Autoria de Lu Dias Carvalho
Guignard, quando esteve em Ouro Preto pela primeira vez, ficou embasbacado. Isso foi em 1942. Ele havia ganhado o Prêmio do Salão Nacional, no Rio de Janeiro, e veio conhecer Minas. Foi o poeta Manuel Bandeira que o aconselhou: “Vá pra Minas que tem tudo a ver com você.” Mário Silésio conta que eles chegaram à noite em Ouro Preto, após o dia inteiro de viagem. Guignard, cansado, não quis ver nada e foi dormir. No dia seguinte, acordou cedo e não sabia dizer uma palavra, maravilhado com o que via. Então exclamou: “É isso que eu procurei a vida inteira. Eu quero viver é aqui!”. (Prof. Pierre Santos)
Eterna criança grande, Guignard conservou a ingenuidade, o lirismo e e a frescura da infância, como se a vida e o tempo por ele tivessem passado impunemente, deixando-o intato. Ninguém como Guignard […] para nos pôr em “estado de graça” diante de um punhado de flores líricas, ou de colinas suaves, que lembram paisagens japonesas. Suas árvores explodem no ar como fogos de artifícios, e seus bosques fazem nossa sensibilidade recuar anos e anos, transpondo-nos a mágicas florestas de Grimm e Perrault. (Lúcia Machado de Almeida)
O crítico de arte Olívio de Tavares Araújo afirma em seu livro “A Poesia Intacta” que “É em Minas que se completa a passagem da pintura de Guignard de uma etapa, digamos, ainda mimética – isto é, relacionada com uma transposição mais ou menos próxima da realidade contemplada – para uma etapa de invenção pura, como a que aparece nas paisagens imaginárias.”. Mais adiante, o crítico complementa: “A paisagem mineira não é, por certo, exatamente como Guignard a representou, de meados dos anos 1950 em diante, com essas igrejinhas assim espalmadas entre linhas sinuosas e esparsas fileiras de casinhas voejantes.”.
Em seu lirismo, Guignard, através de sua observação, retirava da realidade os elementos necessários para a composição de uma obra, contudo, ao transpô-los para a tela, trabalhava-os livremente, criando algo que ninguém até então fizera antes, como diz o crítico de arte Pierre Santos, “em matéria de poesia dentro da pintura”, num misto de poética e invenção.
As “paisagens imaginantes” surgiram nos anos finais da vida de Guignard, quando sua palheta migra para um tom de cinza esbranquiçado. O crítico de arte e professor Rodrigo Naves assim define o novo trabalho do pintor: “[…] tudo parece estar em suspensão, sem solo ou pontos de apoio firmes. Não há caminhos, acidentes geográficos nem distâncias. Há apenas um mundo nublado e tristonho.”.
Ainda que a paisagem mineira não seja tal como a pintou Guignard, ela se fez real nos pincéis do grande artista, como se expressa Olívio de Tavares Araújo: “Sua grandeza está na invenção de uma paisagem mineira a que deu forma definitiva, na fusão dos elementos líricos com momentos do mais intenso patetismo, e enfim no ter sabido transformar a circunstância dolorosa da vida em obra universal, autônoma e perene.”. E é assim que a veem os mineiros e os diversos fãs do pintor, espalhados pelo Brasil e pelo mundo. A obra desse artista é a mais pura poesia.
As paisagens imaginárias de Guignard, adornadas por igrejinhas barrocas, que sempre brotam branquinhas e humildes, aqui e acolá, com pequeninas pinceladas coloridas no arremate de suas cúpulas e telhados, e pontos mais escuros para fazerem a vez de portas e janelas, reinam majestosas sobre as montanhas, nesse mundo encantado com que nos presenteou o pintor-poeta, que se tomou de amor e encantamento pelas cidades históricas das Minas Gerais, eternizando-as com seus pincéis.
A escritora Lélia Coelho Frota, em seu livro “Guignard: Arte, Vida”, diz com conhecimento que “Guignard chega a inscrever-se a si próprio na paisagem. Com a diferença de estar na paisagem pintada, pintando. Como Klee, mas de maneira inteiramente diversa, ele alude a certa inflexão de arte infantil, ao distribuir os signos dos balões, das igrejas, das casas, do encontro das pessoas em festa, pelo risco da passagem pelos desfiladeiros, pela vertigem dos abismos, pela levitação atmosférica, luminescente.”. Bendito seja Guignard!
Ficha técnica de cada gravura
- Tela maior: Paisagem Imaginária Noturna, 1950, óleo sobre madeira, 110 x 180 cm.
- Primeira tela à esquerda: Paisagem Imaginante, 1955, óleo sobre madeira.
- Segunda tela, à esquerda: Tarde de São João, 1959, óleo sobre madeira, 38,5 x 29 cm.
- Terceira tela, a partir da esquerda: Noite de São João, 1961, óleo sobre tela, 61 x 46 cm.
- Quarta tela, a partir da esquerda: São João, 1961, óleo sobre tela, 49,5 x 39,9 cm.
Fonte de pesquisa
Brazilian Art VII
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Lu
O lúdico inebriante do Guignard. Lindas obras. Ouro Preto é de embasbacar, embargar e marejar qualquer sopro de vida.
Grande abraço
Leila
Leila
Eu também me encantei com as igrejas de Guignard. Parecem um paraíso, uma outra dimensão do Universo. São deslumbrantes.
Abraços,
Lu