Arquivo da categoria: Arte Cristã

Pinturas relativas ao cristianismo, abrangendo os mais diferentes pintores, estilos e épocas.

PRESÉPIOS – 300 ANOS DA CIDADE DE TIRADENTES

Autoria de Luiz Cruz

                   

 Por volta de 1702, a primeira ocupação da região do Rio das Mortes foi o Arraial de Santo Antônio, logo fortalecido pelos recursos advindos das atividades auríferas.  Após a instalação do Arraial de Nossa Senhora do Pilar – o Arraial Novo, Santo Antônio passou a ser chamado de Arraial Velho.  Em 19 de janeiro de 1718, o local foi promovido à categoria de vila com o topônimo São José, vindo a ser mais conhecida como São José do Rio das Mortes e em seguida São José del-Rei.  Em 07 de outubro de 1860, obteve nova promoção, com o nome de “cidade e município de São José del-Rei”. Após a proclamação da República, através do Decreto Nº 3, de 6 de dezembro de 1889, passou a ser chamada de “município e cidade de Tiradentes”. Ao longo do século XVIII, a categoria “vila” equivalia ao título de cidade, portanto, em 2018, a localidade completa 300 anos de emancipação política e administrativa.

Para celebrar a efeméride, o Centro Cultural Yves Alves-CCYA realiza a exposição Presépios – 300 Anos da Cidade de Tiradentes. O CCYA recebeu como doação o presépio do artista Antônio Ferreira Gomes (1895-1978). Esse era um dos presépios mais emblemáticos da cidade. O artista e sua esposa, Dona Anésia, sempre o montavam na sala de visitas da casa, na Rua Direita, 111. Esse ritual se iniciava em novembro, com a plantação de arroz e alpiste em latinhas de goiabada, sardinha e outras. Nos primeiros dias de dezembro, após as primeiras chuvas, o casal e a meninada subiam a Serra de São José, com os balaios, para buscar enfeites: musgos, bromélias, líquens, murta e areia branca. A armação do presépio atraia a atenção de muitos e ao ficar pronto causava deslumbramento a todos. À noite recebia visitas de grupos de Folias de Reis. Era uma grande mobilização e um encantamento!

O Presépio de Antônio Gomes é de cerâmica, algumas peças cozidas e outras em barro cru. Ele copiou as principais do antigo presépio de Antônio Veloso (do século XVIII) e acrescentou outras de sua criação, como o flautista, a paralítica, a camponesa, o pedidor de esmolas e o pescador, colocadas junto às peças tradicionais, no cenário emoldurado por uma serra feita com pó de minério e ao fundo uma paisagem com edificações antigas, pintada sobre tecido.

Antônio Gomes foi um artista de muitas habilidades: santeiro, restaurador, pintor, fogueteiro, pedreiro, sapateiro, agricultor – aquela pessoa que se interessava por tudo e por todos. Como fogueteiro coloria os céus com fogos de artifícios em todas festas e fazia o “Judas” que era arrebentado no Domingo de Aleluia, após a leitura do “Testamento”, que deixava  coisas inusitadas para o povo. Sofrera um acidente em sua foguetaria que teve consequência para o resto da vida, mas mesmo com problemas na coluna vertebral, sempre enfrentou longas jornadas de trabalho e procurava atender a todos que o procuravam por suas habilidades peculiares. Após sua morte e a de Dona Anésia, o Presépio foi vendido para o casal Dalma e Yves, que o emprestou para ser armado em diversos locais. Depois, a família o doou para o CCYA, onde tem sido montado todos os anos. Como se trata do presépio mais tradicional da cidade, por iniciativa do Conselho Municipal de Políticas Culturais e Patrimônio foi restaurado pela Anima Conservação e Restauro e será tombado pela municipalidade como patrimônio cultural.

