada. Além disso, o azul aplicado na parte direita da tela é cobalto, enquanto o da esquerda trata-se de azul-marinho. O que demonstra que o quadro foi trabalhado em períodos diferentes.

Renoir coloca justapostas no primeiro plano duas figuras femininas de classes diferentes: uma burguesa e uma operária. A costureira não usa chapéu e, apesar de sua condição humilde, tem o porte altivo de uma grande dama, indiferente aos galanteios do homem a seu lado que lhe oferece guarida debaixo de seu guarda-chuva. Os olhos da jovem dirigem-se para o observador.

Atrás da personagem burguesa uma mulher olha para o céu e abre o seu guarda-chuva, sinalizando que começara a chover. A criança que carrega o aro usa um aparatoso chapéu e um esmerado casaco. Renoir era conhecido pela destreza em retratar crianças. A pequenina parece olhar diretamente para o observador. Em meio à aglomeração uma figura levanta mais alto o seu guarda-chuva, tentando abrir caminho sem bater nos outros. Pela posição dos guarda-chuvas é possível notar que as pessoas caminham em diferentes direções.

A falta de chuviscos e a calma das figuras não conferem realidade à composição no que diz respeito ao momento da queda da chuva. Apesar de aglomeradas, as pessoas parecem ignorar umas às outras.

Ficha técnica
Ano: 1881-1886
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 180 x 115 cm
Localização: The National Gallery, Londres, Grã Bretanha

Fontes de pesquisa:
Renoir/ Folha Coleções
Renoir/ Abril Coleções

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ROSA E AZUL (Aula nº 84 C)

Autoria de Lu Dias Carvalho

                                     

Decênios depois, a menor das modelos, então Lady por ter casado com o general Townsend of Kut, relembraria que o tédio das sessões era compensado pelo prazer de vestir o elegante vestido de renda. (Ettore Camesasca)

Parti imediatamente após terminar o retrato das meninas Cahen, tão cansado que nem lhe sei dizer se a pintura é boa ou ruim. (Renoir)

A obra Rosa e Azul, nome popularmente conhecido da composição em razão das cores das vestimentas das meninas, é também conhecida como As Meninas Cahen d`Anvers. Trata-se de um dos retratos mais conhecidos de Renoir que era exímio em retratar crianças. É também um dos quadros mais visitados no Museu de Arte de São Paulo, onde se encontra desde 1952.

Renoir retratou na composição as duas irmãs: Alice — a de cabelos escuros — e Elizabeth — a de cabelos loiros — filhas de um banqueiro judeu. Elas se encontram com a idade de cinco e seis anos, respectivamente. As duas garotinhas são representadas com seus vestidos rendados, embebidos de luz, com longas faixas na cintura. As meias e os laços dos cabelos possuem a mesma cor das faixas: uma rosa e outra azul, cores reforçadas pelo forte tom do tapete e das cortinas.

A irmã mais velha segura na mão da mais nova, como se quisesse protegê-la do cansaço. Os cabelos de Elizabeth, amarrados com um enorme laço, caem-lhe pelas costas e na frente, quase tocando-lhe a cintura, enquanto os de Alice, também amarrados com um laço, estão jogados para trás. As perninhas abertas da menor — de modo a sustentar o corpo com mais facilidade — denotam o seu cansaço, enquanto descansa a mão na sua faixa rosa. Seus olhos chorosos fitam o observador, como se estivesse a pedir uma pausa para um descanso.

Conforme relatou Renoir, não foi fácil retratar as duas pequenas, sendo necessárias várias e penosas sessões de poses. Elizabeth, a mais velhas, mostra-se vaidosa, segurando delicadamente a renda de seu vestido, mas Alice, a menorzinha, parece cansada, trazendo o rostinho fechado, querendo chorar.

Ao que parece, a família Cahen não ficou satisfeita com o resultado da composição, pois além de ter demorado um ano para pagar o pintor, ainda colocou o quadro na ala dos empregados da casa, o que denotou o seu desprezo pela pintura das filhas, embora Renoir já tivesse pintado outros quadros dessa mesma família.

A obra foi descoberta em 1900 — aparentemente abandonada — e depois disso fez uma longa caminhada até chegar ao Brasil. Foi adquirida em um leilão em Nova York em 1952 pelo Museu de Arte de São Paulo (MASP), com recursos doados por Assis Chateaubriand, fundador do Museu. O quadrinista Maurício de Sousa também criou as suas fofas menininhas, alusivas à composição, com os personagens Magali e Mônica de Rosa e Azul.

