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Textos humorísticos, mas reais, sobre o dia a dia do Brasil, enriquecidos com locuções e expressões da língua portuguesa.

XANDECO REFLETE SOBRE SUA NOVA PÁTRIA (IV)

Autoria de Lu Dias Carvalho

Depois de sua visita à Câmara Federal e ao Senado, Xandeco, o marciano, tirou o resto da semana para refletir sobre o que presenciara e também vira na mídia da capital brasileira, embora alguns fatos chegassem a ele à boca pequena. Nenhuma das duas casas visitadas deixara-lhe uma boa impressão, pois, apesar dos entreveros às claras, ele sabia muito bem que o destino da nação é resolvido à chucha calada, quando todos os gatos sãos pardos,  quando o filho chora e mãe não vê. Embora a fina flor dos mandantes tente passar ao povo a impressão de que o país caminha sobre tapete vermelho, usando aquela mesma e velha história de mudanças, o povo, à duras penas, empurrado a ferro e fogo, vive na penúria, continuando à matroca. E, se um ou outro expõe a verdade nua e crua, deixando claro que a vaca foi para o brejo há muito tempo, é logo tratado a pata de cavalo e chamado a abaixar a bola.

Não é possível a Xandeco deixar de fazer algumas considerações sobre parte dos mandachuvas de sua nova pátria, pois arrotam importância, mas tratam o Brasil a sangue-frio, com seus segredinhos guardados a sete chaves, sempre abaixando a guarda para o Tio Sam e a elite dominante do país, adulando o sol que nasce. O marciano considerou a maioria dos não tão “nobres” representantes brasileiros como um bando de medíocres com a rédea solta, fazendo tudo em conformidade com as forças poderosas que os controlam, aproveitando enquanto Brás é tesoureiro, mesmo vendo a desgraça dos pequenos seguir a todo vapor. Também ficou sabendo  que muitos brasileiros, sentindo que a porta da rua é a saída da casa, estão deixando o país a peito descoberto, mesmo sabendo que Mr. Trump pode lhes dar um belo chute no traseiro (pois tem ojeriza a latinos sem eira e nem beira), e os pobrecos que aqui ficam estão a enfiar bufa na linha, enquanto uns poucos conseguem trabalhar a troco de reza, pois emprego é coisa de primeiro mundo. Junto à maioria dos brasileiros, o marciano segue também a trouxe-mouxe.

Xandeco concluiu que, sem nenhuma sabença sobre a real ocupação de seu planeta no Universo, os prepotentes se consideram a cereja do bolo do Cosmo. Em sua pouca cultura, é provável que ainda esteja achando que a Terra é o centro do Universo, conforme apregoava o matemático e astrônomo grego Ptolomeu (90 d.C. e 168 d.C). Pobres coitados! A sua Via Láctea não passa de mais uma das possíveis 400 bilhões de galáxias existentes apenas no Universo observável (na parte que é capaz de ser vista pela tecnologia humana).  Se irrelevante é a Via Láctea, galáxia que agrega o planeta terrestre, menor importância se pode dar à Terra, uma merdinha à toa perdida na imensidão sideral. Por aí é possível imaginar a insignificância dos terráqueos, seres medíocres, chués e chifrins  diante da magnitude do Cosmo, rodando presos a uma bolinha feita de rocha e metal, solta num obscuro e solitário mundaréu do nada.

O marciano matutava, mas não conseguia entender a empáfia desmedida, especialmente dos chamados representantes brasileiros, a maioria em busca de poder e riqueza, mesmo sabendo que são passageiros fugazes de uma navezinha à toa (Terra) à deriva num Universo que se expande aceleradamente, com galáxias a se afastarem velozmente. Lamentou que a evolução darwiniana (baseada na seleção natural) também não grassasse em meio aos políticos (não apenas do Brasil), sem a necessidade da intervenção da justiça humana que tarda e falha. Xandeco, que não era ligado a nenhuma crença religiosa, passou a acreditar na sabedoria popular que reza que Deus os fez e o diabo os ajuntou. É muita desgraça junta. Grande parte estaria muito bem atrás das grades, mas o marciano sabe que até que o inferno congele isso jamais acontecerá, pois essa gente também costura as leis que a protege. É por isso que o desrespeito ao povo, nas bandas de cá, prossegue até o diabo dizer basta, quiçá até o fim dos tempos, fim esse que nenhuma diferença faria a este paiseco atado de pés e mãos, sem coragem para arregaçar as mangas e dar um basta nesta merda toda. Aqui tem jacutinga! E muita!