Outros presépios curiosos existiram em Tiradentes e chamavam a atenção pela singularidade. Um deles era o de Antônio Veloso, na Rua Padre Toledo, 13. Com as peças em terracota, ficava o ano todo montado na sala. O da família Lopes da Cruz, na Rua Padre Toledo, 106, passava o ano inteiro armado na alcova e destacava-se pela quantidade de peças, inclusive de casinhas, sobrados e capelas. Muitas delas eram de papelão e havia peças em  celuloide, bem leves e fininhas. Até o presente diversas famílias tiradentinas mantém a tradição de montar os presépios, inaugurá-los no dia 8 de dezembro e desmontá-los somente depois do dia 20 de janeiro, após as visitas das Folias de São Sebastião.

A exposição Presépios – 300 Anos da Cidade de Tiradentes tem curadoria de Luiz Cruz e Pepe de Córdoba e apresenta o Presépio de Antônio Gomes restaurado e outras obras do século XVIII ao XXI referentes ao tema. Será inaugurada no dia 8 de dezembro e ficará até o dia 22 de dezembro, quando o CCYA terá recesso. Depois retornará de 6 a 14 de janeiro. A exposição celebra os 300 anos da cidade e comemora, também, os 20 anos de atividades do Centro Cultural Yves Alves. Além da exposição, outros presépios são montados na cidade, na Matriz de Santo Antônio, no Santuário da Santíssima Trindade e nas capelas de Nossa Senhora do Rosário, de São João Evangelista, de Nossa Senhora das Mercês e no Museu da Liturgia.

*Professor, sócio-fundador e presidente do Conselho Deliberativo do CCYA

Créditos:
Realização: Centro Cultural Yves Alves

Luiz Cruz e  Pepe de Córdoba
Pesquisa, texto, e fotografia: Luiz Cruz
Fotografias dos pastores do Presépio de Aleijadinho, acervo Museu da Inconfidência: Eugênio Sávio
Montagem: Luiz Cruz, Pepe de Córdoba e Alberto Lopes
Equipe do CCYA: Gláucia Vitor, Regina Carvalho, Eliseu Cruz, Alberto Lopes, Ricardo Ribeiro, Gina Valéria, Haydee Trindade, Nathália V. Souza

Apoio: Centro Cultural SESIMINAS Yves Alves, Conselho Municipal de Políticas Culturais e Patrimônio, Paróquia de Santo Antônio, Arquiconfraria da Santíssima Trindade, Anima Conservação e Restauro, IPHAN, UFMG, ICBO, Renato Diniz, Alexandre Mascarenha, Família Costa, Antiquário Nobre Decadência, Solar da Ponte, Nícia Braga, Luciana Braga Giovannini, Dorothé Lenner, Bolão Divino, Ulisses Passarelli, Sérgio Carvalho, Jango Silva, Lucas Silva, Rita Gomes,  Brasileirinho, João Elias, Felipe Callipo

Robert Campin – TRÍPTICO DA ANUNCIAÇÃO

Autoria de Lu Dias Carvalho

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O Tríptico da Anunciação, também denominado Retábulo de Mérode, obra do pintor flamengo Robert Campin, apresenta três ambientes: um jardim murado, uma sala  e uma oficina. Esta peça não foi projetada para ser exposta numa igreja, mas num lar, em razão de suas pequenas dimensões. As cenas deste tríptico (obra constituída de um painel central e de duas meias-portas laterais capazes de fecharem-se sobre ele, recobrindo-o completamente) acontecem em um ambiente relativamente rico.

O painel central apresenta Maria e o anjo no interior de uma sala, onde se destacam uma mesa, um banco com almofadas azuis, duas pequenas janelas redondas e uma janela de madeira, semiaberta, através da qual se vê o céu com nuvens brancas. As duas figuras estão ricamente vestidas, sendo as dobras de suas vestes um espetáculo à parte. A presença de uma cena da Anunciação em um ambiente burguês foge à tradição da época, assim como a ausência de auréola nas duas figuras divinas. Mas a presença das asas no anjo e a de uma pequenina figura nua, acima da cabeça desse, demonstram a divindade das personagens.

