Arquivo da categoria: História da Arte

O mundo da arte é incomum e fascinante. Pode-se viajar através dele em todas as épocas da história da humanidade — desde o alvorecer dos povos pré-históricos até os nossos dias —, pois a arte é incessante.

ASTROLOGIA, ALQUIMIA E FIM DO MUNDO (Aula nº 59)

Autoria de Lu Dias Carvalho

   

Platão, Aristóteles e a maioria dos autores clássicos acreditavam haver uma relação entre o que ocorria nos céus e aquilo que acontecia na Terra, ou seja, criam que o macrocosmo do Universo interferia no microcosmo terrestre. A existência de tais ideias suscitou um grande interesse pela astrologia que se sedimenta na crença de que planetas e estrelas afetam os acontecimentos de nosso mundo. Os astrólogos do final do século XV e do século XVI presumiam que a Terra era um globo que se encontrava no coração do Universo esférico e em torno dela giravam sete esferas cristalinas, sobre as quais ficavam planetas e estrelas. Apenas um número muito pequeno de pessoas, tidas como cultas, consideravam que a Terra fosse plana — mesmo na Idade Média.

A partir do século XVI e início do XVII os eruditos passaram a rejeitar a tese do mundo antigo que rezava que a Terra estava situada no centro do Universo, convencendo-se de que o Sol encontrava-se no coração do sistema planetário, exercendo a principal influência recebida pela Terra. Embora o astrônomo e matemático polonês Nicolau Copérnico (1473-1543) acreditasse que os planetas eram direcionados por “espíritos” e “inteligências celestiais”, o seu modelo heliocêntrico (tem o Sol como centro) foi muito importante para que o astrônomo, astrólogo e matemático alemão Johannes Kepler (c.1571-1630) e o físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano Galileu Galilei (1564-1642) — o primeiro a fazer uso do telescópio para estudar os céus — obtivessem grandes êxitos, sendo o modelo heliocêntrico também muito importante para a ciência da astronomia.

Os eruditos buscavam, desde a Idade Média, a compreensão da alquimia. Nos séculos XV e XVI o surgimento dos textos gregos e hebraicos trouxeram novas informações sobre como transformar o metal “base” em ouro. Segundo tais fontes, o Universo era comandado por forças ocultas, sendo morada de anjos e demônios. Asseveravam que o mago que dominasse o funcionamento de sua estrutura ganharia o poder de controlar suas forças, podendo, portanto, conhecer os segredos da alquimia e em consequência conhecer o destino dos homens. Para que seu estudo não fosse confundido com feitiçaria, os alquimistas e os magos do século XVI usavam símbolos intrincados e descrições alegóricas.

Muitos dos alquimistas acreditavam que, ao encontrar a pedra filosofal (Lapis Philosophorum em latim — essencial para obter ouro a partir de qualquer metal — também encontrariam uma fórmula para a sociedade humana perfeita. A transmutação do ouro, portanto, não estava ligado à usura, mas, sim, à espiritualidade.  A pedra filosofal não era algo físico, mas uma substância lendária que eles tentavam recriar em seus laboratórios.  Além disso, ela também se encontrava ligada a outro desejo: obter o elixir da vida — substância capaz de prolongar a vida daquele que a bebesse, segundo a concepção dos alquimistas.

A expectativa pelo “fim do mundo” — evento hipotético — é antiga e faz parte da tradição da cultura ocidental. Em priscas eras não foram poucos os que anunciaram o fim do planeta Terra e o mesmo vem acontecendo até os dias de hoje. As previsões dizem respeito a riscos catastróficos globais, causados por alterações climáticas, guerra nuclear, pandemias, armas de nanotecnologia (ciência que permite a divisão ou a criação de corpos em minúsculas partículas), inteligência artificial (similar à humana exibida por sistemas de software) hostil e até mesmo seres de outros planetas (extraterrestres). A primeira previsão de que se tem notícia sobre o fim do mundo aconteceu em 66-70 d.C., quando a seita dos judeus essênios tomou a revolta judaica contra os romanos como o fim dos tempos que traria a chegada do Messias.  

