Arquivo da categoria: Música

Estudo sobre os grandes nomes da pintura mundial, incluindo o estudo de algumas de suas obras

DISPARADA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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A machinha A Banda revivia a pureza de espírito das cidades do interior nos anos 30. (Zuza Homem de Mello)

A moderna moda de viola Disparada pintava com cores nunca antes percebidas a vida de um boiadeiro. (Zuza Homem de Mello)

O júri pode decidir o que quiser. Eu não quero levar esse prêmio sozinho. Se a A Banda for a primeira, eu devolvo o prêmio em público. (Chico Buarque)

O Festival reconduziu a canção brasileira ao único lugar de onde pode sair e para onde deve ir: o povo, a rua. (Franco Paulino)

Para o II Festival da TV Record, em 1966, 36 canções foram selecionadas, saídas das 2.635 inscritas. Elas seriam apresentadas em três eliminatórias mediante sorteio. Em cada envelope constava o nome da canção, dos autores e o do cantor ou cantora que iria defender a canção sorteada. Os responsáveis pela escolha das 36 canções concorrentes desconheciam seus autores, de modo a não favorecer nenhum conhecido. Os envelopes não traziam nomes. Mesmo assim, o compositor Adoniran Barbosa cometeu uma indiscrição ao dizer para Raul Duarte, um dos responsáveis pela escolha, qual era o nome de sua música inscrita. Chateado, Raul Duarte respondeu-lhe que não deveria ter feito aquilo, comprometendo-o na sua escolha. E que iria alegar suspeição para não votar na sua canção. E assim o fez. A canção de Adoniran não entrou nem no rol das 36 escolhidas. De fora também ficaram nomes importantes da música brasileira. Zé Kétti, que chegou a inscrever 16 canções, teve apenas uma selecionada.

Disparada de Geraldo Vandré e Théo de Barros, defendida por Jair Rodrigues, acompanhada pelo Trio Marayá e pelo Trio Novo foi a música mais aclamada na primeira eliminatória. Ela trazia duas novidades em seu arranjo: o uso de uma queixada de boi, que dava a impressão de um som de chicotada e o som da viola caipira. A entrada de Jair no palco pegou o público de surpresa. Quando iniciou a canção toda a plateia ficou em silêncio. Jair que era muito brincalhão ao apresentar samba, cantou toda a música totalmente sério. Foi muito aplaudido. Ele parecia ter nascido para cantar aquela canção. Roberto Carlos defendeu Anoiteceu, de Francis Hime e Vinicius de Moraes, ficando indignado por não se encontrar entre as quatro classificadas.

Na segunda eliminatória, A Banda, de Chico Buarque, defendida por Nara Leão, ficou entre as quatro classificadas. Como Nara tivesse uma voz muito fraquinha, sendo pouco ouvida na primeira eliminatória, foi sugerido a Chico que cantasse junto com ela da seguinte forma: ele cantaria a música toda, acompanhado pelo violão e Nara repeti-la-ia depois, acompanhada pela bandinha. Chico Buarque assim o fez, mesmo a contragosto, o que deu certo, aumentando o número daqueles que torciam pela canção. Até então Chico era visto como um cantor de “músicas de protesto”. Para o festival, ele procurou fazer uma música mais leve, que fugisse a esse lugar comum.

Na terceira eliminatória, já estava claro que nenhuma das outras classificadas tinha força suficiente para disputar com A Banda e Disparada. Elas já eram cantadas em todo o país, numa disputa acirrada, movida por muitas apostas, como num jogo de futebol.

A final do festival transformou-se num acontecimento especial na história da MPB, onde disputavam as canções A Banda e Disparada, parando cinemas, teatro e o país. Todo mundo queria assistir à final. O país dividiu-se, esperando o resultado. Disparada foi a primeira música sorteada, abrindo a última fase do festival. Ao final, metade da plateia gritava “Já ganhou!”. Quando foi a vez da apresentação de A Banda o clima foi o mesmo. A plateia estava dividida. A tensão pairava no ar.

