Autoria de Lu Dias Carvalho
A mais duradoura e uma das principais civilizações surgidas na Antiguidade desenvolveu-se no Egito, tendo durado cerca de 30 séculos, sendo bastante complexa em sua organização social e muito rica culturalmente. Já vimos que os mestres do Egito Antigo foram também os mestres dos gregos e esses, por sua vez, foram os professores de todos nós. Apesar das mudanças que vêm se processando na arte através dos tempos, pois a arte é dinâmica, ainda ficamos perplexos diante de muitas criações daquele povo, principalmente no que diz respeito à arte pictórica (da ou referente à pintura), uma vez que os pintores egípcios representavam a vida de um jeito diferente do nós. O que lhes importava era a totalidade da obra, ou seja, apresentar todos os seus aspectos com a maior precisão e constância possível. Suas obras de arte — desenhadas de memória — seguiam regras preestabelecidas que tinham por finalidade retratar fatos religiosos — uma vez que a religião estava presente em toda a vida do povo egípcio.
Os artistas egípcios deviam apresentar os elementos de sua composição com perfeita clareza, não deixando ao observador a tarefa de ter que estudá-la, uma vez que toda a sua simbologia já era conhecida, sendo que grande parte das obras de arte produzidas no Egito Antigo era direcionada aos mortos. É possível que ao seguirem as regras que exigiam a inclusão de todas as características que considerassem essencial ao corpo humano, os artistas egípcios estivessem atendendo a um objetivo mágico da representação pictórica. Para eles a composição da figura humana tinha que ser completa no que dizia respeito ao método prescrito, pois se lhe faltasse um braço, por exemplo, não seria possível levar ou receber as oferendas dedicadas aos mortos — conforme rezava a religião. A literatura, as ciências médicas e a matemática estiveram presentes na vida do povo egípcio.
Os artistas egípcios tinham um perfeito sentido de ordem, dando o máximo de veracidade às figuras, tanto é que suas pinturas de animais servem de fonte de pesquisa para zoólogos. Embora tivessem que obedecer a regras severas que lhes cabia apreendê-las já nas suas primeiras aulas — o estudo somente seria concluído após dominá-las — suas obras apresentavam equilíbrio, estabilidade e harmonia ainda que severa. Possivelmente os melhores mestres deveriam ser aqueles que seguiam com maior rigidez os ensinamentos preestabelecidos. Isto explica o fato de a arte egípcia, durante um período de três mil anos ou mais, não ter mudado quase nada. Embora novos temas fossem exigidos dos artistas, o modo como representavam o homem e a natureza era essencialmente o mesmo.
O rei Amenófis IV, pertencente à 18ª dinastia (Novo Reino), foi o único soberano a mexer no até então imutável estilo egípcio. Por acreditar num único deus supremo — Aton —, exigiu que ele fosse representado com a forma de um disco solar, emitindo seus raios e cada raio contendo uma mão (ver ilustração acima). Também mudou seu nome para Akhnaton em homenagem ao deus. No seu reinado as pinturas encomendadas não traziam a imponente e rígida postura dos faraós anteriores. Existe a hipótese de que a reforma promovida por ele tenha a ver com a sua observação de obras estrangeiras, menos rigorosas e circunspectas do que as egípcias. O soberano Akhnaton foi sucedido por Tutankhamon que restaurou as antigas crenças religiosas e estéticas, fechando o contato com o mundo exterior, ou seja, voltando aos modelos de antes. A arte egípcia retomou seu estilo anterior, durando outros mil anos ou talvez mais, sem nenhum acréscimo à realização artística.
E por falar em simbologia, as cores eram muito importantes para a arte egípcia, sendo repletas de simbolismo. O fato de não vermos hoje as cores originais nas obras que eles nos deixaram, deve-se ao fator tempo que tudo destrói. Vejamos as principais: a preta tinha ligação com a noite e a morte, mas também dizia respeito à fertilidade e à regeneração; a branca simbolizava a pureza e a verdade; a vermelha representava a energia e o poder, assim como era a representação do deus do mal “Seti”; a cor amarela simbolizava a eternidade; a verde representava a regeneração da vida; e a cor azul era a representação do rio Nilo e do céu.
O povo egípcio não usava letras para escrever, mas desenhos. Possuía três formas de escrita: hieróglifos (tida como escrita sagrada), hierática (mais simples, usada pela nobreza e sacerdotes) e demótica (usada popularmente). Na pintura a hierarquia das pessoas era representada com o uso do tamanho. As mais importantes eram sempre mais altas, como o faraó e os deuses. As figuras masculinas recebiam a cor vermelha e as femininas o ocre. A cor era usada uniformemente (sem claros e escuros). A “lei da frontalidade” determinava que o tronco da pessoa fosse mostrado de frente, enquanto a cabeça, pernas e pés deviam ser retratados de perfil. Não havia a representação das três dimensões, havendo a ausência de profundidade.
O estudo da arte egípcia mostra-nos como é necessário o conhecimento da cultura de um povo, a fim de entendermos a linguagem de suas obras de arte. Fica também claro que o saber liberta-nos dos preconceitos e, como consequência, apresenta-nos, com maior abrangência, aspectos da vida de cada povo em sua passagem pela Terra num determinado período da história da humanidade.
Exercícios:
- Por que os artistas egípcios preocupavam-se apenas com a totalidade da obra?
- O que levou o rei Amenófis IV a mexer no imutável estilo egípcio?
- Cite algumas características da pintura egípcia de então.
