Autoria de Lu Dias Carvalho
Entretido coo diabo do jogo, deixou o tempo correr.
Chegaria à fazenda noite alta, cheio de aguardente.
Não achava coragem pra sair de debaixo do jatobá.
Aprumou-se depois tentando viajar na noite quente.
Desequilibrou-se por um empurrão e depois outro.
O soldado desafiava-o, com sua cara enferrujada.
Na caatinga, troava de galo, na rua só se reprimia.
O moço vexava-o ao sair da bodega sem despedir.
Plantou o salto da bota na alpercata do vaqueiro.
“Mole e quente é pé de gente” – chiou o sertanejo.
O soldado socalcou o pé com mais maldade ainda.
O vaqueiro fadigou e injuriou a mãe do malfazejo.
O amarelo apitou e o grupo rodeou o pé de jatobá.
O sertanejo marchou zonzo e foi jogado na cadeia.
Caiu de joelhos sem acusação e sem se defender.
Uma lambada de facão caiu-lhe nas costas – preia.
Por que tinham feito aquilo, não conseguia saber.
Era pessoa de bons costumes, nunca fora preso.
Aturdido, ele nem acreditava naquele flagelo atro.
Caíram em cima dele, como se fora um condenado.
Estava moído, depois de preso e surrado na bruta.
Apesar das machucaduras, balançava sua cabeça,
duvidando daquelas vicissitudes sem motivo algum.
Soldado mofino, escarro de gente, filho da puta.
Por causa de uma peste daquela, sem valia alguma,
maltratava-se um trabalhador e bom pai de família.
Estirou as pernas, firmou no muro as carnes doídas.
Foi pego de surpresa e por isso não dera explicação.
O amarelo confundira-o com outro, ele tinha certeza.
Estava acostumado com as violências e as injustiças.
Aos amigos que dormiam no tronco já deu consolação:
“Tenha paciência. Apanhar do governo não é desfeita.”
O governo, coisa distante e perfeita, não podia falhar.
O amarelo jogava com os matutos e provocava depois.
O governo não poderia consentir essa brutal safadeza.
O assucedido os outros podiam depois por aí espalhar.
Mas ele, um abrutado, emudecia, não ia contar nada.
Só queria ir pra junto de Sinha Vitória e dos meninos,
botar o corpo moído de facão na velha cama de varas.
Sua cabeça pesada e ignorante descambava sem tino.
(*) Capa de Floriano Teixeira, para edição brasileira, sem data, Ed. Record
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