Entre os membros do júri o clima era tão tenso quanto na plateia. O resultado foi de 7 x 5, consagrando A Banda como a campeã. Ao tomar conhecimento de que sua canção seria a vencedora, Chico Buarque mandou um recado para o júri, dizendo que se negava a receber o prêmio, se ela fosse a vencedora, pois considerava Disparada melhor do que a sua. Ou A Banda empatava com Disparada, ou ele se recusaria, publicamente, a receber o prêmio. Perguntado se topava dividir o valor da premiação, Chico disse que sim. O júri não teve alternativa senão declarar o empate das duas canções, num 6 x 6. Chico só pediu que nunca fosse dito que A Banda havia sido a finalista e que houvera depois um acordo. E, na sua nobreza de caráter, até o dia de hoje, Chico Buarque nunca comentou ter sido ele o responsável pelo empate. E se lhe perguntam sobre a história, diz que Disparada ganhou por méritos próprios, pois era a melhor música do festival. Tempos depois é que membros do júri deixaram a história escapar.

Quando os finalistas, Nara Leão, Chico Buarque e Jair Rodrigues, adentraram no palco foi uma alegria geral. Tudo terminou em festa, tanto no teatro quanto em todo o país.

Vejam abaixo a letra de Disparada e a canção sendo defendida por Jair Rodrigues no festival. E se arrepiem!

Disparada
Autoria: Geraldo Vandré e Théo de Barros
Intérprete: Jair Rodrigues

Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar
Aprendi a dizer não, ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo, a morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar, eu vivo pra consertar.

Na boiada já fui boi, mas um dia me montei
Não por um motivo meu, ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse, porém por necessidade
Do dono de uma boiada cujo vaqueiro morreu.

Boiadeiro muito tempo, laço firme e braço forte
Muito gado, muita gente, pela vida segurei
Seguia como num sonho, e boiadeiro era um rei
Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo
E nos sonhos que fui sonhando, as visões se clareando
As visões se clareando, até que um dia acordei.

Então não pude seguir valente em lugar tenente
E dono de gado e gente, porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente
Se você não concordar, não posso me desculpar
Não canto pra enganar, vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado, vou cantar noutro lugar.

Na boiada já fui boi, boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém, que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse, por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu querer ir mais longe do que eu.

Mas o mundo foi rodando nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte num reino que não tem rei.

https://www.youtube.com/watch?v=82dRs2z6iQs&feature=kp

Fonte de pesquisa:
Chico Buarque de Holanda/ Abril Coleções
Chico Buarque/ Wagner Homem
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil

SÃO, SÃO PAULO MEU AMOR

Autoria de Lu Dias Carvalho

sapa

O IV Festival da TV Record aconteceu em 1968. Das mais de mil músicas inscritas, 36 seriam escolhidas como semifinalistas. Além do júri oficial foi criado também um júri popular, a pedido dos compositores, portanto, haveria duas premiações.

Amedrontados com as vaias, muitos intérpretes antigos como Hebe Camargo, Agnaldo Rayol e Roni Von recusaram-se a participar. O que deu oportunidade a uma nova leva de cantores, dentre os quais se destacava Gal Costa. Outro problema a ser contornado era a censura às letras das canções, imposta pela ditadura militar, obrigando os compositores a negociar “palavras”.

As 36 músicas, divididas em duas apresentações de 18+18, transcorreram sem incidentes e vaias, quando apresentadas ao público, mas ainda não se encontravam em julgamento. Os organizadores estavam achando o clima tão chocho que sentiram saudades das vaias de outros festivais. Mas ainda não eram as eliminatórias. Eles não perderiam por esperar.

A primeira eliminatória trouxe 12 concorrentes. Tudo transcorreu na maior calmaria. Até demais! Mas na 2ª eliminatória o clima mudou. Elza Soares levantou a plateia com Sei Lá Mangueira (Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho). Divino, Maravilhoso (Gilberto Gil e Caetano Veloso) interpretada por Gal Costa também foi muito aplaudida. Na terceira eliminatória o clima pegou fogo, com direito a sopapo e xingamento entre os que defendiam a concorrente tradicional, representada pelo samba, e os que eram a favor da revolucionária, representada pelo tropicalismo. Martinho da Vila conquistou a plateia com o samba partido-alto Casa de Bamba. Por sua vez, Tom Zé foi aplaudido de pé ao apresentar São, São Paulo Meu Amor. Não houve euforia por parte da plateia quando Chico Buarque cantou Benvinda. E assim foram escolhidas as 18 músicas que iriam para a final.

