Historiando Chico Buarque – MINHA HISTÓRIA

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Autoria de Lu Dias Carvalho

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Minha história é esse nome que ainda hoje carrego comigo/ Quando vou em bar, viro a mesa, berro, bebo e brigo. (Versão de Chico Buarque)

Não há uma só alma neste lugar que não conheça minha história, mas os turistas que aqui chegam, estranham o meu nome. Quando em meu velho barco, eu os atravesso para a outra ilha, não demoram a perguntar-me o porquê de assim ser chamado. Enquanto os conduzo na lenta travessia, conto um sem conta de vezes a minha chegada ao mundo. É como se eu nascesse a cada vez que a historio. Minha mãe partiu, quando ainda me encontrava nos panos, mas minha avó, desde que eu era um tiquinho de gente, narrava minha sina, como se fora uma encantada lenda e eu um ser divino.

Minha mãe era uma formosa morena jambo de cabelos da cor das asas da graúna e pele cheirando a alecrim. Atraía os olhares de todos por onde passava, mas não ligava, talvez, ciente de sua formosura, esperasse alguém que a quisesse de verdade. Mas um dia chegou bem tarde em casa. Havia conhecido um estrangeiro, enquanto voltava da escola. E todo dia “Ele vinha sem muita conversa, sem muito explicar/ Eu só sei que falava e cheirava e gostava de mar/ Sei que tinha tatuagem no braço e dourado no dente/ E minha mãe se entregou a esse homem perdidamente”, a ponto de esquecer-se de seus livros e sonhos.

Contudo, contou-me minha avó que “Ele assim como veio partiu não se sabe pra onde/ E deixou minha mãe com o olhar cada dia mais longe/ Esperando, parada, pregada no porto/ Com seu único velho vestido cada dia mais curto”, pois eu crescia em seu pequenino ventre, como uma semente na terra abandonada. Parecia até que fora ali deixada como paga pelos prazeres, que ela ao homem ofertara ingênua e seguidamente.

Minha avó dizia que minha pobre mãe foi aos poucos perdendo o juízo e “Quando enfim eu nasci, minha mãe embrulhou-me num manto/ Me vestiu como se eu fosse uma espécie de santo/ Mas por não se lembrar de acalantos, a pobre mulher/ Me ninava cantando cantigas de cabaré”, e eu, na minha santa inocência, dormia a sono solto, como um verdadeiro anjo, embora fosse a lembrança machucada e doída daquela frágil mulher.

Ela andou comigo em seus braços, para cima e para baixo, mas sempre de olho no mar e “Minha mãe não tardou a alertar toda a vizinhança/ A mostrar que ali estava bem mais que uma simples criança/ E não sei bem se foi por ironia ou se por amor/ Resolveu me chamar com o nome de Nosso Senhor”. E assim passei a ser chamado por todos aqueles que me conheciam. Até hoje assim o sou. Apenas meu nome muda quando me encontro com “Os ladrões e as amantes, meus colegas de copo e de cruz”, pois eles “Me conhecem só pelo  meu nome de Menino Jesus”.

Portanto, amigos, “Minha história é esse nome que ainda carrego comigo.”.

Obs.: Clique nos links abaixo para ouvir a música com:

Nota: Esta canção é dos italianos Lucio Dalla e Paola Pallotino. Ao adaptá-la para o português, Chico quis colocar o título de “Menino Jesus”, mas a censura implicou e o artista mudou então para “Minha História”.

 Nota: Mulher com duas Crianças, obra de Paul Gauguin

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