Autoria de Lu Dias Carvalho
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Já vimos anteriormente que o século XIII ficou famoso pela construção das catedrais, o que exigiu a participação de inúmeros artistas nos mais diferentes ramos da arte. Tomamos conhecimento também de que a Europa de meados do século XII era um continente ainda bem pouco povoado, sendo os mosteiros e os castelos dos barões os mais importantes centros de poder e saber. A Igreja, voltada para a construção de catedrais, dava início ao despertar do orgulho cívico nos burgos e cidades. Contudo, cento e cinquenta anos depois, tais cidades transformaram-se em importantes centros comerciais, onde até a nobreza, abrindo mão de seus palácios resguardados no campo, escolhia morar na cidade, ostentando sua riqueza nas cortes poderosas. Os burgueses tornavam-se cada vez mais independentes tanto do poder da Igreja quanto do domínio dos senhores feudais.
Foi no século XIV que o gosto dos detentores do poder e das riquezas passou a mudar, buscando mais o refinado do que o monumental e imponente. Os arquitetos góticos que até então se dedicavam quase que especialmente à construção de igrejas, passaram a trabalhar na decoração e nos rendilhados intrincados. As igrejas perdiam a sua primazia, dando espaço para os edifícios seculares (municipalidades, universidades, palácios, pontes, etc.). Tanto é que na Inglaterra o estilo gótico puro das primeiras catedrais — denominado estilo Primitivo —, após as mudanças dos métodos dos arquitetos passou a ser chamado de estilo Decorado.
O Palácio dos Doges (ver primeira ilustração acima à esquerda), símbolo de Veneza e uma maravilha do gótico veneziano, é um exemplo do desenvolvimento do estilo tardio do estilo gótico. Além de seus maravilhosos ornamentos rendilhados é também uma edificação grandiosa, a exemplo das catedrais. Outro exemplo característico desse estilo é a janela oeste da Catedral anglicana de Exeter, situada no Reino Unido (ver ilustração central). É também conhecida como Igreja da Catedral de São Pedro em Exeter.
As esculturas em pedra do século XIV eram bastante encomendadas para ornamentar as igrejas, contudo, os trabalhos feitos em metais preciosos ou marfim ocasionavam grande destaque aos artistas da época. A pequena estátua de prata dourada, esmalte, pérolas e pedras preciosas da Virgem e o Menino (ver ilustração à direita), criada por um ourives francês, é um exemplo desse tipo de trabalho minucioso, sendo conhecida com a “Virgem de Jeanne d’Evreux”. Obras como essa ornavam a capela de um palácio, destinando-se aos cultos particulares.
O exímio ourives deu leveza à figura da Virgem que, ao apoiar a mão no quadril, a fim de sustentar seu Menino, faz uma pequena curvatura, pendendo a cabeça em direção a ele. O pequeno Jesus toca no rosto da mãe. O corpo da Virgem Maria repassa a sensação de balançar suavemente. Tudo neste relicário apresenta um acabamento belo e impecável, a exemplo do manto que desce do braço direito. Na mão direita ela segura um cetro em forma de uma flor-de-lis, decorado com pedras preciosas e pérolas. Esse símbolo muitas vezes representa a monarquia francesa, mas no contexto religioso associa-se à Santíssima Trindade ou à Virgem. A postura da Virgem, conhecida como a “virgem de ternura”, era uma iconografia bizantina, muito comum aos artistas góticos que a adequava ao estilo gótico.
Outro campo em que podemos apreciar a dedicação dos pintores do século XIV no que diz respeito aos detalhes encantadores e finos é o dos “manuscritos iluminados”, tão admirados quanto o saltério, como o “Saltério da Rainha Mary” (ver link abaixo).