A pequenina figura, entrando por uma das janelas circulares, carregando uma minúscula cruz, e deslizando-se sobre sete raios que incidem sobre Maria, é Jesus Cristo, em miniatura. Sua presença significa que salvará todos os homens através do sofrimento pelo qual passará. Ao contrário de outras pinturas da Anunciação, esta não apresenta o Espírito Santo em forma de pomba.

O artista reproduz os objetos com tamanha precisão que é possível notar os mínimos detalhes, com destaque para o banco, o telhado e as dobras das vestes, na parte central do tríptico. Há também muitos detalhes que aludem à pureza de Maria e sua vida de orações: os lírios brancos dentro de um vaso de cerâmica sobre a mesa, a toalha branca e a bacia; o ambiente sem portas e a janela aberta aludem à vida caseira que a Virgem levava; o fato de ela se sentar no chão diz respeito à sua humildade; ao segurar a Sagrada Escritura com um pano, ao invés de tocá-la com as mãos, a Virgem demonstra seu respeito pelo livro; os quatro pequenos leões nas extremidades do banco, sendo dois de cada lado, aludem ao trono de Salomão e, portanto, à sabedoria; a vela sobre a mesa acaba de ser apagada, como mostra a fumaça, provavelmente por um lampejo de vento, como uma alusão ao sopro divino.

A meia-porta da direita do tríptico apresenta a figura de São José, o artesão, pai putativo de Jesus, trabalhando na sua oficina de madeira. Próximas a ele estão inúmeras ferramentas e cravos, feitas com muita precisão. Ele está concentrado, usando a broca num pedaço de madeira. Do interior da oficina, através da janela entreaberta, é possível enxergar uma vista da cidade com praça e ruas, e com as mulheres vestindo casacos pretos com capuz e saias vermelhas, e os homens usando chapéus altos à moda da época. É inverno.

A meia-porta da esquerda mostra três figuras: um homem e uma mulher em primeiro plano, e um homem barbudo com um chapéu de palha na mão e uma carta na outra, em segundo. A mulher, possivelmente, é a esposa do cliente do tríptico. Ela traz o cabelo e o pescoço cobertos, como convinha às mulheres casadas, à época. Encontra-se ajoelhada atrás do marido e traz nas mãos um rosário feito de contas de coral vermelho. O casal está ajoelhado diante de uma porta entreaberta, como se observassem o encontro entre Maria e o anjo Gabriel.

Ficha técnica
Ano: entre 1422 e1430
Técnica: óleo sobre carvalho
Dimensões: trípitico com 120 x 64 cm
Localização: Coleção Os Claustros

Fonte de pesquisa
Los secretos de las obras de arte/ Editora Taschen

SÃO SEBASTIÃO, O SANTO GUERREIRO

Autoria de Luiz Cruz

              

São Sebastião foi amplamente representado por diversos artistas brasileiros. Uma das obras mais significativas é Recompensa de São Sebastião, de Eliseu Visconti, datada de 1898 e que integra o acervo do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, esse trabalho foi premiado nos Estados Unidos, em 1904. O santo é apresentado em corpo lânguido e alvo, tem os braços cruzados ao peito, com as flechas penetradas em seu corpo sendo corado por um grande anjo alado, trata-se de uma bela composição. Alberto da Veiga Guignard pintou diversos quadros representando-o, muitos deles de forte impacto e grande dramaticidade. Cândido Portinari pintou um painel dedicado ao mártir, mas com uma pintura mais leve e forte presença do tom amarelo. Emeric Marcier retratou o santo de forma a nos revelar sua dor, com força e expressividade, mas acima de tudo com criatividade ao expor o corpo torturado. Glauco Rodrigues elaborou diversas representações, associando-o com a cidade do Rio de Janeiro e seus elementos icônicos; realizou várias alegorias inserindo a sua imagem ao universo da pop art. Muitos outros artistas retrataram-no, seja na sua iconografia tradicional ou recriando de acordo com a linguagem de cada um.

