Arquivo da categoria: Música

Estudo sobre os grandes nomes da pintura mundial, incluindo o estudo de algumas de suas obras

TAIGUARA (II) – DITADURA E SONHO DE LIBERDADE

Autoria de Edward Chaddad tai

Geisel iniciou seu governo em 1974, posicionando-se no sentido de permitir, mesmo que de uma forma tênue, a abertura política, amenizando a dureza ditatorial, no que foi fortemente combatido pela linha dura do regime. Lembro ao leitor que o novo ditador, mais tarde, em 1985, inclusive apoiou a candidatura civil de Tancredo Neves. O que animou Taiguara que, em 1975, retornou ao Brasil, oriundo de seu primeiro autoexílio, com muita esperança, e fez uma notável gravação, Imyra, Tayra, Ipy, em parceria com Hermeto Paschoal. Era um espetáculo extraordinário, embalado por uma orquestra sinfônica, com cerca de oitenta músicos, com participação de Jacques Morelenbaum, Zé Eduardo Nazário, Wagner Tiso, Toninho Horta, Nivaldo Ornelas, Novelli. Infelizmente, a censura novamente agiu e todos os seus discos foram recolhidos rapidamente pela Ditadura Militar, abortando outra vez o limiar de seu sonho. Ainda não era momento certo para a volta de Taiguara que, abatido e triste, não conseguiu aqui permanecer e novamente preferiu o exílio.

Em 1979, Figueiredo, apoiado por Geisel, foi eleito indiretamente, pelo colégio eleitoral, como candidato da Arena e, como continuidade do que intencionava o governo anterior, foi logo dizendo na sua posse que “faria deste país uma democracia”. No entanto, acredito eu, as forças extremistas da ditadura não aceitavam a abertura, sem a garantia de que não haveria uma vindicta, uma revanche pela privação da liberdade e pelo sofrimento impostos ao povo, máxime o horror dos atos desumanos praticados pelo regime, nos porões do DOI CODI.

Para cumprir a sua promessa e acalmar a dissidente linha dura, logo no início de seu governo, Figueiredo editou a Lei da Anistia – como ficou chamada – a lei 6.683, de 28 de agosto de 1979 que, a pretexto de anistiar aqueles que haviam cometidos crimes políticos contra o regime ditatorial, com habilidade alcançava também ainda os criminosos do próprio regime militar. Isso não bastou. O caminho foi triste e longo, machucando cada vez mais o espírito democrático que habitava e habita o coração de nosso povo.

Menciona o Coronel Dickson Melges Grael, em seu livro histórico, “Aventura, Corrupção e Terrorismo – À Sombra da Impunidade“, lançados em 1985, pela Editora Vozes, de Petrópolis:

“A partir de 1980, uma série de atentados a bombas foram registrados pela imprensa do país. Na quase totalidade, os alvos eram a oposição ao governo, fossem os da extrema esquerda ou os moderados” (fls. 79).

Certamente, eram os militares que se opunham à abertura política. E o Coronel Dickson enumera, em fls. 79 a 81 em seu corajoso livro, uma série de 40 atentados, nunca esclarecidos, e que durou até 1981, quando ocorreu o maior deles, o atentado do Riocentro. No seu livro, o principal objeto do item, o Terrorismo no país, foi esse atentado, onde a coragem do Coronel Dickson foi extraordinária, revelando muitos fatos importantes, que foram desprezados por inconvenientes à justiça do regime da época.

E tal atentado, que também até hoje não foi pela Justiça esclarecido, foi aquele que, pela sua repercussão no país e internacionalmente, parece-me, fez cessar aquela onda de revolta da linha dura contra a intenção do governo Figueiredo de proceder a abertura democrática. Foi responsável por provocar, com certeza, a maior onda de ojeriza ao regime ditatorial e, paradoxalmente, ao contrário daqueles que, pelo terror, buscavam a manutenção do regime fechado, tenha sido a rua pavimentada para o retorno à Democracia.

Mais adiante, veríamos que, se não houve eleição direta para presidente, pelo menos Figueiredo conseguiu realizar, em 1985, uma eleição indireta com candidatos civis, ainda por colégio eleitoral, agora formado por novos partidos, com a eleição de Tancredo Neves.