Tom Zé e Gal Costa eram os cantores mais aplaudidos daquele festival. O prêmio seria dividido entre os seis primeiros classificados, por cada um dos júris. Se o compositor tivesse a sorte de estar presente na lista dos dois júris, ganharia em dobro. Haveria também outros prêmios.

Na grande final, São, São Paulo Meu Amor foi a sétima a ser apresentada. Por ali passaram Chico Buarque, cantando Benvinda, Milton Nascimento defendendo Sentinela, Taiguara interpretando A Grande Ausente, Os Mutantes cantando 2001, Gal Costa defendendo Divino, Maravilhoso, entre outros.

Assim ficou o resultado, levando em conta os dois júris, em que três canções foram duplamente premiadas.

Júri Oficial
6 – Benvinda (Chico Buarque)
5 – Dia da Graça (Sérgio Ricardo)
4 – 2001 (Tom Zé e Rita Lee)
3 – Divino, Maravilhoso (Gil e Caetano)
2 – Marta Saré (Edu Lobo e Gianfrancesco Guarnieri)
1 – São, São Paulo Meu Amor (Tom Zé)

Júri Popular
6 – A Grande Ausente (Francis Hime e Paulo César Pinheiro)
5 – São, São Paulo Meu Amor (Tom Zé)
4 – Bonita (Geraldo Vandré e Hilton Acioly)
3 – A Família (Ary Toledo e Chico Anísio)
2 – Marta Saré (Edu Lobo e Guarnieri)
1 – Benvinda (Chico Buarque)

A plateia ficou satisfeita com a colocação do Júri Oficial, o que realmente foi levado em conta pela mídia.

Sei Lá Mangueira, de Hermínio e Paulinho da Viola, não se classificou entre as seis de nenhum dos júris, mas se transformou num grande sucesso. Anos depois, Paulinho cantou sua amada Portela em Foi Um Rio Que Passou Em Minha Vida. E Martinho da Vila iniciou aí sua carreira de sucesso com Casa de Bamba, mesmo sem ter sido classificada.

Conheçam agora a letra e ouçam a música finalista do IV Festival da Record:

São, São Paulo
Autor: Tom Zé
Intérprete: Tom Zé

São, São Paulo meu amor
São, São Paulo quanta dor
São oito milhões de habitantes
De todo canto em ação
Que se agridem cortesmente
Morrendo a todo vapor
E amando com todo ódio
Se odeiam com todo amor
São oito milhões de habitantes
Aglomerada solidão
Por mil chaminés e carros
Caseados à prestação
Porém com todo defeito
Te carrego no meu peito
São, São Paulo
Meu amor
São, São Paulo
Quanta dor
Salvai-nos por caridade
Pecadoras invadiram
Todo centro da cidade
Armadas de rouge e batom
Dando vivas ao bom humor
Num atentado contra o pudor
A família protegida
Um palavrão reprimido
Um pregador que condena
Uma bomba por quinzena
Porém com todo defeito
Te carrego no meu peito
São, São Paulo
Meu amor
São, São Paulo
Quanta dor
Santo Antonio foi demitido
Dos Ministros de cupido
Armados da eletrônica
Casam pela TV
Crescem flores de concreto
Céu aberto ninguém vê
Em Brasília é veraneio
No Rio é banho de mar
O país todo de férias
E aqui é só trabalhar
Porém com todo defeito
Te carrego no meu peito
São, São Paulo
Meu amor
São, São Paulo

Fontes de pesquisa
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil
Chico Buarque/ Wagner Homem

SABIÁ

Autoria de Lu Dias Carvalho

cici

,O III FIC (Festival Internacional da Canção) promovido pela TV Globo, em 1968, acontecia em meio à revolta geral dos jovens contra a voracidade do sistema capitalista. No Brasil, o inimigo mais voraz era a ditadura militar. Em todo o mundo surgiam líderes estudantis como Vladimir Pereira, Luís Travessos, José Dirceu e José Arantes, no Brasil; e Daniel Cohn-Bendit, na França. A Passeata dos Cem Mil, contando com a participação de Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Milton Nascimento, foi realizada com estrondoso sucesso. Apesar de tudo isso, um grupo tentava organizar o III FIC, procurando selecionar 24 músicas entre as 1.008 inscritas, na fase paulista.

