Arquivo da categoria: Corpo e Mente

Filosofias e conjunto de práticas físicas, psíquicas e ritualísticas que buscam um estado de harmonia e equilíbrio físico e mental.

É PRECISO FAZER UM CHECK-UP DA ALMA

Autoria do Dr. Telmo Diniz

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Várias pessoas estão doentes da alma e, muitas vezes, deixam outras doentes também. Doenças d’alma, quando não tratadas, contaminam outros ao seu redor. Normalmente são pessoas pessimistas, para quem nada está bom, são desconfiadas e inseguras, negativas, invejosas, etc. Conhece alguém assim? Provavelmente. São indivíduos que podem até apresentar boa saúde física, mas que pouco se conhecem e sofrem ano após ano com doenças do espírito. Uma completa avaliação interior, incluindo aí um check-up da alma, é bem indicada.

Estamos conhecendo, a cada ano que passa, mais e mais o universo e seus segredos, mas não conseguimos entender direito e profundamente o nosso próprio coração. Não nos conhecemos verdadeiramente. Não sondamos suficientemente a nós mesmos. Não gerenciamos bem nossas angústias, medos e aflições. Nosso interior, não raro, passa-nos a perna. Por isso, a vigilância é essencial. E é através dela que mantemos afastado de nós atitudes que envenenam a alma, como a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a inveja, a blasfêmia, a soberba e a loucura.

Faz parte da vida, às vezes, ficar triste, ansioso ou amedrontado. A variação emocional é que dá colorido à vida. Só devemos nos preocupar se nos “congelarmos” em um único estado, como ficar engessado emocionalmente e sem poder de reação. São em momentos como esses que devemos olhar para dentro de nós mesmos e iniciarmos algumas reflexões.
Alguns pontos são importantes a serem observados em nosso comportamento, como forma de uma autoanálise:

• Evitar fugir das situações desagradáveis, pois o confronto e o enfrentamento dos problemas fazem parte da vida.
• Não queira aparentar uma coisa e estar sentindo outra. Portanto, aprenda a dizer “não”. Se você não se respeita, certamente não ganhará a admiração dos outros.
• Explosões de raiva são típicas de pessoas que querem resolver o problema no grito. Na verdade, não resolvem e criam ressentimentos. Por isso, pratique a tolerância. Saiba ouvir opiniões contrárias, pois elas podem ser mais construtivas do que as suas. O bom negociador sabe pedir, mas também sabe ceder, para que o equilíbrio seja atingido.
• A conscientização dos defeitos que temos e a apuração de nossas virtudes são as chaves para melhoramento e aperfeiçoamento interior.

Cristo, como o melhor de todos os médicos, certamente receitaria:

• tomar diariamente, já ao acordar, uma xícara de chá de agradecimento;
• ao chegar ao trabalho, tomar uma colher de sopa de “bom dia”;
• de hora em hora, tomar um comprimido de paciência;
• beber doses semanais de humildade;
• logo ao chegar em casa, inalar doses de paz e amor,
• e ao deitar-se, usar sua dose noturna de consciência tranquila.

Agindo assim, não mais ficará doente, e todos os seus dias certamente serão de confraternização e solidariedade. O corpo agradece, quando a saúde da alma e do espírito vão bem.

Nota: Madalena Arrependida, obra de Artemisia Gentileschi

POR QUE FICAMOS ANGUSTIADOS?

Autoria do Dr. Telmo Diniz

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Chamamos de angústia uma forte sensação psicológica, caracterizada por “abafamento”, insegurança, humor irritadiço, opressão no peito e “fôlego curto”. A angústia é também uma emoção que precede algo, como um acontecimento, uma ocasião ou uma circunstância. A pessoa sente fisicamente que algo ruim ou inesperado poderá ocorrer. Pode, também, a angústia chegar através de lembranças traumáticas que ocorreram no passado. Seus sintomas podem simbolizar situações reais ou imaginárias.

Subitamente e sem aviso, prévio vem aquele aperto no peito e uma “falta de ar”. Surge em qualquer momento, hora ou lugar. Como se uma grande mão apertasse o peito. Em seguida, vem uma sensação bem esquisita de opressão. Você quer se livrar dela, mas não consegue. O coração acelera. Num determinado momento, você está bem e a apreensão surge sem pedir licença. Em outros, está associada a alguma preocupação ou sensação de insegurança. Se você vive um momento confuso ou difícil, a angústia pode se instalar, gerando medos e uma terrível insegurança. Em casos mais graves de angústia, a pessoa pode se sentir perseguida, com quadros típicos de paranóia.