Confiante na promessa de Figueiredo, mesmo em meio de uma intensa revolta do segmento mais radical da ditadura brasileira, Taiguara fez um novo retorno, agora do segundo autoexílio, em meados de 1980. E nesse palco de muita agitação, de atentados a  bomba, o artista, sem medo, tornou a cantar no Brasil e a pregar a liberdade, a sua aspiração tão esperada e que, após alguns anos depois de seu retorno, começara a se tornar realidade.

Embora Taiguara não obtivesse o sucesso de outrora, as músicas que tiveram maior sucesso durante sua carreira, tão interrompida e tão massacrada pela censura em nosso país, continuaram a ser tocadas nos meios de comunicação, com o arrefecimento da ditadura, sobretudo as das décadas de 60 e 70, principalmente nas emissoras de rádio.

Tivemos o privilégio de ouvir músicas inesquecíveis como Hoje, Universo do teu Corpo, Piano e Viola, Amanda, Tributo a Jacob do Bandolim, Viagem, Berço de Marcela, Teu Sonho não Acabou, Geração 70, Que as Crianças Cantem Livres, Coisas, O Cavaleiro da Justiça, O Velho e o Novo e tantas outras.

Os sucessos mais importantes de Taiguara restaram na lembrança do País quase que apenas para a geração Baby Boomer, sendo que as novas gerações, denominadas X, Y e Z pouco conhecem aquele que foi um dos maiores compositores e intérpretes da música brasileira. E foram as suas músicas, sem dúvida, um forte apoio aos ideais de liberdade, que o povo brasileiro se apegou e conseguiu tornar realidade, com uma nova constituição em 1988, depois com eleições diretas em 1989.

O duro golpe para a MPB é que as novas gerações pouco conheceram da genialidade, da sensibilidade, do conteúdo maravilhoso das letras e da música de Taiguara, muito afastada que ficou pela mídia, que sempre se posicionou, infelizmente, na maior parte do tempo, contrária aos interesses do povo, máxime apoiando o regime ditatorial, negando espaço, esquecendo esse inesquecível artista, cujo sonho sempre fora a liberdade.

É de se lembrar e evidenciar que a mídia da época, embora altamente censurada, apoiou e muito o regime militar. Somente deu o ar da graça para as mudanças, durante as manifestações para as Diretas-já, quando então já estava praticamente consumado que o regime democrático estava voltando. Era a vontade de líderes militares sinalizando, mais dia, menos dia que a liberdade não tardaria a voltar.

É triste saber que centenas de composições de Taiguara ainda não são de conhecimento público. Restaram esquecidas, talvez porque parte da mídia brasileira, a mais significativa, o que não se pode entender, renita-se, pois, nunca se apaixonou pelo sonho desse artista comprometido com a liberdade. Há muitas músicas de Taiguara que tocam nosso coração e que, infelizmente, jazem como riquezas no fundo de um baú, que a história ainda não quis abrir.

Anos depois, em 1986, Taiguara fez na Band, esse que foi, naquele momento histórico de grande valor democrático, um especial extraordinário, memorável, onde o cantor, músico, compositor e artista, falou sobre sua vida, a ditadura que o cerceara, censurara suas obras e o fizera sofrer anos de autoexílio, não deixando de mencionar seu sonho maravilhoso, a liberdade que se iniciava com a chegada da democracia. Era esse o seu sonho e também o sonhar de toda a nação brasileira.

Taiguara veio a falecer em 1996, em virtude de um fatal câncer na bexiga, mas seu sonho permanece  até hoje.

Esta é uma das mais belas músicas do cantor e compositor:

http://www.youtube.com/watch?v=3DrzzU2iEfk

Fonte de pesquisa:

Wikipédia

Views: 20

O SAMBA-CANÇÃO

Autoria de Lu Dias Carvalho

dalva2

O samba-canção é um gênero musical que surgiu nos anos 30, antecedendo a bossa-nova que surgiu nos anos 50. É originário do samba, baseado no Romantismo, e é também chamado de Samba Romântico. É um tipo mais lento, melancólico e romântico, orquestral e introspectivo do gênero. Apresenta marcação forte do samba pelo pandeiro e por boleros e baladas brasileiras, por meio de outros instrumentos rítmicos, inclusive o tambor. Pesquisas mostram que o samba-canção foi influenciado pelas baladas americanas e pelo bolero mexicano, caracterizando-se como o samba lento e melodioso do Brasil.