No final do século XV o norte da Europa viu-se tomado pela convicção de que estava chegando os fins dos tempos. Publicações apregoavam os malefícios de sua época. Aliado a isso estavam as queixas contra a arrogância dos governantes, a violência propagada por bandos de soldados mercenários, transitando de um país para outro, a corrupção e a riqueza desmedida da Igreja e a ganância dos mercadores. As pessoas acreditavam que Deus andava muito contrariado com a humanidade, como provavam as más colheitas, as revoltas de camponeses, os surtos de epidemias, a violência desenfreada, etc. Tudo isso contribuía para que o terror relativo ao fim do mundo, numa época muito supersticiosa, ficasse extremado, fazendo surgir a piedade popular. Falsos profetas surgiam de todos os lados e eram muitas as maneiras buscadas para asseverar uma vaga no Céu. Isso tudo comprova que, quanto mais se distancia da Ciência, mais a humanidade fica refém das superstições, vivendo sob o jugo dos espertalhões.

A publicação em 1486 de um livro intitulado “O Martelo das Bruxas”, no qual eram descritas cerimônias de bruxaria, aumentou ainda mais o terror baseado na crença de que uma conspiração diabólica encontrava-se em curso para botar o mundo sob o domínio de Lúcifer. Hieronymus Bosch, pertencente ao norte europeu, foi um dos mais destacados artistas a abordar esse campo de fim de mundo, tendo se tornado extremamente famoso por usar suas obras aterrorizantes como uma advertência contra as forças do mal.

Exercício
1. O que pensava Platão, Aristóteles e a maioria dos autores clássicos sobre a Terra?
2. O que buscavam os alquimistas?
3. O que aconteceu no final do século XV no norte da Europa?

Ilustrações: 1. A Terra no Universo / 2. Elementos da alquimia 3 / Fim do Mundo

Fontes de pesquisa:
Renascimento/ Nicholas Mann
https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_datas_previstas_para_eventos_apocal%C3%

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RENASCIMENTO E REFORMA PROTESTANTE (Aula nº 58)

Autoria de Lu Dias Carvalho

O Renascimento continuava a todo vapor na Itália, exercendo influências nos mais diversos campos. Entretanto, nos países setentrionais (Alemanha, Países Baixos e Inglaterra) as coisas andavam bem complicadas para os artistas. Enquanto os mestres do sul europeu aprendiam a lidar com as novas descobertas, os artistas do norte defrontavam-se com um problema de extrema gravidade para eles: se a pintura podia e devia existir. Mas o que aconteceu com a arte, sobretudo a pictórica e a escultórica, no norte europeu, tão rico em artífices? A cisão religiosa que tanto abalou as estruturas da arte nos países citados tinha um nome: Reforma. Mais uma vez a religião deixava seu real campo de trabalho para se intrometer em outras searas.

O fato é que como acontece em todas as comunhões — em meio aos adeptos do protestantismo existiam os extremistas que se opunham à existência de pinturas ou estátuas, principalmente nas igrejas, sob a alegação de que se tratava de idolatria. E mais, os protestantes extremados censuravam até mesmo as decorações alegres nas casas. E essas, quando permitidas em “teoria”, o tipo de construções, assim como o clima local, era impróprio para grandes afrescos decorativos, à maneira daqueles com os quais a nobreza italiana ornamentava seus palácios.

Os artistas de terras protestantes — em razão do rigor religioso — viram cair por terra a sua mais importante fonte de renda: a pintura de retábulos. Restava-lhes tão somente a ilustração de livros (objetos acessíveis a um número limitado de pessoas) e a pintura de retratos, o que era insuficiente para garantir-lhes uma vida decente, possibilitando-os a viver da profissão escolhida. Não foram poucos aqueles que abandonaram seu país em busca de ventos mais libertários, onde pudessem trabalhar mais livremente.

O Renascimento no norte europeu estava ligado a sentimentos nacionalistas e religiosos que acabaram por desaguar na Reforma que, por sua vez, dividiu o mundo cristão em duas partes: católico e protestante. O início da Reforma é geralmente estipulado em 1517 (século XVI), quando Martinho Lutero (1483-1546) — crítico da Igreja Cristã de então — passou a pregar contra seus excessos. Era um ferrenho opositor do preceito de que se podia ganhar a salvação eterna praticando rituais e comprando indulgências, uma espécie de passagem para o Céu. Se Martinho Lutero aos nossos dias voltasse, certamente faria uma nova reforma, ao ver que tudo aquilo que condenava, encontra-se a todo vapor em meio àqueles que se dizem profetas de seus ensinamentos (venda de grãos de feijão, de óleo e sal ungidos, de espadas milagrosas, etc, e os mais bizarros rituais em nome da prosperidade). O rompimento total entre católicos e protestantes aconteceu por volta de 1521.