Partindo para a filosofia da angústia, Arthur Schopenhauer tinha uma visão extremamente pessimista da vida, onde “viver é necessariamente sofrer”. Para ele, a própria vontade de ter algo é um mal, pois isso gera angústia e dor. Nietzsche, concluiu que “é preciso ter consciência de que a vida é, sim, uma tragédia, para que possamos desviar um instante os olhos da nossa própria indigência, desse nosso horizonte limitado, colocando mais alegria em nossas vidas”. Já Jean-Paul Sartre, filósofo francês, defendeu que a angústia surge no exato momento em que o homem percebe a sua condenação irrevogável à liberdade, isto é, o homem está “condenado a ser livre”. Ao perceber tal condenação, ele se sente angustiado em saber que é senhor de seu destino.

Filosofias à parte, para a ciência, mais especificamente para a psiquiatria, a angústia, se não tratada pode evoluir para a depressão. As pessoas, que apresentam quadro de angústia, e não têm acompanhamento profissional, desenvolvem outros distúrbios emocionais como cansaço físico e mental, comportamento inadequado e baixa autoestima. Ficamos angustiados por opção, por força de nossas próprias escolhas, por causa de coisas e pessoas. Assumimos compromissos financeiros que não podemos saldar, adquirimos bens pelos quais não podemos pagar. Tudo em busca de status. Compramos o que não precisamos com o dinheiro que não temos, para mostrar uma pessoa que não somos. O ato da compra é sublime e fugaz. A obrigação decorrente é amarga e duradoura. É angustiante.

O tratamento é feito com medicações psicotrópicas, tranquilizantes e/ou antidepressivos. Elas ajudam a pessoa a superar os sintomas que acompanham a angústia. Porém, a psicoterapia cognitivo-comportamental é de suma importância para a prevenção. Para as pessoas com religiosidade, sugiro que voltem a alimentar o espírito, com prática de atividades físicas, mais lazer e, principalmente, voltem a respirar fundo e ter fé em si, pois, todos podem ultrapassar os limites e superar medos e receios. A ansiedade é um tempo que não chega; a angústia, um tempo que não vai embora.

Nota: A Ansiedade, de Evard Munch

A COBIÇA NO MUNDO DA POLÍTICA

Autoria do Prof. Hermógenes

O Professor Hermógenes, um dos precursores da ioga no Brasil, escreveu mais de 30 livros sobre a saúde física e mental.  Neste texto retirado de seu livro “Yoga para Nervosos”*, ele nos alerta sobre os malefícios da cobiça.

A cobiça é fonte de ansiedade que, por sua vez, origina-se da insatisfação. Nasce da frustração e também gera frustração. Dela podem advir muitas atitudes mentais, destruidoras da saúde. Quem cobiça jamais experimenta satisfação, desde que está sempre em luta por mais e por melhor. Se você amarrar sobre as costas de um jabuti um pedaço de pau, tendo na ponta um pedaço de alface, teoricamente pelo menos, vai fazê-lo andar até fisicamente exaurir-se. Atraído pelo cheiro apetitoso da folha, andará, sempre a perseguir algo inatingível. É o símbolo da cobiça.

Cobiçando maior conta bancária e mais poder econômico, muitos comerciantes, industriais e homens de empresa cometem suicídio trabalhando demais, ou explorando os outros. Perdem-se no emaranhado de valores que não passam pelos portões da morte. A cobiça dá origem à inveja que é outra fonte geradora de desequilíbrios e crimes. Quanta miséria tem sido praticada por políticos, não só na conquista do poder, mas também no exercício do poder!

A história da humanidade está cheia de exemplos de povos que foram martirizados por alguns obsecados pelo poder. A cobiça quer pelos cifrões, quer pelo mando, quer pela notoriedade tem feito imperar na terra a corrupção. Na luta pelo poder, seja econômico, seja político. O homem se destrói, perseguindo o que, no fim de contas, é tremenda decepção. A morte é certa e não respeita nem o rico nem o rei.

Se você é político ou deseja fazer vida política precisa se lembrar de que o poder político é um “talento” que deve ser judiciosa e inegoisticamente usado para o bem comum. Quem o utilizar em proveito próprio e, consequentemente, prejudicando o bem social, estará desafiando a Lei do Karma que é infalível.