O samba-canção é comparado ao bolero pela exploração e exaltação que faz do amor-romântico, ou pelo sofrimento de um amor não realizado. Também foi chamado de “dor-de-cotovelo” ou “fossa”.  Interpretado por cantores com voz grave e performance teatral, como Dolores Duran, Dalva de Oliveira, Cauby Peixoto, Noel Rosa, Lindomar Castilho, Nelson Gonçalves, Ângela Maria, entre outros.

O gênero varia do puramente lírico, com um vocabulário bastante culto e muito elaborado nas letras, ao trágico. Portanto, pode-se dividir o samba-canção em duas gerações de sucesso:

  1. Sua geração mais primitiva apresentava-se como uma mistura entre bolero lento e samba. Nessa época, o gênero era muito cantado e falado, dando mais ênfase ao sofrimento.

Apesar de o samba-canção ser um estilo definido, ele foi sofrendo outras influências ao longo do tempo. Uma de suas maiores contribuições foi a influência que exerceu na origem da bossa-nova. Tanto na forma quanto no estilo, as duas músicas são similares.

  1. A segunda geração do samba-canção é marcada pelas músicas românticas modernas, influenciada pela musicalidade de teclado eletrônico, que personaliza os sons de balada, samba bem calmo e, às vezes, bolero lento, geração também influenciada pela música sertaneja.

Depois de 1990, o samba-canção sai do sucesso e passa a sofrer com as novas tendências que vão surgindo. O romantismo na música brasileira começou a cair de moda e a dar lugar a outros gêneros de samba mais agitados e descontraídos como o pagode.

Apesar de sua qualidade musical ser superior a de outros estilos, o samba-canção perde para o pagode romântico, que se utiliza um pouco do gênero para dar o tom amoroso, e ao mesmo tempo mantém seu tom festivo e apelativo, mas sem muito compromisso com a elaboração das letras.

Mesmo que o tema amor-romance ainda exista na música nacional, o estilo suave muito elaborado e melodioso, como é o do samba-canção, não tem mais espaço na musicalidade brasileira, o que pode levar à extinção do gênero.

Nota: Dalva de Oliveira

Views: 4

DALVA DE OLIVEIRA – A VOZ DE OURO

Autoria de Lu Dias Carvalho

dalva1

Embora seus pais, Alice do Espírito Santo e Mário Antônio de Oliveira, esperassem a chegada de um menino, foi a menina Vicentina de Paula Oliveira quem chegou à cidade de Rio Claro/SP, em 5 de maio de 1917. Após a chegada de Vicentina de Paula, vieram mais três filhos para o casal: as três meninas: Nair, Margarida e Lila, e um menino que morreu ainda criança.

Filha de um pai músico, nas horas vagas, a garota Vicentina sempre o acompanhava nas serenatas. A família levava uma vida muito simples, até que, aos oito anos de idade, a futura cantora perdeu o pai. Sua mãe ficou com quatro filhos para serem criados. Dona Alice, com responsabilidade dobrada, optou por se mudar para S. Paulo para criar os filhos. Lá, foi trabalhar como governanta e colocou suas três filhas em um internato de irmãs de caridade, onde Vicentina teve aulas de piano, órgão e canto. A futura artista ficou três anos no internato, tendo que abandonar o lugar, em razão de uma infecção nos olhos.

A saída de Vicentina do internato levou a mãe a perder o emprego, pois, os patrões não aceitaram que ela levasse a filha para o trabalho. Mas, para a felicidade das duas, dona Alice arranjou emprego de copeira em um hotel, onde a filha podia ajudá-la. Primeiro, como arrumadeira, depois como babá e ajudante de cozinha em restaurantes. A seguir, conseguiu um emprego como faxineira em uma escola de dança, onde havia um piano. A música parecia perseguir a menina Vicentina.

Dalva iniciou sua carreira em São Paulo. Depois, que terminava o serviço de faxina do salão de danças em que trabalhava, costumava cantar algumas músicas, tentando tirar melodias ao piano. Certo dia, foi ouvida pelo maestro pianista que a convidou para cantar numa trupe  que correu várias cidades de São Paulo, até chegar a Belo Horizonte (MG). Sua participação acontecia nos intervalos dos espetáculos, quando era anunciada como “A menina prodígio da voz de ouro”.