Nas duas fases paulistas foram selecionadas 12 músicas. Dessas, foram classificadas seis para as vagas atribuídas a S. Paulo, que concorreriam à grande finalista nacional.

Nesta primeira fase, o que chamou a atenção foi o modo esdrúxulo com que Caetano Veloso apresentou-se, num exotismo para lá de louco. Ao reapresentar sua música É Proibido Proibir, classificada, recebeu vaias e tomates. Nem era possível ouvi-lo.

A novidade da segunda fase foi a desclassificação de Questão de Ordem, de Gilberto Gil, mostrando que plateia e júri não viam com bons olhos o tropicalismo, apresentado pelos gurus da Tropicália (Gil e Caetano).

Havia também uma preocupação com a música de Geraldo Vandré, Caminhando, em razão da ditadura militar. Imaginava a organização do Festival que ela não iria longe, mas não era o que parecia, pois seu refrão logo se tornou cantado pela plateia (Vem, vamos embora/que esperar não é saber/quem sabe faz a hora/não espera acontecer).

No final da fase paulista, quando seriam escolhidas as seis finalistas para o festival nacional, o clima pegou fogo. Os Mutantes foram os primeiros a serem vaiados. Ao cantar Caminhando, Vandré viu a plateia atritar-se, os grupos brigando entre si, sendo necessária a intervenção policial. Por sua vez, os estudantes mais politizados criticavam a postura de Caetano e Gil, que não se opunham à ditadura, e ainda apareciam como se estivessem participando de um folguedo, sem nenhuma postura política, ao contrário de Geraldo Vandré (mas o futuro traria outra mensagem).

Quando Caetano Veloso foi apresentar É Proibido Proibir, além de sua vestimenta bizarra, rebolava e imitava o ato sexual, provocando a plateia, onde muitos lhe viraram as costas. Em vez de cantar, ele passou a fazer um discurso inflamado, criticando a juventude, mas ninguém conseguia ouvir nada. E vieram ovos, tomates, bananas, papel… e até um pedaço de madeira voou e atingiu Gil, abraçado a Caetano, no palco.

As seis classificadas paulistas para o festival nacional foram:
• Caminhando – Geraldo Vandré
• Oxalá – Teo de Barros
• América, América – Cesar Roldão Vieira
• Dança da Rosa – Chico Maranhão
• Canção do Amor Amado – Sérgio Ricardo
• É Proibido Proibir – Caetano Veloso

A final seria no Maracanãzinho. Dentre as canções cariocas que iam fazer parte da final, Salmo, Andança, Sabiá, Maré Morta, Meu Sonho Antigo e Dia de Vitória, eram as mais faladas pela imprensa. Caetano resolveu não participar. Os artistas estrangeiros estavam temerosos de participar do FIC, com medo de vaias, mesmo assim grandes nomes internacionais vieram ao país.

A primeira eliminatória nacional apresentou 23 canções. Saíram bem cotadas: Dia da Vitória (Marcos Valle), Andança (Danilo Caimmi, Edmundo Souto e Paulinho Tapajós), Na Boca da Noite (Toquinho e Paulo Vanzolini) e Caminhante Noturno (Os Mutantes).

Na segunda eliminatória nacional, Cynara e Cybele apresentaram Sabiá (Tom Jobim e Chico Buarque), sendo muito aplaudida. Caminhando (Geraldo Vandré) foi tão aplaudida, que Vandré ficou muito emocionado, chegando a passar mal fora do palco. Rainha do Sobrado (Eduardo Sousa Neto) foi também muito aplaudida, assim como Sonho (Egberto Gismonti) e América, América (Cesar Roldão Vieira).

A direção do Festival recebeu um comunicado, vindo dos mandantes da ditadura, que as canções Caminhando e América, América não poderiam ganhar o festival. Mas os notificados resolveram deixar as coisas acontecerem.