O humanismo alemão também foi impactado pela Reforma, perdendo grande parte de seu vigor, uma vez que os novos líderes religiosos, embora estimassem a eloquência, a poesia, a habilidade retórica e os conhecimentos clássicos, não o via como um fim em si, mas tão somente como um meio de ocupação dos cristãos protestantes. Em consequência de tantas mudanças bruscas, os primeiros humanistas alemães deixaram de lado o interesse por estudos que vinham fazendo, a exemplo da cabala, do ocultismo e do neoplatonismo. As escolas e as universidades protestantes passaram a só ensinar os textos clássicos tidos como “seguros”, ou seja, aqueles que eram convenientes aos novos mandantes. A arte literária tornou-se predominantemente religiosa. Vemos aqui uma prova de que a história da humanidade é cíclica, pois novamente a religião passa a comandar os caminhos do homem na arte.

Os Países Baixos protestantes tornaram-se independentes nos anos finais do século XVI. O estudo dos clássicos centralizou-se na Universidade de Leiden, onde ainda era possível encontrar tolerância religiosa e abertura intelectual. Muitos eruditos por ali passaram, como foi o caso de Lipsius (1547-1606), dono da obra-prima conhecida como Annales de Tácito. Assim como o teólogo e filósofo humanista Erasmo de Roterdã (1466-1536) —  tido como o mais importante humanista do norte europeu — que correspondeu com humanistas e eruditos da Europa.

A Polônia foi outro país do norte europeu que teve comportamento igual ao dos Países Baixos. Recebeu refugiados religiosos, não importando a denominação, assim como permaneceu aberto às novas ideias. Ali, a astronomia distinguiu-se entre todos os ramos do conhecimento, sendo capaz de desafiar os dogmas teológicos legados pela Idade Média, tendo no astrônomo e matemático polonês Nicolau Copérnico (1473-1543) sua maior figura. Foi responsável por desenvolver a teoria heliocêntrica do Sistema Solar, jogando por terra a crença de que o Sol gravitava em torno da Terra, o que abalou os ensinamentos dos teólogos que em seus argumentos religiosos citavam a imobilidade da Terra.

O Renascimento do norte europeu, além de ter sido influenciado pela erudição dos mestres italianos, também teve suas próprias características, como o fato de mostrar-se mais voltado para os temas religiosos e de piedade pessoal, enquanto italiano cobria os mais diferentes campos. Se o humanismo do norte buscava a grandiosidade da criação de Deus, vendo o homem como um ser insignificante e sem nenhum mérito, o italiano via o homem como capaz de melhorar a si próprio, capacidade essa que podia vir de uma preparação e educação adequadas. A corte de Rodolfo II em Praga serviu de refúgio para artistas, eruditos e cientistas que discordavam das novas diretrizes eclesiásticas, impedindo, assim, outro conflito religioso.

Exercício
1. O que aconteceu aos artistas após a Reforma no norte europeu?
2. Como a Reforma impactou o humanismo?
3.Qual foi a importância de Nicolau Copérnico?

Fontes de pesquisa
A história da arte/ E. H. Gombrich
Renascimento/ Nicholas Mann

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O HOMEM VITRUVIANO (Aula nº 57)

Autoria de Lu Dias Carvalho

          

O pintor italiano Leonardo da Vinci é tido como uma das mais importantes figuras da arte ocidental. Embora tenha sido conhecido principalmente como pintor, era também cientista, matemático, engenheiro, inventor, anatomista, escultor, arquiteto, botânico, poeta e músico. Dentre os desenhos deixados por ele, o Homem Vitruviano (ou o Homem de Vitrúvio) tornou-se um ícone cultural. Sobre tal assunto ele afirmou: “Da mesma forma que o corpo humano oferece um círculo que o rodeia, também podemos encontrar um quadrado onde esteja encerrado o nosso corpo”. Primeiramente é necessário acessar o link Da Vinci – O HOMEM VITRUVIANO e ler o texto com muita atenção, sempre voltando a esse quando se fizer pertinente:

  1. O Homem Vitruviano descreve uma figura masculina desnuda, separada e simultaneamente em duas posições sobrepostas com os braços inscritos num:

    1. quadrado e num triângulo
    2. quadrado e num retângulo
    3. círculo e num quadrado
    4. círculo e num retângulo

  2. Trata-se de um desenho encontrado nos diários do artista, feito por volta de 1490, que mostra o traçado e ………………… entre as diversas partes do corpo humano.

