Autoria do Dr. Telmo Diniz
Trabalho e cuido de idosos há mais de 20 anos e um dos aspectos de grande relevância e sempre observado é não infantilizar aqueles acometidos por algum tipo de demência. Entretanto, nos últimos tempos, o uso de bonecas, como forma de terapia, chamou-me a atenção pelo simples fato de poder acalmar aqueles idosos que se encontram mais angustiados, ansiosos e aflitos em suas condições de saúde.
A “doll terapy”, ou terapia com boneca, vem ganhando reconhecimento por parte de pesquisadores da área, nos últimos 15 anos. Tem alcançado resultados promissores para a qualidade de vida dessa população e seus familiares. Pesquisa realizada no “Newcastle General Hospital”, na Inglaterra, revelou o aumento do comportamento positivo e diminuição dos casos de agressão, depois da introdução das bonecas. Outro estudo divulgado na “Nursing Times” revelou redução dos surtos psicóticos após início da terapia. Na “Ashcroft Care Home”, uma casa para idosos, também na Inglaterra, o número de idosos em uso de medicamentos psicotrópicos teve suas dosagens reduzidas, ou mesmo suspensas, após introdução da terapia.
É uma estratégia que muitas das vezes não é aceita pela família, especialmente por parte dos filhos e cônjuge, pois muitos a veem como humilhante e que infantiliza o idoso. Entretanto, a maioria dos estudos conduz a respostas benéficas, quando utilizada de forma correta, em especial nos portadores da Doença de Alzheimer (DA), em que a demência vai lenta e progressivamente afetando a capacidade intelectual do indivíduo, com consequentes alterações do comportamento, como depressão, ansiedade, agitação, apatia, irritabilidade, incapacidade de comunicar-se, perda da autonomia e da independência. Segundo evidências e pesquisas científicas, a terapia com boneca pode trazer diversos benefícios para a pessoa com demência, pois:
- acalma-a e a torna mais dócil;
- alivia suas aflições;
- reduz o estado de confusão mental e de agitação;
- possibilita maior conforto;
- oferece sensação de utilidade (por cuidar de alguém);
- estimula a comunicação, a linguagem e traz uma interação entre os familiares.
Como em qualquer terapia, não é recomendada para todos. Há idosos que podem não ficar bem com a técnica e apresentar, até mesmo, mais agressividade. Pois isso, ela deve ser introduzida de forma adequada e aos poucos. Alguns idosos podem ficar mais estressados pela responsabilidade de ter de cuidar de alguém. Tudo isso precisa ser pensado e testado. A apresentação da boneca também precisa seguir alguns critérios básicos para causar impacto positivo: a apresentação deve ser indireta e não se deve forçar o idoso a pegá-la. De igual forma, nunca entregue em uma caixa de presente. Além disso, a boneca deve se assemelhar a um bebê de verdade.
Para cuidar de pessoas com DA, é importante entrar em seu mundo para compreender seus sentimentos e interagir melhor com ela. A doença deve ser compreendida em sua plenitude, para que a família possa cuidar de forma menos traumática nas fases de maior agitação. O tratamento com as medicações tenta controlar os sintomas, procurando melhorar o bem-estar e a qualidade de vida dessa pessoa e dos que convivem com ela. Portanto, se há alguma possibilidade terapêutica a mais para oferecer alívio e conforto, o preconceito deve ser deixado de lado e a oportunidade desta terapia deve ser tentada.
Nota: imagem copiada de www.youtube.com
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Idosos! Dementes, doentes, comprometidos, mas sempre com lembranças…
Meu trabalho como Terapeuta Ocupacional mostrou um lado fascinante do poder das lembranças. As bonecas, principalmente às idosas, têm um poder de tranquilizar que enternece quem acompanha a evolução diária da perda da memória, ainda que em lapsos, ou, mais seriamente, em crescimento relativamente acelerado diariamente.
