Arquivo da categoria: Mitos e Lendas

O mito é uma narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. A lenda é uma narração escrita ou oral, de caráter maravilhoso, na qual os fatos históricos são deformados pela imaginação popular ou pela imaginação poética.

O NEGRINHO DO PASTOREIO (I)

Recontada por Lu Dias Carvalho

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Gente má existiu e sempre existirá neste mundo, em quaisquer que sejam as épocas. E numa delas, em que se pode precisar o tempo, como sendo o da escravidão, aconteceu um fato muito triste aqui em nosso país.

Certo fazendeiro, que mais se parecia com o filho do diabo do que do Criador, era senhor de muitas terras, muitas reses e muitos escravos. A sua riqueza evoluía na mesma proporção em que sua maldade crescia em relação aos menos favorecidos. Assim, esse tal senhor, no inverno de certo ano, por sinal muito gélido, comprou duas dúzias de reses da melhor e mais cara espécie, encarregando um meninote negro, ainda imberbe, para delas cuidar, quando no pasto estivessem.

O molecote levava todos os dias o gado para a pastagem e, à tardinha, voltava com ele, estando na maioria das vezes faminto, pois tinha que se valer com as frutas que encontrava pelo caminho. De uma feita, ao contar as reses, o que fazia diariamente, o homem deu pela falta de um novilho. Depois de castigar impiedosamente o garoto, fez com que ele retornasse ao campo em busca da rês desgarrada.

Já estando muito cansado de tanto procurar o novilho e já sendo noitinha, o garoto, usando um toco de vela, encontrou-o, por sorte, pastando detrás de uma moita alta de capim. Laçou-o, mas seu cavalo e suas forças eram fracas para conter um animal no auge de sua resistência. O laço rompeu-se e o novilho desapareceu em disparada. Já era noite alta, quando o rapazola voltou para contar ao amo o que lhe acontecera. Como castigo, o menino negro, depois de apanhar muito, foi amarrado pelos pés e mãos, e deixado nu dentro de uma cova, que não era outra coisa senão um formigueiro aberto.

No dia seguinte, o fazendeiro mau, acompanhado de um grande séquito, a quem queria  mostrar sua valentia e dar exemplo, retornou ao lugar, onde se encontrava o menino negro, para dar continuidade ao suplício. O grupo foi parado inesperadamente por uma nuvem que se levantava da cova, tendo em seu seio o pequeno mártir, ascendendo aos céus, como um santo.

Conta-se que, até os dias de hoje, as pessoas do lugar e adjacências, quando perdem alguma coisa, fazem promessas ao Negrinho do Pastoreio para encontrá-la, sendo comumente ouvidas.

Nota: imagem copiada de www.studioclio.com.br

Fonte de pesquisa
Literatura oral para a infância e a juventude/ Henriqueta Lisboa

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COMO SURGIU A MANDIOCA

Recontada por Lu Dias Carvalho

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Muitos e muitos anos atrás, todos os índios de certa tribo amazônica viviam na mais harmoniosa paz. O cacique era um homem de bom coração, admirado por todos, mas irredutível no que diz respeito aos bons costumes de seu povo. Sua família também era muito generosa e de boa conduta, a quem foi ensinado o respeito às pessoas,  aos bichos e a todas as coisas da natureza. Dentre os cinco filhos do chefe, só havia uma menina, trabalhadora como a mãe e muito admirada pela tribo.

Certo dia, ao observar as mudanças no corpo da filha, a mãe notou que ela estava prenhe. Imediatamente dividiu a notícia com o cacique, seu marido. À moça foi imposta o dever de revelar o nome do pai do rebento que estaria por vir, mas tudo em vão, pois ela jurava não ter tido relação sexual com homem algum. Mas no saber do morubixaba era preciso a semente de um homem para emprenhar uma mulher. Se ela não queria tornar conhecido o infrator, a fim de castigá-lo, seria preciso matá-la, para não desonrar os costumes antiquíssimos da tribo, que rezavam que o rapaz devia sempre pedir ao pai a mão de sua filha em casamento.

Na noite em que antecedeu o dia marcado para o sacrifício da jovem índia, o cacique, muito pesaroso, recebeu, em sonho, a visita de um homem diferente, dizendo-lhe que sua filha era inocente, e, que não deveria ser morta, pois falava a mais pura verdade. Temeroso com o aviso recebido, o morubixaba contou o ocorrido à tribo, sendo o sacrifício esquecido, segundo a anuência de todos. Assim, livre de qualquer empecilho, a gravidez da jovem índia transcorreu na mais perfeita normalidade.