    1. as medidas
    2. as proporções
    3. o distanciamento
    4. a dinâmica

  3. Durante o Renascimento muitos artistas, arquitetos e tratadistas puseram-se a interpretar os textos vitruvianos, para fazer novas representações gráficas, mas nenhum deles conseguiu combinar de forma harmoniosa e matemática aquilo que propunha:

    1. Leonardo da Vinci
    2. Fillipo Brunelleschi
    3. o escultor Donatello
    4. Marcus Vitruvius Pollio

  4.  Dentre os desenhos que foram feitos, a fim de alcançar tal objetivo, o de …………….. tornou-se o mais famoso e o mais difundido.

    1. Leonardo Da Vinci
    2. Giotto di Bondonne
    3. Fillipo Brunelleschi
    4. Paolo Ucello

  5. Ao examinar o desenho acima, o leitor notará que existem duas diferentes posturas, formadas pela combinação das posições:

    1. dos pés e das mãos
    2. da cabeça e do ombro
    3. dos braços e das pernas
    4. do tronco e da cabeça

  6. Todas as afirmativas acerca do desenho da figura humana estão corretas, exceto:

    1. A figura com braços e pernas em cruz está contida dentro do quadrado.
    2. A figura com braços e pernas abertos está contida dentro do círculo.
    3. A postura em cruz delimita os lados do quadrado, enquanto a postura com pernas e braços abertos delimita o círculo.
    4. O tronco da figura humana é o seu real centro de gravidade.

  7. Todas as afirmativas acerca do desenho estão corretas, menos:

    1. O umbigo da figura humana continua imóvel, embora pareça se mover.
    2. A área das duas figuras geométricas não é igual.
    3. A combinação das posições dos braços e pernas forma quatro posturas diferentes.
    4. As posturas são: braços e pernas em cruz, braços e pernas abertos, braços em cruz e pernas abertas, braços abertos (para o alto) e pernas unidas.

  8. O arquiteto romano que viveu em 1 a.C. apresenta no seu tratado sobre arquitetura uma descrição sobre as proporções do corpo humano, usando como unidade de medida:

    1.  o dedo, o palmo e o antebraço
    2. o palmo, o pé e o braço
    3. o dedo, o pé e o antebraço
    4. o braço, o palmo e o dedo

  9. O arquiteto teórico Cesare Cesariano (Milão) entendeu a geometria descrita pelo antigo arquiteto romano, mas cometeu um erro ao relacionar as duas figuras, de modo que a figura humana ficasse inserida no centro das duas. Para que essa coubesse em sua construção, tendo como centro o umbigo, ele teve que esticar ………….., tirando, assim, a proporcionalidade descrita.

    1. pescoço e pés
    2. ombros e cabeça
    3. mãos e pés
    4. braços e pernas

  10. Todas as afirmativas sobre Leonardo da Vinci estão corretas, exceto:

    1. Não se prendeu à relação geométrica entre as duas figuras geométricas perfeitas.
    2. Usando os critérios de Donatello, corrigiu o que achava estar errado nas medidas.
    3. O centro do círculo à volta do “homo ad circulum” coincide com o umbigo.
    4. O centro do quadrado à volta do “homo ad quadratum” está à altura dos genitais.

  11. O desenho do Homem Vitruviano reafirma o grande interesse de Leonardo da Vinci pela:

    1. Ciência e Matemática
    2. Música e Ciência
    3. Arte e Astronomia
    4. Arte e Ciência

  12. O conceito da “Divina Proporção” (busca a definição das partes corporais do ser humano) foi muito procurado nas obras do:

    1. Renascimento
    2. Gótico
    3. Românico
    4. N.R. (n.d.r.)

  13. Sobre o Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci não podemos dizer que:

    1. É usado como referência estética de simetria e proporção no mundo todo.
    2. Não pode ser qualquer homem, ele deverá ter proporções bem específicas.
    3. Seu Homem Vitruviano tornou-se um ícone cultural.
    4. O pé do desenho descrito por Leonardo deve ser igual a 1/8 da altura do corpo.