Ilustração: Akhnaton e Nefertiti com seus Filhos, c. 1345 a. C
Fonte de pesquisa:
A História da Arte/ E. H. Gombrich
Manual Compacto da Arte/ Editora Rideel
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Lu
Quando entrei para o colégio vi no livro de História a figura dos egípcios. Fiquei pasma! Para mim eles pareciam aleijados, os pés diferentes de todas as pessoas do mundo. A posição do corpo deles me impressionou demais. Seriam anormais, eu me perguntava em minha inocência.
Matê
Confesso que aquelas estátuas também me impressionavam muito, assim como a Esfinge de Gizé. Demorei para entender o porquê de eles terem o corpo tão torto… risos.
Abraços,
Lu
Lu
Uma organização social muito equilibrada fez dos egípcios um povo de uma cultura rica e dinâmica que os tornou percursores da arte para outros povos, sendo eles os mestres dos gregos e esses mestres de todos nós. A religião, sempre colocada em primeiro plano, direcionou-os aos trabalhos artísticos em que os temas “vida e morte” foram predominantes. Também a Literatura e as Ciências Médicas tiveram grande destaque no Egito Antigo. O homem e os deuses, o simbolismo das cores vibrantes e representativas, tudo nos leva ao conhecimento e aprendizado da cultura impressionante desse povo espetacular.
Abraços
Marinalva
A civilização egípcia foi realmente fenomenal, tanto é que alguns estudiosos ligados à vida extraterrestre alegam que eles receberam ensinamentos de seres de outros planetas, tamanha é a perícia usada por eles em suas obras, com destaque para as pirâmides. Tudo estava realmente correlacionado com a vida e morte. Conhecer a cultura de outros povos é também conhecer os caminhos percorridos pela espécie humana.
Abraços,
Lu
Lu
Achei interessante a visão deles sobre a simbologia das cores que é praticamente a mesma até os dias de hoje. Seus textos continuam muito interessantes!
Beijos
Moacyr
Quando e encontrava pesquisando, percebi a mesma coisa. E olhe que hoje essa percepção do agir das cores na vida das pessoas traz estudos a respeito. Sensacional a descoberta dos egípcios.
Abraços,
Lu
Lu
A busca da totalidade na obra a meu ver, encarna o respeito ao sagrado e a identidade com a interface da vivência humana em um mundo cheio de formas e cores. Retratar esta realidade da forma mais realística deveria gerar um profundo sentimento de pacificação interior diante da expectativa da continuidade da vida. É interessante refletir como a ciência e a espiritualidade nos colocam, hoje, diante de uma mesma incógnita.
Abraços
Antônio Messias
As leis que regiam a arte egípcia exigiam que tudo fosse retratado em sua totalidade, daí a torção que davam ao corpo retratado, para que nada ficasse de fora, ainda que esse adquirisse uma postura irreal, uma vez que trabalhavam com a frontalidade. Havia, sim, o respeito ao sagrado, fator comum à arte do período Antigo.
Abraços,
Lu
Lu
Como é importante o estudo das artes para ampliar nosso campo de visão em todos os aspectos de nossa vida!
A arte egípcia durou milênios. As dinastias mantiveram seu estilo imutável, com alteração apenas no período do rei Amenofis lV, mas em seguida retornou à tradição anterior e assim continuou até o fim do império. O artista desse período era orientado a direcionar sua arte para homenagear os mortos em virtude da crença em uma vida pós-morte. Mesmo tendo um tema religioso e ao mesmo tempo mórbido como inspiração para os trabalhos artísticos, o artista tinha sensibilidade e percepção, ao transformar as obras de arte em algo espetacular, com harmonia, luminosidade, simetria e beleza. Podemos até falar em paradoxo, porque a representação da morte tem vida, brilho e encantamento. E a utilização das cores tinha um propósito simbólico para expressar algo inerente às crenças dessa civilização magnífica, berço inspiracional para civilizações posteriores, como a greco-romana.
Podemos salientar que as crenças religiosas tiveram um poder monumental como força manipuladora do controle das mentes dos súditos, o que é confirmado em todas as civilizações anteriores. Este tipo de controle continua muito atuante em pleno terceiro milênio, por incrível que pareça. O homem desvenda os códigos da vida através do mundo atômico, desvenda os códigos genéticos, conquista o espaço, possui um desenvolvimento tecnológico avançadíssimo, mas em contrapartida destrói o planeta e faz prevalecer as ideias reacionárias em vários setores da vida: social, econômico, político, cultural e, principalmente, religioso, esse que sempre teve (e tem) uma influência muitas vezes nefasta, quando utiliza o nome de Deus de uma forma criminosa para manipular os ignorantes e atingir seus objetivos sórdidos: poder e dinheiro, ainda que seja via corrupção.
Hernando
Também me pego pensando em como estamos tão próximos do povo do Egito Antigo no que concerne à religião. Para mim, contudo, existe uma diferença fundamental: os faraós eram movidos por uma real ignorância, pois era assim que viam e sentiam o mundo, uma vez que a Ciência ainda engatinhava em quase todos os planos, mas hoje, os que usam a religião como trampolim para o poder e o acúmulo de capital o faz ciente de que a verdade é bem outra. Trocando em miúdos, agem de má fé. O nome de Deus é apenas a moeda de troca, a barganha, a metodologia para enganar os coitados desprovidos de pensamento crítico e, como você bem disse:
“…utilizam o nome de Deus de uma forma criminosa para manipular os ignorantes e atingir seus objetivos sórdidos: poder e dinheiro, ainda que seja via corrupção”.
Abraços,
Lu