Autoria de Lu Dias Carvalho
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Embora saibamos muito pouco sobre os primórdios da arte chinesa, excetuando o fato de que os chineses era exímios na técnica de fundir o bronze, tendo ornado seus templos com vasos de bronze que remetem ao primeiro milênio antes de Cristo, é certo que o choque da religião sobre a arte foi ainda mais forte na China. Está comprovado que nos séculos imediatamente antes e depois de Cristo, esse povo fazia uso de costumes fúnebres que lembravam os do povo egípcio. Em suas câmaras mortuárias diversas cenas mostram o modo de viver dessa gente nesses tempos tão remotos.
Presume-se que alguns dos mestres chineses acreditavam que a arte era um importante meio de relembrar ao povo os exemplos de virtude que existiam em eras passadas, como mostra a primeira ilustração acima, cujo tema diz respeito à acusação injusta do marido a sua esposa. Vê-se aqui que o artista chinês já era capaz de representar o movimento, algo extremamente difícil para aquela época.
O budismo (religião altamente espiritual nascida na Índia, vindo a espalhar-se pelo Tibete e posteriormente pela China) exerceu grande influência na arte chinesa. Os monges e outros seguidores de Buda eram frequentemente representados em realísticas estátuas. Os artistas chineses usavam delineamentos curvos para formar as orelhas, lábios e faces, como mostra a segunda ilustração deste texto. O budismo, além de oferecer novas atividades aos artistas, também foi responsável por dar à pintura uma visão totalmente nova e uma deferência ao trabalho do artista jamais vista em outros lugares. Os chineses, ao contrário de outros povos até agora estudados, viam seus artífices com distinção, sendo a criação artística algo excepcional.
A arte religiosa na China — provavelmente em razão das práticas meditativas — acabou sendo usada muito mais para narrar as lendas do Buda e dos mestres chineses, ou seja, para ajudar na prática da meditação do que para doutrinar, como acontecera com a arte cristã. Como a arte ajudava na prática meditativa, poderia indagar alguém? Os artistas budistas representavam a água, as montanhas, os pinheiros e outras coisas mais da natureza num espírito de profunda humildade e respeito, no intuito de oferecer meios que levassem à meditação. A eles não interessava a arte com a finalidade decorativa ou instrutiva, como faziam outras culturas.
As composições dos artistas chineses eram feitas em rolos de seda que eram guardados com o maior zelo em recipientes especiais e valiosos. Só eram trazidos à vista, ou seja, estendidos para serem apreciados, em momentos de grande serenidade, quando podiam ser contemplados, induzindo à meditação. As maiores pinturas chinesas de paisagens, criadas nos séculos XII e XIII tinham como único objetivo ajudar na meditação, como mostra a terceira ilustração acima. Suas paisagens não eram reais. Os artistas usavam o método de meditação e concentração para criar seus trabalhos, sem se preocupar com a representação da realidade.
Os artistas chineses adquiriam primeiro a habilidade de “como pintar pinheiros, nuvens, rochas, água, etc.”, através do estudo das obras de grandes mestres, mas sem recorrer à própria natureza. Somente após ganhar destreza na representação desses elementos é que passavam a viajar e a observar as maravilhas naturais, objetivando divisar a essência da paisagem. Ao retornarem para seus lares, buscavam a alma daquilo que observaram, unificando as imagens apreendidas (pinheiros, nuvens, rochedos, etc.), tal como um poeta maneja seus versos. Assim, suas criações não retratavam a realidade tal e qual a viram.
Aos mestres chineses importava a habilidade adquirida na lida com o pincel e a tinta, responsáveis por dar vida àquilo que vira, enquanto a inspiração ainda estava presente na memória. Era comum o fato de escreverem alguns versos junto à composição no mesmo rolo de seda como vemos nas gravuras acima. Ainda hoje os chineses buscam nas pinturas do artista os traços de seu arrebatamento ao criar.
Exercício
- Qual era a função da pintura para os antigos chineses?
- O EXÉRCITO CHINÊS DE TERRACOTA
- CHINA – CALENDÁRIO CHINÊS E FENG SHUI
Ilustração: 1. Marido repreendendo a esposa, c. 400 d.C/ 2. Cabeça de um Lohan (c. 1000)/ 3. Seguindo o Caminho na Primavera (c. 1200), Ma Yuan.
Fonte de pesquisa
A História da Arte / Prof. E. H. Gombrich
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Lu
A China é um país muitíssimo antigo e de sabedoria milenar. O budismo, originário da Ásia Central, foi fundado pelo príncipe Sidarta Gautama de um antigo reino, hoje Nepal. Exerceu grande influência na arte chinesa durante seis dinastias. Na China ele é uma das três maiores escolas de filosofia, junto com o confucionismo e o taoismo. Tem influenciado e recebido influência da cultura, política, literatura e filosofia chinesas ao longo dos milênios.
