Autoria de Lu Dias Carvalho
(Faça o curso gratuito de História da Arte, acessando: ÍNDICE – HISTÓRIA DA ARTE)
A composição denominada Jogos Infantis é uma obra do pintor Pieter Bruegel, o Velho, na qual ele mostra a importância de ter sido um pintor de miniaturas, ao agregar numa única tela, cuidadosamente organizada, mais de 230 figuras humanas, fato muito comum em suas pinturas. O artista tornou-se conhecido por suas obras, ao retratar o cotidiano dos camponeses — gente pela qual nutria grande admiração — tanto no trabalho quanto nos festejos. Mais uma vez Bruegel repassa a impressão de que o quadro foi pintado de cima, estando ele a olhar a cena embaixo, como acontece com várias de suas pinturas. Embora tenha pintado outros quadros que retratam a vida camponesa, Jogos Infantis é o único que apresenta predominantemente crianças, o que era incomum naquele período.
Pieter Bruegel nesta sua pintura miniaturiza adultos, transformando-os em crianças, fato comum na iconografia medieval. As crianças variam de bebês a adolescentes. O artista representa um grande número de jogos e atividades lúdicas (em torno de 83) do século XVI, sendo muitos deles identificáveis e ainda usados até os dias de hoje, como as seguintes brincadeiras: pernas de pau, roda, pular corda, rodar aros, cavalo de pau, cata-vento, cabra-cega, pular carniça, soprar bexiga, esconde-esconde, jogar castelo, andar de cadeirinha, boneca, pião, cavalinho, boca de forno, bolhas de sabão, cabo de guerra, e outros tantos mais.
Algumas diversões são calmas, enquanto outras são mais agressivas. Muitas crianças brincam tranquilamente, mas há grupos envolvidos em puxões de cabelo, luta livre e brincadeiras violentas. Um dos grupos está se divertindo com um jogo em que alguém corre pelo meio de um túnel de crianças, tendo todas elas a chutar-lhe as pernas, numa espécie de corredor polonês. Nenhuma atividade mostra-se mais importante do que a outra nesta obra do artista. O rio com suas margens, à esquerda, alivia de certa forma a cena abarrotada de crianças.
Para melhor observação do leitor, listo alguns exemplos das brincadeiras: próximo à cerca vermelha um grupo de 11 crianças simula um casamento. A noiva, usando uma roupa escura que mais se parece com uma batina, traz uma coroa na cabeça, sendo ladeada por duas personagens. Atrás dela segue o séquito e à frente duas garotas levam um grande cesto com pétalas de flores que vão sendo espalhadas à passagem do grupo festivo. Também chama a atenção em primeiro plano a presença de dois grandes barris e aros, usados para entretenimento. Na janela da casa, à esquerda, uma criança usa uma máscara, tentando chamar a atenção dos que se encontram abaixo. Na parte inferior, à esquerda da tela, na entrada do edifício, três crianças cobertas com mantos seguem em procissão atrás daquela que leva um suposto bebê para ser batizado.
Nenhum espaço fica imune ao enxame infantil, espalhado por toda a imensa tela, ocupando praça, ruas, casas, jardins e até mesmo o rio e suas margens. As crianças que se encontram em primeiro plano são bem maiores, as demais vão diminuindo de tamanho, à medida que se distanciam do observador. Elas ocupam o grande edifício que domina a praça, que pode ser uma prefeitura ou algum outro edifício cívico importante, possivelmente enfatizando a moral comum da época que rezava que os adultos que dirigem os assuntos cívicos são como crianças aos olhos de Deus.
As roupas infantis são coloridas, havendo a predominância das cores vermelha e azul que mais chamam a atenção. As cores alegres contrastam com o fundo amarelado da composição. São bem pequenas as diferenças fisionômicas entre uma criança e outra, assim como há pouca variação nas vestimentas. Ainda assim, a pintura não se mostra monótona, pois a postura dos corpos denota movimento, não havendo dois elementos iguais em toda a composição.
A falta de informações sobre quem encomendou a obra levou ao debate sobre o significado existente por trás da pintura. E são inúmeras as teorias. Uma delas afirma que se trata de um ensinamento moral que usa os jogos infantis como metáfora para mostrar a loucura dos adultos. Uma ideia oposta, baseada na teoria humanista do século 16, argumenta que a pintura mostra a importância das brincadeiras no desenvolvimento infantil.
Ainda quanto ao significado da pintura, existe também a ideia de que esta composição tenha sido a primeira de uma série de pinturas representando a Idade do Homem, sendo essa a representação da “juventude”. Se foi esta a intenção do artista, é provável que não houve prosseguimento, pois não existe referência de pinturas relacionadas ao tema, ou seja, às idades madura e velhice. Uma outra teoria revela que as crianças, focadas em suas brincadeiras, possuem a mesma seriedade demonstrada pelos adultos em suas atividades supostamente mais importantes, aos olhos de Deus, ou seja, os jogos dos filhos possuem tanto significado quanto as atividades de seus pais.
O fato é que tal quadro vem passando por inúmeras leituras e interpretações ao longo dos tempos, inclusive é um manual dos divertimentos e recreações da Europa Medieval, muitos dos quais continuam presentes nos dias de hoje. Veja abaixo:
Atenção leitor – a leitura deste texto vem batendo recordes dia após dia, ano após ano. Gostaria que deixasse na parte de “comentários” o porquê de ter chegado até ele, para que eu possa desenvolver uma tese sobre o assunto. Por favor, dê-me seu feedback.
Ficha técnica
Ano: 1560
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 118 x 161 cm
Localização: Museu de História da Arte, Viena, Áustria
Fontes de pesquisa
1000 obras-primas da pintura europeia/ Editora Könemann
https://chnm.gmu.edu/cyh/primary-sources/332
Bruegel/ Editora Cosac e Naify
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