BATER AS BOTAS

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Autoria de Lu Dias Carvalho baleia1

Segundo diziam os antigos, a expressão bater as botas era específica dos endinheirados, pois o calçado era um símbolo de status social, um luxo do qual os desventurados viam-se a anos-luz de distância. Ainda mais em se tratando de botas, artigo luxuoso, feito de couro, à disposição de poucos, símbolo de ostentação e autoridade. Tanto é que todo coronel, graduado ou não, usava tal calçado que muitas vezes subia até a coxa. O tamanho dizia respeito ao seu grau de importância. Como as mulheres não usassem botas, tal expressão só era direcionada aos homens patacudos, é claro.

Os pobres sem eira e nem beira não batiam as botas, apenas esticavam suas canelas finas, desprovidas de músculos, terminadas em pés de sulcos profundos, capazes de esconder toda a miserabilidade que lhes ofertava a vida, sem dó ou piedade. No máximo podiam bater as chinelas ou amarrar o paletó puído, presente de um coronel ou senhor. O mais engraçado é que, num gesto de extrema nobreza, como se vivessem numa sociedade justa, pobres e ricos partiam para “uma vida melhor”, onde supunham que todos chegariam, mas sem o uso de botas, é claro.

Ainda que as injustiças continuem, a expressão bater as botas tornou-se igualitária. Tanto batem as botas, abotoam o paletó ou esticam as canelas os ricos quanto os pobres. E não mais importa o sexo, pois botas e paletós também passaram a fazer parte da indumentária feminina. Sem falar que as botas de hoje também podem ser de borracha ou plástico, trazendo um preço mais em conta, de acordo com o bolso de cada um.

Segundo alguns estudiosos dos ditos populares, esta expressão pode ser fruto da primeira invasão holandesa no Brasil, acontecida em 1624, quando o uso de botas foi estendido aos negros escravos. Como esses não tinham nenhuma destreza no uso de armamentos, acabavam tropeçando em suas próprias botas e caindo, tornando-se um alvo fácil para a mira dos holandeses em luta. Os negros sobreviventes referiam-se aos companheiros que morriam como sendo vítimas das botas, ou seja, os pobrezinhos morriam porque tinham “batido as botas”.

Ilustração: Um Par de Botas, 1886, obra de Van Gogh.

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OS DITADOS E OS TEMPOS

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Autoria de Lu Dias Carvalho

Os ditados (ou ditos) populares são uma das mais belas expressões de uma língua. Eles representam a identidade cultural de um povo, mas são também uma pedra no sapato de quem estuda um idioma estrangeiro, pois são difíceis de serem explicados e entendidos, pois jamais podem ser traduzidos ao pé da letra. Muitas vezes, eles extrapolam as fronteiras de um país e agregam-se a outras línguas, depois de sofrer pequenas alterações. Noutras, fogem totalmente à sua origem, como é o caso dos ditados que veremos abaixo.

Dito Popular: “Quem tem boca vai a Roma”.
Original: “Quem tem boca vaia Roma”

Explicação:
Vaia do verbo “vaiar”, diz respeito à época do imperador romano Júlio Cesar.

Dito Popular: “Esse menino não para quieto, parece que tem bicho carpinteiro”.
Original:  “Esse menino não para quieto, parece que tem bicho no corpo inteiro”.

Dito Popular: “Batatinha quando nasce, esparrama pelo chão”.
Original: “Batatinha quando nasce, espalha a rama pelo chão”.

Dito Popular: “Cor de burro quando foge”.
Original: “Corro de burro quando foge!”

Dito Popular: “Cuspido e escarrado” (alguém muito parecido com outra pessoa).
Original: “Esculpido em carrara” (tipo de mármore).

Dito Popular: “Quem não tem cão, caça com gato”.
Original: “Quem não tem cão, caça como gato”

Explicação:
Precisa ser astuto, esperto como um gato para caçar.

Dito Popular: “Meu amigo enfiou o pé na jaca”.
Original: “Meu amigo enfiou o pé no jacá”.

