Autoria de Danilo Vilela Prado
Alguém poderia me responder “Qual é o tamanho de um pedaço de barbante?”.
A compreensão da pergunta é fácil. O que há de diferente é a quebra do paradigma, dos padrões, dos modelos usuais de referência, porque não fica explícito o raciocínio de tamanhos ou medidas, com exatidão ou números. E o que é pior: A correta interpretação do desafio, por se tratar de análise numérica, poderá ter milhões de respostas. Todas elas poderão ser precisas e matematicamente exatas. Será? Existe a percepção de que a resposta deve ser dada por meio do raciocínio matemático, conforme a dica fornecida. Mas a conclusão oferece dificuldades. Superada a fase da compreensão da pergunta, o leitor desafiado deveria procurar respostas além da gramática. Há dois exercícios conjuntos na busca pela solução:
1) de criatividade, em que deve ser estimulado o raciocínio lógico, ligado a “tamanhos ou medidas”, considerando que está explícita na pergunta a palavra “tamanho”;
2) de investigação da semântica (estudo do significado das palavras numa língua). Nesse segundo caso, poderia haver outras significações para o desafio, como a ambiguidade, por exemplo, que não é o caso.
Por exclusão, a pessoa desafiada iria concluir que a resposta é matemática, conforme foi alertada na dica. Assim, a solução ficaria um pouco mais fácil. O objetivo do desafio é estimular a “pensar diferente”, com a quebra das referências que todos nós usamos diariamente. No cotidiano, todos nós pensamos de acordo com o que é usual, com a familiaridade que temos com as palavras. Por isso, normalmente, não nos preocupamos com raciocínios desafiadores, pois a rotina humana torna o nosso cérebro automático na compreensão de mundo. A fim de estimular a criatividade, deveríamos aceitar, no mínimo, um desafio diário, principalmente com a análise do que ouvimos ou lemos, tentando descobrir outros significados das palavras.
Uma boa sugestão é estudar a polissemia das palavras. Explico: a polissemia, ou polissemia lexical (do grego poli: “muitos”; sema: “significados”), são os vários significados que uma mesma palavra pode ter, de acordo com o contexto em que é usada. Exemplos com a palavra “cabeça”: quando digo “Sinto dores na cabeça”, todos compreenderão que “cabeça” é parte do corpo. Em outro contexto “O cabeça do bando é Lampião”, a palavra “cabeça” tem o significado de líder. Mas a palavra muda completamente o significado se usada assim: “Aquele rapaz, além de ‘cabeça dura’, ainda é ‘cabeça oca’.” Quanta tragédia de uma só vez, porque “cabeça dura” significa que ele é teimoso e “cabeça oca” é coisa de gente distraída, sem conteúdo.
Consultar no dicionário a polissemia de palavras, diariamente, será suficiente para aumentar de maneira expressiva o conhecimento sobre a língua portuguesa. Além disso, pessoas que assim agem tornam-se mais críticas, analíticas e, por conseguinte, mais cultas e inteligentes. O desafio mesmo é deixar a preguiça de lado.
Na questão acima, o leitor pode descobrir a polissemia das palavras “tamanho”, “pedaço” e “barbante”, para tentar desvendar se o contexto da pergunta dará alguma solução. No caso, porém, o raciocínio oferece maior complexidade, pois a questão é capciosa. A palavra “tamanho” pode ser um indício de que a pergunta não foi bem feita, de acordo com os vários significados que possui. Dessa maneira, pode exprimir muitas formas de grandeza como “altura, dimensão, envergadura, estatura, magnitude, massa, porte, volume”.
Ao perguntar “qual é o tamanho de um elefante?”, certamente a grandeza a ser usada será o peso (cinco toneladas) ou altura (três metros), mas e o comprimento do animal, alguém se lembrará de perguntar? A pergunta, portanto, é vaga. O raciocínio sobre o tamanho do elefante indica que as perguntas, para serem respondidas corretamente, devem ter precisão. Da mesma forma, o uso da grandeza “tamanho” para expressar o “pedaço de barbante” é coisa vaga, pois “barbante” também pode ser medido na grandeza massa (quilo), ou seja, a pergunta foi imprecisa. No caso do barbante a pergunta correta é: “Qual é o comprimento de um barbante?” Assim, não irá gerar dúvidas na resposta, porque comprimento é a extensão do barbante.