Na finalíssima, a plateia cantou junto a letra de Caminhando (ou Para Não Dizer Que Não Falei de Flores), Andança (Paulinho Tapajós) e Sabiá (Tom Jobim). E assim ficou a classificação final:

1ª Sabiá (Tom Jobim/ Chico Buarque)
2ª Caminhando (Vandré)
3ª Andança (Danilo Caimmi, Edmundo Souto e Paulinho Tapajós)
4ª Pascalha (Quarteto 004)
5ª Dia de Vitória (Marcos Valle)
6ª Caminhante Noturno (Os Mutantes)

A maior parte do público contestou o resultado numa grande vaia, não aceitando Caminhando em segundo lugar. Era impossível ouvir Cynara e Cybele cantando Sabiá, após seu anúncio como finalista. (Vejam o vídeo abaixo). Conheçam agora sua letra e ouçam a belíssima canção:

Sabiá
Autores: música de Tom Jobim e letra de Chico Buarque
Intérpretes: Cynara e Cybele

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Vou deitar à sombra
De uma palmeira que já não há
Colher a flor que já não dá
E algum amor talvez
Possa espantar as noites
Que eu não queria
E anunciar o dia

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Não vai ser em vão
Que fiz tantos planos
De me enganar
Como fiz enganos
De me encontrar
Como fiz estradas
De me perder
Fiz de tudo e nada
De te esquecer

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
E é pra ficar
Sei que o amor existe
Eu não sou mais triste
E que a nova vida
Já vai chegar
E que a solidão
Vai se acabar

https://www.youtube.com/watch?v=Zhxcu55PRHI/

Fontes de pesquisa
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil
Chico Buarque/ Wagner Homem

LAPINHA

Autoria de Lu Dias Carvalho

Elis

A I Bienal do Samba da TV Record foi realizada em 1968, uma vez que vários compositores de samba encontravam-se chateados com os lugares reservados ao samba nos festivais de então, que sempre ocupavam as piores posições.

A I Bienal do Samba seguiria um processo diferente do que acontecia nos festivais. Uma comissão composta por 15 membros , sendo nove cariocas e seis paulistas, convidaria 36 compositores, escolhidos pelo trabalho já apresentado, e cada um deles deveria apresentar um samba inédito. A preferência seria dada aos compositores da velha guarda, havendo espaço também para os novos, como Chico Buarque, Zé Keti, Paulinho da Viola, Edu Lobo, Tom Jobim, etc. O prêmio atingiria até a 6ª colocação.

Na primeira apresentação para a seleção das músicas que concorreriam aos prêmios, Elis Regina defendeu Lapinha, de Baden Powell e César Camargo Mariano, acompanhada pelos Originais do Samba. Foi amor à primeira vista com a plateia. Vieram a seguir os cantores Isaurinha Garcia, Germano Mathias, Milton Nascimento, Zé Keti, Demônios da Garoa, Chico Buarque e Toquinho, Noite Ilustrada e Jair Rodrigues, cada um defendendo um respectivo samba. O público aplaudia alguns e vaiava outros, como sempre acontecia nos festivais.

Na primeira fase, os quatro sambas classificados foram:

Lapinha – (Baden Powell e Paulo Cesar Pinheiro) – interpretado por Elis Regina
Bom Tempo – (Chico Buarque) – interpretado pelo próprio Chico Buarque
Marina – (Synval Silva) – interpretado por Noite Ilustrada
Foi ela – (Zé Keti) – interpretada por Zé Keti e o Coral Bach que seria substituído por:
Coisas do Mundo, Minha Nega (Paulinho da Viola) – interpretado por Jair Rodrigues

A plateia chiou com a ausência do samba Mulher, Patrão e Cachaça – (Adoniran Barbosa) defendido pelos Demônios da Garoa. A cantora Aracy de Almeida homenageou Noel Rosa, ao cantar X do Problema, Feitiço da Vila e Com que Roupa.

Na segunda fase, foram classificados os sambas:

Tive Sim (Cartola) – defendido por Cyro Monteiro
Quando a Polícia Chegar (João da Baiana) – defendido por Clementina de Jesus
Quem Dera (Sidney Miller) – defendido por MPB4
Luandaluar (Sérgio Ricardo) – defendido por Marília Medalha

O pianista e compositor Sinhô foi o homenageado da segunda fase da I Bienal do Samba. Chico Buarque, seu grande fã, cantou alguns de seus sambas, como Gosto que me Enrosco e Jura.

Como parte de Foi Ela, samba de Zé Keti, classificado na primeira eliminatória, fizesse parte da trilha do filme Rio, Zona Norte (1957), ele foi desclassificado, entrando em seu lugar Coisas do Mundo, Minha Nega (Paulinho da Viola) defendido por Jair Rodrigues.