Marinalva
Também vejo o Budismo como uma filosofia de vida. Dentre os seus ensinamentos está o célebre “Caminho do Meio” que é exatamente o caminho do equilíbrio. Pesquise um pouquinho sobre ele. Você tem estado sempre antenada com os assuntos de nossas aulas. Parabéns!
Abraços,
Lu
Lu
Estou adorando o curso da História da Arte. Tenho aprendido muito. Reservo um tempo sem interrupções, somente meu, para ler, reler, vê as fotos, enfim, mergulhar no passado e saborear todo ensinamento e conhecimento que você nos proporciona. Quando chego nas perguntas do final do texto para mim é uma autoavaliação, não gosto de errar.
Minha eterna gratidão por estes momentos que você me proporciona.
Um grande abraço
Patrícia
Você me deixa feliz ao dizer que está gostando de nosso curso de História da Arte. É muito bom contar com a sua presença e o seu carinho neste espaço. Sei que faz tudo com intensidade e com este curso não seria diferente. Apesar de seus inúmeros trabalhos, sempre deixa um tempinho para o nosso blogue, o que me deixa lisonjeada com tanta atenção.
Grande abraço,
Lu
Lu,
Considerei interessante a afirmação de que a arte religiosa na China foi usada muito mais para engrandecer Buda e os mestres chineses e a arte cristã para doutrinar seus fiéis. Você considera que esse fato foi um dos fatores que determinou as características dessas duas religiões e seus processos de expansionismo até agora?
Adevaldo
Em relação à religião cristã, sim, mas no que diz respeito ao budismo acho que arte não foi determinante para a sua expansão, pois seu fim era outro – levar à meditação, embora narrasse as lendas sobre Buda.
Abraços,
Lu
Lu
E interessante observar como a arte revela todo o pensamento exercido por uma cultura num determinado período da história dos povos.
A arte chinesa diferencia abruptamente de todas as culturas vistas ate o presente, porque ela não é utilizada para doutrinar, ornamentar os templos e sim para colaborar com as práticas de meditação do budismo. No cristianismo o maior mestre espiritual é o Cristo e no budismo é o Buda, tornando-se referência de espiritualidade.
O artista chinês, seguindo os preceitos do budismo, conseguiu, através da sua sensibilidade, desenvolver trabalhos artísticos voltados para os elementais da natureza. Utilizava desenhos de rios, montanhas, arvores, céu, enfim, usava a natureza como símbolo de pureza e vida. Inclusive há uma passagem do budismo em que Buda encostou na árvore da sabedoria, chamada de “bo” e teve a clarividência. Todas as outras culturas que vimos anteriormente preocupavam-se em edificar templos grandiosos decorados com obras de arte.
A arte chinesa, inspirada na filosofia budista era totalmente contrária aos conceitos de outros povos, porque seu Deus está na natureza (nos rios, montanhas, florestas, céu) e também dentro de cada um, pois nós fazemos parte da natureza. Os trabalhos artísticos dos chineses nortearam para o campo do autoconhecimento e integração com a natureza. Fizeram trabalhos belíssimos, lembrando que desenvolveram essas técnicas num período antes de Cristo. Fizeram trabalhos em rolo de seda com representação da natureza, expostos em eventos especiais.
Hernando
A visão da China antiga no que concerne à pintura artística era totalmente diferente das vistas nas culturas de então, como bem afirmou você. Tudo estava voltado para a técnica da meditação, um dos pontos centrais do budismo que é muito mais filosófico do que religioso. Seus textos podem ser usados por qualquer religião. O budismo possui uma grande preocupação com a natureza (inclusive com a natureza humana).
Gostaria de reafirmar o que belamente escreveu referindo-se ao budismo:
“… seu Deus está na natureza (nos rios, montanhas, florestas, céu) e também dentro de cada um, pois nós fazemos parte da natureza.”
Abraços,
Lu
Lu
Analisando as manifestações da arte em diferentes épocas e culturas, a gente percebe elos que se interligam direta ou indiretamente, sinalizando que a natureza humana tem pontos geneticamente manifestos através da arte. É perceptível nos tapetes arábicos ao induzir uma profunda abstração – uma sensação presente em muitas pinturas de outras culturas. A soldadesca encontrada na urna funerária chinesa reporta aos acompanhantes dos faraós. Quanto à arte chinesa da época, esta se distancia bastante dessa percepção. Percebemos as linhas suaves e leves da natureza, todavia sem perder a vitalidade – uma forte característica desse povo.
Antônio
Sim, realmente parece haver um elo entre as diferentes culturas, ainda que tênues em alguns casos e fortes em outros. Isso é plausível de acontecer, uma vez que o cérebro humano possui a mesma constituição. A cultura chinesa em seu passado apresenta traços muito comuns aos dos egípcios, como o fato de enterrar os imperadores junto com as pessoas que o “serviriam” em outra vida. As linhas dos trabalhos chineses de então eram realmente muito suaves, etéreas.
Abraços,
Lu