Gabarito
1.c / 2.b / 3.d / 4.a / 5.c / 6.d / 7.b / 8.a / 9.c / 10.b / 11.d / 12.a / 13.d

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RENASCIMENTO – MULHERES E EDUCAÇÃO (Aula nº 56)

Autoria de Lu Dias Carvalho

O Renascimento foi muito importante para as mulheres, ao permitir que essas também tivessem acesso à educação —, mas não mais do que isso. As escolas dos humanistas tanto aceitavam homens como mulheres, sendo que inicialmente somente as filhas desses buscavam o saber, incentivadas por seus pais que tinham uma nova visão de mundo. Mesmo pertencendo às famílias endinheiradas, as mulheres tinham de ir à luta, se quisessem ser aceitas e reconhecidas pelos homens. Elas não compartilhavam da mesma celebridade vivida pelos homens da Renascença.  

Até então as mulheres eram excluídas dos estudos, não podendo frequentar escolas. Sua educação devia ser providenciada dentro de casa. Se para as de famílias muito ricas era assim, imaginem a vida daquelas que não possuíam bens ou não tinham acesso a nenhum tipo de formação. Só lhes restava dar continuidade à vida das mulheres de sua ancestralidade para sobreviver aos trabalhos, aos mandos e desmandos do marido e aos cuidados com a prole.

Mesmo no Renascimento havia um aspecto intrigante em relação à educação das mulheres, o que mostrava haver uma grande diferença entre elas e os homens. Enquanto a busca pelo saber era vista apenas como um treino da mente, sem nenhum acesso a patamares diferentes dos que ocupavam, elas eram aceitas como iguais, mas, quando uma mulher dedicava-se ao estudo com afinco em busca de novos horizontes, as coisas mudavam. O pensamento moralista da época deixava claro que o espaço doméstico, excetuando o contato com a Igreja, era o que lhes cabia.

Às mulheres faltavam carreiras — uma vez que não podiam ocupar postos tidos como masculinos — tendo elas que enfrentar grandes dificuldades, quando resolviam dedicar sua vida à erudição, tida como “algo específico do homem”. Não era aceitável que competissem com os varões. A grande maioria das que optavam por não se casar buscava o convento. Mesmo aquelas que estudaram, ao abraçar a vida religiosa tinham que abandonar os estudos escolares.  

A mulher erudita era uma raridade, mesmo durante o Renascimento. Aquelas dotadas de erudição trocavam correspondência com outras de igual saber por toda a Europa. Dessa época podem ser citadas as três maiores pintoras italianas: Sofonisba Anguissola (1535-1625) — pintora renascentista, discípula de Bernardino Campi, foi a primeira artista a adquirir fama internacional de que se tem notícia, tendo sido admirada por Michelângelo e Anthony van Dyck, dentre outros mestres; Lavinia Fontana (1552-1614) — filha do pintor e também seu professor bolonhês Prospero Fontana, cuja obra abrangeu vários estilos; e Artemísia Gentileschi (1593-1653) — filha do pintor toscano Orazio Gentileschi, tendo sido a primeira mulher a entrar para a Academia de Arte de Florença, ganhando fama nos tempos atuais como feminista.

Ilustração: Autorretrato no Cavalete (1556), obra de Sofonisba Anguissola

Fontes de pesquisa
História da Arte / E. H. Gombrich
Renascimento / Nicholas Mann
História da Vida Privada

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RENASCIMENTO E VESTIMENTAS (Aula nº 55)

Autoria de Lu Dias Carvalho

 

O livro de etiqueta de Giovanni della Casa, escrito no século XVI, rezava que “Todos devem se vestir bem, de acordo com a sua idade e posição social. Se assim não fizerem, será considerada uma falta de respeito em relação aos demais”. Não é difícil concluir, portanto, que os italianos endinheirados seguiam a etiqueta com rigor, tendo os alfaiates e bordadeiras muito serviço. Os tecidos (linhos, sedas, lãs, damascos, veludo, etc.) eram de excelente qualidade. A eles eram acrescidos fios de prata e de ouro, assim como pérolas legítimas e pedras preciosas, o que aumentava o preço das vestimentas, tornando-as exclusivas dos muito ricos. Os poderosos gastavam exageradamente, a exemplo de Lorenzo de Medici — Lorenzo, o Magnífico — cujo valor de um só de seus ternos dava para custear, durante um ano, uma família de classe média com quatro pessoas.

