Arquivo da categoria: História da Arte

O mundo da arte é incomum e fascinante. Pode-se viajar através dele em todas as épocas da história da humanidade — desde o alvorecer dos povos pré-históricos até os nossos dias —, pois a arte é incessante.

A VIDA E A MORTE / AS TRÊS IDADES DA… (Aula nº 90 C)

Autoria de Lu Dias Carvalho

                            

                                                    (Clique na imagem para ampliá-la.)

Não estou interessado em mim como objeto de um quadro. Quanto a isso, interesso-me mais pelas outras pessoas, em particular pelas mulheres, e ainda mais por outras aparências. Estou convencido de que, como pessoa, não sou particularmente interessante. Se olharem para mim, não veem nada de especial. Sou um pintor que pinta dia após dia, da manhã à noite. Pinto figuras e paisagens, raramente retratos. (Gustav Klimt)

O artista Gustav Klimt (1862-1918) nasceu em Viena, Áustria, numa humilde e numerosa família de sete irmãos e na qual era o segundo. Seus pais Ernst Klimt e Anna Finster já traziam a arte na bagagem. Ele era um meticuloso ourives e ela desejava ser cantora de operetas, desejo não realizado em razão da difícil situação financeira da família. Além deles, os três filhos homens mostravam grande talento para a arte. Em sua arte Klimt tinha predileção pelos temas eróticos e pelas mulheres nuas em atitudes provocativas, convivendo lado a lado com motivos ornamentais, mas sem jamais vulgarizar sua obra. Morreu aos 55 anos, vitimado por uma pneumonia, quando se encontrava hospitalizado, recuperando-se de um acidente vascular que lhe paralisara o lado direito do corpo. Estudaremos hoje dois trabalhos do artista.

A composição A Vida e a Morte (à esquerda) ganhou a medalha de ouro na Exposição Internacional de Arte de Roma no ano de 1911. Após guardá-la por um tempo, Klimt resolveu retocá-la, fazendo diversas mudanças na obra, inclusive com a adição de mais figuras e rostos. O artista apresenta a Morte, à esquerda, observando um grupo de pessoas das mais variadas idades, à direita, representando a Vida. Enquanto a Morte é representada em cores frias e sombrias, a Vida possui cores quentes e exuberantes.

A Morte é representada por um esqueleto usando uma longa túnica azul, entremeada de cruzes negras em diversos formatos e tamanhos. Ela segura firmemente um cetro vermelho nas mãos que simboliza o seu poder sobre a Vida. Ao mirar o conjunto de humanos, a Morte parece rir do fim que os aguarda mais cedo ou mais tarde. Está ali como um predador feroz, à espera de sua presa, não importando o tempo que tenha de esperar. Ninguém está imune à sua foice.

As figuras humanas formam um conjunto oval. A personagem mais velha encontra-se no meio, com a cabeça baixa, como se estivesse rezando. Seu rosto revela uma certa tristeza, pois a Morte está bem mais próxima para ela. Os demais seres humanos parecem se encontrar dormindo, como se a Morte não existisse para eles. Apenas uma mulher, na parte superior esquerda da coluna, fita a Morte com visível surpresa, como se dela nunca tivesse ouvido falar. É possível perceber que a sinuosidade da túnica da Morte encaixa com a do grupo, numa junção perfeita, como se o artista quisesse dizer que Vida e Morte complementam-se.

Após a perda de seu pai e do seu irmão Ernst, grande companheiro nas artes, Gustav Klimt sentiu-se muito abalado. Afastou-se da atividade pictórica por um tempo, tentando se fortalecer através da reflexão. Ao retornar a sua carreira, o artista trazia uma nova visão sobre a vida, na qual se incluía a morte. Desse modo, o ciclo natural da vida passou a fazer parte de seu trabalho, ainda que indiretamente, como veremos a seguir.  Ao voltar ao trabalho, Klimt trazia um novo estilo. Suas obras estavam imbuídas da estética simbolista: figuras femininas de olhar grave, formas planas e naturalísticas, muitos elementos decorativos e emprego do dourado.