Em Belo Horizonte, aconselharam-na a fazer um teste na Rádio Mineira, no qual foi aprovada. Com a dissolução do Circo Damasco, ela e a mãe voltaram a São Paulo. O maestro aconselhou sua mãe a ir para o Rio de Janeiro, onde a menina teria mais chances. Lá, empregou-se como costureira numa fábrica de chinelos, onde um dos proprietários, Milton Guita, (conhecido como Milonguita) era diretor da Rádio Ipanema (atual Mauá). Nessa mesma época, Vicentina foi trabalhar no teatro com Jayme Costa, fazendo pontas em operetas no Teatro Glória, trabalhando ao lado de grandes artistas como Jararaca e Ratinho, Alvarenga e Ranchinho, Ema D`Ávila, entre outros.

No mesmo período Vicentina trabalhou na Cancela, em São Cristóvão, num teatro regional, onde apresentava números imitando a atriz Dorothy Lamour, período em que conheceu Herivelto Martins, que tinha como parceiro Nilo Chagas, formando a Dupla Preto e Branco. Dalva (nome artístico sugerido pela mãe) começou a trabalhar com a dupla. Logo depois, Herivelto foi contratado para trabalhar no Teatro Fênix e pediu-lhe que viesse cantar com ele e Nilo, formando então um trio. Foi quando começaram a namorar. No início, o trio chamava-se Dalva de Oliveira e a Dupla Preto e Branco, mudando, depois, para Trio de Ouro.

Herivelto e Dalva foram contratados pela Rádio Mayrink Veiga e gravaram o primeiro disco em 1937, onde se encontravam as músicas Itaguaí e Ceci e Peri. Na época em que gravaram o disco, Dalva esperava seu primeiro filho. O público torcia para que, se viesse um menino, ele fosse chamado de Pery e, se viesse uma menina, ela fosse chamada de Ceci. Dalva acabou atendendo a seu público.

Na época do Trio de Ouro, os sambas Praça Onze (Herivelto Martins e Grande Otelo) e Ave-Maria no Morro (Herivelto Martins) foram os grandes sucessos de Dalva de Oliveira, que também acabou imortalizando outros sucessos como: Tico-tico no Fubá, Aquarela do Brasil, Bem-te-vi, Atrevido e Na Baixa do Sapateiro, dentre outros.

Alguns críticos diziam que Dalva estilizava os sambas e choros, num ritmo bem próximo ao mambo ou a outros ritmos latinos. Mas seu elepê com Roberto Inglês foi visto como difusor da MPB no mundo. Ela também participou de alguns filmes, como Maria da Praia, de Paulo Wanderley; Milagre de Amor e Tudo Azul, ambos de Moacir Fenelon.

Fatos marcantes na última década de vida de Dalva de Oliveira

1934 – Vai com a família morar no Rio de Janeiro.
1937 – Casa-se com Herivelto Martins, com quem teve dois filhos: Pery e Ubiratã.
1963 – Separa-se de Tito Clemente e se casa com Manuel Nuno.
1965 – Sofre grave acidente automobilístico e é obrigada a abandonar a carreira por alguns anos.
1970 – Retoma a carreira, lançando um dos seus grandes sucessos (e também último):
Bandeira Branca, marcha-rancho.
1971 – Apresenta-se no Teatro Tereza Raquel no Rio de Janeiro e em vários programas de televisão e shows.
1972 – Falece vítima de hemorragia no esôfago.

Dalva de Oliveira foi uma das grandes estrelas dos anos 40 e 50. Dona de uma poderosa voz, cuja extensão ia do contralto ao soprano. O maestro Gambardella, apesar de achar que ela possuía potencial para tornar-se uma cantora lírica, aconselhou-a a se manter como cantora popular. Ele sabia que uma moça pobre dificilmente poderia seguir uma carreira que, além de exigir muitos recursos, ainda não tinha muito futuro no Brasil. Por isso, sugeriu que ela utilizasse sua voz para o canto popular.

Fonte de pesquisa: http://www.tvalenha.jex.com.br/nas+ondas+do+radio

(*) Imagem copiada de www.elianebonotto.com

Views: 0

A BANDA E CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Autoria de Lu Dias Carvalho

carlos

O jeito, no momento, é ver a banda passar, cantando coisas de amor. Pois de amor andamos todos precisados, em dose tal que nos alegre, nos reumanize, nos corrija, nos dê paciência e esperança, força, capacidade de entender, perdoar, ir para frente. Amor que seja navio, casa, coisa cintilante, que nos vacine contra o feio, o errado, o triste, o mau, o absurdo e o mais que estamos vivendo ou presenciando.

