Autoria de Rosali Amaral
Este é mais um provérbio que faz parte da sabedoria popular e que merece uma reflexão. Significa que aquele que não toma uma posição diante de uma atitude concorda com a mesma. A expressão “Quien calla, otorga” foi cunhada pelo 193º papa, Bonifácio VIII, (aquele que conflitou com Dante Alighieri retratado por ele no inferno, em sua “Divina Comédia”), no século 13, entre 1294 e 1303, através de uma de suas decretais ou bulas em que respondia às consultas populares.
Nos textos bíblicos era costume o fato de que bastava o silêncio de um pai para a aceitação e a homologação de um voto feito pela filha sob sua tutela. Se alguém escutasse uma blasfêmia no meio do povo e não denunciasse, tornava-se cúmplice e poderia ser morto. No nosso meio jurídico existem várias situações para a interpretação do silêncio. Algumas são vistas como conivência, consentimento ou tolerância para com alguém ou ato. Por exemplo, quando um réu, que está sendo acusado por algum delito, e mesmo tendo provas contra si, permanece calado, é considerado culpado. Temos também as leis que são validadas por excesso de prazo legal. Outro exemplo é o do pai que se recusa a fazer o teste de DNA. Tal recusa, perante a lei redunda na confissão de que realmente é o pai.
Em certos ambientes de trabalho, funcionários são punidos por omissão e conivência, se souberem de fatos que possam causar prejuízos à empresa e não denunciarem. Muitos, no entanto, preferem se calar por medo de represálias e perseguições e até atentados contra suas vidas. Quando alguém usa um subterfúgio considerado imoral, que é a exploração da boa vontade das pessoas, algumas delas não se manifestam por medo de serem severamente castigadas pelo explorador ou por incapacidade de se manifestarem, é o caso das crianças, dos idosos, dos doentes, ou dos mentalmente incapacitados.
No âmbito psicológico cada ser humano tem um tipo de tolerância para verbalizar ideias, sentimentos e opiniões. E o calar tem várias facetas. Muitas vezes, quem cala é porque concorda, mas pode ser também por falta de argumentos para se contrapor. Outras vezes, quando os fatos são óbvios e transparentes, não há necessidade de respostas nem explicações.
Quando alguém magoa uma pessoa, ao ponto de extrapolar seus limites, ela reprime as emoções e não consegue extravasar os sentimentos e dor, devido ao seu temperamento introspectivo, então surgem a tristeza e a angústia. Neste caso, não seria melhor conversar com o responsável, colocando tudo em pratos limpos? Nem sempre. Às vezes é melhor se calar, pois discutir pode significar trair valores morais e, com isso, sofrer mais ainda do que com a mágoa ou a dor reprimidas. Há também vezes em que não vale a pena gastar energia à toa.
Trabalhar o interior e autoestima, perdoar, liberando-se dos sentimentos ruins pode ser mais vantajoso, principalmente quando certas pessoas já carregam dentro de si um preconceito e uma maldade na sua forma de encarar as pessoas e o mundo, antecipando suas conclusões e julgamentos errôneos e injustos. Aí o diálogo torna-se inviável. E se ele ocorrer será interminável, transformando-se numa briga acirrada em que cada um irá defender seus interesses e opiniões e não haverá vencedor.
Quando a pessoa se cala, qualquer argumento bate no vazio. Sinal de fraqueza, fuga ou medo de encarar o adversário? Não, muitas vezes o silêncio é a melhor resposta, demonstrando o domínio do próprio eu. Quantas vezes já ouvimos o ditado de que “Quando um não quer dois não brigam“? Ou mesmo, “Em boca fechada não entra mosquito“? O silêncio pode servir como remédio que cura as duas partes, possibilitando uma avaliação de pensamentos, acusações e ações e o rumo que isso nos leva.
Nos dias de hoje, diversas vezes somos chamados a abraçar uma causa, uma campanha, seja ela política, social, moral, religiosa ou outra qualquer. Não é certo evitar o erro e se opor a ele, denunciando e combatendo-o ativamente? E quem permanece calado torna-se conivente com tal erro ou injustiça e ajuda o mal a triunfar? Quem cala consente, é conivente, é covarde, é prudente, é passivo, é medroso, ou quem cala não consente, não desmente, não se manifesta, não se envolve, não se compromete ou compromete-se? A decisão é de cada um, de acordo com a maneira como enxerga a vida.
Fontes de Pesquisa:
Revista Aventuras na História – Abril Cultural
Catholic Encyclopedia – New Advent – Erica 1913.
Views: 25