Arquivo da categoria: Mitos e Lendas

O mito é uma narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. A lenda é uma narração escrita ou oral, de caráter maravilhoso, na qual os fatos históricos são deformados pela imaginação popular ou pela imaginação poética.

PORQUE IARA VIROU UMA SEREIA

Recontada por Lu Dias Carvalho

memo12

Conta-se que antigamente havia uma aldeia, no seio da floresta Amazônica, que tinha uma índia tão linda, mas tão linda, que o sol demorava-se mais tempo sobre aquela taba, só para poder contemplar a beleza de Iara, pois este era o seu nome. A lua, quando em suas andanças pelo céu, pedia à brisa para empurrar todas as nuvens, que a impediam de alumiar o corpo moreno da filha das selvas.

Iara gostava de tudo na selva. Acariciava os animais, beijava as flores, abraçava as árvores e deliciava-se com os frutos. Mas, dentre todas as coisas da natureza, ela amava, sobretudo, as águas, tanto as que formavam os igarapés-açus como as que davam vida aos igarapés-mirins. Ali passava horas e horas do dia ou da noite. Na maioria das vezes era observada pelos jovens de sua tribo, no maior deslumbramento, embevecidos com tal visão. De acordo com os ensinamentos repassados de geração para geração, eles sabiam que jamais uma mulher poderia ser tomada à força. A escolha era dela. Assim, esperavam pacientemente pela sua decisão, cada um aguardando ser o eleito.

De uma feita, numa noite de pouco calor, Iara, nadava feliz da vida num igarapé-mirim, entre plantas aquáticas e pequenos peixes, ora imergindo, ora emergindo. Nessa noite, não era observada por ninguém, pois saíra da aldeia silenciosamente. Entretida como estava, nem percebeu que um grupo de homens brancos aproximava-se do lugar, onde ela se encontrava. Mesmo em sua pureza, percebeu que os olhos deles, como os do Jurupari, estavam carregados de libidinagem. Impossibilitada de fugir, viu-se agarrada pelo grupo, passando de mão em mão, como se quisessem virá-la pelo avesso. Depois a usaram, cada um na sua vez, em fila. Não suportando tanta dor, ela perdeu os sentidos. Pensando que estivesse morta, os homens maus jogaram-na nas águas do rio.

Como a natureza está sempre cheia de bons espíritos, o Espírito das Águas tomou-a em seus braços, soprou vida forte no seu corpo e untou seus ferimentos com ervas aquáticas, deixando-a mais bela ainda. Mas temendo que ela pudesse ser vítima de outra violência por parte dos homens brancos, O Espírito das Águas transformou-a numa sereia. A parte de cima de seu corpo tornou-se mais bela do que era antes, enquanto a de baixo ganhou a forma do rabo de um peixe de escamas coloridas. E assim, qualquer homem ruim que pular nas águas para seduzi-la e dominá-la, será levado para as profundezas das águas, de onde jamais voltará.

Nota: imagem copiada de www.flickr.com

Views: 1

COMO SURGIU A HUMANIDADE

Recontada por Lu Dias Carvalho

memo123

Quando o mundo começou, só existia um único casal, que passava o maior tempo cuidando da roça, onde plantava os produtos necessários para o sustento dos dois. Em volta do homem e da mulher, a natureza, com seus animais e plantas, tomava conta de todo o espaço, na maior exuberância. A Terra era um paraíso esplendoroso.

O casal gostava muito do milho, e, por isso, plantava-o sempre. Quando seco, debulhava espiga por espiga e armazenava os grãos em pequenos balaios feitos de cipó, que eram guardados com muito cuidado. Mas logo começou a notar que os patuás estavam desaparecendo um após o outro. Como não havia outras gentes, só poderia ser um bicho qualquer, que gostasse de viver debaixo da terra, como a cotia, o tatu ou a formiga. E assim, o homem e a mulher puseram-se de tocaia para pegar o gatuno.

Qual não foi a surpresa de marido e esposa ao notarem que eram gentes que viviam debaixo da terra, e não bichos a roubarem-lhes o milho? Elas espichavam o braço e enfiavam a mão por um buraco, afanando os balaios. O casal pôs o ouvido na terra e até escutou a conversa deles, disputando o alimento. Também descobriu a passagem para o mundo subterrâneo, que ficava oculta por uma gigantesca pedra. Compadecidos, os dois conseguiram remover um pouco a pedra, de modo que as gentes pudessem passar, ainda que esprimidas. Elas eram muito esquisitas, sem nenhuma parecença com o casal.