A ordem, meus manos e desconhecidos meus, é abrir a janela, abrir não, escancará-la, é subir ao terraço como fez o velho que era fraco mas subiu assim mesmo, é correr à rua no rastro da meninada, e ver e ouvir a banda que passa. Viva a música, viva o sopro de amor que a música e banda vêm trazendo, Chico Buarque de Hollanda à frente, e que restaura em nós hipotecados palácios em ruínas, jardins pisoteados, cisternas secas, compensando-nos da confiança perdida nos homens e suas promessas, da perda dos sonhos que o desamor puiu e fixou, e que são agora como o paletó roído de traça, a pele escarificada de onde fugiu a beleza, o pó no ar, na falta de ar.

A felicidade geral com que foi recebida essa banda tão simples, tão brasileira e tão antiga na sua tradição lírica, que um rapaz de pouco mais de vinte anos botou na rua, alvoroçando novos e velhos, dá bem a ideia de como andávamos precisando de amor. Pois a banda não vem entoando marchas militares, dobrados de guerra. Não convida a matar o inimigo, ela não tem inimigos, nem a festejar com uma pirâmide de camélias e discursos as conquistas da violência. Esta banda é de amor, prefere rasgar corações, na receita do sábio maestro Anacleto Medeiros, fazendo penetrar neles o fogo que arde sem se ver, o contentamento descontente, a dor que desatina sem doer, abrindo a ferida que dói e não se sente, como explicou um velho e imortal especialista português nessas matérias cordiais.

Meu partido está tomado. Não da ARENA nem do MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que encontra na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução. Ele não obedece a cálculos da conveniência momentânea, não admite cassações nem acomodações para evitá-las e, principalmente, não é um partido, mas o desejo, a vontade de compreender pelo amor, e de amar pela compreensão.

Se uma banda sozinha faz a cidade toda se enfeitar e provoca até o aparecimento da lua cheia no céu confuso e soturno, crivado de signos ameaçadores, é porque há uma beleza generosa e solidária na banda, há uma indicação clara para todos os que têm responsabilidade de mandar e os que são mandados, os que estão contando dinheiro e os que não o têm para contar e muito menos para gastar, os espertos e os zangados, os vingadores e os ressentidos, os ambiciosos e todos, mas todos os eteceteras que eu poderia alinhar aqui, se dispusesse da página inteira.

Coisas de amor são finezas que se oferecem a qualquer um que saiba cultivá-las, distribuí-las, começando por querer que elas floresçam. E não se limitam ao jardinzinho particular de afetos que cobre a área de nossa vida particular: abrange terreno infinito, nas relações humanas, no país como entidade social carente de amor, no universo-mundo onde a voz do Papa soa como uma trompa longínqua, chamando o velho fraco, a mocinha feia, o homem sério, o faroleiro… todos que viram a banda passar, e por uns minutos se sentiram melhores. E se o que era doce acabou, depois que a banda passou, que venha outra banda, Chico, e que nunca uma banda como essa deixe de musicalizar a alma da gente.

Carlos Drummond de Andrade/ Correio da Manhã, 14/10/66

Views: 5

A BANDA

Autoria de Lu Dias Carvalho

banda

Imaginem vocês que, um dia desses, entro em casa e encontro minha mulher, Lúcia, e a minha filhinha, Daniela, como os olhos marejados. Acabavam de ouvir A Banda, ou seja, a mais doce música da Terra. Dias depois, eu próprio ouvi a marchinha genial.  E a minha vontade foi de sair de casa, me sentar no meio-fio e começar a chorar. Com A Banda começa uma nova época da música popular no Brasil. (Nelson Gonçalves)

E se o que era doce acabou, depois que a banda passou, que venha outra banda, Chico, e que nunca uma banda como essa deixe de musicar a vida da gente. (Carlos Drummond de Andrade)

A Banda, canção com letra e música de Chico Buarque de Hollanda, venceu o Festival da Música Popular Brasileira da TV Record, em 1966, e logo se tornou uma coqueluche nacional, cantada pelos quatro cantos do país. Ainda hoje é um dos clássicos da MPB, tendo sido gravada por bandas de vários países, nas mais diferentes versões.