A iconografia de São Sebastião é simples, geralmente veste perizônio, descalço, cabelos longos, com braços e pernas atados a um tronco ou coluna. Traz no corpo as flechas, em madeira ou metal. A Matriz de Santo Antônio de Tiradentes possui duas imagens dessa devoção, uma em tecidos e cola, policromada – está no altar-mor; a outra é uma peça em madeira, em que o santo é apresentado com as características de um índio, especialmente o cabelo liso e estilizado – está exposta no Museu da Liturgia. A Matriz de Nossa Senhora do Pilar de São João del-Rei possui uma belíssima imagem do santo, com expressão de êxtase e olhar fixo para o céu. Veste perizônio movimentado, vermelho com detalhes dourados. Está atado em tronco prateado e tem em seu corpo as setas cravadas. O cabelo é arremessado para trás. Sobre a cabeça tem um resplendor de prata. A plasticidade escultórica e a boa policromia contrastam e tornam essa imagem uma obra-prima. Em Santa Cruz de Minas, o padroeiro São Sebastião é representado por uma imagem em gesso, da primeira metade do século XX, provavelmente introduzida pelo padre José Bernardino de Siqueira. Tem o cabelo curto e encaracolado, olhos de vidro e a boca entreaberta. Veste perizônio vermelho com arremate em ouro. Está atado ao tronco e fincadas em seu corpo estão quatro flechas prateadas. Essa imagem é tombada individualmente pelo Conselho Municipal de Política Cultural e Patrimônio e a Festa de São Sebastião é registrada como Patrimônio Imaterial de Santa Cruz de Minas.

São Sebastião (256 d.C. – 286 d.C.) nasceu na França e viveu em Milão. Chegou a Roma através de caravanas de migração. Listou-se como soldado do exército romano por volta de 283 d.C objetivando apoiar os cristãos enfraquecidos pelas torturas. Conquistou a confiança dos imperadores Diocleciano e Maximiano. Apesar de cristão, foi designado capitão da guarda dos imperadores. Foi complacente com os prisioneiros cristãos e por isso considerado traidor, tendo sido ordenada sua execução por meio de flechas. Seu corpo foi atirado ao rio, mas ainda não estava morto, sendo resgatado por Irene, que cuidou dos ferimentos. Após a recuperação, apresentou-se novamente junto a Diocleciano, que ordenara seu espancamento até a morte. Depois seu corpo foi jogado no esgoto público romano. Luciana resgatou-o, limpou e sepultou nas catacumbas. O nome Sebastião deriva-se do grego sebastós, que significa divino, venerável. Devido a sua execução de maneira violenta, tornou-se tema comum na arte medieval. O culto a São Sebastião teve início no século IV e atingiu o auge na Baixa Idade Média (século XIII ao XV).

Sebastião tornou-se um dos santos mártires romanos mais populares da Igreja Católica e da Igreja Ortodoxa. Amplamente cultuado em Portugal, trazido ao Brasil, conquistou fiéis em todas as regiões, inclusive como padroeiro de muitos lugares, como a cidade do Rio de Janeiro. É uma das devoções mais populares em Minas Gerais e presente em muitas igrejas e capelas. Nas religiões de matriz afro-brasileira, São Sebastião é sincretizado como o orixá Oxossi, sendo o orixá das florestas e das relações entre os reinos animal e vegetal. Oxossi se fortalece na mata, onde o negro e o índio se encontravam ou se refugiavam. Quando existiu um “terreiro” em Tiradentes, era de Oxossi e os trabalhos eram feitos nas matas da Serra de São José, o pessoal passava a noite toda lá. Coincidentemente, São Sebastião é o padroeiro de Santa Cruz de Minas e o maior patrimônio da localidade é a Serra de São José.

O dia 20 de janeiro é dedicado a São Sebastião, época em que as Folias de São Sebastião visitam os devotos, e diversas localidades brasileiras prestam homenagens ao santo guerreiro, tão querido em todo Brasil.

