Autoria de LuDiasBH
“Tenho medo. Doenças, fome, miséria.
Onde vou dormir?
Em que calçada?
O que vou comer?
Nunca fiquei com o estômago vazio. Para enchê-lo deverei fuçar as latas de lixo, os despejos de sujeiras que decoram as encruzilhadas das cidades indianas.” (Marc Boulet)
Marc Boulet é um escritor francês, que nos idos de 1980 simulou ser um chinês, para escrever o seu famoso livro “Na Pele de um Chinês”. Animado com o sucesso de seus escritos, optou por uma nova façanha, na década de 1990, que seria escrever um novo livro, dessa vez vivendo a experiência de um dalit (intocável). O escritor permaneceu irredutível com sua família e seu editor, que tentaram persuadi-lo a não viver aquele novo experimento, que trazia embutido em si riscos bem maiores, caso fosse descoberto, sem falar nos problemas sérios de saúde. Ainda assim, o escritor não abriu mão de viver tal experiência e denunciar ao mundo a vida miserável dos dalits (intocáveis). O livro “Na Pele de um Dalit” foi sucesso em todo o mundo.
Antes de se deslocar para a cidade de Benares (também conhecida como Varanasi, cidade do estado de Uttar Pradesh, na Índia, localizada nas margens do Rio Ganges, e uma das mais antigas cidades do mundo e a mais sagrada da religião hinduísta), onde se daria a sua experiência, teve que passar por algumas transformações. Como era muito branco, o seu dermatologista ajudou-o a escurecer a pele, através do uso de melanina, de modo a torná-lo um hindu original. Para tornar a mudança mais verossímil, aprendeu o híndi, língua típica da etnia dos “munda”, da qual passaria a fazer parte, como se fosse um deles. À sua aparência física acresceu enormes bigodes, tão peculiares àquela gente. Satisfeito com os resultados obtidos, falando fluentemente o híndi, tomou os caminhos da Índia, ao lado de sua esposa, que tinha a função de documentar a sua história. Não podemos dizer que Marc Boulet tenha sido um mero aventureiro, pois preocupações sérias povoaram a sua mente, antes mesmo de partir.
O resultado desse ato corajoso foi o comovente livro, Na Pele de um Dalit, onde conta todas as agruras pelas quais passou, sendo um deles. Ali, Ram Munda (nome indiano adotado por Boulet) conviveu com a miséria, a fome e o desprezo, situações que milhões de indianos pertencentes, principalmente ao hinduísmo, vivem na pele, diariamente. E, como já vimos em outros textos, eles aceitam tudo, como se houvesse um destino a lhes comandar a vida.
Ram Munda não conheceu a Índia cantada e decantada pelo seu glamour nas propagandas das agências de viagem e revistas turísticas, tampouco viu as mulheres deslumbrantes, exímias dançarinas, empencadas de joias, tão conhecidas das novelas e dos filmes de Bollywood. Durante o tempo em que viveu junto aos intocáveis (seis semanas), Marc Boulet experimentou de tudo que era comum à vida daquela gente: pediu esmolas pelas ruas de Benares, assediando turistas; foi humilhado, escarnecido e repelido por hindus de outras castas; dormiu nas calçadas; fez suas necessidades fisiológicas nas ruas; comeu sobras de comida; foi impedido de entrar nos templos; teve até a própria sombra escorraçada.
Este é apenas o preâmbulo da história que foi contada pelo livro. Iremos conhecer mais a fundo a história desse verdadeiro homem santo, que foi um dos responsáveis para desmascarar a falsa espiritualidade hindu, num país em que o dinheiro é o verdadeiro guru.
Fontes de Pesquisa:
O desafio de se tornar um dalit/ Reportagem de Carlos Herculano Lopes/ jornal Estado de Minas/ 13 de julho de 2009
Lu
Não li os livros mencionados por você, mas certa vez presenciei um orador se disfarçando de mendigo. As pessoas que assistiriam à palestra passavam por ele com menosprezo, mesmo quando ele as abordava para perguntar se ele poderia participar da palestra. Quando todos já estavam em seus lugares _ inclusive eu _ o “mendigo” adentrou o salão e se dirigiu ao púlpito e começou tirar o disfarce, e a palestrar sobre a hipocrisia e valor excessivo dado às aparências. Enfiei a viola na saco vesti a carapuça e passei a valorizar mais a essência do ser humano.
Ju
É muito interessante o fato que você acaba de relatar, provando que o mundo em que vivemos é realmente dirigido pelas aparências. Isso dá uma tristeza danada no coração da gente. Realmente fantástica a maneira que o palestra usou para chamar a atenção das pessoas. Tinham mesmo era que meter a viola no saco.
Grande abraço,
Lu
Vou seguir, é claro.
Abraços
Matê
Matê
E irá gostar muito.
Abraços,
Lu
Oi, vou ler, sim, tudo que me recomendou. Não estou certo de que o título “Na Pele de um Chinês” tenha sido editado no Brasil; talvez em Portugal. Presumo que o tradutor apenas possa ter incluído o título da aventura chinesa, vertendo-o para o português, no livro do desafio entre os indianos, somente para evitar uma fortuita incompreensão do título original em francês…ufa !! Deu trabalho escrever isto.
Renato
Você está com a razão, pois já o procurei em livrarias e sebos, sem encontrar.
Não deve ter sido editado no Brasil.
Eu sei que “Na pele de um dalit” ganhou uma nova edição.
Estou feliz com a sua presença no blog, enriquecendo-o.
Faça deste cantinho um lugar de descanso e prazer.
A casa é sua.
Obrigada pelo retorno.
Abraços,
Lu
Olá, estou lendo este livro. É simplesmente impressionante. Quando gosto de um livro costumo ler as primeiras 50 ou 100 páginas de uma vez. Este foi o primeiro em que li de cara 200 páginas e só parei para poder ter mais prazer de lê-lo no dia seguinte também. Notável é como algumas vezes, travestido de indiano, Marc Boulet começa a pensar como tal. Altamente recomendado.
Renato
Eu também fiquei profundamente impressionada com o livro.
Realmente não conseguimos parar de ler “Na pele de um dalit”, tamanha é a nossa ansiedade para chegarmos ao fim e ver o que aconteceu.
Tenho procurado por “Na pele de um chinês”, mas não consigo encontrar ainda.
O nosso blog possui mais de 100 artigos sobre os costumes indianos.
Acho que você gostará de conhecer mais sobre o assunto (veja em JANELAS PARA O MUNDO).
Há também dicas de livros semelhantes.
Gostei muito de receber o seu comentário e saber que temos muito em comum.
Grande abraço,
Lu