Na composição As Três Idades da Mulher (imagem à esquerda) a temática sobre o ciclo da vida é mostrada diretamente. Para muitos estudiosos de arte, o artista inspirou-se no quadro “As Três Idades da Mulher e a Morte”, obra do pintor renascentista alemão Hans Baldung Grie, obra presente neste site.

As figuras de Klimt estão dispostas verticalmente: uma mulher idosa, uma jovem e uma garotinha, todas nuas, com o objetivo de mostrar a passagem do tempo. A mulher idosa encontra-se de perfil, com os cabelos a tapar-lhe o rosto. Além dos seios caídos, da pele flácida,  das costas encurvadas e da protuberante barriga, chamam a atenção as veias que se espalham pelo braço, mão, perna e pés direitos da anciã. Próxima a ela está a jovem mãe, com seu corpo rijo e pele rósea, com sua filhinha adormecida nos braços. O enlevo que se vê na figura da mulher jovem contrasta com o isolamento em que se encontra a idosa. Como em todos os quadros do artista, a decoração cumpre o seu papel. Mãe e filha parecem unidas sob um mesmo manto.

Klimt não atribui à figura da mãe a sensualidade característica de suas mulheres, embora ela possua os mesmos atributos dessas: cabelos ruivos, lábios carnudos e rosto carmesim. A presença da criança e o seu aconchego à mãe, assim como os olhos fechados da mulher jovem, inibem qualquer tipo de sensualidade.

Ficha técnica (As Três Idades da Mulher)
Ano: 1905
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 180 x 180 cm
Localização: Galleria Nazionale d’Arte Moderna, Roma, Itália

Ficha técnica (A Vida e a Morte)
Ano: 1910-1915
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 178 x 198 cm
Localização: Leopold Museum, Viena, Áustria

Fonte de pesquisa
Gustav Klimt/ Coleção Folha

Views: 62

DE ONDE VIEMOS? O QUE SOMOS? PARA… (Aula nº 90 B)

Autoria de Lu Dias Carvalho

                                                   (Cliquem na imagem para ampliá-la.)

Gauguin deseja fazer desta obra seu último testamento filosófico, a sua suma antes da tentativa de suicídio. ((Perry T. Rathbone)

O ídolo não aparece em minha pintura como explanação literária, mas como estátua; talvez seja menos uma estátua do que o símbolo da vida animal; e também menos animal, desde que fundido com a natureza, segundo meu sonho, diante de minha cabana. Ele governa nossas almas primitivas, é a imaginária consolação do nosso sofrimento, vagos e ignorantes que somos sobre o mistério de nossa origem e destino. (Gauguin)

A composição simbolista de Gauguin intitulada De Onde Viemos? O que Somos? Para Onde Vamos? trata-se de sua maior pintura, possuindo quase 4 metros de base. É muitas vezes tida como sua obra-prima. Ele a realizou quando vivia um momento de grande angústia, tendo inclusive pensado em se matar em razão das dificuldades pelas quais passava, sem dinheiro até para comprar seu material de pintura, sem saúde e pela falta de reconhecimento de seu trabalho. Mas, antes de dar fim a sua vida, queria pintar um “grande quadro”, como relatou ao seu amigo Daniel Monfreid. A obra foi concluída em um mês, tendo o pintor trabalhado sem praticamente parar, durante esse período. Gauguin inspirou-se no Taiti para compor a sua obra. Ele disse sobre ela: “Antes de morrer, coloco aqui toda a minha energia, numa paixão cheia de sofrimento, e numa visão tão clara e sem correções, que a maturidade precoce desaparece e a vida floresce”.

No fundo da composição existe a predominância dos tons verdes. Sobre eles o artista espalhou vários personagens nativos. Alguns deles apresentam-se nus, outros seminus e alguns vestidos de corpo inteiro. A vegetação é pintada com fortes tons azuis e verdes, enquanto as figuras humanas são coloridas com cores claras. As árvores, com suas formas sinuosas e as figuras sólidas, compõem o paraíso tropical tão desejado pelo pintor, num misto de realidade e imaginação.