O verdadeiro yoguin, se tivesse medo de alguma coisa, este seria o de cometer erros no uso do poder econômico, político ou social emprestado por Deus. O yoguin é candidato à saúde e à paz de espírito e, por isto, está sempre alerta para não se deixar corromper e, para isto, o preventivo é aparigraha, ou seja, a não cobiça.

A cobiça, mesmo que seja pelo céu, perturba-nos. É fato comprovado por poucos homens felizes que somente depois de aliviados da cobiça, vieram-lhes às mãos as coisas que até então haviam em vão perseguido. As gemas parecem que fogem da bateia do garimpeiro endoidecido pela cobiça. Aparigraha é um preceito do Yoga e significa “não cobice”. Aparigraha, a não cobiça, tranquiliza a alma. E quando há tranquilidade até os pântanos ganham o privilégio de refletir as nuvens.

Não tolde sua alma, amigo, com a agitação da cobiça! Não cobice nem sequer sua cura para, assim, não a retardar.

*O livro “Yoga para Nervosos” encontra-se em PDF no Google.

Nota: imagem copiada de terapiabudismo.blogspot.com

DEPRESSÃO E PAPEL DA FAMÍLIA

Autoria de Lu Dias Carvalho

As pessoas deprimidas podem despertar sentimentos de culpa, raiva, impotência e frustração nos familiares, que podem ficar ressentidos e com dificuldades de entender o que está acontecendo com a pessoa. (Dra. Andrea Ferreira)

Tem sido muito comum o recebimento de comentários neste espaço de pessoas com transtornos mentais que se dizem incompreendidas por suas famílias. Enquanto algumas das famílias minimizam o problema, achando que o doente não necessita de ajuda médica, outras partem para o deboche, chamando o transtorno de chilique, faniquito nervoso, fricote, denguice, vitimização, bobagem e por aí vai. Sabemos que isso se dá, não por indiferença, mas por conta da falta de informação no que diz respeito às doenças mentais. Urge que os governos façam campanhas na mídia para que tais doenças sejam compreendidas e, consequentemente, deixem também de ser estigmatizadas, como ainda acontece.

A família tem um papel fundamental na vida de uma pessoa depressiva, pois a doença  torna-a mais arredia, com a autoestima baixa e faz com que tenha dificuldades para viver em grupo, achando que não é bem quista.  Essa rejeição – que muitas vezes só acontece na cabeça do doente – exige afeto redobrado para que ele se sinta aceito e amado, minorando, assim, o seu sofrimento. Ao compreender que a depressão é uma doença séria que jamais pode ser subestimada, a família caminha junto com o ente querido, vítima do transtorno, em busca de uma vida com qualidade. Assim que perceber os primeiros sintomas, ela deverá ajudá-lo a buscar tratamento, pois quanto mais cedo fizer isso, menor será o sofrimento da vítima do transtorno mental.

O isolamento é um comportamento típico dos depressivos, contudo, a família não pode agir do mesmo jeito, deixando o doente no “seu cantinho”, dizendo não querer incomodá-lo, vendo isso como uma escolha de vida pessoal. A psicóloga Pamela Magalhães explica: “Muitas vezes, o depressivo pode ficar mais irritadiço e, dessa forma, acabar se isolando, o que faz parte da patologia. A família precisa entender que não pode entrar nessa dinâmica”. Os familiares em volta também jamais deverão agir com agressividade, o que somente agravará os sintomas, tornando a pessoa ainda mais arredia e sem esperança. Quanto mais carinho e compreensão, melhores serão os resultados.

É comum o fato de muitas famílias usarem o parente doente com transtorno mental para justificar o não cumprimento de seus compromissos, o que o faz sentir-se como um peso. A psicóloga Andréa Ferreira explica: “A família deve manter sua rotina dentro do possível, envolver-se em atividades que interessem e manter os compromissos sociais, ciente de que não deve se sentir culpada pelo estado da pessoa, mas, sim, apoiá-la para que supere esse estado”. Além disso, os familiares devem acompanhar de perto o tratamento do doente, demonstrando interesse e zelando para que ele não abra mão da medicação e da terapia (quando esta for indicada), conforme prescrição médica.

