Historiando C. Buarque e E. Lobo – ODE AOS RATOS

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Autoria de Lu Dias Carvalho

rato

O homem assentou-se no banquinho da praça, buscando calor, naquela manhã fria de inverno. Encostou a cabeça no espaldar do banco, voltando o rosto para cima, em busca dos raios solares. Não demorou muito para que sentisse algo macio roçando seus pés. Imaginou que fosse algum cãozinho de madama. Mas a tentativa de subir-lhe pelas pernas, passando pela boca da calça, alertou-o para que descobrisse qual seria aquele ser tão audacioso. Era um “Rato de rua/ Irrequieta criatura/ Tribo em frenética/ Proliferação/ Lúbrico, libidinoso/ Transeunte/ Boca de estômago/ Atrás do seu quinhão”. Tomado pelo asco, ele sacudiu as pernas longas, botando o atrevido invasor em fuga.

Voltando à posição de antes, o homem lembrou-se dos artigos, que lera na internet naquela manhã, sobre os “ratos do erário público”. E pôs-se a fazer comparação entre os ratos humanos e os ratos bichos. Todos eles – pensou – “Vão aos magotes/ A dar com um pau/ Levando terror/ Do parking ao living/ Do shopping center ao léu/ Do cano de esgoto/ Pro topo do arranha-céu”. Os segundos são guiados pelo instinto com que os dotou a natureza. Os primeiros, no entanto, são pérfidos, cruéis, pois maquinam e pactuam com seus iguais. Estão em todos os lugares, onde possam surrupiar aquilo que jamais lhes pertenceu. Vivem no esgoto da velhacaria, embora habitem luxuosas mansões ou belos arranha-céus, indiferentes ao destino da nação.

O “Rato de rua/ Aborígene do lodo/ Fuça gelada/ Couraça de sabão/ Quase risonho/ Profanador de tumba/ Sobrevivente/ À chacina e à lei do cão”. O rato do erário, sempre risonho, é um aborígene da cobiça, profanador da legalidade, fruto da falta de justiça, que submete seu país à lei do cão. Cada um deles é “Saqueador/ Da metrópole/ Tenaz roedor/ De toda esperança/ Estuporador da ilusão/ Ó meu semelhante/ Filho de Deus, meu irmão”.

O calor do sol foi se tornando mais intenso à medida que a manhã ia sendo deixada para trás. Ratos quadrúpedes corriam ligeiros pela praça, enquanto os bípedes tramavam em ambientes atapetados. E o homem, de volta para casa, seguiu murmurando estupefato acerca de seu parentesco com o rato, qualquer que fosse ele: “Ó meu semelhante/ Filho de Deus, meu irmão”.

Obs.: ouça a música ODE AOS RATOS

Nota: imagem copiada de ratomfelix.blogspot.com

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