XANDECO NO SENADO (III)

Autoria de Lu Dias Carvalho

Três dias após visitar a Câmara Federal, Xandeco optou por conhecer a segunda casa mais importante da governança brasileira, o Senado Federal, composta por 81 membros – representantes dos Estados brasileiros e do Distrito Federal –, três membros para cada um, com um mandato de oito anos, o que ele achou um despautério, pois se as figurinhas forem ruins, o povo brasileiro terá que engolir sapo por um tempo longo demais, podendo até mesmo morrer engasgado. Será que esses representantes se assemelham à maioria dos primeiros que conhecera? Se assim forem, o Brasil está a andar na corda bamba, pois os tais são os responsáveis por aprovar as indicações feitas pelo Poder Executivo que anda tão limpo quanto pau de galinheiro, ainda assim não há quem ate guizo ao pescoço do gato mor. Ao contrário, muitos estão a aproveitar o carreto, sem falar naqueles que foram apanhados com a boca na botija e continuam posando de vestais da ética, quando já deveriam estar no olho da rua ou vendo o sol nascer quadrado. Mas no novo país do marciano tudo funciona ao contrário.

Xandeco metamorfoseou-se num brasileiro comum e rumou para o Senado. Lá bateu com a cara na porta, pois os nobres representantes dos Estados e do DF não trabalham nos finais de semana e, quando o fazem, trabalham para as galerias. O marciano indagou na portaria o porquê de andarem à mercê das ondas, pois ainda era quinta-feira. Os informantes, com cara de poucos amigos, talvez pelo seu traje popular, disseram-lhe que os senadores precisam “visitar suas bases”. Sabia que não era verdade – pois é telepata –, mas também compreendeu que os funcionários têm que amarrar o burro onde manda o dono. Logo concluiu que a grande maioria dos representantes brasileiros gosta de amornar os ovos. Não passa pela sua cabeça verde que um país com tantos problemas, estando seu povo a andar aos pontapés da sorte, possa se dar ao luxo de ver seus principais representantes andando à rédea solta, apenas acoando em sombra de corvo, enquanto o povo trabalha como burro de carga.

Na segunda-feira seguinte, Xandeco voltou ao Senado, usando terno e gravata, o que lhe garantiu o título de “doutor”. Não era mais o zé-ninguém, o sujeito afogando em pouca água, mas alguém vestido nos conformes. Os funcionários, que anteriormente pareciam ter acordado com a avó atrás do toco, mostravam-se atenciosos, trazendo suas canjicas de fora. O marciano, abismado, entendeu que a roupagem no Brasil faz toda a diferença – abrindo ou fechando portas. O aspecto exterior é o responsável por alimentar o fogo da discórdia, numa rixa de opulência versus pobreza. Em seu planeta, todos têm a mesma cor verde – variando apenas o matiz –, somente a cor dos olhos indica a região marciana de cada um. Pelo andar da carruagem, Xandeco deduziu que o povo brasileiro irá aguentar o banzeiro por muito tempo. Enquanto não aprender a escolher seus representantes terá que aguentar o diabo e levar muito tombo, a menos que queira atirar-se no mundo, como está a fazer muita gente.

Ao chegar ao plenário, ali se aboletou o marciano, aguardando o que estaria por vir. A delonga foi tão grande que ele imaginou que os nobres representantes não fossem aluir uma palha. Depois de muitos tapinhas nos ombros – deles, é claro! – risos e conversas ao pé do ouvido, teve início a sessão. Não tardou para que Xandeco compreendesse que tudo era como dantes no quartel de abrantes, igualzinho ao que vira na Câmara Federal, onde ninguém respeitava ninguém. Uns arrotavam farofa ali, outros arrotavam peidança acolá, mais outros assistiam de braços cruzados, torcendo para ver o circo pegando fogo, enquanto os problemas do país eram adiados para as calendas gregas. Pareciam querer que a gente brasileira continuasse amassando barro. Eles só sabiam andar às turras – pensava o marciano –, enquanto a gente brasileira andava de crista caída e de cabresto curto, andando de Herodes para Pilatos.

