Autoria de Lu Dias Carvalho
O pintor brasileiro Candido Portinari (1903-1962) demonstrou no ano de 1944 uma grande preocupação com a situação social do trabalhador brasileiro, tanto é que criou a “Série Retirantes”, uma denúncia social com influências expressionistas, composta por Criança Morta, Emigrantes, Retirantes e Enterro na Rede (presentes no site). Essa série mostra o sofrimento dos trabalhadores nordestinos que eram sempre açoitados pela seca.
Na obra Retirantes, ilustrada acima, o conjunto de personagens é formado por quatro adultos e cinco crianças, todos esquálidos. O grupo é composto por imensas figuras que ocupam o primeiro plano da composição. A obra possui o formato piramidal, cujo vértice superior é formado pela trouxa que a mulher carrega na cabeça. A fisionomia dos personagens demonstra tão profundo abatimento que chega a doer no coração de quem as observa.
A figura do velho que leva um cajado e a do bebê escanchado na cintura da mulher à sua frente são descarnadas, lembrando esqueletos ambulantes. O homem idoso é retratado como se fosse um santo penitente, tamanha é tristeza e o desalento que repassa. Na parte direita da composição um garotinho, vestido apenas com uma camisa, traz à vista uma enorme barriga, evocando a presença de vermes. No centro do grupo uma mulher carrega uma trouxa na cabeça, enquanto traz no braço esquerdo um desmilinguido bebê, cujo rostinho repassa uma extrema piedade.
O homem de chapéu traz um saco na ponta de um pau escorado em seu ombro esquerdo. Com a mão direita ele segura um desalentado garotinho, usando também um imenso chapéu. À sua esquerda estão presentes duas outras crianças. Homem e crianças parecem fixar tristemente o observador, como se lhes pedissem socorro. Todas as gerações são mostradas na composição, sendo afetadas pela seca.
A terra escura está salpicada de ossos, enquanto aves negras de rapina espalham-se pelo céu esquisito. Todo o grupo é composto por tipos magérrimos e acinzentados, aparentando sujeira, e descalços. O sol mostra-se tão feio e sujo quanto os retirantes, figuras que nos trazem a impressão de serem palpáveis.
A paisagem, atrás dos retirantes, é seca, triste e desolada, onde não se vê uma folha verde. Mais ao longe montanhas nuas e ressequidas complementam-na. Existem poucas tonalidades fundamentais na tela (brancas, cinzas e pardas) que têm por objetivo colocar em evidência o contexto estrutural, avivado em poucos pontos com tons mais quentes que possuem valor meramente decorativo.
Ficha técnica
Ano: 1944
Dimensões: 190 x 180
Técnica: Óleo sobre tela
Localização: Acervo MASP, Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand
Fontes de pesquisa
Portinari/ Coleção Folha
Enciclopédia dos Museus/ Mirador
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Lu,
Esta tela é impressionantemente bela! Pelo incrível que pareça dizer isto! A necessidade chega a ser bonita retratada pelo grande artista. Reparei, além do que você já colocou, duas coisas: as pessoas sofridas estão agrupadas, unidas pela miséria, para enfrentar o não sei o quê; e o céu, primeiro, aparece escuro, meio que sobre eles, e, no fundo, está claro, como que acenando para tempos melhores. Uma obra magnífica, embora retrate situação muito triste!
Abraço,
Alfredo Domingos.
Alf
Esta tela comove-me muito, sobretudo o rostinho do bebê, virado para o observador. E eu sei o porquê: crianças, idosos e animais, em sofrimento, sempre exerceram sobre mim uma dor imensurável, lancinante. Você nem imagina como me foi difícil escrever sobre este e mais outros três quadros de Portinari que virão a seguir.
Como sempre, você é um observador fantástico, a quem nada passa, sempre guiado pela sensibilidade. É verdade, o grupo compacto está agrupado pelo sofrimento. O grande elo que os une. Tomara que adiante, o céu acene para tempos melhores e que cenas como essa nunca mais venham a existir não só no nosso país, mas em todo o mundo.
Abraços,
Lu