VOCÊ JÁ SERVIU DE BOI DE PIRANHA?

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Autoria de Lu Dias Carvalho

boi

A minha amiga Josefina não se encontrava hoje num dos seus bons dias. Estava tomada pela dor ocasionada pela ingratidão, sentindo-se usada por seus familiares. Ofereci-lhe meus ouvidos e atenção para que lavasse a alma. Assim, desabafou ela:

– Eu me peguei pensando nas vezes sem conta em que me usaram, ou nas vezes em que permiti que me usassem, como um verdadeiro “boi de piranha”. Eu não sou devorada viva como acontece com o pobre animal, mas esfacelada paulatinamente. Minha dor é tão grande que tenho a sensação de que vou me desintegrar em meio ao caos que assola minha alma. Mas irei superar este momento e aqueles, ou seja, as piranhas que tentaram me devorar, não estarão bem por muito tempo, pois tudo na vida tem o seu reverso.

Certíssima em entregar a contrapartida dos reveses ao tempo, minha amiga saiu da conversa bem mais leve, e eu fiquei curiosa para saber a origem da expressão boi de piranha, à qual ela se referiu com tanta mágoa. Vamos lá:

Quando os boiadeiros vão atravessar com suas boiadas os rios da Bacia Amazônica e do Pantanal, quase sempre infestados por piranhas (peixes carnívoros), pegam o boi mais velho e cansado ou o mais doente da manada e o sacrificam, colocando o pobre infeliz num lugar acima ou abaixo de onde se dará a travessia. De modo que, enquanto as piranhas devoram a pobre vítima, os boiadeiros aproveitam para atravessar o rebanho bovino, sem perigo algum.  Que pena do animal! Esta expressão popular é genuinamente brasileira.

Transposta para a linguagem popular, segundo o nosso Aurélio, trata-se da pessoa que, em um grupo, é submetida ou se submete a um sacrifício ou experiência para favorecer os companheiros. Não é fácil servir de “boi de piranha” contra a vontade.

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MOÇA COM CÃO BRANCO (Aula nº 111 A)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

O artista Lucian Freud (1922–2011) era filho de um arquiteto e neto do psicanalista Sigmund Freud. Nasceu em Berlim/Alemanha, mas se mudou para o Reino Unido com a sua família, ainda criança, fugindo do Nazismo. Tornou-se cidadão britânico e, ao lado de Francis Bacon, é tido como o principal pintor figurativo inglês do século XX. A partir dos meados dos anos de 1960 optou pela pintura de nus e, para criar a sensação de flacidez da pele, passou a usar pincéis mais ásperos e largos. Pintou principalmente pessoas com as quais tinha contato (membros de sua enorme família, amantes ou amigos íntimos) e que posavam durante muito tempo para ele. Não dava importância à expressão facial, alegando ser essencial que a “expressão venha à tona através do corpo”. Ainda assim, os seus retratos pareciam transmitir um sofrimento espiritual.

A composição intitulada Moça com um Cão Branco faz parte das primeiras pinturas de Lucian Freud, quando ele apresentava composições nítidas e lineares. É tido como uma das obras mais notáveis do artista e de difícil descrição. Muito da atmosfera fria, densa e desnorteante de suas primeiras obras tem a ver com o Surrealismo. Trata-se do último dos retratos criados pelo artista, no qual toma como modelo sua primeira mulher Kitty Garman, filha do reconhecido escultor Jacob Epstein. O mais surpreendente é que a união de Lucian e Kitty findou logo depois de ele ter terminado esta obra extremamente ordenada. O artista pintou muitos retratos de Kitty durante seu breve casamento que terminou em divórcio em 1952 por causa de suas infidelidades crônicas.

A modelo apresenta-se com uma expressão de cansaço, com cavidades profundas sob os olhos, usando um roupão verde, com o seio direito de fora, sentada sobre o que parece ser um sofá ou um colchão desprovido de forro, num cenário severo (uma representação do ateliê do artista), o que leva à presunção de que se refere a uma cena íntima. Ela traz olhos grandes levemente assimétricos, correspondendo à expressão popular de que “os olhos são o espelho da alma”. Eles parecem fixos no observador, mas ao mesmo tempo mostram-se perdidos, expressando receio e aflição — carregados de uma grande tensão psicológica.