Xandeco sentiu vontade de apanhar a trouxa – se trouxa carregasse –, pois não compreendia como um país tão belo e com um povo tão bom ficasse a andar para trás que nem rabo de cavalo. Pela segunda vez sentiu temor por ter escolhido o Brasil como pátria, pois o diabo andava à solta por todo lado. Seria necessário que as gentes parassem de andar com a orelha murcha e armassem o maior quiproquó ou quizumba para se verem livres de seus maus representantes, caso contrário continuariam a viver na rua da amargura. Ele entrou em contato telepático com seu planeta para dizer que o Brasil andava às avessas, com os maiorais adorando o próprio umbigo, enquanto o povo andava com o rabo entre as pernas.

XANDECO NO CONGRESSO NACIONAL (II)

Autoria de Lu Dias Carvalho

Em seu novo país (Brasil), Xandeco procurou saber como funcionava sua governança. Tomou conhecimento de que o Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, em sistema bicameral, ou seja, constituído por duas Casas: o Senado Federal (81 representantes) e a Câmara dos Deputados (513 membros).  Os representantes do Senado e da Câmara possuem funções comuns, como a elaboração das leis e a fiscalização dos atos do Executivo. Senadores e deputados também cumprem (pelo menos deveriam) atribuições específicas. E foi ao Congresso Nacional que o marciano direcionou a sua primeira visita, certo de que os deputados federais estavam a abafar a banca no que diz respeito ao Brasil, mas não perderia por esperar o abraço de tamanduá que ali recebe sua nova pátria.

Ao chegar à Câmara dos Deputados Federais, Xandeco já se encontrava botando a alma pela boca, pois não tinha sido moleza andar pela vastidão de Brasília. Aboletou-se numa das cadeiras da galeria e ali ficou, ansioso, aguardando os “nobres” deputados botarem a conversa em dia no que tange aos assuntos brasileiros. Contudo, o que viu foi um bate-boca sem fim, cada um querendo botar a bunda na janela, sem que o presidente da casa fosse capaz de chamá-los a botar a cabeça no lugar. Num determinado momento, pensou que a casa fosse ser botada abaixo, pois ninguém parecia querer botar a mão na massa, mas tão somente botar areia no falatório um do outro, na tentativa de botar fogo na fogueira. Havia também os que trabalhavam botando panos quentes, quando a rixa dizia respeito aos seus correligionários.

Aquela gente é capaz de botar bode na chuva sem titubear – concluiu Xandeco. Está sempre a botar fogo pelas ventas e a botar merda no ventilador, mas botar no bolso seus altos salários e outros ganhos inconfessáveis isso lá faz muito bem, pois sabe que a Justiça não a botará no cepo. Quem haverá de botá-la no eixo? Quem botará ordem naquela suruba? A Justiça faz de conta que nada vê, sob a ameaça de ser botada no ventilador, o que torna impossível botar os pingos nos ii/is. Além disso, botar os quartos de banda é muito menos comprometedor.  Sabe dona Justa que o povo brasileiro não tem pulso para botar para quebrar, apenas bota tudo nas mãos de Deus, o que muito agrada aos Podres Poderes, botando verde para colher maduro.

Xandeco compreendeu o porquê de o povo botar a boca no trombone em relação ao mau funcionamento do Congresso Nacional. O melhor mesmo é botar a boca no mundo, uma vez que não é possível botar tudo abaixo, botando o pau para quebrar. O brasileiro já está cansado de ser botado no chinelo e ver a maioria daquela gente botando a mão nas riquezas do país, revalidando seu repasse a estrangeiros, botando suas afiadas unhas de fora em tudo que lhe traga ganhos, em detrimento da nação. Ali não é possível botar a mão no fogo por quase ninguém. E pior, aquela gente bota tudo na conta do povo e espera que, quando vierem as eleições, esse mesmo povo bote uma pedra em cima de seu (deles) vergonhoso passado.

O marciano vai aos poucos compreendendo que é preciso botar as barbas de molho. Não  escolheu um país sério para viver e agora se encontra em palpos de aranha. Sentiu vontade de botar as tripas para fora diante de tanta hipocrisia vista. Agora que sua nave zarpara de volta a Marte, só lhe resta botar a vergonha de lado e reconhecer que fez uma péssima escolha. Nada em seu novo país parece ser botado em pratos limpos. A maioria dos governantes é capaz de dar nó em pingo d’água. Ele não bota fé em seus gestores. Tampouco irá botar o rabo entre as pernas e fingir que nada vê. Isso não faz parte de sua ética. Acha que o povo brasileiro deve botar os cachorros nos vendilhões da pátria. Ele, como novo cidadão deste país, compromete-se a ajudar a botar zebu ou não se chamará Xandeco, o marciano. Que o aguardem!