Um bebê dorme no chão, tendo ao seu lado três jovens que descansam. Seria a representação da vida simples e sem preocupações do paraíso. No centro da composição um jovem de corpo bem proporcionado e ereto retira uma fruta de uma árvore. O amarelo brilhante de seu corpo contrasta-se com os verdes e azuis do fundo da tela. Talvez o pintor tenha feito aqui uma alusão ao Jardim do Éden. As duas mulheres ao fundo, com o corpo todo coberto, representam a sabedoria.

A senhora idosa, com sua pele escura, destoa da vivacidade da mulher jovem ao seu lado. Na sombra ela parece estar olhando para o passado, enquanto  aguarda o fim de seus dias na Terra. A ave ao seu lado pode representar o desconhecido que a aguarda após a morte. No primeiro plano, na parte esquerda da composição, uma garota come uma fruta, enquanto dois gatinhos brincam ao seu lado. Assim como o rapaz colhendo a fruta, esta cena retrata a vida cotidiana.

A divindade presente na parte esquerda do quadro, toda em azul, simboliza o mundo do além. Ela traz os braços para cima e relembra as crenças primitivas, sendo tida por muitos como a deusa polinésia Hina que, além de representar a Mãe Terra, simboliza também a morte e a ressurreição.

O ciclo da vida é visto na pintura da direita para a esquerda, fugindo à habitualidade, pois está de acordo com a convenção oriental de leitura, iniciada da direita para a esquerda. O bebê e a anciã encontram-se nos dois extremos da tela, assim como acontece na linha da vida. Como se pode deduzir através do título da obra que se encontra na margem superior esquerda da tela, escrito em francês, as figuras estão dispostas de forma a representar o ciclo da vida:

  • o bebê dormindo (o início);
  • o jovem colhendo uma fruta (o meio);
  • a senhora idosa perto de uma ave (o fim).

No diagrama de Gauguin o quadro está assim explicado:

  • à direita (De onde Viemos) – as mulheres, as crianças, o cachorro e os símbolos da primavera representam o início da vida (De onde viemos);
  • no centro (Que Somos) – o homem se pergunta sobre o sentido da existência e procura alcançar o fruto da árvore do conhecimento;
  • à esquerda (Para aonde Vamos) – uma velha próxima da morte simboliza o final da vida. O pássaro é um aviso sobre a futilidade das palavras;
  • as duas figuras perto da árvore da sabedoria , envoltas em vestes escuras, simbolizam a tristeza trazida pelo próprio conhecimento;
  • os seres simples entregam-se à alegria de viver , numa natureza virgem que poderia ser um paraíso na acepção humana.

Curiosidade
Passando por um período precário, sem dinheiro, o pintor usou um tecido barato de saco como tela para sua composição. Nela também estão presentes elementos de outros quadros do pintor que a considera como sendo a sua obra-prima, ou seja, uma síntese de suas pinturas e sua visão do mundo. Após a conclusão da tela, Gauguin fez uma tentativa frustrada de suicídio ao tomar arsênico. Vomitou e foi levado para o hospital, onde conseguiu se recuperar, voltando à calma interior. Ele sempre pretendeu mostrar que “a natureza não é um instrumento do homem, mas sua parceira”.

Ficha técnica
Ano: 1897
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 139 x 374,5 cm
Localização: Museum of Fine Arts, Boston, EUA

Fontes de pesquisa
Enciclopédia dos Museus/ Mirador
Gauguin/ Coleção Folha
Gaugin/ Abril Coleções
Gauguin/ ArtBook
Gauguin/ Taschen
Grandes Pinturas/ Publifolha

Views: 13

A DANÇA DA VIDA (Aula nº 90 A)

Autoria de Lu Dias Carvalho

O norueguês Edvard Munch (1863–1944) era o segundo filho do casal Christian Munch e Laura Catherine. Seu pai era um médico tradicional, muito devoto, moralista e castrador. O artista perdeu sua mãe quando ela tinha 30 anos de idade, vitimada pela tuberculose, assumindo a tia Karen Bjolstad, irmã dela, o controle da família. Aos 16 anos de idade Munch matriculou-se para estudar engenharia, mas um mês depois deixou o curso para estudar pintura. Aos 26 anos de idade o pintor fez sua a primeira viagem a Paris, ocasião em que perdeu o pai. Foi influenciado pelo trabalho de Vincent van Gogh e Paul Gauguin.