Kitty encontrava-se grávida de sua segunda filha, quando estava sendo retratada para esta obra. O seio direito à vista — amparado pelo braço esquerdo, cuja mão segura o outro escondido sob o roupão — pode simbolizar a amamentação. É possível que o artista tenha se inspirado na obra de Jean Fouquet (Fouquet – O DÍPTICO DE MELUN). O jeito como o artista coloca a cabeça do cão (o uso de animais nas composições Lucian Freud é bastante difundido, e muitas vezes ele apresenta um animal de estimação e seu dono) em estado de alerta, com os olhos fixos no observador, pode estar remetendo à impossibilidade sexual, quaisquer que sejam as conotações sexuais que o seio possa ter quando relacionado à cama.

O artista era reconhecido sobretudo por sua capacidade ao representar a textura da pele. A representação do pé aqui na obra é também excepcional. Para Lucian o pé mereceu tanta atenção quanto as mãos ou o rosto de Kitty.

Ficha técnica
Ano: 1950-1951
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 76 cm x 101,5 cm
Localização: Tate Britain, Londres, Reino Unido

Fontes de pesquisa
Tudo sobre arte/ Editora Sextante
Lucian Freud/ Taschen
Arte/ Publifolha

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Daumier – A LAVADEIRA

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Autoria de Lu Dias Carvalho

O pintor francês Honoré Daumier (1808-1879) entrou aos 14 anos de idade para o atelier de Alexandre Lenoir, um antigo aluno de Jacques-Louis David. Também estudou escultura antiga no Louvre e as obras de Ticiano e Rubens. A liberdade de expressão chegou à França após a Revolução de 1830, o que sinalizou para que a arte da caricatura política se tornasse livre e ganhasse grande importância. Como era um grande admirador da República, Daumier passou a trabalhar com esse tipo de caricatura, principalmente com as que satirizavam o rei Luís Felipe. Ficou seis meses na prisão por causa de uma delas. Iniciou a pintura de quadros aos 37 anos de idade, vindo a transformar-se no maior representante do Realismo Social na pintura. Sua capacidade de síntese era tamanha que nenhum outro pintor do século XIX conseguiu igualá-lo. Morreu na miséria e quase cego numa casa que lhe foi dada. Apesar de ser visto como um exímio gravurista, foi também um dos mais importantes pintores do século XIX.

A composição intitulada A Lavadeira é uma obra desse artista francês e também a mais famosa de um conjunto de sete quadros com o mesmo tema. Sua composição apresenta duas robustas silhuetas escuras – a lavadeira e seu filho – subindo escadas nas margens do Rio Sena. O local em Paris, onde o artista viveu, permitia-lhe acompanhar o trabalho das lavadeiras no Rio Sena. A composição caracteriza-se pelas cores ocre e terra. As suas obras expressam a desgraça social e crianças na miséria, algo que o mobilizava e do qual foi vítima.

Um esboçado pano de fundo, composto por uma fila de casas, encontra-se banhado pela luz do crepúsculo que realça a silhueta das duas figuras humanas. A lavadeira galga os degraus de pedra após um dia extenuante de trabalho. Ela está voltando para casa. Debaixo do braço esquerdo carrega uma trouxa de roupas lavadas, enquanto traz o filho seguro pela mão direita. Tem o corpo curvado e os olhos voltados para a sua criança que traz uma pasta na mão, provavelmente está chegando da escola.

Ficha técnica
Ano: c. 1860
Técnica: óleo sobre painel
Dimensões: 49 cm x 34 cm
Localização: Museu do Louvre, Paris, França

Fonte de pesquisa
Obras-primas da pintura ocidental/ Taschen

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Historiando Fábulas – A CABEÇA E O RABO DA COBRA

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Autoria de Lu Dias Carvalho

A jiboiaçu rastejava preguiçosamente próxima à margem de certo rio amazônico, quando sua cabeça e cauda entraram num embate que foge a qualquer encadeamento lógico. O que poderia levar as duas partes de um mesmíssimo corpo a um enfrenta- mento tão irracional, como se diferentes seres fossem? Se ambas dependiam de reciprocidade, que bobagem era aquela de caírem numa altercação?