Mandi nasceu com a pele branca como o leite de égua e os cabelos dourados como as espigas de milho sob o sol equatorial, algo nunca visto na história da tribo. Os índios mais idosos, amedrontados, viram nisso um mau presságio. Alguma coisa ruim estaria para acontecer ao povo e às plantações. Para evitá-la, pensaram eles, seria necessário matar a recém-nascida. Mas o cacique, ainda se lembrando do sonho que tivera, disse a seu povo que os bons espíritos exigiram que a garotinha permanecesse entre eles, sendo muito bem tratada por todos. E assim aconteceu.

A criança, à medida que crescia, tornava-se cada vez mais amorosa e bela como as flores da floresta. Era amada por sua tribo, encantando a todos. Só que um dia, inesperadamente, ela morreu, como se fosse um passarinho. Ninguém sabia o motivo. Todos a choraram dia e noite. E, para alegrar o coração de seu inconsolável avô, seu corpinho foi enterrado na pequena praça do interior da taba, bem pertinho de sua maloca, onde ele poderia chorá-la sempre que se sentisse triste.

Certo dia, o cacique notou a presença de uma plantinha, regada com suas lágrimas, onde fora enterrada Mandi. Alguns dias depois, deparou-se com fortes raízes, que levantavam a terra para sentirem a luz do sol. Por fora, elas traziam uma casca preta, mas por dentro tinham a mesma cor da pele da pequenina Mandi. A aldeia entrou em festa, com todos compartilhando aquela deliciosa iguaria, que foi transformada em beijus, farinhas, mingaus e cauim. Ela recebeu o nome de “mandioca” que significa “a casa de Mandi” ou o “corpo de Mandi“. A mandioca não apenas passou a fazer parte da alimentação das aldeias, como também tomou parte na mesa de todos os brasileiros. Tem, inclusive, outros nomes como aipi, aipim, uaipi, macaxeira, maniva, maniveira, pão-de-pobre, etc.

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PORQUE O SOL ESCONDE-SE À NOITE

Recontada por Lu Dias Carvalho

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Não se podia dizer que na tribo houvesse quem mais amasse os animais e as plantas do que aquele jovem índio, que com eles passava todo o tempo em que não estivesse ajudando seu povo. Não apenas entendia a linguagem dos bichos como a das plantas, desde as menorzinhas às gigantescas.

Certa noite, ao observar o céu, viu que nenhuma estrela aparecia, ainda que não estivesse chovendo ou ameaçando temporal. Alguma coisa estava errada. Uma noite escura não poderia prescindir de seus astros luminosos. Perguntou a vários bichos o que estava acontecendo, mas nenhum deles sabia responder ou tinha medo de contar. Por fim, encontrou a raposa que, enraivecida, contou-lhe que o culpado era o urubu-rei, que havia roubado as Estrelas para com elas ornar sua cabeça. Em sua vaidade, ele queria ter o penacho mais resplandecente do mundo dos homens e dos animais.

O índio procurou o urubu-rei para que confirmasse a história contada pela raposa. Raivoso, esse o ameaçou com suas garras afiadas e bico. Os dois entraram em luta corporal, mas o índio acabou vencendo, colocando a grande ave sob sua ordenança. Só a soltaria quando  devolvesse ao firmamento suas Estrelas, pois ainda não existia o Sol e nem a Lua. Ainda assim, o animal fez pouco caso do aviso recebido. O índio, então, começou a retirar as penas que compunham o penacho do presunçoso. Cada pena tirada, e lançada ao ar, voava para o alto até atingir o firmamento, e lá virava Estrela de novo. Quase ao final, retirou uma pena prateada e, ao lançá-la ao ar, viu que ela havia se transformado na Lua. Uma pena dourada, que ainda restava na cabeça da ave, ao ser lançada,  encheu o céu de tanta resplandecência, que apagou o brilho das Estrelas e da Lua. O índio murmurou então para si:

– Como seria bom, se o Sol dividisse seu tempo de brilho no céu com a Lua e as Estrelas, pois ele é tão poderoso, que oculta o tênue brilho delas.

E não foi que o Sol ouviu seu pedido e atendeu-o? Foi por isso que nasceu o dia e a noite. O Sol alumia durante o dia, e as Estrelas e a Lua alumiam durante a noite. Depois de tudo nos seus devidos lugares, o índio voltou  para sua oca e dormiu muito feliz por ter restituído ao firmamento os seus fulgurosos adornos, além de contribuir para o aparecimento do Sol e da Lua, que criaram o dia e a noite.

Nota: imagem copiada de gartic.com.br

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O NEGRINHO DO PASTOREIO (II)

Recontada por Lu Dias Carvalho

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As gentes de hoje não fazem ideia do que era o tempo da escravidão no Brasil, quando o fato de ser negro significava ser tratado como bicho sem valor. Naqueles tempos desgraçados, havia homens e mulheres que tinham no lugar do coração uma pedra bruta, pois não se apiedavam daquela gente sofredora, vinda à força de seus países, para aqui submeterem-se aos maus-tratos da nobreza e burguesia. Faziam-lhes todo tipo de maldade, sob a alegação de que os escravos não possuíam alma.