Nota: Manuscritos iluminados são livros escritos à mão que foram decorados (iluminados) com ouro, prata ou cores brilhantes. As iluminuras podem incluir pequenas ilustrações (miniaturas), iniciais, bordas ou outros elementos decorativos. Elas eram usadas para indicar divisões no texto, contar histórias e adicionar beleza e elementos visualmente memoráveis aos textos. Os exemplos remanescentes mais antigos de tais obras datam da antiguidade tardia (do século III ao V). A iluminação de manuscritos atingiu seu auge na Europa medieval quando iluminadores, trabalhando dentro de oficinas chamadas scriptorias, produziram saltérios, Bíblias, textos litúrgicos, vidas ilustradas dos santos e outras obras iluminadas. (Biblioteca Digital Mundial)
Exercício
Para o enriquecimento deste texto/aula os participantes deverão responder a uma pergunta e acessar os dois links abaixo:
1. O que são manuscritos iluminados e onde eram usadas as iluminuras?
2. SALTÉTRIO DA RAINHA MARY
3. ILUMINURA DO EVANGELHO DE LORSCH
Ilustração: 1. Palácio do Doge, (iniciado em 1309, Veneza, Itália)/ 2. Catedral de Exeter c. 1350-1400/ 3. Virgem de Jeanne d’Evreux, c. 1324-39.
Fonte de pesquisa
A História da Arte / Prof. E. H. Gombrich
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Lu
Vimos como ocorreram muitas mudanças na arte, principalmente no final do século XIV. Os artistas de diversas áreas trabalhando com o propósito de atingir um grau mais alto de perfeição, leveza e muita beleza. Florença assimila as mudanças. A delicadeza e o refinamento tomam conta do espírito criativo dos artistas. Os padrões antigos vão ficando para trás. Os trabalhos mais bem elaborados e finos agradam o público. Também o corpo humano passa a ser objeto do artista. Plantas e animais passam a fazer parte de seus trabalhos artísticos. Giotto, por sua ideias renovadoras, é o grande expoente da pintura.
Marinalva
Peço-lhe desculpas, pois somente agora vi seu comentário no zap.
Grandes transformações estão acontecendo na arte nesse período, prenunciando que algo muito belo está por vir. O mundo artístico encontra-se em ebulição. Os artistas querem mais… O público desenvolve o gosto pelo refinado. A perfeição ganha o lugar do monumental. Tudo se encaminha para o Renascimento… Estamos chegando lá!
Abraços,
Lu
Lu
Este texto aclara o quanto a liberdade de expressão e a abertura ao novo são fundamentais para formarem a argamassa da arte. Chama a atenção a torre ao fundo da igreja, diferente da maioria que era construídas simétricas e frontais. Nessa igreja ela, além de bela, parece ser um indicador assimétrico e equilibrado com as mini torres, para se ver a suntuosa fachada. Cada arte um aprendizado de tempo, espaço, história e arte. Muito bom!
Antônio
Se colocarmos numa balança a tecnologia que se tem hoje (inclusive com plantas em 3D) e as dificuldades pelas quais passavam os artistas daquela, sobretudo os arquitetos, deduzimos que tratavam de homens magistrais, donos de uma inteligência e de uma criatividade sem limites.
Abraços,
Lu
Lu
Com a decadência do feudalismo que perdurou por muitos anos na Idade Média, muitas pessoas migraram para as cidades, inicialmente chamadas de burgos. Eram construções residenciais e comerciais circundadas por grandes muralhas para se protegerem de ataques de inimigos. O desenvolvimento desses burgos através da expansão do comércio e do desenvolvimento dos trabalhos dos artesãos possibilitou o aparecimento dos novos burgueses. Nesse período houve construções de inúmeras catedrais com requinte arquitetônico, no estilo gotico, com influências bizantinas e românicas.
O surgimento dessa nova classe social abastada contribuiu para construções de belíssimos castelos e residências requintadas nas cidades, onde havia uma infraestrutura mais arrojada dentro de suas limitações.Tudo isso contribuiu para a expansão das artes tanto na arquitetura como em outras modalidades, afim de decorar os palácios particulares com beleza e requinte.