Benozzo Gozzoli – O CORTEJO DOS REIS MAGOS

Autoria de Lu Dias Carvalho

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O pintor italiano Benozzo Gozzoli (1420 -1497) foi contratado pelos Medici em Florença, para decorar a capela Palazzo Medici-Riccardi. Para imortalizar aquela ambiciosa família de banqueiros e mecenas, tomou como tema a lenda da procissão dos Reis Magos. Na Itália renascentista, os desfiles pomposos e festivos gozavam de grande popularidade, proporcionando grande divertimento ao povo. Portanto, a cada seis de janeiro, organizava-se a procissão dos Reis Magos, com as pessoas desfilando pelas ruas.

O artista pintou afrescos em três das paredes da capela, reproduzindo em cada uma delas um dos reis, acompanhados de seus séquitos e encaminhando-se para a pintura do altar Virgem Adorando o Menino (Natividade), obra de Filippo Lippi, pintada em 1459. Mas, com os estragos decorrentes do tempo, houve inúmeras reformas nos afrescos, excetuando um deles, o que representa o Rei Gaspar (visto acima) e onde é retratada a família Medici como parte da comitiva, pois, conforme tradição da época, os doadores de retábulos costumavam aparecer nas obras de arte, ainda que fosse numa posição discreta, distante dos santos reverenciados, mas próximos ao primeiro plano, de modo a serem reconhecidos.

É possível ver Cósimo de Medici, o cavaleiro mais velho à esquerda, montado num cavalo castanho, ladeado por dois brancos, cavalgados por dois de seus filhos, Giovanni e Piero. Ao contrário dos filhos, Cósimo era muito discreto, como mostra seu manto preto. O filho mais jovem de Cósimo, Lorenzo, que chegou ao poder aos 21 anos, e mais tarde foi apelidado de “o Magnífico”, está mais à frente, montado num cavalo branco, cuja armação traz os símbolos da família: penas e bolas douradas. Ele está cercado por alguns escudeiros armados.

Na comitiva encontram-se, entre os comerciantes florentinos, sem barbas, várias figuras barbudas, com roupas exóticas, usando toucas, numa referência a um cortejo no Oriente. Ao fundo da pintura vê-se um palácio no alto da colina. Animais exóticos podem ser vistos por toda a pintura. Chama também a atenção os tecidos raros retratados pelo pintor e a majestosa paisagem. O artista usou as novas realizações aprendidas para mostrar belas cenas, pois a vida desse período era colorida e pitoresca.

A enorme pintura é ricamente decorada e apresenta várias cenas. O pintor retratou-se no cortejo. Sobre o seu gorro, em letras douradas está escrito “Opus Benotti” (Obra de Benezzo).

Ficha técnica
Ano: c. 1460
Técnica: afresco
Dimensões: largura aprox. De 750 cm
Localização: Palazzo Medici-Riccardi, Florença, Itália

Fontes de pesquisa
Los secretos de las obras de arte/ Taschen
A história da arte/ E. H. Gombrich
1000 obras-primas da pintura europeia/ Könemann

HOJE É DIA DE FESTA DE REIS

Autoria de Lu Dias Carvalhotai1

A Festa de Reis celebra a visita dos Reis Magos, conhecidos como Melchior, Baltazar e Gaspar, ao menino Jesus, logo após o seu nascimento, vindo do Oriente até Belém, guiados por uma estrela, segundo reza o cristianismo. Grupos pequenos de ranchos e folias fazem parte da comemoração. De acordo com a região, participam também o boi janeiro, o burrinho, os palhaços, a mulinha, pastorinhas ou zagais (pastores).

Segundo Frei Chico, em seu Dicionário da Religiosidade Popular, a origem da Festa de Reis pode estar correlacionada com o “13º e último solstício do inverno europeu: 6 de janeiro, que terminou recebendo um significado religioso”. A folia dos santos reis é tão antiga, que relatos dela vêm da Idade Média. A folia de reis apresentadas no Brasil tem a sua origem em Portugal. Foram trazidas pelos jesuítas com o intuito de catequizar os índios e, posteriormente, os escravos. São ainda encontradas em vários países europeus. A diversidade étnica, geográfica e cultural de nosso povo contribuiu para que variadas formas de folia surgissem, tradição que é recebida e passada para frente, através dos tempos.