Após fechar o buraco, o homem começou a dar um conserto naquelas pessoas estranhas, dividindo-as em vários grupos. E depois ensinou uma língua e um modo de ser, diferentes, a cada um. Eles foram enviados para cada parte do mundo, para viverem nas florestas, em harmonia com os bichos e com as plantas. Eram os índios. Tudo foi maravilhoso, até o aparecimento dos brancos.

Nota: imagem copiada de comandoestrelinha.ning.com

Views: 1

A INDÍGENA PRESUNÇOSA

Recontada por Lu Dias Carvalho

mandi123456789

Numa tribo amazônica, situada próxima ao rio Madeira, havia uma indígena que era tão linda, mas tão linda, que muitos diziam que, antigamente, ela era uma estrela de grande fulgor que havia caído do céu. Mas não era bem isso, pois havia nascido na aldeia, dado o seu primeiro choro nos braços de uma indígena idosa, que servira de ajuda no seu nascimento, e tendo como primeiro alimento o leite de sua mãe.

À medida que aquela menina ganhava corpo, mais formosura seu corpo recebia, encantando os olhares dos jovens guerreiros da tribo. E ela, sem juízo, movida apenas pela futilidade da presunção, seduzia-os e, ao mesmo tempo, repelia-os, como se fossem brinquedos de palha. Alguns a temiam, mas outros, dominados pela paixão, tentavam ganhar o seu amor. Dentre os últimos estava certo jovem guerreiro, por quem ela se interessou. Mas a revelação de que a amava não lhe era suficiente. Queria provas. Exigiu que o guerreiro pegasse certo veado-galheiro, já conhecido por sua rapidez, e trouxesse-lhe a pele do animal, que seria usada na rede do casal, na noite de núpcias.

O guerreiro não se intimidou diante do pedido, tamanho era o seu ardor pela jovem. Assim, depois de tentar pegar o animal das mais diferentes maneiras, viu que só lhe restava um jeito: montar nele e tentar subjugá-lo. Quando o veado-galheiro passou em disparada, o índio pôs-se a correr, enlouquecido, atrás dele, ambos parecendo flechas cortando o ar. A alguns quilômetros de onde começara a caçada havia um acentuado declive, que se fundia com um sorvedouro. E foi esse lugar que serviu de sepultura para caçador e caça.

Durante dias e dias houve uma procura infrutífera pelo corpo do guerreiro. Todos se apiedavam de sua sorte, e sentiam grande indignação pela formosa indígena, responsável por aquela tragédia. Ela também se sentiu culpada. Chorando dia e noite, olhava em direção à mata, na tentativa de vislumbrar a imagem do jovem. Junto com suas lágrimas, sua beleza foi fugindo do corpo, assim como suas forças, e ela não demorou muito a partir para a morada dos mortos.

Dizem os mais velhos da tribo que o lamento que se ouve à beira do abismo, vem do coração da moça, pois seu espírito ainda espera a volta daquele que seria seu amado companheiro.

Nota: Iracema, obra de José Maria de Medeiros, 1884

Views: 4

COMO OS ANIMAIS GANHARAM CORES

Recontada por Lu Dias Carvalho

mandi12345678

Contam os povos bem antigos que o Criador não deu vida aos animais assim como eles são hoje, talvez pela pressa, ao ter tanta coisa para fazer. O fato é que os bichos eram acinzentados, sem nenhuma belezura de cor. Todos eram monocromáticos, o que dava uma tristeza danada, quando um mirava o outro. E foi com pena, de ver tanta melancolia nos olhos de seus bichinhos, que o Espírito Criador resolveu modificar aquela situação. Para tanto, escolheu um lugar bem visível na floresta, e fez nascer uma árvore que, em vez de folhas, estava carregada de caixinhas de todas as cores e dos mais diferentes matizes. Ali, cada animal iria escolher aquela com a cor que mais o agradasse. Se quisesse, poderia pegar mais outras e outras.

Os macacos foram os primeiros a aproximarem-se da gigantesca árvore, formando atrás de si uma fila que parecia não ter fim, tudo na maior ordem. Viram uma caixinha preta e resolveram pegá-la, mas alguns escolheram uma marrom mais escuro, outros optaram por uma bege claro, e mais outros acrescentaram um toque de amarelo ou de vermelho, bem a gosto deles. A onça escolheu para si uma caixinha com a cor preta, mas algumas de suas irmãs acharam que elas ficaram muito melancólicas, usando uma única cor. Resolveram então salpicar sobre si um pouco de amarelo, preto e branco. É por isso que encontramos onças pretas e onças pintadas.