A terceira eliminatória classificou os sambas:

Rainha Porta Bandeira (Edu Lobo) – cantado por Márcia e Edu
Canto Chorado (Billy Blanco) – cantado por Jair Rodrigues
Protesto Meu Amor (Pixinguinha) – cantado por Clementina de Jesus
Pressentimento (Elton Medeiro e Hermínio Bello de Carvalho) – cantado por  Marília Medalha

Ary Barroso foi o homenageado da terceira fase da I Bienal do Samba, com alguns de  seus sambas interpretados por Cyro Monteiro.

Uma vez pronto o resultado das três eliminatórias, deu-se a finalíssima. A plateia já se via dividida entre as interpretações de Elis Regina e Jair Rodrigues, além de outros grupos que ostentavam faixas com o nome de suas canções escolhidas.

Ao somarem os votos, os jurados perceberam que os sambas Lapinha, de Baden Powell, defendido por Elis Regina e Os Originais do Samba e Bom Tempo, de Chico Buarque, defendido por ele mesmo, estavam empatados. Houve nova votação e, no desempate, o 1º lugar ficou com Lapinha.

Classificação dos sambas vencedores, em ordem decrescente:

Coisas do Mundo, Minha Nega
Tive Sim
Canto Chorado
Pressentimento
Bom Tempo
Lapinha

Agora conheçam a letra e ouçam o samba Lapinha, na voz maravilhosa de Elis Regina:

Lapinha
Autoria: Baden Powell e Paulo César Pinheiro
Intérprete: Elis Regina

Quando eu morrer me enterre na Lapinha,
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Vai meu lamento vai contar
Toda tristeza de viver
Ai a verdade sempre trai
E às vezes traz um mal a mais
Ai só me fez dilacerar
Ver tanta gente se entregar
Mas não me conformei
Indo contra lei
Sei que não me arrependi
Tenho um pedido só
Último talvez, antes de partir
Quando eu morrer me enterre na Lapinha,
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Sai minha mágoa
Sai de mim
Há tanto coração ruim
Ai é tão desesperador
O amor perder do desamor
Ah tanto erro eu vi, lutei
E como perdedor gritei
Que eu sou um homem só
Sem saber mudar
Nunca mais vou lastimar
Tenho um pedido só
Último talvez, antes de partir
Quando eu morrer me enterre na Lapinha,
Quando eu morrer me enterre na Lapinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Calça, culote, paletó almofadinha
Adeus Bahia, zum-zum-zum
Cordão de ouro
Eu vou partir porque mataram meu besouro

https://www.youtube.com/watch?v=UXPNfPhVIGg/

Fontes de pesquisa
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil
Chico Buarque/ Wagner Homem

MARGARIDA

Autoria de Lu Dias Carvalho

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O II Festival Internacional da Canção (FIC) foi realizado em 1667 pela TV Globo. Do total das canções inscritas seriam escolhidas 40, que passariam por duas preliminares, sendo 20 em cada fase. No rol das canções classificadas estavam presentes grandes compositores já conhecidos e muitos outros desconhecidos, dentre eles o jovem Milton Nascimento.

Como o FIC tratava-se de uma promoção da Secretaria de Turismo do Estado da Guanabara, não agradou aos participantes a intromissão do bedelho de Carlos Laert, Secretário de Turismo, no governo de Negrão de Lima. Ele havia rejeitado três músicas da listagem das 40. A seguir, para contornar a situação, os dirigentes fizeram com que as concorrentes passassem de 40 para 50 canções, mas sem as três eliminadas pelo secretário (Balanço do Vento, Maria Madrugada e Motivo). Ao ser questionado por Roberto Menescal, o secretário Carlos de Laert simplesmente respondeu que o Festival era deles (governo) e, assim sendo, podiam mudar o que quisessem. Menescal então comunicou sua saída, com muitos compositores aderindo a ele.

Esse grupo de compositores reuniu-se e decidiu não acatar a decisão do secretário de Turismo de jeito algum. Se caso não fossem levados em conta, eles se retirariam do FIC e informariam a Negrão de Lima a decisão tomada, com a sugestão de que Carlos de Laert fosse afastado. Descobriram também, através de investigações ocultas, que o secretário havia escolhido dois amigos de seu prédio para botar na nova lista, o que lhes deu munição para a briga.