Um grupo de pessoas, movidas pela fé ou pelo divertimento, visita casas e até mesmo fazendas mais próximas, cantando e brincado, simbolizando a visitação dos reis magos ao Deus Menino. À frente do grupo vai a bandeira, ou estandarte, com a figura dos reis magos, que é a peça sagrada que o grupo carrega. A duração das visitas varia de acordo com a tradição do lugar. Pode começar na noite de Natal, antes da missa do galo e prosseguir até o dia 6 de janeiro. Ou se iniciar no dia primeiro de janeiro indo até o dia 6 do mesmo mês. Há regiões em que ela se estende até o dia 2 de fevereiro, simbolizando a volta dos reis magos para o Oriente.

O grupo de folia canta em frente ao presépio, onde se encontra o menino Jesus. Alguns grupos possuem o mestre, embaixador ou tirador (de versos). Ele possui uma grande responsabilidade pelo andamento da folia e deve responder a qualquer pergunta feita pelo público sobre o nascimento de Jesus.

Ao se postar diante de uma casa, o grupo de folia canta o canto da chegada, pede licença para entrar, saúda o menino Jesus no presépio e também os moradores, pede esmola, agradece e se despede. O interessante é que as casas que são visitadas, normalmente se encontram com a porta fechada, para que todo o ritual seja cumprido. Em algumas regiões do país, os moradores da casa beijam a bandeira, e o dono da morada entra nos cômodos com ela, abençoando todos os aposentos.

A esmola recebida tem, normalmente, um fim filantrópico. Em muitas casas, os foliões são generosamente alimentados, podendo continuar, sem fome ou cansaço, a visitação. O estado de Minas Gerais é um dos mais ricos na tradição de Folia de Reis também conhecida como Terno de Reis.

Os cantos que acompanham as visitas são bastante variados. Abaixo, alguns exemplos:

(Chegada)
Aqui estão os santos reis/ que vieram lhe visitar/ vêm pedir a sua esmola/ pra seu dia festejar.

(Pedido)
Se tiver de dar a esmola/ não demore, venha dar/ que as noites estão pequenas/ temos muito que andar.

(Agradecimento)
Deus lhe pague a bela esmola/ Dada de bom coração/ na Terra terá o pague/ e no céu a salvação.

ou

A pessoa que põe um ovo/ na sacola do pidão/ peço a Deus que a proteja/ e nunca lhe falte o pão.

(Se a esmola não sai)
Esta barba de farelo/ não tem nada pra nos dar/ Deus permita que ela vire/ gavião caracará.

Nota:
A imagem do texto representa as associações de moradores dos bairros Patrimônio e Morada da Colina, na região Sul de Uberlândia, e a festa de Folia de Reis. (uipi.com.br)

DIA DOS SANTOS REIS

Autoria de Luiz Cruz

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“Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Art. 216)

No período de 25 de dezembro a seis de janeiro, grupos de Folias de Reis e Pastorinhas saem para visitar as casas, homenageando o Menino Deus dos presépios. Esta é uma tradição de origem latina, que recebemos de Portugal. Até hoje, em nossa contemporaneidade, ela é expressiva em diversas regiões brasileiras. Em Minas Gerais, tanto as Folias de Reis quanto as Pastorinhas percorrem as ruas centenárias de Ouro Preto, Mariana, São João del Rei, Sabará, Itabira e outras cidades mais recentes, como Entre Rios de Minas e Jeceaba, mantendo esse traço de nossa cultura, ou melhor, de nosso patrimônio imaterial, que resiste às modernidades tecnológicas.