XANDECO DEIXA MARTE (I)

Autoria de Lu Dias Carvalho

O planeta vermelho, cujo nome originou-se de Marte, denominação do deus mitológico romano da guerra, dá visíveis sinais de destruição. Grandes tempestades de poeira, ventos fortíssimos e baixas temperaturas passaram a assolá-lo. O Monte Olimpo, tido como o maior vulcão do Sistema Solar, e três vezes mais alto do que o Everest, está a botar as unhas de fora. A temperatura cai e, segundo os cientistas de lá, não tardará a ficar entre 10 e 140 graus negativos. Os marcianos sabem que não tardarão a abandonar o navio, se ali não quiserem abotoar o paletó. É necessário começar a abrir as ideias para o futuro. Diante das catastróficas previsões, seus governantes optaram por estudar a Terra, cujo ambiente assemelha-se ao deles. Dez indivíduos foram enviados ao nosso planeta, a fim de abrir caminho para o estudo.

Xandeco, já bem próximo do planeta terrestre, viu um extenso e esverdeado país – Brasil – e escolheu-o para fincar barraca. A vasta floresta Amazônica, situada ao norte, fez com que abrisse olhos grandes diante de tanta exuberância, não sabendo que, assim como seu planeta, ela está por um fio para ser dizimada, não por ventos e baixas temperaturas, mas pela ganância desenfreada que abala as estruturas do país. O povo omisso se ausenta, abaixando a guarda e fazendo ouvidos de mercador diante de sérias advertências. Os governantes do país que ele escolheu estão a abrir a torneira para o desmatamento, a fim de agradar os grandes latifundiários e empresas, principalmente estrangeiras. Os corruptos – cuja grande parte jamais alisou os bancos da ciência – estão a abrir o cadeado, entregando tudo a preço de banana. O povo precisa abrir o olho antes que a vaca vá para o brejo, pois não adianta chorar o leite derramado. Corruptores e corruptíveis estão almoçando, jantando e ceando  a nação brasileira.

A nave de Xandeco aterrissou no coração doentio de seu novo país – Brasília –, onde ele logo assumiu a identidade humana, disposto a não abrir a boca, até se assenhorear de mais informações. Sabe que em terra estranha não se pode abrir a guarda. E olhe que nem imagina em que boca de lobo caiu. É bom que coloque suas barbas de molho e faça ouvidos moucos. Quem terá coragem de abrir os olhos do inocente marciano? Ele haverá de entender com o tempo, que naquelas bandas se acende uma vela a Deus e outra ao Diabo. A maioria daquela gente sempre age de má fé, de olho no próprio umbigo, almoçando na copa. Enquanto os mandantes sempre acertam no milhar, o povo só acerta na trave, aguentando a rebordosa, como se tivesse alugado o passe. Assim segue a carruagem, ao deus-dará, sem alterar nem uma vírgula em relação aos desmandos, à falta de ética e ao descompromisso com a nação.

Xandeco ainda não sabe que o povo brasileiro só faz aguentar as pontas, enquanto “os dominantes” vêm com a ladainha de sempre, dizendo que tudo está melhorando. São exímios fanfarrões, apregoando seus cantos de sereia. E, se contestados, viram cachorro doido. Alguns poucos tentam abrir o jogo, mas o povo continua aguentando pianinho, adormecido à sombra da bananeira, sem se preocupar em ajustar os ponteiros. Então, que aguente o tombo! O marciano não sabe que a democracia brasileira é tão forte que não aguenta um gato pelo rabo, ou – usando uma linguagem chula –, não aguenta um peido, mas os “grandes” estão sempre a ajuntar as camas. Ainda assim, dizem eles – os mandachuvas – que todas as instituições estão funcionando a contento, que estão ajustando as contas e outras baboseiras mais.  Poucos de nós estão a alertar os gansos. Brevemente Xandeco irá torcer para que o povo brasileiro  levante com a avó atrás do toco ou de chinelos trocados e leve os dissipadores da pátria brasileira a amarrar a égua nos quintos dos infernos, onde terão que amassar o pão com o suor do rosto.

O QUE FALTA AO POVO BRASILEIRO?