Na segunda eliminatória do festival, A Banda, de Chico Buarque, defendida por Nara Leão, ficou entre as quatro classificadas. Como Nara tivesse uma voz muito fraquinha, sendo pouco ouvida na primeira eliminatória, em razão da bandinha com tumba e bumbo que a acompanhava, foi sugerido a Chico que cantasse junto com ela, usando a  seguinte forma: ele cantaria a música toda, acompanhado pelo violão e Nara repetiria depois, acompanhada pela bandinha. Chico Buarque assim o fez, mesmo a contragosto, o que deu certo, aumentando o número daqueles que torciam pela canção. Até então, Chico Buarque era visto como um cantor de “músicas de protesto”. Para o festival, ele procurou fazer uma música mais leve, que fugisse a esse lugar comum.

Quando inscreveu A Banda no festival, Chico tinha apenas 20 anos de idade e muita timidez. A canção foi interpretada por ele e Nara Leão, ganhando o primeiro lugar, juntamente com a canção Disparada, cantada por Jair Rodrigues, de autoria de Geraldo Vandré e Théo de Barros. Mas Chico foi o responsável para que Disparada dividisse com A Banda o primeiro lugar.  O júri havia dado a vitória à música de Chico Buarque, por sete votos a cinco, mas ao tomar conhecimento de que sua canção seria a finalista, Chico exigiu que as duas dividissem o prêmio, sob protesto do júri, dizendo que Disparada era melhor e, se assim não acontecesse, ele se recusaria a receber o prêmio. Contudo, ele jamais falou sobre isso. Quando lhe perguntam sobre o assunto, diz que Disparada ganhou por méritos próprios. O assunto só veio à tona através dos jurados, tempos depois.

A Banda conta a passagem  de uma banda musical pelas ruas de uma cidade interiorana, que com sua alegria vai mexendo com a gente sofrida e triste do lugar, fazendo com que todos deixem seus afazeres para lhe dar atenção, embevecidos. Ninguém fica imune à sua alegria. Até a lua deixa seu esconderijo para vê-la. Mas como tudo passa na vida, a banda também passou. A canção de Chico Buarque agradou tanto ao país, que até o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade ofereceu à canção e a seu autor uma crônica, em um dos jornais mais famosos da época.

Chico Buarque e Nara Leão, em razão do sucesso musical obtido com A Banda, ganharam um programa na tevê, chamado Pra Ver a Banda Passar. Segundo dizem, a dupla era tão tímida que o diretor da atração, Manoel Carlos, desabafou:

– Eles são os maiores desanimadores da televisão brasileira.

Foi depois do sucesso de A Banda, gravada em compacto simples, que Chico Buarque gravou seu primeiro LP – Chico Buarque de Hollanda, em dezembro de 1966, onde figura a canção que o projetou no cenário da MPB, que desde então nunca mais foi a mesma. Nara Leão também se tornou uma grande cantora, gravando, principalmente, bossa-nova.

O pintor Clóvis Graciano fez muitas pinturas inspirado pela canção A Banda, como a que ilustra o texto.

A Banda
Autor: Chico Buarque
Intérpretes: Nara Leão e Chico Buarque

Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu

A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor
Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou

 E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor

Nota
Abaixo a letra da música e a canção

https://www.youtube.com/watch?v=wFPPawLq_5Q

Fonte de pesquisa:
Chico Buarque de Holanda/ Abril Coleções
Chico Buarque/ Wagner Homem
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil

Views: 0

TAIGUARA (I) – O SONHO DE LIBERDADE

Autoria de Edward Chaddad

tai

Nosso povo sempre sonhou em ser livre.

O Hino à Proclamação da República que havia sido feito, na verdade, para ser o Hino Nacional, mostrava, com toda ênfase, em versos fortes, este sentimento que habitava o seio de nossa Nação: “Liberdade, Liberdade, abre as asas sobre nós…”. Todavia, mesmo depois da proclamação da República, tivemos pouco tempo de democracia, tênue e frágil, tempo do coronelismo, da elite agroexportadora, época em que o povo votava a descoberto, vigiado, e as mulheres nem tinham este direito. Na primeira República, também chamada de República da Oligarquia, imperava o liberalismo, que fragilizava o Estado e concedia total liberdade social, econômica e política ao setor privado, esmagando o trabalhador.

A libertação dos escravos deu abrigo à escravidão do trabalhador, sem legislação que o protegesse, restando sem horário de trabalho, sem férias, sem descanso semanal, sem o mínimo de remuneração para sobrevivência própria e de sua família. Sem nada, sem garantia alguma, sem futuro!