A família deve estar atenta a alguns pontos, tais como:

  • Ajudar o familiar depressivo a compreender o momento pelo qual passa, incentivando-o a buscar ajuda médica, pois se trata de uma doença séria.
  • Respeitar o doente, sem jamais minimizar o problema, dizendo que “não é nada”. Deve lhe mostrar que sabe que seu sofrimento é real, mas que terá ajuda.
  • Estar sempre pronta a ouvir o familiar, quando ele quiser se manifestar, procurando ouvir mais e falar menos.
  • Compreender seus momentos de introspecção, ao não querer expor seus sentimentos num determinado momento.
  • Acompanhar as mudanças no seu comportamento, principalmente no início do tratamento, levando ao conhecimento de seu médico aquilo que notar que não se encontra dentro do esperado.
  • Deverá envolver o familiar doente em afeto e compreensão, servindo sempre de suporte emocional.

Nota: A artista e sua Modelo, obra de Edvard Munch

Fonte de pesquisa
Guia 301: Dicas para não ter depressão / Editora Online

O PODER DA AUTOSSUGESTÃO

Autoria do Prof. Hermógenes

O Professor Hermógenes, um dos precursores da ioga no Brasil, escreveu mais de 30 livros sobre a saúde física e mental.  Neste texto retirado de seu livro “Yoga para Nervosos”*, ele nos adverte sobre o poder da autossugestão tanto para o bem quanto para o mal.

“A principal missão do homem em sua vida é dar a luz a si mesmo, é tornar-se aquilo que ele é potencialmente”. (ErichFromm, em “Análise do Homem”.) Esta é a linguagem de um psicólogo ilustre. É bem igual à linguagem de um yogui. “Cada alma é potencialmente divina. O fim é manifestar este íntimo divino para controlar a natureza externa e interna. Faça isto pelo trabalho ou pela adoração, pelo controle psíquica ou filosófico ou por um ou mais ou todos esses caminhos, e seja livre. Este é papel da religião. Doutrinas ou dogmas, ou rituais, ou livros, ou templos, ou imagens são somente detalhes secundários” (Vivekananda, Works).

Desde os anos de nossa infância aprendemos que somos todos “filhos do pecado”, que “degradados” somos frágeis, imperfeitos e indignos de olharmos para Deus. Supondo e pretendendo em nós cultivar a virtude da humildade, piedosos instrutores religiosos encheram-nos desta funesta autodepreciação e, para mais acentuá-la, ensinaram-nos também ser Deus algo infinitamente diferente, distanciado e absolutamente fora de nosso alcance.

Colocar Deus tão alto, lá no inacessível e, simultaneamente, nós mesmos no mais tenebroso pélago da inferioridade, tem nos feito tanto mal! Por isso, Deus tem sido temido, mas não amado. Está tão longe que não temos a audácia de pensar esteja ao alcance de nossa busca. E, não obstante enunciemos sua onipresença, vivemos na convicção do contrário. E, assim, nos sentimos desamparados.

O desalento resultante da inacessibilidade à Bem-Aventurança Suprema faz-nos ficar parados onde estamos ou mesmo regredir, tornando-nos ainda mais frágeis e pecadores (cheios de erros). O que imaginamos que somos, somos. Afirmar imperfeições e concentrar a consciência sobre inferioridades só tem conseguido conduzir ao padecimento, à falência. Ninguém desconhece o poder da autossugestão, seja para curar, melhorar, elevar ou, ao contrário, seja para enfermar, inferiorizar e piorar. Tudo depende de seu conteúdo ser positivo ou negativo.

O ocidental, mercê de tão bem intencionado, mas funesto ensino religioso generalizado, tem enraizado no subconsciente a autossugestão “eficaz” que diz ser mísero pecador. Esta sugestão tem dado seus frutos: sofrimento, doença, vícios, ansiedades, complexo de inferioridade e até amoralismo patológico.

O yoguin nunca se preocupa com seus pecados (erros) ou com o pecado. Prefere atender ao oposto e afirmar sua unidade com o Divino, imitando Jesus ao dizer: “Eu e o Pai somos um”. Jesus realizou isto. Convidados estamos nós a imitá-lo. Potencialmente, somos divinos. E a existência nos foi dada para que possamos atualizar esta potencialidade. Divinizar-nos é o desafio.

Religiosos – dogmáticos fanáticos – acharão mesmo que comete profanação quem não se humilha, quem não se afirma degradado e pecador. Acreditar-se herdeiro do Absoluto é tido por irreverência e pecado, aos olhos de muitas vítimas da nociva pedagogia religiosa da autodepreciação piedosa. Tais pessoas precisam aprender de Ramakrisna que “nenhum orgulho que exprima a glória da Alma chega a ser orgulho. Nenhuma humildade que procure humilhar nosso Ego verdadeiro merece o nome de humildade”.