As aves escolheram para si uma caixinha que continha as cores do arco-íris, de modo que cada espécie usou as sete cores, mas de conformidade com o gosto próprio. Umas usaram apenas duas cores, outras três ou quatro, e assim por diante. Os beija-flores esmeraram-se na coloração. O chefe dos urubus optou por uma caixinha preta, dizendo que deveriam usar uma cor básica, e todo o grupo seguiu-o. Certa ararinha ficou maravilhada com uma caixinha, que trazia um primoroso tom de azul, e escolheu-a para si, ficando com o nome de ararinha-azul. O tucano foi logo procurando cores chamativas: vermelho, amarelo, azul, verde e preto, cada espécie fazendo sua própria escolha, na maior democracia.

O Espírito Criador alegrava-se com o entusiasmo dos animais, qualquer que fosse a sua classe (mamíferos, aves, peixes, répteis, anfíbios ou artrópodes), todos escolhendo, democraticamente, suas cores. E isso demorou luas e luas, pois havia tantos bichos na floresta que pareciam não acabar mais. Vez ou outra, uma espécie resolvia adicionar, ao pelo ou à plumagem, alguns matizes, enchendo-se ainda mais de belezura. E o Espírito Criador ali, na maior paciência, zelando para que todos saíssem satisfeitos. Se por acaso acabava uma caixinha com alguma cor, imediatamente era reposta. A mesma coisa foi feita com os animais aquáticos.

É por isso que os bichos são cheios de formosura, primor e perfeição.

Nota: imagem copiada de www.deccolar.com.br

Views: 2

COMO NASCEU O TAMANDUÁ-BANDEIRA

Recontada por Lu Dias Carvalho

mandi123456

A chuva forte despencou do céu sobre a floresta. A princípio, os índios acharam mais do que natural, pois as florestas tropicais são banhadas pelas águas diariamente. Eles começaram a se preocupar, quando observaram que ela não parava nem um tiquinho de tempo, entrando noite e saindo dia. Depois, observaram que os rios estavam a engolir a terra com sua vegetação e os bichinhos, que viviam perto do solo. E mais depois, alguns poucos humanos puderam observar que a enchente atingia o topo das árvores mais altas, ingerindo tudo, como se estivesse esfomeada.

Apenas uns poucos guerreiros de certa tribo conseguiram se salvar, pois ficaram deitados nas folhas da Coccoloba, que possui a maior folha do mundo, singrando de um lado para outro. Mas nem mesmo sabiam se teria valido a pena sobreviverem, tamanha era a tristeza em que se encontravam. Tudo era uma grande monotonia, só cortada pela voz deles ou pelo crepitar da madeira nas fogueiras. Não havia ficado nem mesmo uma avezinha com seu trinado, para quebrar aquele silêncio de morte, enquanto as florestas iam reaparecendo.

Aqueles valentes guerreiros, já acabrunhados pela melancolia, suplicaram ao Grande Espírito que trouxesse de novo à floresta todos os seus animais. E foram atendidos. Tudo seria recriado como dantes pelo anjo enviado, sendo feito das cinzas dos carvões da primeira fogueira feita pelos sobreviventes, após o dilúvio. O orvalho serviria de líquido para moldar a massa. Todo o serviço só poderia ser feito à noite. Os animais foram sendo recriados, tanto os do céu quanto os da terra.

A onça, por ser a rainha da floresta tropical, foi a primeira a ser criada, depois veio o macaco, o gavião, a anta, e assim por diante. Os animais nasciam sem saber nada, tendo que aprender tudo: voar, cantar, subir nas árvores, que alimento comer, correr, pular, nadar, etc. Era uma dura tarefa, mas que foi integralmente cumprida. O Grande Espírito deu ordem a seu anjo para que retornasse, mas esse alegou que ainda tinha um punhado de cinzas e uns pedacinhos de carvão. Recebeu a ordem de ficar apenas mais uma noite, não mais do que isso, usando o restante do material.

O anjo começou a modelar, calmamente, um animal que fosse bem diferente. Fazia um molde e não achava bom. Depois fazia outro, e mais outro, e assim foi durante grande parte da noite. Não poderia deixar nenhum material sobrando. Optou por fazer um bicho bastante forte, com um comprido e tubular focinho, e, que tivesse garras poderosas. Para deixá-lo mais charmoso, agregou-lhe uma longa cauda, semelhante a uma bandeira. Ainda faltava ao modelo alguns apetrechos, quando o anjo percebeu que o dia estava chegando. Bom ou ruim, ele deu seu trabalho por terminado, conforme as ordens recebidas.

Ao ganhar vida, o animal não gostou muito de sua pobre figura. Faltavam-lhe os dentes, e, além do mais, a língua era extensa e mole, incapaz de trabalhar alimentos duros. Mas, antes de desaparecer numa nuvem, o anjo, condoído, gritou-lhe:

– Busque como alimento aquilo que não seja necessário mastigar. As formigas, que existirão sempre em demasia, são um bom prato, assim como os cupins. Use apenas a sua enorme língua pegajosa para apanhá-los. E o melhor é que você não terá concorrentes.