O gasto das famílias governantes era tão absurdo que foi necessária a promulgação de leis para conter tais despesas creditadas ao erário público. Não foram poucas as mulheres dessas famílias a protestar contra tal contenção, sob a alegação de que suas vestes diziam qual era a sua posição social. A vestimenta feminina constava normalmente de três camadas de roupas: uma camisa de fio, uma combinação de lã ou de seda e um vestido finamente trabalhado, ornado com muitos enfeites para as ocasiões especiais (ver ilustração acima). As mulheres mais velhas normalmente optavam por vestidos mais discretos, enquanto os das jovens excediam em pedras preciosas, apliques de peles, pérolas, etc. No princípio do século XV as mangas volumosas (bufantes) estavam no auge, tempos depois vieram as mangas justas, com aberturas, a fim de deixar à vista as peças interiores.

Os sapatos (chopines) pareciam uma peça de martírio. As plataformas podiam ostentar de dez a trinta centímetros e tinha por finalidade impedir que a barra dos longos vestidos fosse arrastada pelo chão e, certamente, tinham por objetivo tornar as mulheres mais altas. As damas tinham que contar com o auxílio de suas criadas para andarem, o que de outro modo não conseguiriam. Outra moda estranha para os nossos dias era a linha do cabelo depilada (ver ilustração acima), cujo objetivo era aumentar o tamanho da testa e repassar a ilusão de que as mulheres eram mais altas. Os cabelos eram presos numa touca bordada, muitas vezes com fios de ouro e pérolas, tendo como adorno um véu transparente com bordas de ouro e pérolas. Enquanto as mulheres apreciavam os cabelos louros, os homens tingiam os seus de preto.

Segundo o escritor Giovanni Boccaccio, “os cabelereiros despelavam as damas, tosando-lhes as sobrancelhas e rostos, para dar a impressão de serem mais altas”. Com o passar dos tempos, outros estilos de beleza foram se apropriando da moda. As mulheres passaram, então, a usar tranças ou coques no alto da cabeça. A esses eram agregados broches, pérolas, pedras preciosas, etc. As joias eram adornos importantes para as damas ricas. Essas se tornaram ainda mais volumosas a partir do século XV, à medida que os decotes iam se ampliando. Ainda que as leis referentes às despesas do erário público tentassem coibir o uso de joias caras, as damas ricas transgrediam-nas.

A vestimenta do homem rico renascentista compunha-se de três partes principais: uma camisa de manga longa de fio fino, um jaleco ou casaco justo e calças de tricô ou de tecido. Os homens mais velhos, principalmente funcionários e acadêmicos, costumavam fazer uso de túnicas longas e elegantes sobre o traje normal. As leis para diminuírem os gastos também diziam respeito ao exagero da largura das mangas. Quanto mais ricas se tornavam as cidades italianas, maior era a competição entre elas, organizando festividades religiosas, cujo objetivo maior era exibir luxo, ostentação e poder — oportunidade em que homens e mulheres de famílias ricas esmeravam nas vestimentas e adornos, numa verdadeira competição.

Ilustração: 1. Chopine / 2. Moda do Renascimento / Simonetta Vespucci, (c.1500-1510), obra de Piero di Cosimo.

Exercício
1. Como se vestiam as mulheres renascentistas da aristocracia?
2. Que moda parece aos nossos olhos extremamente bizarra?
3.O que o texto diz sobre Lorenzo, o Magnífico?

Fontes de pesquisa
História da Vida Privada 2 / Edit. Companhia das Letras
Arte e Vida na Itália Renascentista / Editora Folio

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RENASCIMENTO – MULHERES E VIDA CONJUGAL (Aula nº 54)

Autoria de Lu Dias Carvalho

A união nupcial era resultante de uma combinação política entre as famílias abastadas, fortalecendo dessa maneira o cume da pirâmide social. Havia a cerimônia do “dia do anel”, quando um notório registrava a união. A combinação era feita entre os pais dos nubentes e, na falta desses, por um membro varão da família. Segundo a tradição da época, os casamentos somente eram consumados após a esposa mudar para a casa do marido, o que podia demorar meses. Era comum que os recém-casados, após trancarem a porta do quarto, dessem início à vida matrimonial ajoelhados em oração, pedindo a Deus abundância, harmonia, riqueza, honra, virtude, fecundidade e que viessem muitos meninos.