Este é considerado o período em que os Reis Magos Baltazar, Gaspar e Belquior saíram para visitar e levar presentes para o Menino Deus, seguindo a Estrela do Oriente. Em alguns países latinos, o dia seis de janeiro é Dia Santo, considerado mais importante que o dia 25 de dezembro, quando se oferece os presentes, exatamente como os Magos fizeram com o Menino Deus. Além das visitas aos presépios das igrejas e particulares, em algumas cidades realizam-se encontros de folias e pastorinhas, momento significativo para os grupos se confraternizarem e prestar homenagem coletiva ao Menino Deus, mantendo a tradição e a fé.

Cada localidade foi se adequando, conforme as condições, incentivo e reconhecimento da comunidade, sendo que, em alguns grupos, os detalhes recebem muita atenção, desde os instrumentos artesanais, as vestes, as máscaras, os ensaios e os meios de transporte, contrastando com outros em que só o esforço em mobilizar os componentes consome muitas energias, comprometendo tudo. Os grupos mais tradicionais têm as seguintes formações:

  • os três Reis Magos;
  • os palhaços, que dançam e animam o grupo;
  • os músicos que tocam os instrumentos: violão, viola, cavaquinho, tambor, triângulo, pandeiro e acordeom;
  • coro – geralmente masculino;
  • folião – o chefe da folia, que organiza e conduz o grupo,
  • bandeireiro – que conduz a bandeira da folia e recebe as oferendas, geralmente em dinheiro. A bandeira é feita em pano de cetim, com a imagem da adoração dos Santos Reis ao Menino Deus na manjedoura. É enfeitada com fitas e flores.

Cada grupo desenvolve seus cantos que são improvisados de acordo com as circunstâncias. Há um canto quando se chega à casa, com a porta fechada; um quando a dona da casa recebe a bandeira e a conduz por seu interior, abençoando a morada e a família. Em seguida, junto ao presépio. Depois, o dono oferece um café aos foliões e logo é feito o agradecimento. Se houve doação, o grupo agradece novamente. É um ritual cheio de significação e emoção!

Em São João del Rei existe uma Folia de Reis feminina, que é raro, a foliã é Dona Lilia, que conduz o grupo há alguns anos, revigorando a tradição. Como os cantos são improvisados, é da maior relevância o registro das cantigas, o que tem sido feito pelo folclorista Ulisses Passareli, em São João del Rei. Trabalho que poderia ser realizado em outras localidades para o registro desta manifestação cultural tão rica e cheia de espontaneidade.

As Pastorinhas têm formações diferentes, há grupos com meninos e meninas e há grupos somente de meninas. Em alguns, temos a participação dos três Reis Magos, pastores e as ciganas, que levam os cantos ao Menino Deus. Alguns grupos cantam e dançam, com coreografia desenvolvida à frente dos presépios. As vestes são bem cuidadas e os personagens levam oferendas para o Menino Deus. Grupos de Pastorinhas estão presentes em várias cidades mineiras e também pelo Brasil afora. A cada localidade, os cantos vão se adaptando, mas mantendo o costume.

Hoje, seis de janeiro, Dia dos Santos Reis, as Folias e as Pastorinhas estarão percorrendo as ruas e visitando os presépios, exatamente como fizeram Baltazar, Melquior e Gaspar. Em Tiradentes, as Pastorinhas não têm saído por falta de iniciativa e apoio. O folião Gilson Costa consegue sair com a Folia de Reis com grande esforço, por falta de reconhecimento e incentivo. No Dia de Reis sua folia visitará o presépio do Largo das Forras, a partir das 20h00. Não deixem de participar e incentivar esse grupo tão importante para nossa cultura.

Aqui, aproveito para homenagear o folião Orlando Curió, falecido recentemente, que participou de tantas folias, levando canto e alegria a muitas famílias e presépios. Acima, ilustrando o texto, o encontro em Mariana foi emocionante, com a participação de grupos de todos os distritos e ainda mais convidados da região, unindo várias gerações. (Fotos 1,2 e 3)