Autoria de Luiz Cruz
Por volta de 1702, a primeira ocupação da região do Rio das Mortes foi o Arraial de Santo Antônio, logo fortalecido pelos recursos advindos das atividades auríferas. Após a instalação do Arraial de Nossa Senhora do Pilar – o Arraial Novo, Santo Antônio passou a ser chamado de Arraial Velho. Em 19 de janeiro de 1718, o local foi promovido à categoria de vila com o topônimo São José, vindo a ser mais conhecida como São José do Rio das Mortes e em seguida São José del-Rei. Em 07 de outubro de 1860, obteve nova promoção, com o nome de “cidade e município de São José del-Rei”. Após a proclamação da República, através do Decreto Nº 3, de 6 de dezembro de 1889, passou a ser chamada de “município e cidade de Tiradentes”. Ao longo do século XVIII, a categoria “vila” equivalia ao título de cidade, portanto, em 2018, a localidade completa 300 anos de emancipação política e administrativa.
Para celebrar a efeméride, o Centro Cultural Yves Alves-CCYA realiza a exposição Presépios – 300 Anos da Cidade de Tiradentes. O CCYA recebeu como doação o presépio do artista Antônio Ferreira Gomes (1895-1978). Esse era um dos presépios mais emblemáticos da cidade. O artista e sua esposa, Dona Anésia, sempre o montavam na sala de visitas da casa, na Rua Direita, 111. Esse ritual se iniciava em novembro, com a plantação de arroz e alpiste em latinhas de goiabada, sardinha e outras. Nos primeiros dias de dezembro, após as primeiras chuvas, o casal e a meninada subiam a Serra de São José, com os balaios, para buscar enfeites: musgos, bromélias, líquens, murta e areia branca. A armação do presépio atraia a atenção de muitos e ao ficar pronto causava deslumbramento a todos. À noite recebia visitas de grupos de Folias de Reis. Era uma grande mobilização e um encantamento!
O Presépio de Antônio Gomes é de cerâmica, algumas peças cozidas e outras em barro cru. Ele copiou as principais do antigo presépio de Antônio Veloso (do século XVIII) e acrescentou outras de sua criação, como o flautista, a paralítica, a camponesa, o pedidor de esmolas e o pescador, colocadas junto às peças tradicionais, no cenário emoldurado por uma serra feita com pó de minério e ao fundo uma paisagem com edificações antigas, pintada sobre tecido.
Antônio Gomes foi um artista de muitas habilidades: santeiro, restaurador, pintor, fogueteiro, pedreiro, sapateiro, agricultor – aquela pessoa que se interessava por tudo e por todos. Como fogueteiro coloria os céus com fogos de artifícios em todas festas e fazia o “Judas” que era arrebentado no Domingo de Aleluia, após a leitura do “Testamento”, que deixava coisas inusitadas para o povo. Sofrera um acidente em sua foguetaria que teve consequência para o resto da vida, mas mesmo com problemas na coluna vertebral, sempre enfrentou longas jornadas de trabalho e procurava atender a todos que o procuravam por suas habilidades peculiares. Após sua morte e a de Dona Anésia, o Presépio foi vendido para o casal Dalma e Yves, que o emprestou para ser armado em diversos locais. Depois, a família o doou para o CCYA, onde tem sido montado todos os anos. Como se trata do presépio mais tradicional da cidade, por iniciativa do Conselho Municipal de Políticas Culturais e Patrimônio foi restaurado pela Anima Conservação e Restauro e será tombado pela municipalidade como patrimônio cultural.
Outros presépios curiosos existiram em Tiradentes e chamavam a atenção pela singularidade. Um deles era o de Antônio Veloso, na Rua Padre Toledo, 13. Com as peças em terracota, ficava o ano todo montado na sala. O da família Lopes da Cruz, na Rua Padre Toledo, 106, passava o ano inteiro armado na alcova e destacava-se pela quantidade de peças, inclusive de casinhas, sobrados e capelas. Muitas delas eram de papelão e havia peças em celuloide, bem leves e fininhas. Até o presente diversas famílias tiradentinas mantém a tradição de montar os presépios, inaugurá-los no dia 8 de dezembro e desmontá-los somente depois do dia 20 de janeiro, após as visitas das Folias de São Sebastião.
A exposição Presépios – 300 Anos da Cidade de Tiradentes tem curadoria de Luiz Cruz e Pepe de Córdoba e apresenta o Presépio de Antônio Gomes restaurado e outras obras do século XVIII ao XXI referentes ao tema. Será inaugurada no dia 8 de dezembro e ficará até o dia 22 de dezembro, quando o CCYA terá recesso. Depois retornará de 6 a 14 de janeiro. A exposição celebra os 300 anos da cidade e comemora, também, os 20 anos de atividades do Centro Cultural Yves Alves. Além da exposição, outros presépios são montados na cidade, na Matriz de Santo Antônio, no Santuário da Santíssima Trindade e nas capelas de Nossa Senhora do Rosário, de São João Evangelista, de Nossa Senhora das Mercês e no Museu da Liturgia.
*Professor, sócio-fundador e presidente do Conselho Deliberativo do CCYA
Créditos:
Realização: Centro Cultural Yves Alves
Luiz Cruz e Pepe de Córdoba
Pesquisa, texto, e fotografia: Luiz Cruz
Fotografias dos pastores do Presépio de Aleijadinho, acervo Museu da Inconfidência: Eugênio Sávio
Montagem: Luiz Cruz, Pepe de Córdoba e Alberto Lopes
Equipe do CCYA: Gláucia Vitor, Regina Carvalho, Eliseu Cruz, Alberto Lopes, Ricardo Ribeiro, Gina Valéria, Haydee Trindade, Nathália V. Souza
Apoio: Centro Cultural SESIMINAS Yves Alves, Conselho Municipal de Políticas Culturais e Patrimônio, Paróquia de Santo Antônio, Arquiconfraria da Santíssima Trindade, Anima Conservação e Restauro, IPHAN, UFMG, ICBO, Renato Diniz, Alexandre Mascarenha, Família Costa, Antiquário Nobre Decadência, Solar da Ponte, Nícia Braga, Luciana Braga Giovannini, Dorothé Lenner, Bolão Divino, Ulisses Passarelli, Sérgio Carvalho, Jango Silva, Lucas Silva, Rita Gomes, Brasileirinho, João Elias, Felipe Callipo
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Luiz
Excelente registro; ótima iniciativa. Parabéns!Desejo-lhe sucesso nessa exposição.
Caro Ulisses,
Obrigado por sua presença aqui no Virusdaarte.
Nossa exposição apresenta um belo conjunto de Presépios e está vinculada ao Patrimônio Imaterial, com a inclusão das Folias de Reis, com suas bandeiras e seus instrumentos. Seria um prazer receber você nessa exposição que é singular, mas cheia de histórias, habilidades artísticas, devoção e muita tradição.
Um grande abraço para você.
Luiz Cruz
Parabéns, Luiz!
Que texto lindo sobre uma história tão bonita.
Parabéns, Lu Dias pelo blog. Uau! Muito bom.
Beijo,
Terezinha
Olá Terezinha Pereira,
Obrigado por sua presença aqui no blog.
Para mim, seu retorno é sempre uma grande alegria, pois sei o quanto seu trabalho de escritora é relevante e quanto ele tem crescido. Isso é muito bom.
Um grande abraço para você.
Luiz Cruz