A composição intitulada A Dança da Vida faz parte de uma série de pinturas e gravuras do artista sobre a condição humana. Munch era capaz de desenvolver sua iconografia sem que para isso houvesse qualquer perda de inteligibilidade.  Trata-se, portanto, de uma obra simbolista em que ele usa ao máximo os recursos expressivos da linha, da cor e do ritmo, ampliando sua relação com o tema.  É uma composição em friso (banda ou tira pintada em parede), levemente simétrica, com a finalidade de levar o observador a fazer uma série de comparações.

O artista toma como temática de sua obra as três idades da mulher, mostrando também estágios diferenciados do amor, numa cena que se desenrola como uma dança numa praia. Não existe uma localização específica, ou seja, um cenário determinado, parecendo encontrar-se fora do tempo e do espaço, assim como não há uma passagem lúcida ou verossímil do primeiro plano para o fundo da composição. Ali se misturam a areia, o prado e o horizonte.

O ritmo da pintura está ligado à disposição das figuras que se mostram em dois terrenos narrativos. Em primeiro plano estão as três figuras femininas, uma delas com seu par de olhos fechados, ambos distantes do mundo em derredor e unidos, através de linhas onduladas, numa única figura. Ao fundo outras figuras são vistas a dançar agitadamente. A composição está centrada a partir do casal em primeiro plano. O sol (ou lua) é formado por um ponto brilhante no horizonte, evidenciando-se no fundo do quadro, refletindo sobre a água, o que leva a uma forte conotação sexual. Dele desce uma coluna de luz pálida e misteriosa que se projeta na água.

O artista pintou a natureza com formas simples, linhas onduladas e cheias de força, deixando à vista o movimento do pincel, enquanto os personagens são retratados com pinceladas verticais, assim como o reflexo da luz do sol (ou da lua) e o pequeno arbusto inclinado que mostra flores simbolizando o amor. Esta obra simbolista de Munch, além de repassar ideias e sentimentos, vai bem além da descrição comum do viver cotidiano.

O artista não se preocupou em colocar imagens específicas a fim de guiar o observador na interpretação da cena. O que caracteriza as figuras é a postura, a expressão e a cor dos vestidos de cada uma:

  • o branco simbolizando a virgindade e o gesto de colher uma flor indicando que está apaixonada, ou seja, a inocência com traços platônicos;
  • o vermelho simbolizando a idade do amor, da sedução e da maturidade;
  • o preto simbolizando a viuvez e a resignação diante da solidão.

A obra mostra uma progressão da esquerda para a direita e da claridade para a escuridão, o que cria uma faixa que se põe além da realidade temporal, representada pelo artista com a arrebatada dança na praia. O sol (ou lua) é visto no céu. Mais tarde Munch reconheceu que a inspiração para este quadro foi um verão em Asgardstrand (paisagem da costa norueguesa), onde dançou com o seu primeiro amor. Esta obra, portanto, reflete sua vida interior, transcendendo o simples terreno pessoal — o que era tão comum aos artistas simbólicos. Esta composição, portanto, pode ser vista como um exemplo da propagação internacional das influências, técnicas e ideias simbolistas. Mais à frente veremos que Munch também teve sua passagem pelo Expressionismo.

Ficha técnica
Ano: 1889/1900
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 1,25m x 1,9m
Localização: Galiria Nacional, Oslo, Noruega

Fonte de pesquisa
Edvard Munch / Coleção Folha
História da arte/ Folio

Views: 40

UM NOVO ESTILO – SIMBOLISMO (Aula nº 90)

Autoria de Lu Dias Carvalho

As últimas décadas do século XIX e o período que antecedeu a Primeira Guerra Mundial primaram pela prosperidade e pela modernidade e foi justamente nesse período que surgiram dois novos movimentos artísticos: o Simbolismo e a Arte Nova (ou Art Nouveau). A França foi o berço do Simbolismo, mas contou com adeptos em grande parte da Europa, sendo Paris e Bruxelas os mais importantes centros do pensamento e da obra simbolista, cujas raízes estavam fincadas no Movimento Estético que achava ser mais importante trazer à imaginação um clima com leves harmonias de cor ao invés de narrar uma história. Os anos 1880 foram o ápice desse movimento.

