Autoria de Lu Dias Carvalho
O acentuado interesse dos humanistas italianos pela literatura clássica grega deu-se em razão da interação com os eruditos gregos, quando Constantinopla — capital do Império Bizantino — foi tomada pelos turcos otomanos, fazendo com que muitos letrados gregos bizantinos buscassem asilo nas cidades italianas. Esse foi o primeiro passo para que o filósofo grego Platão se tornasse cada vez mais conhecido. Contudo, os textos levados para a Itália não eram totalmente puros, pois diziam respeito a comentários feitos durante os primeiros séculos da era cristã. Não se tratava da filosofia pura de Platão, mas da interpretação dela, daí o título de “neoplatonismo” (neo = novo), podendo conter muitas distorções.
Os neoplatônicos do século XV defendiam que a arte (arquitetura, literatura e a música) devia chegar o mais próximo possível da perfeição e da harmonia que orientavam o trabalho de criação de Deus. Os filósofos neoplatônicos anunciavam que era de fundamental importância que o mundo material e o espiritual formassem uma só unidade. Eles acreditavam que o homem (erudito ou adepto), ao estudar o movimento das estrelas e ao recitar as súplicas e os hinos, seria capaz de ocupar um lugar mais elevado dentro da hierarquia do Universo e, assim, alcançar a perfeição espiritual. Essa visão do neoplatonismo foi muito importante para o mundo da alquimia e da astrologia e, ainda que indiretamente, abriu caminho para a revolução científica do século XVII.
A história tem nos mostrado que quanto mais inculto for o grupo que professa uma crença — qualquer que seja ela —, maior é a possibilidade de acontecer exageros, inadequações e temeridades. O início do cristianismo não foi diferente. O acolhimento daquilo que era pregado nos sermões era tomado ao pé da letra, tido como uma verdade divina absoluta, sem que as pessoas esboçassem qualquer capacidade crítica, — fato que ainda acontece nos dias de hoje nos mais diferentes credos. Deus há muito deixou de operar de acordo com a sua esperada grandeza, para se tornar um garoto propaganda da pecúnia e do poder dessa ou daquela religião ou seita.
Agindo os fiéis de pleno século 21, exatamente como se comportavam os fiéis da Idade Média, não nos causa surpresa que essa mesma visão religiosa medieval continuasse tão conturbada durante o Renascimento. Só para se ter uma ideia, com o crescimento das cidades, mercadores e financistas — amedrontados com a possibilidade de perderem a salvação eterna — compactuavam com o “divino”, empregando somas fabulosas em obras de arte devocional ou deixavam seus bens para a Igreja. Ainda que seguindo uma via questionável, isso foi importante para a arte, pois a Igreja era extremamente generosa como mecenas.
A peste negra abateu-se sobre a Europa em meados do século XIV, aniquilando um número considerável de vidas, levando muitos a crerem no suposto “fim do mundo”. Na Itália ela foi responsável — dentre outros fatos — pelo atraso da construção da catedral de Florença. O mais paradoxal nesse acontecimento medonho que assolou a humanidade é que ele acabou por impulsionar a arte, uma vez que homens e mulheres ricos vitimados pela peste, depositavam dinheiro nos santuários, esperando encontrar a salvação. Esse dinheiro era empregado nas obras envolvendo a arquitetura, a escultura, a pintura, contribuindo para empregar os artistas, etc. A Igreja era vista como o único guia religioso, responsável pela salvação eterna do indivíduo. E era a ela que as pessoas recorriam em suas prementes necessidades.
Naquela época, a ganância não era menor do que a vista nos dias de hoje, tanto é que o dinheiro emprestado a juros configurava um grande pecado. Contudo, o pecador tinha sua culpa perdoada desde que fizesse doações à Igreja e aos pobres. Dois grandes banqueiros europeus — os Bradi e os Peruzzi — deram muito serviço a Giotto, permitindo que o artista a criasse inúmeros afrescos de vida de santos. A intenção desses endinheirados era a de livrarem-se da culpa da usura e da avareza. Imaginemos nós o quanto os banqueiros de nossos dias — com os lucros exorbitantes que acumulam nestes tempos — teriam que destinar às artes, para se livrarem do pecado do apego extremado ao dinheiro e da falta de generosidade para com os pequenos…
Muitos palácios foram construídos no século XV na Itália para mostrar a grandiosidade das famílias ou das instituições. As atitudes filosóficas relativas ao excesso de riqueza começaram a mudar nos últimos tempos daquela época. Se antes a pobreza era vista como um estado superior — conforme preconizava São Francisco de Assis — tal conceito foi ficando démodé. Não mais se condenava o excesso de riqueza de uns poucos e a miséria da imensa maioria da população, desde que os ricos mostrassem as virtudes da generosidade para com os pobres — sabe-se lá como. Como tudo se ajeita para os ricos neste mundo, não é mesmo?
Exercício
1. O que levou o filósofo grego Platão a tornar-se conhecido na Itália?
2. O que defendiam os neoplatônicos do século XV?
3. Qual era a visão religiosa dos fiéis do Renascimento?
Ilustração: A Escola de Atenas (detalhe), 1509, obra de Rafael Sanzio.
Fontes de pesquisa
A História da Arte / Prof. E. H. Gombrich
Renascimento/ Nicholas Mann
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