E é por causa dessa mancha vergonhosa na história de nosso país que chegamos à história do Negrinho do Pastoreio. Bem, esse rapazola sofria a sujeição de uma família, cuja malvadeza era ainda maior do que a imensa riqueza que possuía. O patrão era um homem dono de terras a perder de vista. E esse tal tinha um filho que era a corda de seu coração. Contudo, era impossível mesurar qual dos dois era mais perverso. Toda a raiva, que sentiam, era descontada nos seus escravos. E mais ainda nesse menino, negrinho como uma noite escura e de dentadura branca como a neve. Como não lhe fora dado um nome, recebeu o apelido de Negrinho, e assim era chamado por todos.

Se para os escravos não fazia diferença entre domingo, feriado e dia de semana, pois havia sempre uma quantidade de serviço a ser feito, Negrinho não tinha sossego nem mesmo durante a noite. De uma feita, o tal senhor resolveu fazer uma aposta com outro vizinho, para saber qual dos dois tinha o cavalo mais veloz. A Negrinho coube a tarefa de treinar o cavalo baio e participar da corrida.

No dia marcado, com a presença de toda a vizinhança, deu-se o evento. O cavalo baio, que vinha mantendo a dianteira, assustou-se com uma cobra e, por uma cabeça, perdeu a corrida. Negrinho sabia que se encontrava em maus lençóis. Estimulado pelo filho, o homem mau não via a hora de castigar o garoto. E assim o fez, deixando-o em carne viva. Negrinho adormeceu de dor e cansaço. Enquanto isso, o cavalo baio fugiu, levando os outros atrás. E num mesmo dia, o molecote recebeu duas sovas de chicote.

Negrinho foi obrigado a ir atrás dos cavalos, à noite, levando apenas um toco de vela para alumiar a escuridão. Os pingos, que escorriam pelo chão, iam se transformando em luz, a alumiar o caminho, de modo que lhe foi possível encontrar os cavalos, mas depois de amarrá-los, caiu no chão desmaiado de dor, cansaço e sono.

Ainda de madrugada, o filho do fazendeiro chegou pé ante pé e soltou o cavalo baio, e foi contar ao pai que Negrinho não o trouxera. O perverso mandou buscar o sofredor. Como não aguentava caminhar, o garoto veio amparado por dois escravos, sendo depositado aos pés de seu senhor. Apesar das explicações e dos pedidos de clemência, nada comoveu aquele demônio em figura de gente, que bateu no garoto ainda com mais força. Todo o seu corpinho estava dilacerado, espirrando sangue. Ele parecia morto.

Junto com os escravos, o satânico senhor começou a procurar uma cova para enterrar Negrinho. Encontraram um enorme formigueiro, e ali jogaram seu corpo para que as formigas devorassem-no. Depois do amanhecer do dia seguinte, o homem e o filho foram visitar o local, para se vangloriar do feito. Mas lá estava Negrinho, de pé, tendo ao lado o cavalo baio e mais trinta cavalos.

O menino montou no cavalo baio e partiu como um raio, enquanto o malévolo fazendeiro gritava por seus cavalos. E há quem diga que, até os dias de hoje, é comum encontrar o Negrinho montado no seu cavalo cor de ouro, seguido pelos outros, pois virara um anjo negro, e, que Nossa Senhora tomou-o por afilhado. Dizem também que, se alguém perder alguma coisa, basta interceder a ele para encontrar.

Nota: imagem copiada de textosmaravilha.blogspot.com

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A LENDA SOBRE O SOL E A LUA

Recontada por Lu Dias Carvalho

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Quem pensa, que conhece tudo sobre a história de nosso Sistema Solar, anda muito enganado. Pouca gente sabe, por exemplo, que bem antigamente, quando os primeiros índios começaram a habitar a Terra, a Lua e o Sol eram também pessoas como eles. Por isso, tudo era um breu, uma escuridão sem fim. Se não fossem pelas estrelas, a alumiar nosso planeta, ainda que fosse com uma iluminação bem fraquinha, poder-se-ia dizer que não havia beleza no mundo. Com a ajuda delas e com a dos vaga-lumes, que os indígenas criavam para iluminar suas ocas, as gentes encontravam madeira para fazer archotes e fogueiras, trazendo vida para os lugares onde viviam, inclusive  fazendo suas festas.