Mesmo sendo ameaçado por Carlos de Laert, Menescal e o grupo não arredou pé, denunciando a colocação dos seus dois amigos na lista. Ao final, as três canções retiradas foram reincluídas, ficando 23 canções para cada eliminatória, pois houve a retirada, pelos próprios donos, por decisão própria, de duas músicas inscritas. Dentre as 46 músicas concorrentes, três pertenciam ao mineiro Milton Nascimento: Travessia, Morro Velho e Maria, Minha Fé).

O Maracanãzinho, já com a acústica bem melhorada, e com outras mudanças seria o palco do II FIC. Havia inúmeros artistas estrangeiros presentes. O país todo aguardava a grande festa, já se preparando para suas escolhas.

Na primeira fase, quem abriu o Festival foi Adenilde Fonseca, defendendo Fala Baixinho, de Pixinguinha. Milton Nascimento foi ovacionado ao apresentar Travessia. Era sem dúvida um dos candidatos ao prêmio. Canção de Esperar Você, interpretada por Lucinha (futura esposa de Sérgio Mendes) também encantou o público. Cynara e Cybele defenderam Carolina, de Chico Buarque, feita sem muita pretensão pelo compositor que não imaginava que ela viesse a se classificar. Ao cantar o baião-exaltação São os do Norte que Vêm, Claudionor Germano levantou a plateia. A canção Margarida, defendida pelo grupo Manifesto e pelo autor, Gutemberg Guarabyra, foi entusiasticamente recebida. Ao final da primeira fase, o público deixou clara suas preferidas: Travessia (Milton), Carolina (Chico) e Margarida (Gutemberg).

Na segunda eliminatória, Milton Nascimento foi o primeiro a se apresentar com sua canção Morro Velho, sendo aplaudidíssimo o rapaz acanhado, que não tinha dinheiro nem para ir de São Paulo ao Festival no Rio. As demais canções que se sucederam não animaram a plateia, excetuando Fuga e Antifuga do maestro Edino Krieger e Vinícius de Moraes, defendida pelo Quarteto 004 e As Meninas.

O mais interessante é que não foi Milton Nascimento quem inscreveu suas canções naquele Festival, mas Agostinho Santos, impressionado com sua voz e canções, ao ouvi-lo cantar certo dia, em São Paulo. Como ele se recusasse a participar do Festival, em parte por sua grande timidez e em parte pelo que vira em um do qual participara. Agostinho Santos pediu-lhe para gravar três músicas, para que ele escolhesse uma para botar no seu disco que iria sair, mas inscreveu as três, numa bela armação. E as três foram selecionadas para a final, numa grande façanha do compositor e cantor.

Foram classificadas onze canções na primeira eliminatória e nove na segunda. A final, contava, portanto, com 20 canções. Desse rol, dez seriam premiadas, sendo a classificada em primeiro lugar a que viria a competir com as internacionais. Para a finalíssima estavam grandes nomes como Vandré, Luís Bonfá, Dori Caymmi, Chico Buarque, Edu Lobo e Francis Hime, entre outros.

A canção Margarida foi defendida por Gutemberg Guarabyra e Gracinha, empolgando todo o Maracanãzinho. Não tinha para ninguém. Com sua letra fácil, todo mundo cantava seu refrão de cantiga de roda. Contudo, pela qualidade, até o diretor do FIC, Augusto Margazão, achava que a primeira colocada deveria ser Travessia, de Milton Nascimento. E assim ficou a colocação dos três primeiros lugares:

1º lugar – Margarida (Gutemberg Guarabyra) defendida pelo autor e Gracinha
2º lugar – Travessia (Milton Nascimento) defendida pelo próprio compositor
3º lugar – Carolina (Chico Buarque) defendida por Cynara e Cibele

Ao concorrer com as músicas internacionais, Margarida abocanhou o terceiro lugar, ganhando o primeiro lugar a canção italiana Per Uma Dona, na voz de Jimmy Fontana, que recebeu muita vaia, ao ser anunciada.

Milton Nascimento também ganhou como melhor intérprete do II FIC. Ele foi, sem dúvida, o vencedor do Festival, sendo o mais premiado. Gutemberg Guarabira, esnobado pelas gravadoras, só retomou sua caminhada artística ao formar um trio com Sá e Rodrix, enquanto Chico Buarque continuava aclamado por todos.