Ficha técnica:
Ano: 1881
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 119 x 74 cm
Localização: Museu de Arte de São Paulo, São Paulo, Brasil

Fontes de pesquisa:
Renoir/ Folha Coleções
Renoir/ Abril Coleções

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O ALMOÇO DOS REMADORES (Aula nº 84 B)

Autoria de Lu Dias Carvalho 

Estou em Chatou. Comecei a pintar um quadro de remadores que me tentava havia muito tempo. De vez em quando é preciso buscar coisas que estejam acima das próprias forças. (Renoir)

Tenho conhecido pintores que não fizeram nada de útil, porque se dedicaram a seduzir as mulheres em vez de pintá-las. (Renoir)

Renoir foi um dos principais integrantes do Impressionismo, sendo sua composição O Almoço dos Remadores a sua última grande obra no estilo, antes de buscar novos caminhos na pintura, como veremos mais adiante. Na composição o pintor retrata um almoço num dia de feriado, no terraço do restaurante francês La Fournaise, nas margens do rio Sena em Chatou, num dia quente de verão. A maioria dos modelos ali presentes são seus amigos e clientes habituais do lugar, todos muito jovens. Este quadro tornou-se uma das mais importantes criações do movimento impressionista.

Embora haja quatorze figuras na cena, são os dois barqueiros o eixo central da composição, não só pela robustez de seus corpos musculosos, como pelo tipo de roupa que usam, contrastando com os demais. Eles, ao contrário dos outros, usam camisetas brancas, deixando braços e pescoço nus. À época a moral burguesa exigia que todo o corpo estivesse coberto, sendo que os braços nus dos atletas poderiam trazer constrangimento às mulheres, o que não parece ocorrer com as da composição.

Todas as cinco garotas presentes na mesa usam chapéus, pois esses eram à época o símbolo da respeitabilidade e de status social. As mais pobres têm os chapéus adornados de flores e fitas, decorados por elas mesmas. Ao fundo uma mulher, ricamente vestida com seu casaco de pele e usando luvas, tapa os ouvidos para não escutar os elogios dos dois fãs ao seu lado.

O terraço está fechado por uma balaustrada. Finas estruturas de metal suportam o toldo de listras vermelhas que o cobre. Uma garota apoia-se despreocupadamente na balaustrada, enquanto ouve atentamente o personagem à sua frente. No parapeito também se encosta um dos barqueiros, numa atitude de ausência, parecendo mirar ao longe. Alguns personagens estão assentados ao redor de duas mesas, enquanto outros encontram-se ao fundo, no lado esquerdo da composição. Uma moça (futura esposa de Renoir) tem um cãozinho nos braços que traz suas patinhas traseiras sobre a mesa.

Ao fundo, entre as ramagens e na parte superior esquerda da composição, algumas embarcações podem ser vislumbradas, deslizando sobre as águas do rio Sena. Observando os objetos nas mesas, é possível concluir que o almoço está chegando ao fim, ou seja, os remadores e seus amigos acabam de comer.

Renoir mostra aqui sua perícia em pintar naturezas-mortas, ao representar os restos da refeição. Sobre a toalha branca da mesa em primeiro plano encontram-se um guardanapo amassado, uma fruteira, um pequeno barril de conhaque, garrafas de vinho semi-cheias e diversos tipos de copos: os grandes para o vinho tinto, os altos para o café, os pequenos para conhaques e licores.

Ficha técnica
Ano: 1880-1881
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 130 x 173 cm
Localização: The Phillips Collection, Washington, EUA

Fontes de pesquisa
Renoir/ Coleção Folhas
Renoir/ Coleção Girassol
Renoir/ Abril Coleções
Los Secretos de las Obras de Arte/ Editora Taschen

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BAILE NO MOINHO DA GALLETE (Aula nº 84 A)

Autoria de Lu Dias Carvalho

É difícil entender por que este quadro provocou uma tempestade de indignação e escárnio. Percebemos sem dificuldade que a aparente superficialidade nada tem a ver com desleixo, mas é, pelo contrário, o resultado de um grande talento artístico. Se Renoir tivesse pintado todos os detalhes, o quadro teria um aspecto enfadonho e sem vida. (E. H. Gombrich)

Levou algum tempo até o público descobrir que, para apreciar um quadro impressionista, deve recuar alguns metros e desfrutar o milagre de ver essas manchas intrigantes súbito se organizarem e ganharem vida diante dos olhos. (E. H. Gombrich)

Os artistas da época do Impressionismo estavam sempre presentes nos bailes realizados no ex-moinho, situado na colina de Montmartre em Paris, a uma hora de caminhada do centro da cidade, onde se reuniam costureiras e trabalhadores em seus dias de folga, em busca de modelos para suas pinturas ou aventuras passageiras. Havia muitas garotas pobres ali que cobravam muito pouco para posar. Renoir retrata nesta composição um baile no local, onde os personagens são os seus amigos, garotas e operários que estão pousando para ele.

Baile no Moinho da Gallete é uma das mais conhecidas e admiradas pinturas de Renoir, tida como a mais bela do século XIX e uma das obras-primas do Impressionismo. Nela o pintor faz um uso excepcional do espaço, trazendo uma fantástica ideia de multidão, através da superposição de rostos. Também dá vida a uma festiva combinação de cores brilhantes, trazendo o efeito da luz do sol sobre os alegres participantes. Raios de sol atravessam as folhas das árvores frondosas, iluminando pessoas e ambiente, o que nos traz a certeza de que ainda era dia (os bailes ali começavam às 15h e acabavam às 23h). Os postes brancos com lampiões dão uma beleza singular à cena.