A mulher, ao casar-se muito jovem — normalmente havia uma diferença de sete a dez anos entre marido e esposa — ainda inexperiente, tinha no marido o seu educador, era tratada do mesmo modo como ele agia com os filhos. Seus dons e formação eram vistos como mérito do esposo, pois dos homens dependia a qualidade de uma esposa exemplar — assim pensavam. Havia um provérbio que dizia: “Boa esposa ou desmazelada, toda mulher necessita de bordoada”. É bom dizer, contudo, que as esposas pobres não tinham por seus maridos tamanho apreço, pois, ao contrário das ricas, tinham que trabalhar muito para prover a família, referindo este texto às ricas.

No que diz respeito à beleza da mulher, essa não era vista como uma característica exterior apenas, simbolizava sua perfeição moral interior. Como uma mulher bela poderia ser dotada de maldade ou de costumes amorais? Em assim sendo, as mulheres consideradas bonitas encontravam maridos facilmente e esses tanto podiam ser de sua mesma classe social como de uma classe superior. A beleza encobria o fato de que a donzela não levava consigo uma boa fortuna ou não contava com padrinhos políticos. E como ficam aquelas destituídas de atributos tidos como necessários para arranjar um casório? Nem tudo estava perdido, uma vez que para essas existiam preparações herbais muito conhecidas que prometiam grandes transformações, tais como: tingir o cabelo, eliminar as rugas, clarear a pele e os dentes, etc.

O marido era o chefe incontestável da família, o administrador de seus bens. Poder que atingia também seus netos, uma vez que a ele deviam obediência. A esposa era totalmente obediente, dócil e servil ao seu marido. A Igreja Cristã comungava com a postura enérgica do esposo e a submissão da mulher. As pregações religiosas reforçavam: “Único senhor em sua casa, o marido não revela à sua esposa senão uma parte dos segredos familiares. Ele próprio forma-a em seu ofício de mulher e, considerando a fragilidade de seu corpo e de seu caráter, não lhe deve confiar senão responsabilidade menores”. E certos estatutos diziam que os maridos deviam “corrigir seus filhos, seu irmão mais novo e também sua mulher”.

O nascimento de um herdeiro era muito comemorado pelas famílias ricas, o mesmo não acontecendo com a vinda de uma menina. A ilustração acima apresenta uma bandeja do século XV, criada pelo pintor Masaccio, em comemoração ao nascimento de um herdeiro de uma nobre família florentina. A mãe encontra-se deitada na cama, enquanto as parteiras cuidam do bebê que já se encontra todo enfaixado, trazendo um terço no pescoço. Duas freiras cumprem a obrigação de receber as mulheres visitantes. Um arauto, mostrando uma bandeira com o símbolo da família, anuncia a chegada dos familiares masculinos — esses não podiam entrar no quarto — trazendo presentes. Outra bandeira similar é carregada por outro criado.

A toalete das crianças era supervisionada pelas mães, mas a limpeza do marido contava sempre com a ajuda de sua mulher. Essa, por sua vez, contava com o auxílio das domésticas para lavá-la, vesti-la e maquiá-la. A catação de piolhos era tão comum entre as mulheres e suas famílias que no século XIII um decreto proibiu que tal comportamento acontecesse em público, debaixo das arcadas. Após a ceia uma infinidade de coisas — direcionadas pela mulher — eram feitas: remendar, debulhar grãos, limpar, consertar objetos e conversar. Era o momento em que diferentes assuntos vinham à tona: casamento das filhas, o fisco, o desconforto com a parição e o excessivo número de rebentos, dote, problemas materiais, reações com o proprietário ou patrão, religião, etc. Era comum os avós falarem de sua genealogia, muitas vezes imprecisa. Entravam em pauta também os escândalos locais (bigamia, assassinatos, etc.). Tais assuntos só fugiam à regra na casa dos humanistas, onde a conversa atingia certo ar de erudição.

Ilustração: O Parto de uma Nobre Florentina, (1425 a 1428), obra de Masaccio.

Exercício
1.  Como era, de modo geral, a união nupcial durante o Renascimento?
2. Qual era a função do marido numa família rica e como agia a Igreja Cristã?
3. Havia diferença entre o nascimento de meninos e meninas? Explique.

Fontes de pesquisa
História da Vida Privada 2 / Edit. Companhia das Letra
Arte e Vida na Itália Renascentista / Editora Folio

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