 O Simbolismo foi, portanto, um movimento artístico surgido na década de 1880 que se contrapôs ao materialismo e às mudanças tecnológicas do século XIX, ou seja, foi uma oposição aos movimentos naturalistas — o Realismo e o Impressionismo — que dominaram o cenário artístico depois da década de 1850. O termo “simbolismo” foi cunhado por Jean Moréas, poeta de arte francês, ao escrever um artigo para o Le Figaro, jornal diário francês, que tinha por título “O Simbolismo”, termo este que acabou sendo estendido a todo estilo imaginativo e intuitivo de pintura que se abstivesse da objetividade e do naturalismo. O manifesto simbolista foi escrito por poeta em 1886.

Os pintores simbolistas criticavam os movimentos naturalistas que se dedicavam apenas ao que viam, renegando a imaginação, o intelecto e as emoções. Achavam necessário criar imagens que trouxessem à lembrança certos climas e sentimentos. Preferiam a visão interior, os sentimentos e as ideias como sendo os pontos de partida da arte, ao invés de explorar o mundo exterior palpável, ou seja, aquele que os sentidos podiam apreender. Queriam que a arte se fizesse presente por meio da linha, da cor e da forma, assim como acontecia com a poesia e a música. Eles não tinham símbolos determinados, mas preferiam imagens que fossem bastante evocativas. Bem mais do que um estilo, o Simbolismo era uma concepção artística, sendo ao mesmo tempo uma tendência literária e artística.

Não se deve confundir o “sonho simbolista” com o sonho analisado por Freud, aquele que se tem ao dormir. Os simbolistas não tinham conhecimento sobre a existência do subconsciente. O sonho a que se referiam dizia respeito a uma ilusão consciente, aprimorada com as experiências sensuais relativas ao sentido estético, capazes de distanciar a mente de preocupações corriqueiras e, assim, propor e trazer experiências inesperadas e casuais, conduzidas pela imaginação humana, providas de estímulos emocionais e sensuais. Em resumo, o artista simbolista não se encontrava inerte, adormecido ou inconsciente, mas atento ao que se passava em sua mente.

Sendo o sonho uma fonte de inspiração dos escritores e pintores simbolistas, é normal que suas obras tenham como características seu componente fantástico indispensável e suas imagens cheias de emocionalidade. Eles buscavam explorar a experimentação sensorial através da imaginação. Para fugir do mundo físico, tentavam tornar seus sentidos tão conscientes e tensos a ponto de torná-los doídos. Em suma, o sonho simbolista buscava se extasiar com a experiência sensual instigada por estímulos artificiais.

As obras simbolistas almejavam encontrar a experimentação da provocação sensual da imaginação. Através dela os seus autores não queriam ser demais claros ou excessivamente difíceis de serem compreendidos. À medida que o movimento se desenvolvia, a representação da realidade concreta ia sendo deixada de lado na busca de um maior aprofundamento no significado da obra de arte. No que diz respeito à poesia simbolista, sua característica principal era a de botar o sentido do poema em um segundo plano, para que os sons das palavras, ou seja, seus aspectos materiais, ganhassem mais destaque. O Simbolismo em Paris deu destaque a um grande número de artistas e literatos como Gustave Moreau e Stéphene Mallarmé.

Os simbolistas, tanto escritores quanto pintores, recobravam temas da mitologia clássica e da Bíblia que estivessem dentro daquilo que buscavam. Algumas vezes expunham o tema sem oferecer referências, ou seja, sem indicar espaço, tempo ou pessoas, mas criando imagens próprias, sem ser preciso se referir ao passado clássico ou bíblico. A imagem de Salomé, por exemplo, personagem bíblica, em razão de sua sensualidade era extremamente popular entre os simbolistas, sendo ao mesmo tempo objeto de horror e fascínio. Eles a viam como a representação da sensualidade feminina, vista sob o ponto de vista masculino, mostrando-se ao mesmo tempo fascinante e mortífera.