 Autoria do Prof. Rodolpho Caniato

Temos e somos o BRASIL. Temos e somos a cultura brasileira. Esta cultura inclui muitas diferentes características no sentir, no olhar, no fazer e nas relações. Estas características resultam das muitas variáveis reunidas pelas circunstâncias de nossa história. Somos o que somos por muitas razões. Uma dessas razões é a nossa história que não podemos mudar. Esta história produziu-nos uma CULTURA com muitas qualidades. Algumas dessas nos ajudam, mas há outras que nos retardam e podem até nos conduzir ao caos.

Ao longo de nossa história, nós, brasileiros, habituamo-nos, muitas vezes, à desconsideração pelas normas de ordenamento civilizado e respeito às instituições. Também de nada nos adianta culpar a história por nossos defeitos. O que poderíamos fazer é mudar seu curso futuro. Para isso, no entanto, temos que, em primeiro lugar, reconhecer nossos problemas em relação a culturas cujos benefícios também queremos alcançar. Em segundo lugar teríamos que estar dispostos a fazer um grande esforço para mudar o rumo da história futura. Já não podemos confiar naquele ufanismo tolo que pregava o destino obrigatoriamente glorioso do Brasil. Também não nos valerá a esperança de que seremos salvos sem “fazer força” porque “Deus é brasileiro”.

Hoje sabemos que a riqueza de um país depende muito pouco de seus recursos naturais e muito mais da competência (EDUCAÇÃO) e trabalho de sua gente. A verificação disso pode ser evidenciada tanto por países cheios de riquezas naturais e subdesenvolvidos quanto por países ricos que são pobres de recursos naturais. Entre os grandes problemas que teríamos que reconhecer, aquele que está numa das raízes de nossa cultura e que se constitui, a meu ver, no maior deles: a falta de seriedade nas relações e, que resulta numa complacência ou tolerância com a burla, com as pequenas transgressões e com os pequenos delitos. Dele resultam a impunidade (aceita) e a muito difundida postura de querer “levar vantagem” em tudo. Chegou-se ao ponto de o cidadão honesto e cumpridor de seus deveres sentir-se um “otário”, envergonhado diante de tanta “esperteza”. Isso acaba por minar todas as relações e a comprometer quase todas as iniciativas e projetos que  poderiam resultar em uma sociedade mais produtiva, mais justa e mais segura.

Não nos faltam leis e normas de convívio. Falta-nos o exercício e o hábito de observá-las para o bem de todos. Isso só pode ser conseguido com EDUCAÇÃO. Esta não se resume a boas maneiras somadas a conhecimentos. A EDUCAÇÃO de que precisamos exige seriedade, competência e exercício de cidadania. Essas coisas, sabe-se, não são aprendidas simplesmente ouvindo discursos ou mesmo aulas sobre esses temas, mas exercitando esses valores diariamente, de modo especial na fase em que se formam nossos primeiros hábitos,  desde nossa primeira infância. O desejável seria que isso sempre ocorresse no meio familiar. Hoje sabemos que já não se pode contar com a família para que todos passem por esse tipo de EDUCAÇÃO. Por mais essa razão fica aumentada a responsabilidade e a importância tanto da ESCOLA quanto do PROFESSOR.

Nota: texto extraído do livro “Nossa Escola Quase Inútil”, 2006, inédito

POVO BRASILEIRO, TRÊS PODERES E FORÇAS ARMADAS

Autoria de Lu Dias Carvalho

Assim como a imensa maioria da gente brasileira, eu sou uma democrata nata, e jamais gostaria de ver meu país sob a tutela das Forças Armadas. Não é esta a razão da existência dessas. Mas não posso negar que são elas as guardiãs de nossa pátria, devendo se posicionar sempre que houver perigo à sua soberania. Engana-se quem pensa que o risco à independência da pátria brasileira vem apenas de fora. Na maioria das vezes ele se encontra no âmago de governos impatrióticos, comprometidos apenas com o capital, buscado para si e para o grupo que lhes garante o exercício do “poder”. Por isso, faz-se necessário que as Forças Armadas também coíbam os desmandos na governança de nosso país, comprometendo-se com a sua estabilidade política, financeira e social, importantes para o pleno exercício de nossa democracia.

