Autoria de Lu Dias Carvalho
Marc Boulet, ao viver Ram Munda na pele de um dalit, percebeu que as coisas não são bem como lhe ensinaram antes. Ao preparar-se para a sua metamorfose, procurou conhecer a fundo a cultura indiana, através de livros, filmes e informações. No entanto, alguns conhecimentos obtidos não correspondem em nada à verdade que sentiu na própria pele. Por exemplo, ele aprendeu que os indianos eram tolerantes e não violentos. Compreende agora que a tolerância indiana, de que tanto falam os ocidentais, não passa de um grande engano, um engodo. Na verdade, o que eles sentem é uma profunda indiferença pela sorte do outro. Ignoram-no! Simplesmente recusam-se a enxergá-lo, principalmente quando não pertence à própria casta.
O modo como os poderosos tratam os mais pobres é de uma violência vista em poucos lugares do mundo. Dificilmente eles os veem. E, quando isso acontece, tratam-nos como escravos, coisas sem valor algum. Pois o respeito e a piedade pelos mais fracos não existem no aclamado país da espiritualidade chamado Índia. Os pobres e miseráveis são sempre oprimidos e esmagados. Mesmo quando os indianos praticam a caridade, fazem-no pensando na própria evolução e não no outro. Nem nesse momento eles enxergam os miseráveis.
A submissão, o descaso e a miséria quando explodem no território indiano são de uma ferocidade inimaginável. A violência contra os considerados intocáveis é pregada nos textos sagrados, na intolerância do sistema de castas e no egoísmo hindu. Qualquer coisa é motivo para que apanhem, sem que ninguém os socorra. Tudo que fazem é visto como insulto às castas mais ricas. A polícia é brutal. Nem os loucos passam imunes. E para quem não sabe, na Índia, a violência parece ser a resposta para tudo. Os indianos estão sempre repetindo: “Quero bater em você!”. Trata-se de um povo excessivamente violento, brutal e sem generosidade.
Marc Boulet observa que os hindus (praticantes do hinduísmo) de casta elevada são incoerentes na busca pela pureza, pois a conduta deles é totalmente orientada pela religião. Embora sigam uma dieta vegetariana e sem álcool, sendo que os mais ortodoxos não comem nem cebola e alho, considerados impuros, a maioria consome drogas à base de cannabis. Existe também um grande número de hipócritas, que comem carne de cabra ou de frango, e se embriagam às escondidas. Sem falar no grande número de trapaceiros, sempre querendo obter vantagem, passando o outro para trás. Trata-se de um povo excessivamente materialista.
Os brâmanes, a casta dos poderosos, são fechados e intolerantes, embora assumam uma aparência honesta e civilizada. É verdadeiro que fomentam a violência contra os intocáveis, que têm horror a eles. São cruéis e perversos. Acham-se poderosos e são prepotentes.
É muito comum encontrar eunucos pelas ruas de Benares. Usam muita maquiagem, cabelos compridos e sáris coloridos. E rebolam ao andar. Se alguém assovia para um eunuco e lhe pergunta se tem bur (gíria referente à vagina), é comum que esse levante o sári e o saiote para mostrar o sexo: dois lábios finos e vermelhos, de três a quatro centímetros de comprimento, como se fossem costurados sobre a bacia reta e chata. Não possuem pênis, testículos e pelos. Dizem que eles não usam cuecas, para poderem exibir o sexo, quando as pessoas aborrecem-nos. De modo que, assim, possam caminhar em paz.
Gurus abundam na Índia. Em cada cruzamento é possível ver, no mínimo, um guru, um filósofo ou um santo. Verdadeiro ou impostor. A maioria deles é uma fraude, vive a tirar dinheiro dos incautos, principalmente dos turistas. O país também é farto em adivinhos, curandeiros e astrólogos. E ali nada se faz sem uma consulta prévia a eles. Jogam com a credulidade dos indianos nas forças sobrenaturais. Em suma, a superstição abunda por toda parte.