A resposta surpreende. O comprimento de um pedaço de barbante é duas vezes a sua metade; ou um décimo do seu comprimento multiplicado por dez; ou três vezes o seu terço; ou quatro vezes o seu quarto; ou cem vezes o seu centésimo; ou mil vezes o seu milésimo e assim por diante, infinitamente… Talvez o desafio do texto produza no leitor mais confusão que explicação. Mas aqueles, que tiverem disposição para refletir e raciocinar, terão “lucro mental” (o que é isso?). Xiii… é melhor não complicar.
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Prezada Lu,
Obrigado pelo elogio.
Viver no “piloto automático” equivale a perder oportunidades de usar adequadamente os recursos disponíveis no cérebro . Porém, como seres humanos, continuamente repetimos os padrões sociais e de comportamento aprendidos desde a infância. Assim nos sentimos como parte do rebanho e não ficaremos discriminados socialmente. Para viver dentro dos padrões, muitas vezes ficamos acomodados na maneira de pensar. Por isso, precisamos pensar e fazer algo diferente. Ações inovadores que empreendemos fazem conexões de neurônios, que proporcionam ganho intelectual e qualidade de vida.
Abraço,
Danilo
Danilo, gostei muito do seu texto. Que venham muitos outros.
Abraços,
Moacyr
Prezado Moacyr,
Fico contente por saber que você gostou do texto. O cérebro humano necessita de desafios constantes. Por isso, os neurocientistas recomendam que criemos nossos próprios desafios, tarefa que só pode ser iniciada com o estímulo da própria criatividade. Diariamente temos infinitas possibilidade de criar algo simples e inovador para a nossa mente. O esforço compensa.
Firmei uma parceria de colaboração com a Lu. Então, outros textos de minha autoria serão publicados em breve.
Atenciosamente,
Danilo
Caro Danilo,
Ótima reflexão sobre os sentidos das palavras. As possibilidades são múltiplas. Adorei o desafio!
Abraço,
Luiz Cruz
Prezado Luiz Cruz,
A polissemia, ou seja, os vários significados de uma palavra, muitas vezes não é observada por quem escreve. Dificilmente, as pessoas recorrem ao dicionário para conferir o significado da palavra que melhor representa a ideia que vai ser expressa. É uma pena, porque os recursos na internet são infindáveis e permite o acesso fácil a qualquer verbete do dicionário.
Há poucas semanas, o departamento da universidade de Oxford responsável por elaborar dicionários, denominado Oxford Dictionaries, escolheu, como a mais usada em 2016, a palavra “pós-verdade” (“post-truth”). “Pós-verdade” é o adjetivo que expressa circunstâncias ou fatos objetivos considerados de menor valor e, assim, têm menor importância do que crenças pessoais, marcadas pelas emoções e valores pessoais. A palavra foi incorporada ao dicionário em 1992, mas passou a ter maior relevância em 2016.
A polissemia da “pós-verdade” é aplicável a muitos acontecimentos no Brasil neste ano. Vale a pena conferir no site https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/11/16/O-que-%C3%A9-E2%80%98p%C3%B3s-verdade%E2%80%99-a-palavra-do-ano-segundo-a-Universidade-de-Oxford ou em outras fontes de informação disponíveis na internet.
Atenciosamente,
Danilo
Danilo
Achei sensacional o desafio. Como só andamos no automático, deixamos de perceber coisas tão simples e que fazem uma enorme diferença. Seu texto chama-nos a atenção para a necessidade da reflexão. É realmente fantástico.
Abraços,
Lu
Prezada Lu,
Obrigado pelo elogio.
Viver no “piloto automático” equivale a perder oportunidades de usar adequadamente os recursos disponíveis no cérebro . Porém, como seres humanos, continuamente repetimos os padrões sociais e de comportamento aprendidos desde a infância. Assim nos sentimos como parte do rebanho e não ficaremos discriminados socialmente. Para viver dentro dos padrões, muitas vezes ficamos acomodados na maneira de pensar. Por isso, precisamos pensar e fazer algo diferente. Ações inovadores que empreendemos fazem conexões de neurônios, que proporcionam ganho intelectual e qualidade de vida.
Abraço,
Danilo