Autoria de Lu Dias Carvalho
Sanfoneiro de boca, solfejava, nota por nota, a partir da sanfona, para Sivuca, Dominguinhos, Severo e quem mais estivesse no palco ou estúdio. Uma máquina de ritmos. O rei do sincopado, do canto com chuleado e veneno, Jackson do Pandeiro foi uma matriz de muitos ritmos, de levadas variadas, de estilos que convergiam numa personalidade original. (Kiko Ferreira, jornalista, radialista e crítico musical)
O compositor, cantor e percussionista José Gomes Filho nasceu em Alagoa Grande,/PB, em 1919, filho de José Gomes, oleiro, e de Flora Mourão, cantora de cocos, que ajudava a família cantando em casamentos, batizados e outros tipos de festas. Naquela época, José nem cogitava de se enveredar pelos caminhos da música. Mas gostava de assistir às rodas de coco feitas em casa pela mãe, aprendendo letras, ritmos e batidas.
Quando José estava na casa dos sete anos, num desses encontros musicais que a mãe fazia em casa, seu acompanhante do zabumba, João Feitosa, faltou. O garoto então assumiu o bumbo. Três anos depois, era o responsável por acompanhar a mãe artista. Contudo, não abria mão de suas brincadeiras com os amigos, imitando personagens de cinema. Seu preferido era o ator americano Jack Perrim, por isso, nas brincadeiras, usava o apelido de Zé Jack.
Para ajudar a família, já com três filhos, tendo a mãe largado de cantar, Zé Jack passou a trabalhar na olaria como pai, até o falecimento desse. Mãe e filhos então se mudaram para Campina Grande, centro maior, indo morar com o cunhado e os filhos da irmã falecida. A vida ficou ainda mais dura para Zé Jack que passou a trabalhar como ajudante de padeiro ao lado dos primos.
Como a família morasse próxima à zona boêmia, Zé Jack passou a frequentar o local, sendo levado principalmente pela música, mas também gostava de ouvir música nas feiras. O menino sabia tocar toda espécie de instrumento de percussão. Depois de acompanhar o amigo Chico Bernardo, cego e cantador e também vendedor de literatura de cordel, é que assumiu o pandeiro.
Aos 18 anos de idade, Jack casou-se na polícia com Maria da Penha Filgueiras, filha de uma prostituta, separando-se pouco tempo depois, não oficialmente, o que lhe rendeu um processo por bigamia, ao se casar tempos depois com Almira Castilho.
Mesmo atuando apenas em saraus, mesas de bar e serestas, Jackson passou a ser visto como um bom músico, acompanhando profissionais da música nos bares, onde esses se apresentavam. Embora não tocasse bem a sanfona, chegou a chamar a atenção de sanfoneiros como Sivuca e Dominguinhos. Mas, como seu salário não desse para comprar tal instrumento, acabou optando pelo pandeiro. E viraria mais tarde Jackson do Pandeiro.
Jack assumiu o lugar de condutor do pastoril (mistura de festa religiosa com profana). Como animador, recebeu o nome de palhaço Parafuso. Depois formou com Zé Lacerda, seu amigo, a dupla Café com Leite, que cantava samba e marchas de carnaval e tocava pandeiro, participando de um show de calouros aos domingos. Tudo sem ganhar nada.
Tempos depois, Jack foi trabalhar num cabaré recém-inaugurado, muito chique, fazendo parte de uma excelente orquestra, onde se tocava gêneros variados: do choro ao jazz, do maxixe à rumba, do tango ao blues. Ao ver no cinema o chapéu do cantor e compositor Manezinho Araújo, adotou a nova moda. Também se encantou com o samba bem humorado e cheio de breques de Jorge Veiga, chegando a colocar no seu repertório músicas dos dois admirados.
Na época da Segunda Guerra Mundial, Jack mudou-se para João Pessoa, indo tocar num bar sugerido pelos amigos. Ao passar a frequentar a boemia, ficou conhecendo a famosa orquestra Jazz Tabajara. Tal era a fama da orquestra que parte dos músicos acabou indo para o Rio de Janeiro e Jackson ocupou uma das vagas deixadas. O salário era muito baixo, mas lhe dava a oportunidade de ter mais contato com a Rádio Tabajara da Paraíba e o meio musical.
Jack passou a participar de vários grupos da rádio, trabalhando com bons músicos e aprendendo mais sobre o choro, o frevo e as emboladas. Época em que passou a ser chamado de Jackson do Pandeiro. Depois foi para a Rádio Jornal do Comércio, no Recife, fazendo muito sucesso. Fez dupla com Almira Castilho, que se tornou sua parceira de música e na vida pessoal, tornando os dois uma das atrações de maior sucesso do rádio. Jackson do Pandeiro assumiu a posição de cantor e comediante.
Jackson foi contratado pela gravadora Copacabana, onde gravou cinco discos. Depois, seguiu para o Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Nunca mais a dupla voltaria a morar no nordeste. Separou-se de Almira, casando-se depois com Neuza Flores dos Anjos, que aprendeu a tocar agogô e formou com ele uma nova dupla. No final de 1969, foi gravado por Gilberto Gil e Caetano Veloso e também por Gal Costa. Influenciou os nordestino: Geraldo Azevedo, Zé Ramalho, Fagner e Alceu Valença.
Jackson do Pandeiro morreu em 1983, aos 64 anos, em consequência de um infarte.
Nota:
No link abaixo, ouçam Chiclete com Banana
http://www.youtube.com/watch?v=EWjLg74cS4A
Fonte de pesquisa:
Raízes da Música Popular Brasileira/Coleção Folha de São Paulo
Views: 0
LuDias
O talento musical oferece a quem o desenvolve um dos prazeres maiores da vida. Convivi com músicos e sei como eles se sentiam, quando atingiam o clímax, seu apogeu na interpretação, interessante dizer, ao compor, porque o músico de excelência tem seu ” estilo próprio”, acaba fazendo arranjos dentro do seu desempenho e promove modificações, por vezes, profundas na melodia, sem deixar de se apegar e agarrar à mesma até o final, dando aquela contribuição que torna a música diferenciada.
Tive o prazer de deleitar-me com todos esses músicos, quando eles estavam se projetando ou mesmo já como sucesso, e Jackson era uma unanimidad.
Parabéns pela excelência de seu texto.
Ed
Jackson do Pandeiro é o exemplo do talento que nasce bruto e não consegue se manter oculto, indiferente à pobreza de quem o contém.
Menino pobre, lutando contra as mais severas dificuldades, sem estudo, transformou-se numa usina de ritmos.
Conhecer a vida de pessoas assim é muito importante para todas as gerações.
Para que vejam que é possível superar, sempre.
Abraços,
Lu
Lu,
Jackson tem participação especial na música brasileira, em particular na música nordestina tradicional. Era considerado o Rei do Ritmo. Assisti a uma apresentação dele aqui no Rio, no teatro Glaucio Gil, em Copacabana. Na ocasião, quem deu “canja”, timidamente, foi Gilberto Gil, no início de carreira. Isso, foi entre os anos 1960 e 1970, mais ou menos.
Parabéns por relembrar Jackson. Abração,
Alfredo Domingos.
Alf
Estou me deliciando com a pesquisa sobre as raízes da MPB.
O mais importante é como se dá a entrada de Jackson do Pandeiro no meio musical.
A vida não era fácil para os músicos, compositores e cantores da época.
O cara precisava ter talento mesmo.
Ao contrário de hoje, quando só basta ter a mídia a favor ou ser da família.
Abraços,
Lu