O pintor francês Eugène Delacroix em meados do século XIX expôs a ideia de que era possível fazer uso da cor tanto para descrever como para expressar. Os pintores simbolistas pegaram esta ideia de Delacroix e desenvolveram-na. Alguns deles exploraram ideias semelhantes com a linha e a forma. Para eles, quando a superfície pictórica é sutilmente organizada, a cor e a linha chegam ao ápice de sua expressividade. E se uma obra é excessivamente descritiva, ela deixa de ser um apoio eficiente do conjunto, tornando-se mais um elemento de distração. Com base em tal conceito a maioria dos pintores simbolistas eliminavam os detalhes na representação das imagens mais importantes.

O Simbolismo contou com vários grupos, sendo o que se estabelecera durante um pequeno tempo em Pont-Aven (Bretenha) um dos mais importantes. Dele faziam parte Paul Gauguin, Emile Bernard e Paul Sérusier. Esse grupo sentiu-se seduzido pelo folclore camponês e pela religiosidade daquela gente dos rincões rurais. Tratava-se de um campo ideal para que fizessem experiências com imagens de sonhos e recordações, usando formas simplificadas, cores não naturais e padrões rítmicos. Além dos simbolistas já citados, podemos enumerar, entre outros, Edvard Much, Gustav Klimt, Frida Kahlo e Marc Chagall.

Ilustração: A Dança da Vida, 1900, Edvard Munch

Fontes de pesquisa
Tudo sobre arte/ Editora Sextante
Manual compacto de arte/ Editora Rideel
A história da arte/ E. H. Gombrich
História da arte/ Folio
Arte/ Publifolha

Views: 8

NOITE ESTRELADA SOBRE RÓDANO / TERRAÇO… (Aula nº 89 E)

Autoria de Lu Dias Carvalho

   

Estou terrivelmente fascinado pelo problema de pintar cenas ou efeitos noturnos no local, ou melhor, à noite. Com frequência penso que a noite é mais rica e viva em cores do que o dia. (Van Gogh)

Nos últimos anos de sua vida o pintor holandês demonstrou um grande interesse pelos céus noturnos. Dizem que nutria grande interesse pela astronomia, sendo um leitor assíduo de uma revista com tal tema. Segundo algumas fontes, quanto mais ele questionava a relação entre o homem e o Cosmo, mais se interessava por tal ciência. Em uma de suas cartas ao irmão Theo, ele fala com grande entusiasmo sobre as cores e cintilações das estrelas e outros corpos celestes: No azul profundo as estrelas eram cintilantemente esverdeadas, amarelas, brancas, cor-de-rosa, de um brilhante mais vítreo do que em casa – mesmo em Paris: chame-se lhes opalas, esmeraldas, lápis lazuli, rubis, safiras. Certas estrelas são amarelo-limão, outras têm um rubor rosa, ou um verde ou azul ou um brilho que não se esquece. E, sem querer alargar-me neste assunto, torna-se suficientemente claro que colocar pequenos pontos brancos numa superfície azul-preta não basta. (Carta de Van Gogh a Theo em 19 de junho de 1888)

Nesta aula, ao findarmos nosso estudo sobre as obras de Van Gogh, às quais acabei dando um destaque maior, possivelmente pela empatia que nutro pelo artista, faremos o estudo de duas de suas pinturas: Noite Estrelada sobre Ródano (à esquerda) e Terraço do Café à Noite (à direita). Outras obras maravilhosas do artista encontram-se neste site.

A tela Noite Estrelada sobre Ródano foi pintada em Arles, sul da França, para onde Van Gogh mudou-se em busca de luz e cor, nove meses antes de internar-se num sanatório. Apesar da exuberância das cores azul e amarela, vistas na pintura, tudo se mostra calmo e esplendoroso com as luzes naturais, vindas das estrelas, e a luz dourada das casas refletindo-se no rio. As ondulações da água trazem um clima romântico. O impacto visual causado é imediato, estabelecendo uma magia entre a pintura e o observador.