É por isso que o tamanduá-bandeira, que significa “o comedor de formigas“, deita e rola nos formigueiros e cupinzeiros. Por causa de sua cauda vistosa e festiva, foi-lhe acrescido o nome de “bandeira”, porém, é muitas vezes apelidado de “papa-formiga”.

Views: 11

O ARCO-ÍRIS E OS DOIS AMANTES

Recontada por Lu Dias Carvalho

memo1

Os índios brasileiros acreditam que o Bem e o Mal vivem em permanente luta, do modo que um tenta sobrepujar o outro desde o comecinho do mundo, sendo que ora um ganha, ora outro perde, numa infindável mudança de posições. É por isso que ninguém é feliz e tampouco infeliz o tempo todo.

Certa tribo do sul de nosso país, que vinha sofrendo perversamente com a visita constante do Mal, reuniu seus homens mais idosos, e, portanto, mais sábios, para que criassem um artifício para deter as investidas de ser tão cruel. Durante dois dias e duas noites, em permanente jejum, eles convocaram todos os bons espíritos da floresta para que lhes dessem sabedoria, a fim de encontrar uma saída, de modo a proteger seu povo. Sabiam que jamais seriam capazes de banir totalmente a maldade, mas poderiam, pelo menos, aquietá-la com mais frequência, recebendo a bondade mais assiduamente. E a iluminação tão ansiada chegou até eles, embora com ela viesse certa dose de sofrimento.

A chegada de cada primavera assinalava que uma das mais belas jovens da aldeia seria sacrificada, ou melhor, ofertada ao Mal em casamento. Ela tinha que ser casta, e nem mesmo seu olhar poderia fitar homem algum. Ao desposá-la, o Mal deixava a tribo em paz por algum tempo. Escasseavam-se as doenças, as secas, as enchentes, as tempestades nervosas, as pragas nas lavouras e a guerra entre as tribos rivais. A garota selecionada, portanto, via na sua escolha uma forma de ajudar sua gente. Aceitava seu sacrifício com heroísmo e benevolência.

Naquela primavera, a escolhida foi a primorosa filha do cacique. Ela sabia que tinha que devotar sua vida ao bem de seu povo, como fizeram tantas outras jovens antes dela. Restava-lhe, portanto, aguardar o dia do casamento, conforme os ditames do Mal, que exigia que fossem feitos muitos convites às aldeias vizinhas. E, assim, no dia que antecedeu as núpcias, os convidados começaram a chegar, ornados com suas maravilhosas pinturas. Dentre eles encontrava-se um vistoso guerreiro de uma tribo mais distante. Num relance, os olhos dos dois jovens cruzaram-se, nascendo daí uma paixão incapaz de ser domada até mesmo pela crueldade do Mal.

O casal, aproveitando o corre-corre na aldeia, refugiou-se nas margens do rio Iguaçu, onde, além de trocarem carícias, também planejaram a fuga na noite do casamento. Contudo, coitadinhos, o Mal estava a espreitá-los, deixando que os planos fossem feitos, para depois puni-los no flagrante. E assim aconteceu. Enquanto fugiam velozmente numa canoa, como se as águas do rio estivessem a ajudá-los, foram surpreendidos por uma gigantesca serpente, que desceu dos céus em direção às águas do Iguaçu. Ao cair no meio do rio, abriu uma cratera gigantesca, que engoliu a embarcação, e esparramou água por todos os lados, nascendo ali as Cataratas do rio Iguaçu.

O Mal ainda não estava satisfeito em sua vingança. Para completá-la, transformou a bela índia numa pedra, depositada em meio às espumas brancas da cachoeira, e o guerreiro numa palmeira, que ficava lá no topo das cataratas. Ele poderia vê-la, mas jamais tocá-la. Contudo, o Bem não permitiu que um amor tão lindo assim pudesse morrer. Deu ordem ao vento  para que, quando chegasse, sacudisse com força as folhas da palmeira, a fim de que ela enviasse mensagens de amor à pedra, e, quando fosse primavera, levasse suas flores até ela. E o Bem fez mais pelo casal, fato que acontece até os dias de hoje: quando o arco-íris visita as Cataratas do Iguaçu, ele une a palmeira e a pedra, momento em que esses dois elementos voltam a transformar-se em gente, como eram antes. Enquanto dura o arco-celeste, os dois amantes vivem momentos de grande paixão. E repetem doces juras de amor, aguardando a chegada de um novo arco-íris. E a lua, embevecida, comove-se com a ternura dos dois amásios.

Nota: imagem copiada de www.indoviajar.com.br

Views: 0