Nada mais justo que as Forças Armadas posicionem-se com sabedoria e equilíbrio sempre que os dirigentes civis (Três Podres), responsáveis pelos destinos da nação brasileira, jogarem-na no lodaçal da vergonha, alheios à prática dos bons costumes, e praticantes confessos do desregramento, grandes e maléficos vilões da ética no tratamento dado ao bem público. Se tais Forças não agirem em prol do Brasil, não haverá motivo para gastar-se tanto dinheiro público com a existência das mesmas, esperando apenas que ajam diante de uma invasão estrangeira ou quiçá alienígena. Mesmo nos países de primeiro mundo, donos de democracia plena, quando os comandantes de suas Forças Armadas notam que a nação está indo à deriva, eles se posicionam, ainda que nos bastidores. E é isso que esperamos que os nossos façam.

É fato que não podemos nos esquecer das duas décadas em que imperou a ditadura militar. Subtraíram a nossa liberdade através da força bruta, fizeram rolar o sangue de nossa gente em todos os quadrantes do país. Nem mesmo no pior dos pesadelos gostaríamos de passar por tão catastrófica opressão. Contudo, esse passado inglório não justifica a postura daqueles que querem ver as nossas Forças Armadas, instituições nacionais, como fantoches, ainda que essas tenham o dever de responder pelo funcionamento, a contento,  de nossos poderes constitucionais. Tal visão contrária só interessa a uns poucos, mancomunados com as forças dominantes, que desrespeitam a Constituição brasileira, tiram os direitos do povo trabalhador, e também vendem, descaradamente, as riquezas do Brasil a países estrangeiros. A continuar assim, logo não passaremos de um arremedo de nação, subserviente às potências estrangeiras. É bom atinarmos para o fato de que as potências estrangeiras globalizam o que pertence aos países pobres, mas não o que é delas. 

Todos nós: povo, Três Poderes e Forças Armadas somos partes integrantes deste país, portanto, sem exceção, temos o dever cívico de defendê-lo.  O que se espera neste momento tão conturbado de nossa história é a postura patriótica de quem ama esta nação ora aviltada e espoliada, buscando torná-la digna de ser chamada de “nossa pátria brasileira”. Os comandantes militares de hoje, se sábios, não serão os mesmo de ontem, até porque o mundo civilizado não mais dá aval a golpes militares, tampouco nós, brasileiros. Contudo, o passado não os exime do comprometimento com a grandeza do Brasil e, sobretudo, com a defesa de sua soberania. Se os mandantes atuais dos destinos da nação brasileira continuarem a vender seus bens soberanos, ela não tardará a voltar à posição de colônia, como tristemente já o foi, curvando-se a outras nações. E o Poder Judiciário, onde se encaixa no atual contexto de nossa crise política e moral?

Tem sido visível a promiscuidade existente entre os Três Poderes. O conluio entre eles é imoral e leva à execração da nação brasileira aos olhos de seu povo e do mundo. A confiança do povo brasileiro não mais se deposita em nenhum deles. O aviltamento a que se entregou o Poder Judiciário maculou e enxovalhou sua isenção. E se não há democracia com o uso da força bruta por parte das Forças Armadas, também não o há com a prostituição dos Três Poderes. Se as primeiras fizeram derramar sangue da gente brasileira no passado, os segundos também o fazem, agora, principalmente no que tange aos desvalidos, destituídos dos direitos essenciais à vida. Se os militares decidiam sobre quem devia viver e quem devia morrer, os governantes civis atuais também decidem sobre quem deve viver na bonança e quem deve sobreviver em meio à penúria e à indignidade. Viver ou morrer não faz diferença para quem está afundando na miserabilidade.

Ao que me parece, o tempo de exceção de ontem é parecido com o de hoje, bastando apenas olhar o rasgamento da Constituição no que diz respeito aos direitos do trabalhador, que nem mesmo foi consultado. É tudo a serviço do capital. Não estamos no que se chama “Estado Democrático”, mas, sim, de “Estado de Exceção”. O Brasil está retrocedendo, pois se tornou uma nação capenga, ainda que carregue o adesivo de “democracia”. Aqui, ao contrário do que queria Abraão Lincoln para o povo estadunidense, não temos um “governo do povo, pelo povo e para o povo”.  Temos, sim, governantes que governam para si mesmos e suas gangues. E dias melhores não virão sem o árduo trabalho dos patriotas brasileiros. Sonhar apenas não levará a nada. Precisamos nos empenhar na busca por um Estado Democrático de verdade e não de falácia. Deixo o texto abaixo como reflexão:

Art. 1, § 1 da Constituição Federal de 88

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.