O local, antes de Renoir, tinha trinta moinhos de vento funcionando. E “galette” — dá nome aos moinhos — era um tipo de pastel liso feito de farinha moída, servido ali. Os dois moinhos que sobraram pertenceram à família Debray, sendo um deles transformado em uma construção isolada, ao lado da qual foi aberto um local de dança. Tratava-se de um barracão já bem arruinado, ornamentado com vime e pintado de verde. Ao lado havia um jardim com muitas árvores, onde uma orquestrava tocava polcas, valsas, cancan, etc. Cobrava-se uma quantia insignificante para se frequentar os bailes.

O clima da composição é festivo, mostrando casais dançando, jovens conversando em suas mesas, pessoas de pé observando o movimento, algumas assentadas em bancos, outras próximas à orquestra e outras no pátio do local. O pintor francês organizou sua composição da seguinte maneira:

1- dois círculos, sendo um mais fechado, no lado direito em volta da mesa, e o outro mais aberto, à esquerda em volta da mulher de vestido cor de rosa e seu par;
2- uma pirâmide: as três figuras do primeiro plano formam uma pirâmide;
3- linhas verticais formadas por pessoas de pé, pares dançantes, suporte dos lampiões, etc;
4- linhas horizontais formadas pelos postes dos lampiões, pela construção de madeira pintada de branco, etc.

O quadro parece ter vida própria, tamanha é a vibração, que repassa ao observador, como se tudo fosse movimento. Como se trata de uma obra impressionista em que não há preocupação com os contornos e detalhes, a composição parece que ainda está por terminar, pois apenas algumas cabeças das figuras, no primeiro plano, trazem detalhes, ainda que de maneira não convencional.  À medida que vão se afastando do primeiro plano, as figuras vão se tornando cada vez mais fugidias, desmanchando-se ao sol e no ar.

É interessante notar que o pintor corta parte das figuras nas margens direita e esquerda, para repassar a ideia de continuidade, ou seja, a de que ele captara com seus pincéis apenas parte do ambiente onde se realiza o baile. É também um meio para dar mais naturalidade à cena, de modo a passar a impressão de que os personagens não estão pousando para ele e que tudo acontece naturalmente.

Os personagens ao redor das mesas formam o primeiro plano da composição. A moça do vaporoso vestido listrado, assentada num banco de frente para um rapaz assentado numa cadeira e de costas para o observador, tem os cabelos e parte do rosto coberto pelas sombras, enquanto o sol reflete sobre sua boca e queixo. A modelo tinha 16 anos na época. A mulher de vestido cor de rosa e seu par ganharam um destaque especial no quadro, podendo ser visualizados por inteiro, isolados dos demais casais dançantes. Tem-se a sensação de que o par dança sobre nuvens. No centro da parte esquerda da tela é possível flagrar um casal em clima de flerte. O homem descansa o braço esquerdo no tronco da árvore, inclina-se para a frente, cortejando a moça vestida de azul, recostada na árvore bem à sua frente.

Crianças também estão presentes na composição, o que dá à cena um certo ar de pureza. No canto inferior esquerdo da pintura, uma garotinha de cabelos loiros com fita conversa com uma moça. Ambas estão assentadas num banco. Na verdade, à noite, quando se acendiam as lamparinas, para ali vinham delinquentes e prostitutas com seus cafetões, acontecendo muitos brigas ou navalhadas. Durante a parte da tarde, ao contrário do que acontecia à noite, as mulheres eram obrigadas a se comporem com um chapéu em sinal da respeitabilidade. Quanto menos roupa uma garota usasse, mais duvidosa era a sua reputação, mas muitas garotas na composição de Renoir são vistas sem chapéu. Todos os homens são vistos usando chapéu no Moulin de la Galette, mesmo quando estavam dançando, pois uma pessoa educada devia deixar o chapéu na cabeça (Como mudam os tempos!). Alguns usavam um chapéu de palha de verão, outros um chapéu preto de feltro. Grenadine era a bebida mais usada. Tratava-se de um xarope de Granada, com água.

Renoir usou pinceladas cintilantes para unir as personagens do baile, sem se preocupar com a clareza das formas. Talentoso, o artista nutria indiferença por qualquer tipo de intelectualismo.

Dados técnicos
Data: 1876
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 131 x 175 cm
Localização: Museu d`Orsay, Paris, França

Fontes de Pesquisa
istória da Arte/ E. H. Gombrich
Renoir/ Abril Coleções
Renoir/ Coleção Folha
Renoir/ Coleção Girassol
Tudo sobre arte/ Editora Sextante
Los secretos de las obras de arte/ Taschen

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