Esta cena noturna baseou-se, segundo os pesquisadores, numa experiência comovente da escuridão sem fim, que Van Gogh descreve numa carta ao irmão: Uma vez fui dar um passeio pela praia deserta, à noite. Não foi alegre, nem triste – foi belo.  O Ródano (francês Rhône) é um importante rio europeu que tem sua nascente na Suíça e acaba seu curso na França, onde desagua no mar Mediterrâneo. É o rio francês mais caudaloso e o mais importante rio europeu a desaguar no Mediterrâneo.

A composição intitulada Terraço do Café à Noite é uma obra de Van Gogh. Retrata a Praça do Fórum em Arles. Trata-se de uma cena noturna pintada no local. O artista tinha fascinação pelas noites provençais, cheias de estrelas, como podemos ver em muitas de suas telas. Sobre esta obra o artista assim se expressou: Aqui está um quadro noturno, sem ter usado tinta preta, somente azuis, violetas e verdes maravilhosos.

O céu de Terraço do Café à Noite encontra-se todo pintado de azul e não de preto, salpicado de estrelas de diversos tamanhos, embora seja noite. As pinceladas deixadas pelo pintor estão bem visíveis, pois a superfície não é alisada, sendo possível acompanhar o rastro do pincel. Várias pessoas estão assentadas em frente ao café. O garçom está vestido com um avental branco em meio aos clientes. Algumas mesas e cadeiras encontram-se vazias na entrada do café. Outras estão espalhadas pela rua à espera dos fregueses.

Alguns transeuntes conversam parados na rua. Um cavalo, que parece puxar uma carruagem, surge no centro da composição em direção ao café. Tanto as pessoas que se encontram na rua, quanto o cavalo recebem o reflexo amarelado da lâmpada a gás dependurada no café. Van Gogh usou a perspectiva na metade inferior do quadro, atraindo o olhar do observador em direção ao café. A composição apresenta duas fontes de luz: a natural – vinda das estrelas – e a artificial – vinda do café. Essas fontes se fundem, trazendo à obra uma luminosidade toda especial.

O café – em especial o toldo – apresenta inúmeros tons de amarelo que contrastam maravilhosamente com os diversos tons de azul. O verde também marca sua presença na tela. O vermelho está presente em pequena quantidade. Como o próprio artista registrou, embora se tratasse da noite, não existe a presença do preto.

Ficha técnica: (Noite Estrelada sobre Ródano)
Data: 1888
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 72,5 x 92 cm
Localização: Museu d`Orsay, Paris, França

Ficha técnica  (Terraço do Café à Noite)
Data: 1888
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 81 x 65,5 cm
Localização: Kröller – Müller Otterlo, Holanda

Curiosidades:
Àqueles que se sentiram emocionados com a história de Vincent van Gogh, sugiro as seguintes obras:

  • Sede de Viver – filme de Vincent Minelli
  • Sonhos – filme de Akira Kurosawa
  • Vincent e Theo – filme de Robert Altman
  • Van Gogh – filme de Maurice Pialat
  • Van Gogh/ Vida e Obra – Editora Taschen

Fontes de Pesquisa:
Van Gogh/ Editora Taschen
Tudo Sobre Arte/Editora Sextante
Van Gogh/Coleção Folha do Estado de São Paulo
Van Gogh/Abril Cultural

Views: 11

QUARTO EM ARLES e A CASA AMARELA (Aula nº 89 D)

Autoria de Lu Dias Carvalho

                                                               (Cliquem nas imagens para ampliá-las.)

 Uma luz amarela de enxofre pálido, limão dourado pálido. Que belo é o amarelo! (Van Gogh)

“A minha casa aqui é pintada por fora de amarelo manteiga e tem persianas em verde forte; fica rodeada de sol, numa praça, onde também há um parque verde com plátanos, aloendros, acácias. Por dentro é pintada de branco e o chão é de azulejos vermelhos. E por cima o céu de azul luminoso. Lá dentro posso, com efeito, viver e respirar e pensar e pintar”. (Van Gogh)

O Quarto em Arles (1888) é uma das pinturas mais conhecidas de Vincent van Gogh. A primeira versão foi feita apenas duas semanas depois de o artista terminar a obra A Casa Amarela, que retrata o local onde ele morou em Arles, e onde pensava instalar a sua tão sonhada comunidade dos artistas. O quarto fazia parte da “casa amarela”, nome com que a nomeou, tamanha era a sua paixão pela cor amarela.