Explicação
Antigamente os bares traziam cestas na parte da frente. Tais cestas eram conhecidas como “jacá”. Ali ficavam legumes e frutas para serem vendidos. As pessoas bêbadas, ao sairem do bar, costumavam enfiar o pé no jacá, nascendo daí a expressão.

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AFLIÇÃO DO DESEJO

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Autoria de Amanda Lemos

Perdida, eu percebi alguém.
E alguém também me percebeu.
Percebi que queria saber mais além
E além de mim esse alguém se perdeu.

Perdeu-se no que queria.
De tão perdida
Seu desejo não reconhecia.
Um caminho para seguir?
Não sabia!
De uma direção precisava
E isso a afligia.

Procurava entender o que buscava.
Entender o cerco que a rondava.
Os olhos ajudavam,
Mas ela evitava.

Evitava sentir.
Evitava estar ali.
Não queria ver, não queria se ver.
Talvez para si própria,
Não quisesse viver.

Mas disso ainda não sabia.
Lutava contra o que a perseguia.
Mesmo não sabendo ao certo
O que a afligia.

Vivera até ali sem saber.
Andava mais um passo.
Olhava para trás,
Na esperança de entender
Por que o seu verdadeiro sentido
Era tão difícil reconhecer.

Ilustração: A Madona, 1894/95, Edvard Munch

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A CRUCIFICAÇÃO BRANCA / SOLIDÃO (Aula nº 90 E)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

      

Quando eu via meu pai, a barba e as rugas de seu rosto, sentia-me tomado de profunda pena. E quando contemplava uma árvore novinha, ou a lua, ficava encantado com sua beleza. Mas eu não atinava com o que eu poderia fazer dessas sensações. (Chagall)

O pintor russo Marc Chagall (1887-1953) nasceu de pais pobres e incultos, sendo que o cotidiano da família desenrolava-se num gueto judaico da cidade russa de Vitebsk. Desde pequeno ajudava o pai no mercado, onde tinha uma banca de peixes. Apesar do cansativo trabalho, não abria mão da leitura diária dos livros sagrados do Judaísmo e de assistir aos cultos na sinagoga. A vida em família era pacífica, apesar de simples, embora houvesse o temor dos periódicos “pogroms” (massacres). Desde criança, Chagall mostrava-se muito sensível, enternecendo-se com as coisas mais simples que via. Gostava de desenhar. Seus primeiros desenhos eram feitos com carvão e papel. Hoje veremos duas obras do artista: A Crucifixão Branca e Solidião.

A primeira composição, intitulada A Crucifixão Branca (ilustração à esquerda), em que Jesus Cristo, tido pelos judeus como um profeta do Deus da cristandade, é morto e crucificado como homem. Aqui, nesta sua única obra, o pintor deixa para trás a leveza e a doce ironia de suas obras, para buscar na religião uma resposta para o medo existencial. A imensa cruz com Cristo crucificado, coberto com um pano judaico da cintura para baixo, indo até próximo aos joelhos, e trazendo um pano na cabeça, em vez da coroa de espinhos, ocupa o cento da composição. Junto à cruz está a escada usada para retirar Cristo da cruz. Inúmeras cenas de selvageria acontecem em volta de Jesus Cristo crucificado:

  • em primeiro plano, pessoas correm para fora do quadro, na tentativa de deixarem para trás o caos, inclusive uma mulher com seu bebê;
  • um menorá (candelabro sagrado de sete braços), com suas velas acesas, parece iluminar o caminho dos que fogem;
  • Asevero, o Judeu Errante, usando uma vestimenta verde e um saco às costas, passa por cima do rolo da Torá que se encontra em chamas;
  • no céu tormentoso e amedrontador pairam quatro figuras, que são as testemunhas do Antigo Testamento, em lamentação;
  • bandos de revolucionários com suas bandeiras atravessam uma aldeia, onde duas casas estão queimando e uma terceira encontra-se de cabeça para baixo. Eles estão roubando e destruindo o que encontram pela frente;
  • dentro de um barco à deriva, os fugitivos, compostos por homens, mulheres e crianças, pedem socorro;
  • à direita, um homem, com um uniforme nazista, ateia fogo numa sinagoga;
  • vários objetos, incluindo livros sagrados espalham-se em derredor.