Hernando
Penso que a tendência às mudanças para as cidades aconteceu nesse instante. Houve muitas revoltas contra os senhores feudais, pois a maioria desses maltratava seus dependentes. A cidade era um caminho que levava à libertação, onde a pessoa passaria a trabalhar para sim mesma e não para sustentar a extrema ganância dos senhores feudais. Com o crescimento do comércio houve o enriquecimento da burguesia que passou a exigir ter voz própria. E é claro que arte retratou esse momento, senda ela um veio da história de cada época.
Abraços,
Lu
Lu
Aqui já começa a destacar o poder das cidades na mudança da vida das pessoas, o que vemos com muita força nos dias de hoje, principalmente nas grandes metrópoles. E essa tendência será cada vez maior no futuro, uma vez que os moradores das grandes cidades estão sempre mais comprometidos com as transformações sociais, das quais fazem parte, enquanto o meio rural e as pequenas cidades sempre foram mais conservadores, pois estão distantes da realidade. Excelente texto!
Moacyr
Você tem toda a razão em sua análise. O crescimento das cidades empoderou as pessoas para que começassem a ver o mundo que as rodeava sob um outro olhar, ainda que com a firme crença de que a Igreja era responsável por guiá-las até a “vida eterna”, iam se tornando críticas tanto dos dirigentes dessa instituição quanto dos mandachuvas advindos das famílias que detinham o poder. Vemos o poder das cidades crescer cada vez mais em toda a história da humanidade.
Abraços,
Lu
Lu
Como é prazeroso seguir as transformações da arte e sua interligação com a história. Obrigado pela oportunidade!
Através desta aula vê-se que a burguesia teve um papel importante na transformação das artes. Com o mercantilismo houve o fortalecimento da burguesia a partir do século XV e já influenciando a eclosão em 1517 do Protestantismo de Lutero que considerava abusivas as indulgências da Igreja Católica com a finalidade de obter dinheiro para construir templos, fazendo a gente concluir que o protestantismo começou na classe rica e detentora de poder. A partir ascensão da burguesia houve a mudança de uma sociedade aristocrática para uma capitalista, sendo responsável por grandes movimentos sociopolíticos ocorridos na Inglaterra – 1640/50 – e França em 1789.
Em relação aos links desta aula, esses fazem a gente pensar que os “saltérios” e os “manuscritos iluminados” eram artes para mostrar o poder e a riqueza, claro, não criticando a capacidade e a criatividade dos artistas. Não sei se você concorda.
Adevaldo
Considero a arte o veio artístico da história. Ela é o reflexo mais poderoso que fica de um determinado tempo. O crescimento econômico das cidades foi favorável ao crescimento da burguesia, que é quem realmente comandava o comércio, enquanto aos nobres cabia apenas parte dos lucros. Você tem toda a razão ao analisar o movimento da Reforma como partindo da classe rica que era aquela que tinha dinheiro para pagar as chamadas indulgências, que nada mais eram do que o dinheiro que seria investido na construção de catedrais e nas obras de arte que as adornariam (pictóricas e estatuárias). Com o andar da carruagem verá que o Protestantismo fará tudo aquilo que condenava (como vemos nos dias de hoje)
Alegra-me muito o fato de estar gostando de nosso curso de História da Arte que na verdade é uma via da história da humanidade. Virão textos bem conclusivos sobre o seu modo de pensar. Quanto aos saltérios e os manuscritos iluminados, concordo, sim, vejo aí três causas: 1. a necessidade da Igreja mostrar a divindade dos livros cristãos; 2. a Igreja também queria mostrar seu poder e glória; 3. os monges copistas (normalmente eram eles os responsáveis) se sentiam muito especiais ao fazer trabalhos para os livros cristãos, pois eram os maiores devotos do cristianismo.
Abraços,
Lu