Travessia correu mundo, projetando Milton Nascimento internacionalmente. O II FIC ficou conhecido como o Festival de Travessia.

Abaixo, conheçam a letra e a música da canção Margarida:

Margarida
Autor: Gutemberg Guarabyra
Intérpretes: Gutemberg Guarabyra e o Grupo Manifesto

Andei, terras do meu reino em vão
Por senhora que perdi
E por quem fui descobrir
Não me crer-mais-ei aqui, me encerrei
Sou cantor e cantarei
Que em procuras de amor morri, ai!
Dor que no meu peito dói
Que destróis assim de mim
Bem sei que eu achei enfim
E que adiantou a dor,
Mas me queimou
Pois por não saber de amar
Ela ainda rainha está
E ela está em seu castelo, olê, olê, olá
E ela está em seu castelo, olê, seus cavaleiros
Ora peçam que apareça
Pois por mais que me eu me ofereça
Mais me evita essa senhora
Eu já fui rei, já fui cantor

Fontes de pesquisa
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil
Chico Buarque/ Wagner Homem

PORTA ESTANDARTE

Autoria de Lu Dias Carvalho

tuca

No II Festival da TV Excelsior, 1966, as cinco músicas classificadas na final foram:

1º – Porta Estandarte (Geraldo Vandré e Fernando Lona)
2º – Inaê (Vera Brasil e Macene Costa)
3º – Chora Céu (Adilson Godoy e Luiz Roberto)
4º – Cidade Vazia (Baden Powell e Lula Freire)
5º – Boa Palavra (Caetano Veloso)

O primeiro lugar dado à canção Porta Estandarte não trouxe nenhuma contestação, pois era realmente a mais bela das inscritas. Foi defendida pela voz exuberante da excepcional Tuca (Vanelisa Zagnida Silva) e do catarinense Airton Moreira Melo. Tuca veio a falecer aos 33 anos de idade. Airton foi para os Estados Unidos onde, convidado por Miles Davis, tornou-se um grande músico, responsável por abrir espaço para a percussão brasileira internacionalmente, ganhando inúmeros prêmios.

O paraibano Geraldo Vandré, cujo nome verdadeiro era Geraldo Pedrosa de Araújo Dias, sendo Vandré uma homenagem ao pai José Vandregísilo, embora fizesse parceria com alguns compositores, era mais conhecido no meio artístico como cantor. Compôs Porta Estandarte com seu amigo baiano Fernando Lona, quando ambos passavam férias em Penápolis, São Paulo. Fernando morreu aos 40 anos em um acidente na BR 116.

Geraldo Vandré sempre havia sonhado em fazer canções voltadas para os valores culturais do povo brasileiro, englobando suas necessidades e anseios. Portanto, a sua vitória no festival proporcionou-lhe a realização desse sonho. Foi um dos grandes nomes do período dos festivais e se transformou em um dos mitos da MPB.

Anteriormente Vandré havia defendido Sonho de um Carnaval, de Chico Buarque e no ano seguinte foi o vencedor com Porta Estandarte, ao lado de Fernando Lona.

Porta Estandarte não foi gravada com Tuca e Airton Moreira, mas com Vandré e Tuca. Diversos cantores gravaram a canção, como Dalva de Oliveira, Helena de Lima e Zizi Possi. Abaixo, a letra e a canção. Arrepiante!

Porta Estandarte
Autores: Geraldo Vandré e Fernando Lona
Intérprete: Tuca e Vandré

Olha que a vida tão linda se perde em tristezas assim
Desce o teu rancho cantando essa tua esperança sem fim
Deixa que a tua certeza se faça do povo a canção
Pra que teu povo cantando teu canto ele não seja em vão
Eu vou levando a minha vida enfim
Cantando e canto sim
E não cantava se não fosse assim
Levando pra quem me ouvir
Certezas e esperanças pra trocar
Por dores e tristezas que bem sei
Um dia ainda vão findar
Um dia que vem vindo
E que eu vivo pra cantar
Na Avenida girando, estandarte na mão pra anunciar.

https://www.youtube.com/watch?v=CSaXxblfQ5k/

Fontes de pesquisa
A era dos festivais/ Zuza Homem de Mello
Uma noite em 67/ Renato Terra e Ricardo Calil
Chico Buarque/ Wagner Homem