A cada década se cria uma nova denominação para as mudanças comportamentais decorrentes da idade, do ataque que sofre a pessoa que envelhece. Perde-se capacidades, não se perde o instinto e na mulher – ainda que existente também no homem – o instinto materno, sempre latente, ou, talvez, a volta à infância, o que é comum no labirinto do cérebro, está aceso, à busca e a boneca tem um papel bastante importante.
Na área psiquiátrica, atendi pacientes masculinos que se apegavam às bonecas com a luta ferrenha em não abandoná-la ou perdê-la. Era o conforto, o porto seguro, um quê de lembranças e carinho que talvez compensasse toda a complexidade do quadro. Numa das situações, um paciente em particular, homem de estatura alta, forte, com um quadro de comprometimento bem complexo, deu-me um certo trabalho ao apanhar uma das bonecas que eu havia levado ao hospital para ensinar às pacientes. Era uma boneca de porcelana. Linda, delicada e ele, numa rapidez surpreendente, a apanha, abraça com o maior dos abraços e não a solta mais. Virou sua mascote e nunca sofreu um único arranhão. Perdi a boneca e ganhei o sorriso diário em vê-la tão bem protegida por aquelas mãos grandes, aquele sorriso aberto e o carinho que o fazia tão criança! Doce lembrança! Não foi o único paciente onde as bonecas davam o sossego que precisavam. Muitos se enquadravam no quadro.
Na fase do trabalho voluntário em asilos – ainda não as ILPIs – a boneca sempre foi o melhor dos presentes e impossível chegar às idosas sem que viessem com os olhos da expectativa, mostrando as bonecas já com cheirinho de muito colo ou, pidonas que só, pedindo outra. Algumas gostavam de trocá-las por outra, mas se de panos ou plástico, as bonecas sempre estiveram presentes na vidinha de pessoinhas que por vezes nem lembravam se tinham família, ou não, mas sabiam que tinham a boneca.
Voltei há pouco para visitar pessoas idosas. O mesmo pedido, o mesmo amor, o mesmo gesto de carinho. Também, assustadoramente, descobri que algumas a afagam, tratam a “menininha” com o maior chamego e logo em seguida, num repente, lá se vai a garotinha para o ar. Um gesto de inconformismo com a realidade, um saber que causará espanto, ou a prova de que a doença que acomete o idoso muda, como muda a forma de verificar-se a dinâmica do envelhecimento? Não sei. Em verdade, nem importa saber, mas fico com a crença de que naquela mente, o instinto do amor ainda é o forte, independentemente de como estejam. Não vou visitar idosos sem levar uma boneca, mesmo numa clínica conceituada perto de onde moro e que tem regras específicas, mas como sou “de casa”, levo uma das filhotinhas, porque sei que esse pedacinho de maciez acalma… Sou bonequeira por todos os motivos: gosto de fazê-las, sei que fazem bem e quando menos se espera lá vem a pergunta se levei outra boneca. Sempre levo!
Como todo tratamento para doença de Alzheimer na atualidade é apenas paliativo, o uso da boneca também o é, melhora a agressividade, acalmando, aliviando um pouco a tensão familiar, tem um custo-benefício pequeno, pois em pouco tempo o paciente se desliga da boneca. Como é uma terapia que tem um custo financeiro baixo é validada a indicação, mas nem todos os pacientes respondem da mesma maneira, assim como todo tipo de terapia.
Caro Dr. Paulo Cardoso
Antes de mais nada agradeço a sua visita e comentário, pois toda informação é muito importante para as pessoas que lidam com doentes de Alzheimer.
Esse tipo de terapia é realmente um paliativo nesse mundo tão complexo em que vivem as pessoas acometidas pelo Alzheimer, mas, ainda que breve, seu custo financeiro, como você mesmo afirma, vale a indicação. Ao que me parece, trabalha com pacientes com esta doença tão incapacitante. Saiba que este site estará aberto, caso queira nos enriquecer com textos seus sobre o assunto ou sobre quaisquer outros relativos à saúde.
Abraços,
Lu