O Sol, que era um moço de uma aldeia distante, muito bem apessoado e desejado por toda índia que o encontrasse, viu a indiazinha Lua, que se parecia com uma flor-de-miosótis, numa festa para a qual fora convidado. Bastou uma troca de olhar para que os dois ficassem apaixonados. Tudo teria dado certo, se a Lua não fosse demasiadamente orgulhosa, querendo ser a mais rica e a mais bela de todas as mulheres das aldeias próximas e distantes. Além disso, exigia que o Sol andasse cada vez mais enfeitado, com as penas das aves mais formosas que pudesse encontrar. Com o tempo, passou a disputar com ele nos atavios. O pai da Lua já vivia cansado à cata de penas para manter a vaidade da filha, que nunca se comprazia com coisa alguma. Queria mais e mais!

De uma feita, estavam o Sol e o pai de sua amada procurando belos enfeites, quando viram um pássaro majestoso, nunca visto até então por ali, pousar numa árvores. Para encurtar conversa, mataram a ave e ficaram brigando pelo despojo. Resolveram, depois de muita disputa, que as penas seriam divididas entre o Sol e a Lua. Mas nenhum dos dois amantes aceitou. Cada um queria o lote todo para si. A disputa estava cerrada. Foi nessa hora que ave de penas majestosas, até então tida como morta, tomou a forma do deus Tupã. Toda a aldeia ajoelhou-se diante dele. E Tupã, com sua voz forte e entristecida, dirigiu-se ao casal:

– Envaidecidos e assoberbados humanos, que só pensam em si, sem jamais voltar o olhar para o próximo. Tampouco se apiedam dos animais, que matam, para roubar-lhes os atrativos que eu lhes dei. Se os dois desejam ser opulentos e cultuados, assim serão, daqui para frente. O Sol terá um trono de ouro, enquanto a Lua terá um de prata. Os dois vagarão pelo Universo, sem nunca mais se encontrarem.

E assim aconteceu!

Nota: imagem copiada de apascentarospequeninos.blogspot.com

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A LENDA DO GUARANÁ (I)

Recontada por Lu Dias Carvalho

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Contam os habitantes mais velhos de certa aldeia tupi, alojada no coração da floresta Amazônica brasileira, que havia na taba um casal de índios que era muito feliz. Eles se amavam muito, estando sempre um a ajudar e proteger o outro, sem falar que eram generosos com todos aqueles que os procuravam. A única coisa que lhes faltava, para arrematar tamanha felicidade, era um filho.

O casal pediu a Tupã que os abençoasse com um garotinho cheio de saúde, e, que esse tivesse o coração transbordante de bondade. Outras pessoas da aldeia também fizeram o mesmo pedido. E Tupã ouviu-os, enviando-lhes uma criança encantadora, meiga e generosa como seus pais. E toda a tribo tinha por ela um grande amor. Tanto os pais quanto os índios mais velhos ensinavam-na todos os segredos da floresta. Ou melhor, apenas um não foi lhe dado a conhecer: o que era o Jurupari. Por mais que o “mitang” (menino) perguntasse, as pessoas achavam que ele ainda estava muito novo para receber tal informação. Necessitava ficar um pouco mais velho.

Por sua vez, o Jurupari, um dos demônios conhecidos pela nação tupi, tomou conhecimento da existência desse garoto nobre, leal e valente, e passou a espumar de raiva. Ele não gostava de ninguém que fosse inteligente e bondoso. Achava que o procedimento da criança, com o tempo, iria transformar outras pessoas, levando-as para o caminho do bem. Mas isso não iria ficar assim. Daria um fim naquele fedelho, pensava ele carregado de ódio. Passou a estudar a melhor maneira de matar o pequenino.

Como o “mitang” gostasse muito da companhia dos animais, das árvores, dos rios e, sobretudo, de comer as frutas deliciosas da floresta ao lado dos bichos, assim que ele se levantava, ia para o coração da selva encontrar-se com seus amigos. E foi aí que o Jurupari encontrou uma saída para matá-lo: transformar-se-ia numa cobra venenosa e acabaria com a sua raça. E assim aconteceu.

A criança foi encontrada morta, sendo chorada por toda a aldeia, porém, repentinamente, um ensurdecedor trovão, antecedido por um intenso relâmpago, estrondou por todos os lados da floresta. Os bichos correram para suas tocas, amedrontados, e as pessoas não entendiam o porquê, pois o céu estava azulzinho como a plumagem de uma gralha-do-campo. Somente a mãe da criança entendeu a mensagem enviada por Tupã. Ela disse:

– Não choremos mais! Tupã quer que plantemos os olhos de nosso filho. Deles nascerá uma planta miraculosa, de modo que seus pequenos frutos hão de fazer nosso povo feliz, assim como fazia nossa criança à nossa gente.

E foi assim que nasceu o guaraná que significa “frutos semelhantes a olhos de gente.”.

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