A chamada primeira República teve vida efêmera e, com a crise de 1929, trouxe-nos o Estado Novo brasileiro, introduzindo a ditadura de Getúlio, como reação ao declínio do liberalismo no mundo e ao avanço do comunismo. Para tanto, basicamente Getúlio promoveu mudanças sociais, máxime com introdução das leis trabalhistas. Porém, também legou-nos a censura, a ausência e agressão à liberdade diante um poder ditatorial.

Com o fim da 2ª Guerra Mundial, a queda de Hitler e a derrubada de quase todos os Estados Novos, o período ditatorial no Brasil finalizou, oportunizando a convocação de uma Assembleia Constituinte, que resultou na Constituição Federal de 1946, uma das mais bem elaboradas em todos os tempos, que marca o início da 2ª República, a verdadeira alvorada de um Estado democrático, onde o povo governa e a liberdade é o dogma que se devia respeitar. Naquele momento, com mais fervor, o País passou a acreditar que, com a democracia, íamo-nos tornar livres, fazendo valer a vontade coletiva, dentro da legalidade.

Porém, a trégua demorou pouco e, logo, em 1964, com a ditadura militar, o sonho novamente se desmoronou e passamos por 21 anos de trevas, em que o ir e vir só era possível para alienados ou ignorantes, também aos cidadãos fragilizados e impotentes diante do reino da vontade de poucos. Voltamos neste período negro da história de nossa República a sentir o gosto amargo do silêncio, sob as penas da lei do suserano, até a Nova República, em 1985.

Neste período – regime militar – (1964/1985), aqueles que se atreviam a protestar, a contrariar o poder ditatorial, clamando pela democracia, eram presos, inclusive muitos deles torturados. Houve mortes e desaparecidos. Outros se autoexilaram ou fugiram para países que lhes deram abrigo e proteção. Entre eles, políticos, jornalistas, cientistas, professores, estudantes, liberais, artistas e soldados de nossa Pátria.

Taiguara Chalar da Silva, nascido no Uruguai, filho de músico, o maestro Ubirajara Silva, mas que, aos quatro anos de idade, veio residir no Brasil, tornou-se um brasileiro por vontade e escolha própria, um ser humano que amou demais o Brasil e a liberdade. Na década de 60, estudava Direito, quando desistiu da futura profissão para se dedicar exclusivamente à música, tornando-se um artista extraordinário. Taiguara não foi somente um cantor. Era também um grande músico, um pianista e compositor maravilhoso. Ele chegava ao sublime quando, no piano, cantava e tocava as músicas que compôs, onde desfrutava a liberdade que ela, a música, proporciona ao ser humano.

“In veritas”, falar sobre a música é descrever a liberdade. Nela não há limites para a imaginação, para a criação, para o revelar do que mais intimamente vai no interior, no coração do compositor, seja nas notas musicas, seja nas letras que descrevem o desejo mais forte de liberdade! Por isso, Taiguara foi o artista mais censurado pela ditadura. Mais de cem músicas de sua lavra foram contidas na sua divulgação.

Pressionado pelos donos do Poder, embora considerado um dos símbolos da resistência à censura, Taiguara não teve outra saída que não se autoexilar, buscando segurança até que o pesadelo passasse, até que as trevas se dissipassem, até, como ele cantou, o amanhecer, com os raios brilhantes do sol, anunciando a liberdade, viesse.

Para ilustrar este primeiro texto sobre Taiguara Chalar da Silva, um dos mais importantes compositores de nossa música, escolhi a sua composição que mais reflete o seu sonhar pela liberdade. E não só a música, mas a letra desta música tem um significado maravilhoso, escondido no seu coração.

Que as Crianças Cantem Livres

O tempo passa e atravessa as avenidas
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé.
E o vento forte quebra as telhas e vidraças
E o livro sábio deixa em branco o que não é.

Pode não ser essa mulher o que te falta
Pode não ser esse calor o que faz mal
Pode não ser essa gravata o que sufoca
Ou essa falta de dinheiro que é fatal

Vê como um fogo brando funde um ferro duro
Vê como o asfalto é teu jardim se você crê
Que há sol nascente avermelhando o céu escuro
Chamando os homens pro seu tempo de viver

E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer…

Nota:

Há um vídeo, no Youtube, onde Taiguara interpreta esta música e, além de mostrar um pouco de seu drama, revela-se um ser humano altamente sensível e que nos emociona intensamente ainda hoje. Cliquem no link abaixo para ouvirem a música:

http://www.youtube.com/watch?v=wrWSACrF7hE

Views: 2