Surpreendente para Marc Boulet é o julgamento que os indianos fazem sobre os ocidentais, em relação às mulheres. Dizem que os ocidentais não respeitam as mulheres, ao olharem diretamente em seus olhos e se sentarem perto delas. A moral indiana proíbe qualquer gesto que possa despertar a sexualidade, de modo que as relações sociais entre homens e mulheres ficam no campo do estritamente necessário. A tradição hindu reza que a mulher é apenas um vício concentrado sob o umbigo e um instrumento do diabo para tentar os homens. Ela é comparada ao jogo e ao álcool. E, para eliminar esse vício é necessário que se case na puberdade.
As famosas Leis de Manu, que governam a sociedade hindu estipulam que “Deus atribuiu à mulher a cólera, a desonestidade, a malícia e a imoralidade (…) Do nascimento até a morte, ela depende de um homem: primeiro de seu pai, depois de seu marido e, após a morte desse, de seu filho (…) Não tem o direito de possuir bens.” .
Antigamente as viúvas eram sacrificadas na pira funerária do marido. Os britânicos aboliram esse costume, ainda comum nas aldeias afastadas. Normalmente, se há cadeiras, os homens sentam-se nelas, enquanto as mulheres assentam no chão. Eles comem antes delas e as trancam em casa. Isso acontece até entre os intocáveis, onde as mulheres possuem mais liberdade, podendo sair, fumar e beber.
Os maridos batem em suas mulheres pelas faltas cometidas, sem que elas possam se queixar a sua família. Ela pertence ao marido, como se fosse um objeto, e dela ele pode dispor como bem lhe aprouver. As Leis de Manu rezam que “Um marido, mesmo bêbado, leproso, sádico ou violento, deve ser venerado como um deus.”.
O casamento hindu não passa de uma máquina de fazer filhos. A mulher nunca é vista como uma amante, mas como cozinheira e mãe dos filhos. As uniões são arranjadas e endógamas. As tradições ligam a mulher ao marido como o patrão está ligado ao escravo. Com o tempo, o amor e a amizade podem nascer, assim como nascem entre o cachorro e seu dono. A endogamia (casamento entre indivíduos do mesmo grupo, casta…) é vista pelo hinduísmo, como uma maneira de melhorar a raça indiana, de purificá-la de modo que não venha a se degenerar. Na Índia, os seres humanos são acasalados como os animais domésticos no Ocidente: segundo o pedigree, ou seja, a casta. Não se cruza um vira lata com um buldogue, assim como um brâmane não se une a um ferreiro. E caso um cruzamento desses vier a acontecer, dele nascerá um “chandal”, seres que originalmente constituíram a classe dos intocáveis. A condição vivida pelas mulheres incentiva o assassinato. Como o divórcio é uma infâmia para o marido, só a morte da esposa dá uma liberdade honrosa a ele. De modo geral, a mulher é borrifada com gasolina e queimada viva. Na maioria das vezes o motivo é o dote.
Diante do obscurantismo, da bestialidade e da intolerância vistos na Índia, Ram Munda sentiu-se como se vivesse na Idade Média.
Leiam o capítulo 13…
Nota: Imagem copiada de www.historiadomundo.com.br/indiana
Fonte de Pesquisa:
Na Pele de um Dalit / Marc Boulet
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Lu, lendo esse texto veio à mente algo. Quando falava com meu “amigo” indiano, uma ocasião em que eu disse umas verdades para ele, ele disse ,”slap you”, acredita? Agora, depois deste texto começo entender. É tudo muito triste. Por mais que estivesse sendo uma espécie de brincadeira, ouvir isso da mesma boca que dizia:”I love you so much” ou “you’re my life”, é muito triste. Mas, assim só prova o quanto desprezíveis são. E desculpem-me, costumo compreender as diferenças culturais, mas certas coisas vão além.
Vivian
O escritor Marc Boulet sentiu na pele o que é ser pobre no país da “espiritualidade”.
É impossível compreender e aceitar tais diferenças culturais. É um absurdo!
Estou para postar um texto em que as verdades serão ainda mais cruas. Aguarde.
Abraços,
Lu