O pintor holandês fez três versões da pintura referente ao seu próprio quarto e, segundo ele, a obra tinha o objetivo de trazer uma sensação de repouso e descanso, conforme escreveu a seu querido irmão Theo:

Desta vez é simplesmente um dormitório; só que a cor deve predominar aqui, transmitindo, com a sua simplificação, um estilo maior às coisas, para sugerir o repouso ou o sono. Em resumo, a presença do quadro deve acalmar a cabeça, ou melhor, a imaginação. As paredes são de um violeta pálido. O chão é de quadros vermelhos. A madeira da cama e das cadeiras é de um amarelo de manteiga fresca; o lençol e os travesseiros, limão verde muito claro. A colcha é vermelha escarlate. O lavatório, alaranjado; a cuba, azul. As portas são lilases. E isso é tudo – nada mais neste quarto com as persianas fechadas. O quadrado dos móveis deve insistir na expressão de repouso inquebrantável. Os retratos na parede, um espelho, uma garrafa e algumas roupas. A moldura – como não há branco no quadro – será branca.

Sobre a mesa vista na pintura encontram-se uma bacia com um jarro em seu interior, uma garrafa, um copo, um prato com sabão e um par de frascos e de escovas. O chão está pintado em variações da cor vermelha e verde e as pinceladas parecem simular faixas de madeira. O quadro que se encontra à cabeceira da cama é a reprodução da paisagem de Árvore Balançando ao Vento. Na outra parede existe um autorretrato do artista.

O dormitório de Van Gogh é de uma simplicidade extrema, possuindo apenas as coisas que lhe são necessárias. Contudo, não passa a sensação da tranquilidade tão desejada por ele. Ao contrário, destacam-se a solidão e a pobreza material em que vivia. O enquadramento e a disposição dos móveis e objetos no quarto deixam claro que ele não se encontrava muito lúcido na ocasião. Também é incomum duas cadeiras no quarto, o que evidencia o seu desejo por companhia.

Quando Van Gogh pintou Quarto em Arles, ele se via impossibilitado de trabalhar ao ar livre, porque era a época do vento mistral (vento violento, frio e seco, que sopra no N. da região sudeste da França) que trazia muitas lufadas de ar frio. Além disto, ele se encontrava com a vista muito fraca. Recentemente esta obra foi restaurada, pois, segundo informações do Van Gogh Museum`s, as cores da pintura esmaeceram-se com o tempo. O mais interessante é que a sua restauração pode ser acompanhada através de um blog hospedado no site do museu em Amsterdam.

Van Gogh morou em Arles durante 15 meses, sendo esse um dos seus períodos mais ricos em produtividade, assim como um dos mais lamentáveis, pois foi ali que ele cortou a própria orelha. Em Arles, nos dias de hoje, é possível ter uma ideia de como era o seu quarto, ao visitar o Le Chambre de Vincent, onde existe uma réplica em tamanho real e bem fiel à época.

A Casa Amarela (1888), uma das pinturas noturnas de Van Gogh, retrata a casa em que ele morou em Arles. Embora as outras casas estejam também pintadas com a cor amarela, a casa em questão é a de janelas verdes. A cor amarela da fachada foi de escolha do próprio artista.

Fichas técnicas
Obra: O Quarto em Arles
Data: 1889
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 57,5 x 74 cm
Localização: Museu d`Orsay, Paris, França

Obra: A Casa Amarela
Data: 1888
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 72 x 91,5 cm
Localização: Rijksmuseum Van Gogh, Amsterdã, Holanda

Fontes de pesquisa:
Mestres da Pintura/ Editora Abril
Grandes Mestres da Pintura/ Coleção Folha
Van Gogh/ Editora Taschen

Views: 9