Autoria de Lucas Alves Assunção
Antes de explicar o porquê de os cantores sertanejos parecerem ter a mesma voz, vou dar uma breve explicação sobre teoria musical. A música é uma onda que viaja a 340 metros por segundo, porém nosso ouvido tem um “atraso” de 0,1 segundos para começar a ouvi-la e isso gera dois efeitos: a “reverbação / reverb” e o “eco” que nada mais é do que uma continuação do “reverb”, quando as ondas da música batem em paredes, prédios, montanhas e refletem, voltando para nós. Como nosso ouvido tem esse atraso, se estivermos a uma distância de até 17 metros de uma parede, escutaremos o “reverb”. Você pode testar isso no seu banheiro. Apenas grite e o seu grito irá continuar soando por um breve momento. Agora, se estiver a mais de 17 metros, como nosso ouvido tem essa latência para captar o som, você escutará o eco que é um “reverb” atrasado.
A música dos dias atuais em sua maioria é praticamente um barulho robotizado, pois os estúdios contam com vários sistemas de edição para “ajustar” os erros que as pessoas cometem, seja no tempo da bateria, nos instrumentos ou na voz. Na voz, todos usam um efeito chamado “auto tune” que é um processador digital de áudio que deixa sua voz na nota certa, na nota em que deveria estar no andamento da música, então, é impossível desafinar. Voltando à teoria, existem dois tipos de sistemas para usarmos em efeitos musicais: os analógicos e os digitais.
Um sistema analógico mantém a onda musical da maneira exata que ela era antes de entrar no equipamento, seja um pedal, um disco de vinil ou o que for, enquanto o sistema digital altera essa onda que se torna digital ao passar pelo equipamento e depois volta a ser analógica, porém, ela não volta da maneira exata como era, volta “quadrada”, pois sofre alterações. Você já deve ter notado que vários cantores sertanejos da atualidade parecem ter a mesma voz, certo? Esse é o motivo, o uso do “auto tune” deixa a voz robotizada, alterada e todos que o usam terão um timbre parecido.
A música atual segue um “padrão” independentemente do estilo ou do gênero. Se você fugir desse modelo não terá espaço em mídia alguma. As letras não podem ser críticas e as melodias precisam ser simples. Em mais de 80% das vezes, as músicas não são feitas pelas pessoas que as cantam, sendo gravadas por músicos contratados, com as melodias feitas por maestros e tudo tendo a mão de produtores no meio. Isso também quebra o ciclo de “música e sentimento”, pois os artistas “cantam” algo que não foi criado por eles. É fácil falar de amor sem nunca ter amado, de dor sem nunca ter sofrido, portanto, eu posso dizer com clareza que quase toda a música atual e quase todo esse chamado “gênero pop” nada mais são do que uma grande mentira, uma farsa que visa apenas o lucro imediato.
Falar sobre a música brasileira é algo que para mim é extremamente doloroso, pois os talentos daqui muitas vezes vagam esquecidos, sem nunca chegar ao conhecimento do público. Nosso país possui a melhor música do mundo em termos de teoria, técnica e letra, superando todo o resto, porém, 98% do que é bom fica fora das grandes mídias. A maioria da produção dos gêneros populares da atualidade é péssima (funk, sertanejo, sertanejo com funk, rap, rap com funk, emo disfarçado de rock, MPB feita por “filhinhos de papai” que fizeram faculdade de música paga fora do país e se acham os tais).
Também temos a típica “bunda”, sim, entre todos os gêneros musicais da atualidade, o mais popular é a “bunda”, quantas músicas sobre “desce o bumbum, rebola o bumbum, mexe o bumbum” você já ouviu? A verdade é que nem o público que vai aos shows com esse tipo de música está ali pra ouvi-la. Pouca importa quem está tocando ou o que está sendo tocado, pois está ali somente atrás de sexo e bebidas – essa é a triste realidade do sucesso atual. Entretanto, o Brasil é muito mais que tudo isso. Existem músicas por aqui que nem tem como ser classificar em um gênero, pois são únicas, a exemplo das de Renato Goda, músico da atualidade, um dos poucos presentes na mídia que possui talento hoje em dia. Ele é um poeta nato. Goda fez uma das músicas mais lindas que já ouvi, chama-se “Como o Mar”.
Temos várias bandas antigas, da década de 70, como: “Recordando o Vale das Maçãs”, “A Barca do Sol”, “Som Nosso de Cada dia”, “Terreno Baldio”… Temos também uma ótima banda de blues, “Bêbados Habilidosos”, que tinha um grande poeta chamado Renato Fernandes nos vocais, que infelizmente veio a falecer. As letras do grande Renato são as melhores dentre todas do blues brasileiro. Esse é apenas um dos muitos músicos brasileiros que, pela falta de cultura de nosso país, nunca teve o merecido sucesso. Tenho a certeza de que se as mesmas chances que são dadas aos arremedos de músicos fossem dadas aos bons músicos, tudo seria diferente, porém, infelizmente, é preciso seguir a mediocridade do “padrão” vigente.
Nota: O Violeiro, obra de Almeida Júnior
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Lucas
Excelente artigo!
No fundo percebe-se que o recado maior é que a música é o retrato de nossa sociedade. Nasci em 1943, conheci grandes músicas de nossas raízes (mesmo estrangeiras), que estão sendo esquecidas pela mudança radical de nossa sociedade que do romantismo e do amor está partindo para o ódio.
Adoro essa obra do violeiro, já tinha a visto antes, ótima escolha para o post Lu, adorei.
Lucas
Escrevi sobre ela. Encontre-a em PINTORES BRASILEIROS, no Índice.
Abraços,
Lu