Um urutau que a tudo observava com esmerada atenção, decifrou a causa da quizila: a cabeça queria seguir adiante em busca de alimento, mas o rabo desejava um lugar fresco para descansar e em razão disso uma discussão travou-se entre as duas partes. Os bichos confabulavam, dizendo que aquilo era coisa de fim do mundo. Alguns até apostavam para ver como acabaria aquela bizarra rusga. Irritado, o rabo falou para a cabeça:

— Você está sempre a tomar a direção de tudo, enquanto eu, sempre na retaguarda, só faço obedecer. Tenho sido seu escravo, enquanto você goza de plena liberdade para agir. Soberba, nem ao menos olha para trás para ver como me encontro, achando que onde entra a cabeça também passa o rabo. O que é verdade no meu caso, mas muitas vezes por ali passo todo escalavrado, batendo numa coisa e noutra ao longo do trajeto. Clamo aos deuses para que a justiça se faça de imediato.

O grande Júpiter — também conhecido por Zeus pelos gregos antigos — passeava sobranceiro pelos céus, até que uma viração levou aos seus ouvidos os rogos do rabo. Achou aquela solicitação bem esquisita, totalmente desprovida de bom senso. Jamais recebera ou ouvira falar de pedido semelhante, mas resolveu atendê-lo — muito mais por diversão do que por sensatez —, queria saber como um rabo poderia servir de guia à cabeça. Assentou – se numa nuvem e pôs-se a observar a cena.

O rabo ia à frente, sem enxergar um palmo adiante do nariz — se nariz tivesse —, trombando aqui, escorregando acolá, sem rumo e nem prumo, enquanto a cabeça — enlouquecida e desgovernada — seguia atrás, mal se mantendo erguida, enquanto os bichos arregalavam os olhos sem saber no que iria dar aquela danura. O perturbado e zureta rabo, não tendo visto o despenhadeiro, por suas encostas escorregou-se. O corpo da jiboiaçu desceu destrambelhado e, ao final de muitos metros, cabeça e rabo separaram-se para sempre… Esfacelados!

Moral da História

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NOVO ESTILO – A ARTE FIGURATIVA (Aula nº 111)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

Pensava-se que no período pós-guerra, ou seja, nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial, que a pintura abstrata, até então vista como uma evolução lógica da arte, fosse ocupar cada vez mais espaço, mas curiosamente o que se viu foi a retomada do figurativismo, o que comprova que a arte encontra-se em eterna mudança, ainda que certos estilos durem mais tempo que outros.

Figurativismo ou Arte Figurativa são os termos usados para descrever as manifestações artísticas que representam a forma humana, os elementos da natureza e os objetos criados pelo homem, podendo ser realista ou estilizado, desde que seja possível reconhecer aquilo que foi representado. É muito comum o uso do vocábulo “abstrato” para se contrapor ao “figurativo”, contudo, a expressão que se mostra mais eficaz e dá margem para menos confusão é “não figurativo”.

Os pintores figurativos diferiam dos abstracionistas, porque optavam por representar pessoas e objetos de forma reconhecível, embora alguns deles fizessem uso de criações tão experimentais quanto o que faziam os artistas abstratos. Suas criações eram desafiadoras, ao apresentar figuras contemporâneas e também do ambiente em que se encontravam inseridos, buscando eliminar o sentimentalismo. Em algumas de suas obras podiam se mostrar poéticos, enquanto noutras se faziam chocantes na exposição do tema escolhido. Os pintores figurativos não apenas passaram a trabalhar com as tradições do estilo em questão, como enriqueceram-no, criando imagens provocativas sobre a condição humana presente num mundo extremamente desigual e em constante mudança.