Um enorme raio de luz branca, vindo da margem superior da tela, ilumina Cristo crucificado, como a dizer que ainda há esperança, apesar de todas as atrocidades. Chagall em sua obra repassa a mensagem de que a fé é capaz de remover todo o sofrimento, por mais terrível que ele possa parecer, ou seja, há sempre esperança.

A segunda composição, intitulada Solidão (ilustração presente à direita), foge à alegria encontrada nas suas obras anteriores. O quadro exala uma contagiante tristeza, que ganha vida através do pincel do artista. Chagall não se mostra indiferente às ameaças ao seu povo. A pintura mostra um judeu, vestido com seu escuro hábito de orações, coberto por um manto branco, sentado no gramado, ao lado de um boi, com os olhos voltados para o chão. Seus cabelos são escuros assim como as espessas sobrancelhas. Um bigode e uma barba longa entrelaçam-se e ajudam a compor os seus fortes traços fisionômicos. Não se pode precisar qual seja a idade do personagem.

A expressão desse homem religioso, que se ampara na mão direita, repassa um profundo desalento. Ele se mostra perdido em suas divagações, como se não houvesse mais esperança em relação àquilo que o atormenta. Na mão esquerda traz o rolo vermelho da Torá (os cinco primeiros livros do Tanakh) ainda fechado. Parece encontrar-se alheio a tudo em derredor.

À esquerda do judeu encontra-se deitada uma vaca branca, trazendo também um olhar tristonho. O homem simboliza Asvero, o Judeu Errante, vagando pelo mundo sem destino certo. Um violino jaz no chão, possivelmente silenciado pela atrocidade das perseguições vividas pelo povo judeu. O anjo vestido de branco, no céu turbulento, é perseguido pelas árduas tempestades acontecidas na vida do povo judeu, como se a esperança voasse sempre para longe, vitimada pelas violentas perseguições. O anjo, o boi e o judeu parecem formar uma pirâmide branca. Ao fundo, em segundo plano, vê-se a cidade com suas casas e sinagogas.

Ficha técnica (A Crucifixão Branca)
Ano: 1938
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 155 x 140 cm
Localização: Instituto de Arte de Chicago, Chicago, EUA

Ficha técnica (Solidão)
Ano: 1933
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 102 x 169 cm
Localização: Museu de Tel Aviv, Telavive, Israel

Fonte de pesquisa
Marc Chagall/ Taschen

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BÊBADO COMO UM GAMBÁ

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Postado por Lu Dias Carvalho

gambebo

Segundo a minha amiga Celestina Queiroga, o marido de sua secretária bebe como um gambá. E eu pensei cá com os meus botões sobre essa mania que as pessoas têm de sempre botar a culpa nos bichos. Os coitadinhos acabam levando a fama pelas maluquices e vícios humanos. Protesto veementemente contra tal comportamento.

Mas que engano! Eu estou aqui a defender o gambá, um bichinho noturno, para depois ficar sabendo que o danado é caidinho por bebidas alcoólicas, principalmente por uma birita. O moleque gosta tanto da sinhazinha que basta sentir o seu cheiro para cair na esparrela. De modo que, para pegá-lo, basta colocar um pouco de pinga numa vasilha. O bichinho bebum é atraído pelo cheiro. Ele bebe a terebintina e cai embriagado, bebaço, ficando impossibilitado de defender-se, ou seja, incapacitado de soltar aquele aroma que lhe é tão peculiar e que afasta as companhias indesejáveis, assim como os inimigos. Como os bêbados humanos, o animalzinho fica à mercê de terceiros que dele fazem o que bem quer, inclusive matam. Coitadinhos!