Para tais pessoas que confundem humildade com humilhação autodestrutiva, um dia escrevi: “Quando eu disse ao caroço de laranja que dentro dele dormia um laranjal inteirinho, ele sorriu e zombou de mim e se mostrou estupidamente incrédulo”.

Um tolo todos os dias batia no peito e repetia contrito: eu pecador… Eu pecador… Eu pecador… Acabou sendo. Um sábio, até mesmo ao cair, repetia: “Eu e Deus somos um… Deus e eu somos um… Eu e Deus somos um… Acabou sendo.” (Hermógenes, do livro “Mergulho na Paz”).

*O livro “Yoga para Nervosos” encontra-se em PDF no Google.

Nota: pintura do artista ucraniano Oleg Shuplyak

REALIDADE E ILUSÃO

Autoria do Prof. Hermógenes

O Professor Hermógenes, um dos precursores da ioga no Brasil, escreveu mais de 30 livros sobre a saúde física e mental.  Neste texto retirado de seu livro “Yoga para Nervosos”*, ele faz um paralelo entre a realidade e a ilusão.

Em um livro tradicional da Índia fala-se que uma pessoa chegou a um quarto escuro e se horripilou ao ver uma cobra que a ameaçava. Depois que acendeu o candeeiro, constatou que era tão somente uma corda.

Nossas reações de medo, ódio, cobiça, apego, finalmente todas as emoções com que reagimos ao mundo são originadas por um estado de ilusão, pois não vemos a corda, vemos a cobra. Reagimos à cobra que, embora sendo falsa, tem o real poder de afetar-nos. Não vemos a corda, embora ela seja real.

Na história da cobra e da corda, qual era real: a cobra ou a corda? A mente destituída de viveka (discriminação) viu uma cobra e caiu presa do medo, com todas as consequências desagradáveis desta emoção/choque. Na mente iluminada pela discriminação, a candeia de viveka afastou a ilusão. E, desiludido, o homem viu que não era uma cobra, mas uma corda. Isto lhe restaurou a calma e a segurança. Cada vez que nos capacitamos de que o mundo, com suas ameaças, desventuras, misérias, decepções e vicissitudes não é mais do que uma corda, que não é uma cobra, começa a instalar-se em nós a imperturbabilidade divina. À medida que o mundo, diante da luz de viveka, já não nos hipnotiza e ilude com suas fantasias, com seus prazeres ou dissabores, com seus atrativos ou ameaças, vamos caminhando para a libertação final, até atingirmos o Real.

Então, o mundo em que vivemos é ilusório? Vamos então cair no platonismo? Vamos negar a realidade ao que vemos, sentimos, sobre que agimos? O mundo não é ilusório inteiramente. Não é somente maya (ilusão). A cobra não é de mentira. É real. O mundo o é na medida e extensão em que consegue gerar medo ou apego. As reações somáticas do amedrontado emprestam realidade àquilo que lhe dá causa. E, enquanto a cobra for uma apavorante realidade, a corda não é vista e, portanto, não tem realidade, embora seja real. Dessa maneira o mundo fenomênico, isto é, o que vemos e sentimos é uma realidade, na medida e extensão dos efeitos que em nós provocam ou suas delícias ou suas misérias.

Em relação à realidade somos, naturalmente, hipnotizados, pois só lhe conhecemos as aparências sob o ângulo das sugestões particulares que em cada um predomina. A mais aproximada tradução para viveka é discriminação, isto é, a capacidade de discernir entre o falso e o verdadeiro, entre o efêmero e o eterno, a meta e os meios para atingi-la. É através dela que nos desiludimos, isto é, deixamos de ser engodados pelos aparentes do mundo. O estudo do Ser, isto é, svadhyaya, através da leitura de livros sagrados de todas as tradições religiosas, através de permanente observação das coisas de fora e de dentro de nós, é que nos dá a coragem resultante de matar a ameaçadora cobra da ilusão.

O estudo da filosofia é a chave que nos liberta da vinculação, dos sofrimentos, da cobiça, do medo e do ódio. Se é a ilusão que nos assusta ou prende, é a desilusão que nos salva. Nunca se entristeça por desiludir-se de algo ou de alguém. É uma libertação que merece seja comemorada com um sincero “Graças a Deus”.

*O livro “Yoga para Nervosos” encontra-se em PDF no Google.

Nota: Aparição de Rosto e Fruteira numa Praia, obra de Dalí