O artista estadunidense R. B. Kitajé, morando em Londres, deu a um grupo de pintores ingleses, do qual também participava, o nome de “Escola de Londres”. Esses artistas estavam juntos mais pelo companheirismo de que por semelhanças reais de estilo. Do grupo faziam parte: Francis Bacon, Lucian Freud (neto do psicanalista Freud), Leon Kossof, Frank Auerbach, Michael Andrew e o próprio R. B. Kitajé. Esses artistas tiveram no pintor David Bomberg — que dava grande distinção ao tato e à visão — uma importante influência. Entre eles era comum que um artista posasse para o outro. Após os anos de 1945 surgiram nos Estados Unidos pintores figurativos realistas como Philip Pearlstein — mais conhecido pelos nus do Realismo Modernista — Alex Katz — conhecido por suas imagens simplificadas e em tamanho grande — que criaram estudos figurativos imparciais e Andrew Wyeth – também famoso por produzir obras regionalistas — que criaram obras mais emocionais.

Francis Bacon foi o mais festejado pintor britânico do século XX, com suas pinturas dramáticas em que o tema central era a figura humana. Ele as tirava da posição normal e distorcia-as para repassar a sensação de isolamento e terror. Lucian Freud foi para a Inglaterra com a família, ainda criança, fugindo dos nazistas. Ao lado de Francis Bacon — de quem era um grande amigo e com quem compartilhava uma visão amarga em relação à condição humana, avaliando ser essa de angústia, isolamento e solidão — é tido como o principal pintor figurativo inglês do século XX. A pintura figurativa, segundo o ponto de vista de alguns artistas e estudiosos da arte, era o único estilo que realmente poderia estar de acordo na sociedade sociopolítica dos dias atuais.

Nota: a obra que ilustra este texto é intitulada Annie e Alice (1950) obra de Lucian Freud.

Fontes de pesquisa
Tudo sobre arte/ Editora Sextante
Manual compacto de arte/ Editora Rideel
A história da arte/ E. H. Gombrich
História da arte/ Folio
Arte/ Publifolha

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VIVENDO AO DEUS-DARÁ

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Autoria de Lu Dias Carvalho

mendigo

Eu fico cá pensando com os meus botões sobre qual será o porquê de alguns poucos indivíduos viverem no bem bom, enquanto grande parte da humanidade vive ao deus-dará, se vivemos neste planeta apenas como hóspedes, e ainda por cima por um curto espaço de tempo. Não adianta abocanharmos tudo que podemos, perdendo a noção da brevidade de nossa vida. Na verdade não somos absolutamente donos de nada. Tudo nos é emprestado por um determinado tempo. Logo deixaremos nossa bagagem para outrem. E os ladrões do erário público ainda acham que enganam a morte, ao jogar na rua da amargura tantos desvalidos, privando-os de saúde, educação e comida.  Mas eles, de uma forma ou de outra, terão o  que merecem. Não perdem por esperar!

A expressão “deus-dará” que o Aurélio explica como “à toa; a esmo; ao acaso; à ventura; a Deus e à ventura” possui duas explicações para a sua origem. Vejamos:

Lá pelo século XVII em Recife (PE), os soldados eram providos pela Fazenda Real. Mas, por isso ou por aquilo, alguns não eram abastecidos, de modo que os necessitados se viam obrigados a recorrer ao comerciante Manoel Álvares. E se por acaso faltava ao bom homem as mercadorias necessárias, esse consolava os soldados dizendo: “Deus dará!”. E tanto repetia a expressão – o que significa que ele estava sempre com falta de mercadorias – que foi apelidado pelos soldados de “Deus Dará”, apelido esse que, com o passar do tempo, foi agregado a seu nome próprio: Manuel Álvares Deus Dará. O mais interessante é que o acréscimo também passou para seus descendentes como sobrenome.

Outros, porém, contam que “deus-dará” tem a ver com os sovinas que se recusavam a dar esmolas. Quando um mendigo tinha o desprazer de estender a mão em busca de um auxílio a um desses unha de fome, ouvia logo a resposta: “Deus dará!”, ou seja, legavam toda a responsabilidade a Deus de modo que não tivessem de ser importunados pelos mendicantes. E assim, o coitado ficava abandonado à própria sorte, aguardando que Deus socorresse-o. Apesar de dizerem que eram cristãos, não levavam em conta o ensinamento bíblico em que Jesus estimula o socorro aos pobres.

Fontes de pesquisa:
A Casa da Mãe Joana / Reinaldo Pimenta
http://ninitelles.blogspot.com.br

Nota: Imagem copiada de tmsfrainha.blogspot.com

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