E, que outro parecer poderia receber o sertanejo que, à semelhança dos tuaregues, atravessa o deserto escavado pela seca, senão que é um forte? Para conhecer melhor a agrura dessa gente, basta ler Vidas Secas (em LIVROS, aqui no site) de Graciliano Ramos, se o coração não for fraco.
O etnólogo francês, Pierre Verger, documentou a cena acima, em 1947. Os sertanejos levam tudo o que tem, na tentativa de fugir do inferno ardente. A mesma terra que os acolhe e que tanto amam, também os expulsa. Vida dura cheia de sofrimento e labuta.
Todos ali eram pobríssimos, mas
não havia desespero ou humilhação
nos rostos curtidos pelo sol ardente
alumiando a terra árida e sedenta,
na mais penosa das estações.
Os casebres tinham paredes de taipa,
e o piso batido de terra avermelhada
estava trincado e cheio de ondulação.
Eram nichos singelos e ressequidos,
incrustados naquela densa solidão.
Lá fora, a quentura ardia feito tição,
sendo capaz de queimar os miolos
de quem a desafiasse em seu reino.
Vertia brasume por todos os cantos
daquele desalentado sertão.
A poeira avermelhada dos caminhos
subia em nuvens de redemoinhos, pra
depois entocar nos furos das paredes,
e se assentar sobre esteiras rasgadas,
espalhadas aos montes pelo chão.
Os animais esparramados na poeira,
traziam uma expressão de melancolia,
jamais vista em bicho de terra alguma.
A agonia daquela gente amara ofendia
os olhos e vazava qualquer coração.
Podia-se ouvir gotas de suor caindo,
escorrendo daqueles rostos acabados,
quando o sol grudava no meio do céu.
Ninguém, a não ser os loucos e santos
viveriam naquela cruel situação.
O miserê varria tudo. Olhos de lince
assuntando a vida bronca do sertão.
Gente e bicho tristes com a desgraça,
varavam o céu com um olhar aflitivo,
em busca de uma milagrosa viração.
Havia no rosto de cada gente um dó,
uma piedade explícita ou punição.
As enxadas arriadas esperavam o sol
queimante amainar e a chuvada cair,
pra plantar esperança no sertão.
Ficha técnica
Ano: 1947
Autor: Pierre Verger
Localização: Fundação Pierre Verger
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LuDias
Lindo texto e versos.
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. Foi uma das lições que aprendi quando relato o texto “O Sertanejo”, de Euclides da Cunha, que meu extraordinário professor de português, o saudoso Benedito Ortiz, lá no tempo de minha adolescência, exclamava, com força na voz, quando nos levava à leitura do texto e a interpretava, com muita admiração. Releva, ao que me lembro, que sua aparência nada disto nos mostrava, mas como agora você nos mostra o sofrimento que tem, mas nada o desanima e continua, sempre e sempre, a acreditar que, no futuro, tudo irá mudar e que o mundo onde ele vive será melhor, muito melhor para se viver. A fé dos sertanejos remove montanhas. E acredito neles!
Ed
O sertanejo é mesmo um forte, ao resistir à perda de tudo.
Um exemplo disso é VIDAS SECAS.
Este livro marcou-me muito, sobretudo o sofrimento da cadela Baleia.
Acredito que hoje eles carreguem mais esperança.
Mas a imagem do sertanejo como um homem que resistia a tudo é muito mais poética do que real.
Abraços,
Lu