O leitor poderá ver agora que existem coisas em comum entre o gambá e o bebum. Ambos adoram uma jurubita e expelem um bodum danado, pois os bebuns não são chegados a um banho. Mas é bem possível que o bichinho, ao contrário do bicho-homem, nunca vomite ou faça aquela lambança no banheiro, o que deixa qualquer mulher com os cabelos em pé, ciente de que onde entra a bebida, escafede-se o prazer. Segundo os abstênios, onde a bebida torna-se patroa, o saber pica a mula numa boa.

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O BEIJO (Aula nº 90 D)

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Autoria de Lu Dias Carvalho

O Beijo é tido como a composição mais extraordinária de Gustav Klimt, sua obra-prima, vista como um ícone da arte do século XX, ao representar com tanto ardor o amor sensual. Ao lado de “Retrato de Adele Bloch-Bauer I” (presente neste site), O Beijo diz respeito ao apogeu do pintor em sua fase dourada que vai de 1903 a 1909, quando o artista fazia uso do ouro em suas obras. Trata-se de uma composição muito rica, onde se destacam a presença de folhas de ouro e de prata opacas e brilhantes e de fio de ouro (encontrados no vestido da mulher). Além disso, pó de ouro cobre o fundo marrom avermelhado da tela. A obra é também vista como um trabalho da “Art Nouveau”, estilo que veremos à frente.

Um casal encontra-se no centro da composição, ajoelhado sobre um tapete floral, numa intensa manifestação de amor, num local indeterminado, como se só existissem os dois amantes. Não se trata de um mero gesto de carinho, mas de um momento intensamente íntimo em que os sentidos estão todos direcionados para o beijo. Vemos muito pouco do corpo do casal.

O homem veste um imenso quimono que cobre todo o seu corpo, excetuando a cabeça cingida por uma coroa de hera. O pescoço e as mãos envolvem o rosto da mulher, puxando-o em sua direção, com o objetivo de beijá-la na boca. O homem encontra-se de frente, mas a posição da cabeça impossibilita a visão de seu rosto. Ele inclina o rosto da amada para beijá-lo, deixando-a ruborizada, mas seus olhos fechados denotam total entrega, submissão.

A mulher ajoelhada, com a cabeça apoiada nos ombros, tem o corpo de perfil e também usa flores nos cabelos. Ela mostra apenas o rosto, o braço direito, mãos e pés. Seu rosto, com os olhos e lábios fechados, está voltado para o observador. Seus pés estão descalços, deixando visíveis parte das pernas. Com a mão direita, ela cinge o pescoço do amante e com a esquerda afaga sua mão.

Pela decoração das túnicas é possível divisar a roupa de um e de outro. O homem veste um gigantesco quimono amarelo, cheio de retângulos e quadrados em tamanhos diversos, nas cores preta, prata e branca. A mulher usa um delicado vestido que se encaixa nos talhes de seu corpo, com círculos de vários tamanhos, representando as inflorescências. A pele dele é mais escura e a dela mais alva.

Ao contrário de outras obras, nesta Klimt dá ao homem um papel ativo, enquanto a mulher não se mostra como uma “femme fatale”, mas passiva, ajoelhada, numa entrega total ao amor, bem diferente de outras obras do artista. Há mais ternura do que erotismo na cena. As duas figuras encontram-se ricamente vestidas num espaço pictórico decorado com vários motivos de padrões geométricos e cores.

A posição das figuras é muito controversa. Alguns veem atrás das duas figuras uma poltrona de espaldar alto, outros dizem que o casal está dentro de um sino dourado, e outros que só estão presos ao espaço pelo tapete de flores, e mais outros que se trata de um halo dourado a cair em forma de cascata. Eu fico com a primeira explicação em razão da mudança da decoração que passa atrás da cabeça de ambos, descendo pelas costas da mulher, até suas pernas e pés. E você?

Ficha técnica
Ano: 1907-1908
Técnica: óleo e folha de ouro e prata sobre tela
Dimensões: 180 x 180 cm
Localização: Österrichische Galerie Belvedere, Viena, Áustria

Fonte de pesquisa
Gustav Klimt/ Coleção Folha
Arte/ Publifolha
Arte do século XX/ Taschen

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